
Valeu a pena? Não.
Introduzido pelo Grão Mestre de Cerimonia, Jean-Claude "Garrafa" Juncker, o simpático Emmanuel dirige-se para o pequeno púlpito: a plateia está esgotada, as bandeirinhas todas em ordem, os jornalistas prontos para gravar cada sílaba. Afinal é o primeiro discurso do Petit Napoléon no palco do Grande Cirque.
"Eu não quero fazer parte de uma geração de sonâmbulos" começa o bardo francês perante os deputados, num discurso que dura cerca de três horas ("pontuadas por aplausos" diz o Le Monde).
"Eu pertenço a uma geração que não experimentou a guerra e está a desfrutar o luxo de esquecer o que os antecessores experimentaram". E nisso é honesto: a geração de Macron não experimenta a guerra, limita-se a cria-la longe de casa.

sentimento anti-europeu em muitos Países: "Não podemos fingir estar num período normal, há uma dúvida sobre a Europa que atravessa os nossos Países, uma espécie de guerra civil europeia está a surgir, mas não devemos ceder ao fascínio dos sistemas iliberais e do egoísmo nacional. [...] O nosso egoísmo nacional às vezes parece mais importante do que nos une ao resto do mundo". Grande Macron. A referência é para as vitórias dos partidos eurocéticos nas últimas eleições na Itália e na Hungria.
Mas o Presidente extrai do bolso a frase histórica: "A resposta não é a democracia autoritária, mas a autoridade da democracia". Enorme Macron. Que continua com o apelo "para organizar o verdadeiro debate europeu que permitirá aos nossos povos escolher entre aqueles que querem uma Europa fraca e aqueles que estão prontos para uma Europa de soberania reinventada, uma democracia viva". Imenso Macron. Que frases, que fina inteligência.
O Petit Napoléon agora está lançado: se o Velho Continente quer os meios para reforçar as ambições duma "soberania europeia" enfrentando os desafios internacionais, a França "está pronta para aumentar a sua contribuição" para o orçamento da União após o Brexit. Que Homem, que generosidade (com o dinheiro dos outros).

Em relação à imigração, uma das questões que mais dividem os europeus, o génio galês pede para "ir
além do debate envenenado" e propõe "criar um programa europeu que apoie diretamente as autoridades locais". Começasse a França a acolher os imigrantes, tal como faz a Italia, em vez de fechar as fronteiras, talvez a coisa poderia melhorar, não é? Ops, desculpem, foi sem crer: enorme projecto de Macron, ninguém tinha pensado nisso antes!
E depois a guerra, aquela real, aquela das bombas, do sofrimento: um assunto que o sensível Macron não quer evitar: "Defendemos os princípios e o direito perto de nós, mas a realidade das crianças e das mulheres mortas num ataque ao cloro vamos deixa-la para os outros? Não, não e não! Nós destruímos três locais de produção de armas químicas sem causar sequer uma vítima. Nós não declaramos guerra a Assad, a intervenção não tem nada a ver com o Iraque ou a Líbia, apenas salvamos a honra da comunidade internacional". Palavras para quê? É um triunfo, o ponto mais elevado que um ser humano poda atingir na sua miserável vida.

Velhos. Estes são velhos. Macron é um jovem-velho. Juncker um alcoolizado velho. Esta gente é velha dentro. Falam de coisas velhas, com palavras já podres, num projecto vetusto que nem lhes pertence: são meros executores. Não há ideias novas, não há iluminações, algo que possa ser apontado como sugestão: tudo segue o percurso preestabelecido e previsível. Evocam a Democracia num púlpito anti-democrático. Falam do sofrimento das mães e atiram mísseis. Não declaram as guerras mas bombardeiam Países soberanos, atropelando os valores mais básicos do direito internacional. E aplaudem-se.
Tristeza. Melhor voltar a fechar a gaveta.
Ipse dixit
Fontes: Le Monde, La Repubblica