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O mea culpa do FMI e a canonização de Dominique

27 de Novembro de 2014, 14:00 , por Desconhecido - | No one following this article yet.
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Bom artigo de Mike Whitney publicado nas páginas de Information Clearing House.

Whitney parte duma simples consideração: nos 455 artigos que é possível encontrar no Google News e que têm como tema central o mea culpa do Fundo Monetário Internacional (FMI), nunca aparece o nome de Dominique Strauss-Kahn.

Esquisito? Sim, muito.

O FMI está arrependido. Admite que estava errado em 2010-2011, quando recomendou a austeridade para resolver os problemas económico-finenceiros. Admite que deveria ter esperado, pois as economias ocidentais ainda não estavam prontas para medidas de "lágrimas e sangue", antes deveriam der dado pelo menos alguns sinais de retoma.

De acordo com o relatório publicado pela Divisão de Investigação do Gabinete de Avaliação Independente do FMI:
As recomendações do FMI sobre a consolidação fiscal provaram ser prematuras para todas as principais economias avançadas, como também é provado terem sido optimistas todas as suas projecções de crescimento [...] A combinação dessas políticas não só provou não ser totalmente eficaz na promoção da recuperação, mas também exacerbou os efeitos negativos.
Wow...foram precisos 3 anos mas afinal o FMI concorda com o blog: retirar sangue a quem sofre de hemorragia não é o melhor dos tratamentos. Nobel da Economia para o Max? Não, porque não era apenas Informação Incorrecta a dizer estas coisas, havia outros: Leitores, blogues, sites, economistas, políticos... então como é que o FMI ignorou todos os avisos e continuou com a política suicida?

Simples: porque a política suicida era o verdadeiro objectivo.
E a admissão tardia do FMI é falsa, apenas uma maneira de fazer saber ao público que não era aquele o caminho. Fica sempre bem, sobretudo quando as previsões para os próximos tempos não são as melhores e o ranger do prédio começa a ser audível.

Tentamos ser sérios: mas alguém pensa que ninguém no FMI tinha previsto o actual cenário? Centenas de economistas não tinham intuído que empobrecer economias já empobrecidas teria dado torto?

Na verdade alguém do FMI tinha imaginado isso e costumava definir os apologistas da austeridade como furieux fous, loucos furioso. Este alguém era o Director do FMI em 2011: Dominique Strauss Khan.

Do ponto de vista dele, as medidas de choque impostas à Grécia e a outros Países europeus (Portugal!) com a crise da dívida soberana só iam provocar uma grave recessão económica e agitação social.

Foi exactamente o que aconteceu. Mas este foi apenas uma das consequências, como veremos mais à frente.

Sabemos o que aconteceu a Strauss Khan. Sabemos que foi preciso tempo para perceber exactamente o que estava em causa (eu, na altura, não vi nada de estranho nas acusações, considerando os gostos do simpático Dominique). Sabemos também que a procuradoria de New York arquivou definitivamente o caso contra ele. Mas já Strauss Khan não era Director do FMI, substituído por Christine Lagarde, casualmente apoiante da austeridade. E só a seguir tornou-se claro qual o novo rumo escolhido pela instituição.

Mas voltamos ao mea culpa do FMI. A instituição sabia exactamente quais teriam sido os efeitos da política que recomendou, e graças a essas recomendações os efeitos negativos da crise não apenas não foram bloqueados mas até pioraram.

Por qual razão? Quem ganhou com isso?
Eis um gráfico que responde bem à pergunta:


Nos Estados Unidos, 1% da população, os mais ricos, aumentaram os seus rendimentos; o resto da população viu os rendimentos cair de forma abrupta.
Muito simples.

As privatizações, os despedimentos, os jogos da Alta Finança tiveram este efeito, amplamente previsível e previsto. Nisso o FMI tem tido um papel fundamental, recomendando a redução dos gastos, o aumento dos impostos, enquanto os bancos centrais inundavam os mercados financeiros com liquidez (Quantitative Easing) que nunca atingiram a maior parte dos cidadãos ou das empresas.

Tudo isso não teria sido possível sem o apoio do FMI.

Eis alguns excertos do discurso de Dominique Strauss Kahn de Abril de 2011, um mês antes do escândalo do Hotel Sofitel de New York. Foi o discurso no Brookings Institution, think tank baseado em Washington:
As falhas mais evidentes da sociedade económica em que vivemos são o seu fracasso em proporcionar o pleno emprego e a sua distribuição arbitrária e desigual da riqueza e dos rendimentos. [...] Nem todos vão concordar com esta afirmação, na íntegra, mas o que aprendemos ao longo do tempo é que o desemprego e a desigualdade podem minar as conquistas da economia de mercado, espalhando as sementes da instabilidade.

O FMI não pode ficar indiferente aos problemas da distribuição.

Hoje, precisamos de uma força de resposta que possa empurrar nessa direcção para garantir a recuperação e isso não significa apenas trabalho para uma recuperação sustentável e equilibrada entre os países, mas também uma política que traga emprego e uma distribuição equitativa.

Mas o crescimento por si só não é suficiente. Precisamos de políticas directas para o mercado de trabalho.

Deixe-me falar um pouco sobre o segundo pulmão da crise social: a desigualdade. As pesquisas do FMI mostram que o crescimento sustentável ao longo do tempo também traz uma distribuição mais equitativa dos rendimentos.

Precisamos de políticas para reduzir as desigualdades e garantir uma distribuição mais equitativa das oportunidades e dos recursos. Fortes redes de segurança social, conjugadas com a tributação progressiva podem diminuir as desigualdades que orientam o mercado. Os investimentos na saúde e na educação são fundamentais. O direito à negociação colectiva é importante, especialmente num contexto de estagnação dos salários reais. A parceria social é um instrumento útil, pois permite não só os lucros do crescimento, mas também que os sofrimentos sejam limitados e divididos de forma bastante equilibrada.

Em última análise, o emprego e a equidade são os blocos fundamentais para a estabilidade e a prosperidade económica, a estabilidade política e a paz. Esta é a essência do mandato do FMI e deve ser colocada na agenda política. Muito obrigado.

"Tributação progressiva", "direitos colectivos", "proteger os instrumentos de segurança social", "políticas para o mercado do trabalho", "impostos sobre as actividades financeiras": na prática, Strauss Khan tinha acabado de enforcar-se.

O simpático Dominique não é um santo (tarado sexual é mesmo), longe disso: nenhum santo chega a ser Director duma instituição como o FMI. Mas tinha percebido qual a única estrada que poderia ter permitido uma recuperação económica e um futuro mais sustentável.

Infelizmente, estes não eram e ainda não são os planos dos donos do FMI.

(ao ponto em que chegamos: temos que reabilitar Dominique Strauss Khan...)


Ipse dixit.

Fontes: International Clearing House, NPR, FMI - Sustaining the Recovery through Employment and Equitable Growth

Fonte: http://feedproxy.google.com/~r/InformaoIncorrecta/~3/hFg_UhsFeMw/o-mea-culpa-do-fmi-e-canonizacao-de.html