Depois das previsões económicas (previsão pessoal: leve retoma. Logo a seguir eis que as bolsas de meio mundo entraram em queda....), vamos alargar os horizontes. Porque há vida além da economia.
O Plano A
Breve resumo dos últimos 25 anos: em Dezembro de 1991 a União Soviética desaparece oficialmente da história; em Fevereiro de 1992 é assinado o Tratado de Maastricht que estabelece as bases da desastrosa moeda única e o futuro alargamento da União Europeia; no mesmo ano, o Congresso do Partido Comunista Chinês abraça oficialmente a "economia socialista do mercado", tornando Pequim a fábrica do mundo que produz os bens consumidos pelos Estados Unidos e que também financia a compra porções crescentes de dívida pública dos EUA.
Em 1995 há o primeiro alargamento da União Europeia (Áustria, Finlândia e Suécia) que empurra as suas fronteiras perto da Rússia. Moscovo está mal: em 1998, a mistura mortal de privatização selvagem e planos do Fundo Monetário Internacional levam o País à falência; entretanto, com a primeira (1994-1996) e a segunda (1999-2009) guerra da Tchetchênia, os Anglo-Americanos e sauditas procuram expulsar os Russos do Cáucaso, a histórica porta de entrada pela qual Moscovo tem acesso ao Oriente Médio. E paciência se isso comporta o desmembramento dum inteiro País (Jugoslávia, guerras balcânicas de 1991-1999), de modo a eliminar um histórico reduto pró-russo no sudeste da Europa.
O objectivo final não é tanto a destruição ou a divisão da Rússia, por definição uma entidades multi-nacional e multi-étnica, mas reduzi-la para o nível de potência de segunda ordem, para que depois possa ser absorvida pela NATO. E no final dos anos '90 e início dos anos 2000, a entrada de Moscovo no bloco atlântico parece cada vez mais um cenário concreto.
Em Dezembro de 2001 a China é admitida oficialmente no WTO, a Organização Mundial do Comércio: Pequim se torna de verdade a fábrica do mundo, com um oceano de mão de obra barata, assegurando o rápido enriquecimento tanto duma minoria chinesa quanto das empresas ocidentais que aí se deslocam.
Em troca, Wall Street pede a abertura do sistema financeiro chinês, de forma a alargar também para a República Popular da China o controle do sistema bancário, principal ferramenta (desde o século XIX) com a qual as oligarquias anglófonas puxam as cordas das Nações e dos povos. EUA, UE e Japão pressionam a China sobre os serviços financeiros no âmbito do WTO, pois a compensação para o acesso aos livres mercados ocidentais é a possibilidade dos financiadores anglófonos se instalarem na China.
Por último, mas não menos importante, sempre nos últimos meses de 2001 temos a operação Enduring Freedom que é útil aos anglo-americanos para estabelecer-se na região estratégica do Afeganistão, já palco do grande jogo entre o Império Britânico e o Império Russo durante o século XIX (e excelente fonte de ópio): Kabul, na verdade, é apenas a primeira etapa dum projecto hegemónico bem maior porque a intenção é aquela de "abater sete Países em cinco anos, começando com o Iraque, e em seguida Síria, Líbano, Líbia, Somália, Sudão e, para acabar, o Irão".
Finalmente, a Administração de George W. Bush trabalha para atrair a Índia na órbita americana, tornando-a "aliado estratégico".
Como é claramente visível, os acontecimentos do período 1991-2001 faziam parte dum plano, que chamamos de Plano A: se totalmente implementado, teria garantido aos oligarcas anglófonos a hegemonia global, com nas mãos mais de 50% do PIB (Produto Interno Bruto) mundial, a plena posse das reservas de petróleo do Oriente Médio, uma forte presença em todo o continente euroasiático, uma influência decisiva sobre a China através do sistema bancário, a hegemonia no Mar Mediterrâneo e nos oceanos (lembramos: Reino Unido e EUA são potências de mar).
Mas o Plano A cai em pedaços. A razão? Mais do que uma:
- a ocupação do Afeganistão e do Iraque rapidamente se transformam num pântano, o que impede a estratégica mudança de regime via-militar no Irão e na Síria. Além disso, a eliminação de Saddam Hussein, um ditador sunita num País de maioria xiita, combinado com a não-intervenção paralela no Irão, aumenta exponencialmente a influência regional de Teherão;
- as relações entre as oligarquias anglófonas e Vladimir Putin gradualmente esfriam e entram em crise pela guerra na Ossétia (Agosto de 2008), adiando indefinidamente a entrada da Rússia para a NATO;
- a China não abre o seu sistema financeiro em prol de Wall Street;
- o capitalismo anglo-saxónico inicia uma fase negativa com a falência do banco Lehman Brothers em Setembro de 2008: os anglo-americanos já não têm o dinheiro para manter o império.
O Plano B
O Plano B é a repetição do anterior, com algumas mudanças estruturais: a Rússia de Vladimir Putin não é mais uma potência de segunda ordem, subordinada aos interesses euro-atlânticos, as mudanças de regime no Oriente Médio, antes conseguidas com as maciças campanhas militares de George W. Bush, são conduzidas primeiro com a Primavera Árabe (clássicas revoluções coloridas em molho médioriental) depois com as milícias do Estado Islâmico (o ISIS), uma entidade moldada pelo anglo-americanos, os israelitas e as petro-monarquias sunitas.
No Velho Continente avança a operação para incorporar as Nações europeias na entidade Atlântica: a zona do Euro, moeda introduzida com um regime de câmbios fixos numa área monetária demasiado heterogénea, acumula tensões suficientes para explodir ao primeiro choque externo (a falência Lehman Brothers); a crise e os ataques especulativos que partem dos centros financeiros de língua inglesa não visam abater o Euro mas criar um estado de crise permanente que empurre para a fundação dos Estados Unidos da Europa, algo que pode ser obtido apenas com o esgotamento das soberanias nacionais numa fase de crise aguda. O zénite da eurocrise é atingido em 2011-2012, onde, no entanto, fica claro que nem a França nem a Alemanha estão disponíveis para cair debaixo de poderes supranacionais: portanto, o Euro começa um longo e doloroso caminho para a dissolução.
Ao mesmo tempo, procedem as mudanças de regime no Oriente Médio através das Primaveras Árabes, perseguindo dois objectivos: a eliminação dos governos hostis a fim de transformar o Mediterrâneo numa espécie de "lago NATO" e a balcanização da região, para facilitar o controle. As Primaveras Árabes atingem Argélia, Tunísia, Líbia, Egipto, Síria, Irão e Iêmen. Em alguns Países falham (Argélia e Irão), em outros resultam (Tunísia, Iêmen e Egipto), em outros ainda alcançam um sucesso parcial, tanto que é precisa a intervenção da NATO para acabar o trabalho: é o caso da Líbia e da Síria. Aqui, em particular, a Rússia e a China não vão repetir o erro cometido com a Líbia (abstenção na resolução da ONU 1973) e decidem defender ao máximo o País: na óptica de Moscovo também está em jogo a base naval em Laodicéia e a capacidade de influenciar o Mediterrâneo.
A insurreição armada contra Damasco abranda ao ponto que, em Agosto de 2013, é organizado um false flag nos arredores da capital, com o uso de armas químicas, útil para justificar a intervenção militar ocidental: Rússia e Irão afirmam que vão reagir perante qualquer agressão contra a Síria, com o risco real de uma escalada militar global. O Prémio Nobel da Paz (sic!) Barack Obama desiste da intervenção desagradando aqueles importantes sectores norte-americanos prontos até a uma guerra contra a Rússia: em vez disso, aceita o compromisso para o desmantelamento das armas químicas. É uma humilhação que se acrescenta ao impasse estratégico, o que fornece uma boa chance de que Bashar Assad consiga sobreviver às tentativas de derrubá-lo por meio dos "rebelde moderados" (FSA) e da galáxia terrorista sunita (Al Qaeda, Al Nusra, etc).
As oligarquias atlânticas reagem de duas formas: com o golpe pró-ocidental na Ucrânia (Fevereiro de 2014) e com o desencadeamento paralelo do ISIS (Inverno 2013 e Primavera de 2014).
Com o Califado, entidade já por si absurda, o desejo é concluir a desestabilização da Síria e a balcanização do Iraque, onde os governos democraticamente eleitos inevitavelmente reflectem a maioria xiita no País, aproximando cada vez mais Bagdade ao Irão. A propagação do ISIS, que deixa para trás um rastro de morte e destruição, também cumpre outro propósito: a activação duma vaga migratória, útil para criar outra crise da qual deve resultar a procura de "mais Europa", ou seja, a vontade de vender quantidades crescentes de soberania nacional para enfrentar mais um desastre histórico.
Entretanto, Barack Obama continua a tentar deslocar o centro de gravidade da política americana para o Oceano Pacífico, o que culmina em 2015 com a assinatura do acordo de comércio Trans-Pacific Partnership (TPP), em clara função de anti-chinês.
O cerco anglo-americano contra Rússia e China causa, em primeiro lugar, a criação em 2014 do Novo Banco de Desenvolvimento (que incorpora também um País estratégico como a Índia) e, em seguida, o aumento da cooperação nos domínios económico e militar, através da Shanghai Cooperation Organisation (SCO).
No SCO está interessado também o Irão, potência regional em ascensão que trabalha em estreita colaboração com Moscovo sobre os casos do Iraque e da Síria: é precisamente o activismo internacional de Teherão que induz a Arábia Saudita a aventurar-se em Março de 2015 nas areias movediças iemenitas, com o objectivo de suprimir a revolta xiita pró-iraniana.
Todavia, também o Plano B aborta, pelas seguintes razões:
- a crise do Euro, em vez de fornecer um empurrão decisivo para a solidificação das instituições europeias, cria uma corrosiva relação centro-periferia, credores-devedores, que devora gradualmente a União Europeia: a imposição da austeridade para equilibrar o regime de taxas de câmbio fixas agrava as finanças públicas, produz taxas de desemprego alarmante e aniquila o tecido económico. Não só: a situação de emergência migratória, em vez de produzir "mais Europa", cria linhas de fractura adicionais com até o restabelecimento das fronteiras: isso enquanto os Países da Europa Oriental (o grupo Visegrad) excluem o colhimento de milhares de refugiados;
- a intervenção conjunta russo-iraniana retarda o processo de desestabilização da Síria e do Iraque, onde o ISIS é colocado em dificuldades a partir da intervenção russa no Outono de 2015;
- o capitalismo financeiro anglo-saxónico dá graves sinais de falhas estruturais. Apesar de Wall Street continuar a funcionar como do costume (pelo menos até Janeiro de 2016), a taxa de participação da força-trabalho está no seu nível mais baixo em 30 anos, a dívida nacional dos EUA já atinge 100% do PIB e as infra-estruturas do País caem em pedaços. Torna-se impossível garantir a Pax Americana, a prioridade para as oligarquias anglófonas é agora que ninguém preencha o vácuo de poder, a criação de novas estruturas que inevitavelmente iriam marginalizar Londres e Washington.
O Plano C
O Plano C prevê, pela primeira vez, a possibilidade de um conflito regional ou até internacional, com as duas
grandes potências (Rússia e China) que apenas quinze anos antes as oligarquias anglófonas esperavam incorporar na sua esfera de influência, enquanto hoje estão em concorrência directa para a hegemonia global.
O plano baseia-se no pressuposto de que, tal como o colapso da URSS levou ao avanço da NATO, assim o colapso da União Europeia-Zona Euro implique o prepotente regresso de Moscovo no palco europeu. Mais: a acção conjunta russo-iraniana, ao derrotar o ISIS, prejudica toda a estratégia de desestabilização do Médio Oriente realizada pelos anglófonos-israelitas-sunitas. É preciso voltar ao século XIX para encontrar uma Rússia tão activa no tabuleiro da mesma região e, tal como hoje, o Império Britânico apoiava os turcos para conter a exuberância de Moscovo (Guerra da Criméia de 1853-1856).
Europa
Após seis anos de crise, a Europa tem irremediavelmente comprometidas as finanças públicas, a saúde económica dos membros da Zona Euro (com excepção da Alemanha, que tem outros problemas) e o tecido político.
Em França, a estratégia da tensão (que depois do massacre do 13/11 continua: 7 de Janeiro em Paris, 10 de Janeiro Disneyland, sempre Paris) é funcional: a capa de terror serve para ocultar uma nova crise, desta vez bem real, representada por uma economia em coma. Uma alarmante taxa de desemprego superior a 10% e o ranger das contas públicas, a crescente intolerância do eleitorado para as condições económicas e as decisões políticas, com o consenso recolhido pelo Front National, a popularidade nos mínimos históricos do presidente François Hollande e do primeiro-ministro Manuel Valls, uma Dívida Pública que se aproxima do 100% do PIB e um défice crónico fora dos parâmetros de Bruxelas. São estas as verdadeiras razões de toda a actividade do "ISIS" na França (o que não exclui outras motivações fornecidas pelo panorama internacional).
Em Italia não é preciso o ISIS (por enquanto): é suficiente um Primeiro Ministro, Renzi, que afirma ver uma luz no fundo do túnel. E de facto há uma luz, mas provavelmente é aquela dum comboio lançado à grande velocidade.
A situação não está melhor em Espanha, onde os eleitores, cansados por uma taxa de desemprego de mais de 20%, têm quebrado a velha bipolaridade, levantando dúvidas e dificuldades sobre a formação de um executivo que é suposto suceder ao governo de Mariano Rajoy, fiel executor das ordens da Troika. Para não falar da Grécia, que no Verão de 2015 parecia condenada a sair da Zona Euro, foi mantida e agora arrisca ser expulsa da área de Schengen.
A situação é crítica ao nível dos Países, mas não também não brilha no conjunto: depois de quase um ano de flexibilização quantitativa, o Banco Central Europeu é forçado a concluir que a Zona Euro arrisca novamente a deflação. Para uma área que tem como moeda o Euro, sobrecarregado por uma quantidade insustentável da dívida, a tendência negativa dos preços pode significar (e justamente) a morte certa.
A implosão da Zona Euro é cada vez mais provável, sendo que a política já não pode contar com a forte liderança de Angela Merkel, muito enfraquecida pela política de portas abertas perante os "refugiados", em rota de colisão com os empreendedores alemães por ter aceite as sanções contra a Rússia e empenhada no resgate duma Deutsche Bank cada vez mais em dificuldades.
O esmagamento da União Europeia é uma grave derrota estratégica atlântica: um projecto de décadas aniquilado no prazo de pouco anos, com efeitos ainda para ser descobertos. Sem União, serão os interesses dos vários Países a prevalecer, um "cada um por si" que é exactamente o que as oligarquias anglófonas não desejam. É claro que não poucos Países, apesar das pressões de Washington, terão que olhar para Moscovo.
E este é um problema na óptica dos EUA, porque a maioria dos Países europeus tem como interesse um Oriente Médio (e um Mediterrâneo) estabilizado. Típico a este respeito é o caso da Itália: depois de ter sofrido o cancelamento do South Stream pela pressão anglo-americana e a desestabilização da Líbia pela NATO, dificilmente Roma continuará a apoiar a falsa guerra contra o ISIS. Mais provável que, fora dos laços europeus, a Itália convergia na direcção de Moscou com a qual tem um interesse comum no combate à desestabilização da região (Líbia, Síria, Egipto: e já temos o primeiro caso de "crise" construída entre Roma e Cairo, o estudante torturado e morto pelos serviços secretos egípcios).
Oriente Médio
O que leva ao capítulo Oriente Médio, onde a intervenção militar russa de 2015 tem sido decisiva: no prazo de três meses, o exército regular sírio recuperou as fronteiras com a Turquia e a Jordânia (donde entram os terroristas pagos pela NATO) e prepara a batalha decisiva de Aleppo, que vai decidir o destino da guerra. Mesmo discurso no Iraque, onde (em Bagdade) o estabelecimento de um centro de coordenação entre Iraque, Irão, Síria e Rússia levou à reconquista quase total de Ramadi, uma cidade estratégica nas margens do rio Eufrates e coração do Califado.
O ponto de viragem na luta contra o ISIS coincidiu com o início do bombardeio russo contra as rotas nas quais é contrabandeado o petróleo bruto (e onde o filho do primeiro ministro turco Erdogan consegue enriquecer): sem a receita do "ouro negro", permitida pelos anglófonos com a cumplicidade activa da Turquia, o ISIS começa a recuar.
Seguiu-se a derrubada por mãos turcas do avião SU-24 russo, uma óbvia retaliação contra Moscovo, e a corrida do Ocidente no Iraque, a seguir ao ataque de Paris em Novembro, de modo a ocupar uma região (o Curdistão iraquiano) para continuar o trabalho de desestabilização: são 3.700 os soldados norte-americanos no Iraque (formalmente abandonado em Dezembro de 2011) com outras tropas da NATO. Mas nem podemos esquecer as intervenções nos outros Países árabes, como o Mali e também a Libia: é nestas regiões que os militantes do ISIS encontram refugio das bombas russas, deixando as costas turcas para atracar nos portos líbios de Sirte e Derna.
Turquia
Quem se encontra em evidente dificuldade estratégica é Ankara que após ter apostado tudo na queda de Bashar Assad e no desmembramento da Síria e do Iraque, agora vê os seus objetivos desaparecer por causa da interferência russa: diminuída pelo activismo russo-iraniano e surpreendida pelo rebolir da minoria curda, Ankara é agora uma perigosa incógnita, capaz duma explosão improvisa e/ou de ações potencialmente desastrosas. Na verdade não há dúvida de que um eventual conflito entre Moscovo e Ankara significaria o início das hostilidades com os anglo-americanos também, preocupados que os Russos, uma vez eliminada a Turquia, possam expandir o controle no Mediterrâneo. Receios não muito longes daqueles de israel, onde, depois da esperança inicial em 2011 duma balcanização total da região, tem chegado a dura realidade da crescente influência do Irão, sob a protecção da máquina militar russa: é destas semanas a entrega do sistema de misseis S-300 com o qual Teherão pode complicar consideravelmente eventuais ataques aéreos em território iraniano.
Arábia Saudita
Não está melhor a Arábia Saudita que, tendo uma economia muito menos diversificada do que a Rússia (que também pode contar com os pilares dos armamentos e dos cereais), é a primeira vítima do petróleo a 30 Dólares ao barril: para estancar o crescente défice orçamental (98 bilhões de Dólares apenas em 2015, é obra) foi ventilada pela primeira vez a possibilidade de vender parte da ARAMCO, a empresa petrolífera de propriedade da família Saud. Algo que tem o sabor de desespero, explicado também pela campanha no Iêmen: este é um poço sem fundo, que engole dinheiro e que está longe de atingir o objectivo de reprimir a rebelião pró-iraniana. Até agora, Riad tem conseguido desilusões militares com a agravante de ter colocado em ebulição a grande minoria xiita (concentrada nas regiões ricas em petróleo). Como no caso da Turquia, podem EUA e israel abandonar em apuros quem partilhou e ainda partilha as muitas aventuras, como a invasão soviética do Afeganistão ou o 9/11? É muito difícil que isso possa acontecer, dados os relacionamentos entre EUA e a família Saud, por exemplo, além de que isso poderia provocar um fortalecimento do Irão e da Rússia no Golfo Pérsico. 2016 terá uma intervenção ocidental na península arábica ao lado das forças sunitas?
China
No Extremo Oriente, a China é vítima da mesma "síndrome de asfixia naval" da qual já sofreu a Alemanha durante a Primeira Guerra Mundial: Washington e os seus aliados regionais estão a tentar acalmar a crescente frota militar e comercial de Pequim através duma série de bases marítimas ao redor da costa da China, de modo a impedir o acesso aos estreitos (especialmente o de Malaca, onde Singapore juntou-se ao TTP) e ao oceano aberto. A tensão com a Marinha dos EUA está concentrada especialmente no Mar do Sul da China, ao redor das ilhas Spratly e Paracel. É de ontem a notícia da instalação nestas últimas, por parte de Pequim, de oito sistemas de misseis HQ-9 com alcance de 200 quilómetros, o que quase põe em risco até as costas das Filipinas, histórico aliado de Washington. Para ultrapassar as limitações dum possível bloqueio naval em caso de guerra, a China dá muita ênfase ao desenvolvimento da nova Rota da Seda, terrestre, com ligação à Rússia, o que deveria compensar a escassez de combustíveis e minerais.
Em conclusão, o cenário mais provável é o duma crescente tensão militar que, a partir do Oriente Médio, pode espalhar-se a nível internacional: é preciso acompanhar atentamente os desenvolvimentos das situações críticas da Turquia e da Arábia Saudita; sem esquecer as eleições nos EUA em Novembro, quando o novo presidente (eleito provavelmente com a contribuição decisiva da lobby israelita e da saudita) pode optar para uma intervenção directa no tabuleiro do Oriente Médio.
A União Europeia estará a continuar naquela altura o seu processo de decomposição e os interesses nacionais individuais (ver o recente acordo russo-alemão acerca do North Stream) vão provavelmente impedir o envolvimento dalguns Países do Velho Continente nas operações da NATO.
Num certo sentido é uma guerra de resistência, sendo que um dos lados (o pró-ocidental) tem mais pressa porque o tempo joga em favor de Bassad, do Irão e da Rússia. Estes devem apenas manter as posições e continuar a obra de enfraquecimento do ISIS até a inevitável queda. Por isso é provável nos próximos meses (final do ano?) aparecer um casus belli qualquer, uma false flag que justifique uma tomada de posição mais decisiva por parte ocidental. Sempre que Turquia ou Arábia não decidam abrir as danças ainda antes...
Ipse dixit.