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OBOR: a Estrada da Seda

25 de Fevereiro de 2018, 16:30 , por Informação Incorrecta - | No one following this article yet.
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Em Julho de 2010, no meio da crise da Grécia, os chineses compraram o porto do Pireu. Na altura, Informação Incorrecta dedicou um artigo ao facto, realçando os esforços da China para ter um cada vez melhor acesso aos mercados ocidentais.

Oito anos depois o verdadeiro objectivo destes esforços é claro: Pequim está a construir a nova Estrada da Seda, uma obra mastodóntica da qual o porto do Pireu era apenas uma peça. One Belt One Road é o nome com o qual o projecto é mais conhecido: uma nova estrada da seda destinada a mudar a fisionomia da economia mundial, algo cujo valor é avaliado em seis vezes o Plano Marshall dos americanos no final da Segunda Guerra Mundial. Vamos observa-lo mais de perto.
OBOR

O governo chinês prevê o estabelecimento de duas rotas comerciais, com a criação de novos caminhos e a exploração dos que já existem:
  • o caminho terrestre: inclui três diferentes rotas para conectar a China com a Europa, Oriente Médio e Sudeste Asiático.
  • o caminho marítimo: está dividido em duas rotas, uma que vai da China à Europa através do Oceano Índico e do Mar Vermelho; outra liga Pequim com as ilhas do Pacífico ao longo do mar da China.
Em pormenor, as rotas terrestres de referência são três:
  • uma começa a partir de Xi'an (a primeira das quatro antigas capitais chinesas), uma cidade localizada no centro do País, e atravessa o centro da Ásia, ou seja, o Cazaquistão, a Rússia (Moscovo) e, finalmente, chega ao Mar Báltico;
  • sempre de Xi'an começa uma segunda rota terrestre que atravessa o Médio Oriente, especificamente Islamabad (Paquistão), Teherão (Irão) e Istambul (Turquia);
  • a terceira rota parte de Kunming, atravessa o sudeste asiático (Tailândia, Myanmar, etc.) e termina a viagem em Delhi na Índia.
As rotas marítimas principais são duas:
  • uma começa no porto de Fuzhou e atravessa o Oceano Índico tocando Malásia, Sri Lanka e Mar Vermelho; acaba na Europa, no porto holandês de Roterdão;
  • a segunda parte sempre de Fuzhou e chega às Ilhas do Pacífico através do Mar da China.


A iniciativa One Belt One Road (OBOR) é supervisionada pela Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros e pelo Ministro do Comércio e desempenha um papel primordial nos planos do governo de Pequim como factor que contribui para os objectivos de longo prazo: dobrar o Produto Interno Bruto e criar novos laços internacionais.

O projecto abrange mais de 60 Países, que se disponibilizaram para alinhar os seus planos de desenvolvimento com aquele chinês; envolve cerca de 4.4 bilhões de pessoas (cerca de 63% da população mundial) e 29% do PIB mundial (21 bilhões de Dólares).

Os fundos? O governo de Pequim já anunciou a alocação de 40 milhões de Dólares das instituições de crédito vinculadas à iniciativa, com o fim de apoiar activamente a construção das infraestruturas necessárias para a realização do projecto. O Banco Asiático de Desenvolvimento, liderado pelo Japão, prevê a necessidade de investimentos no valor de 8 mil milhões de Dólares em infraestruturas até o final de 2020. A Indonésia, a maior economia do Sudeste Asiático, gasta 3 % do seu PIB no projecto, o que ressalta a vontade do País de adaptar os seus padrões de transporte e estruturas para permitir um desenvolvimento económico e comercial sustentado.

Como interpretar One Belt One Road? Uma simples resposta à campanha político-militar dos EUA na Eurásia? Na verdade, o OBOR é muito mais do que isso. Com esta iniciativa a China visa desenvolver laços internacionais para remediar
questões como o excesso da capacidade produtiva das empresas locais, manter o alto crescimento do PIB, alocar os seus recursos, reforçar o papel de "guia" em âmbito regional.

O projeto OBOR diz respeito a uma variedade consistente de elementos económicos e não económicos. Entre os primeiros, Pequim investe no desenvolvimento das infraestruturas dos Países envolvidos no projecto OBOR: isso reflecte o esforço para aumentar a capacidade de produção dos parceiros de negócios, bem como o grau de conexão entre a China e os Países ocidentais. Pequim forneceu vários instrumentos para apoiar os investimentos em infra-estrutura, como o estabelecimento de instituições como o Silk Road Fund e o Asian Infrastructure Investment Bank; além disso, há o apoio do Banco da China e da China International Trust & Investment Corporation.

A iniciativa One Belt One Road pode desempenhar um papel fundamental no crescimento económico dos Países mais atrasados ​​na Ásia, no Médio Oriente e no Leste Europeu, oferecendo uma saída comercial de primeira classe e uma conexão directa com os mercados mais distantes e de difícil acesso. Especificamente, uma consequência imediata será a crescente demanda por bens de empresas chinesas envolvidas na construção de equipamentos e infra-estruturas necessárias à implementação do plano. Estas novas ligações comerciais, por conseguinte, estimularão a criação de novas parcerias entre empresas locais e estrangeiras, nos sectores de construção e da tecnologia.

Com a nova rota de seda, do ponto de vista diplomático, a China tem cinco objetivos principais: a coordenação política, o aumento da conectividade, o aumento dos fluxos comerciais entre os Países, a integração financeira e a integração cultural entre as diferentes realidades. Em resumo, os objectivos do OBOR podem ser destacados nos seguintes pontos:
  • contectar os vários Países, facilitando a comunicação entre os governos;
  • conectar as infra-estruturas, para facilitar o transporte de mercadorias e de pessoas entre diferentes Estados;
  • conectar as economias para aumentar os volumes comerciais;
  • conectar os capitais, para incentivar os seus fluxos;
  • conectar as pessoas, facilitando o intercâmbio entre diferentes culturas e sistemas educacionais, incentivando a partilha de tecnologias.
Para atingir esses objectivos, a China deve tentar aplicar políticas voltadas para a estabilização do mercado e evitar uma excessiva desvalorização da sua moeda, o Yuan. O projecto One Belt One Road tem o potencial de estimular ainda mais a economia chinesa, acompanhando assim o crescimento previsto pelo governo de Pequim.

É claro que um projeto político dessa magnitude não pode estar livre de problemas.

Problemas?

Em primeiro lugar, há a oposição dos Estados Unidos perante o Asian Infrastructure Investment Bank. Esta instituição é uma resposta à gestão "ocidental" dos vários Banco Asiático de Desenvolvimento, Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional. Consequentemente, de acordo com os planos de Pequim, representa um elemento complementar e competitivo em comparação com as instituições acima mencionadas.

Outro elemento crítico pode ser representado pela invasividade do projecto, que obscurecerá os acordos entre Países previamente estipulados. Além disso, podem surgir dificuldades na aplicação de práticas empresariais tipicamente chinesas em contextos tradicionalmente e culturalmente diferentes, bem como na implementação de políticas comuns em sistemas económicos e jurídicos muito diversos.

Instabilidade política e dificuldades económicas de alguns Países interessados no projecto OBOR podem desempenhar um papel fundamental, bem como a percepção das vantagens ligadas à iniciativa: o nível de cooperação dos participantes tenderia a cair se os benefícios fossem apenas para Pequim.

Mas o maior desafio está mais uma vez ligado ao dinheiro: a situação económica chinesa encontra-se num estado relativamente incerto por causa da crescente desvalorização do Yuan (que facilita as exportações) e a consequente política monetária adotada pelo governo. A volatilidade dos mercados e uma possível diminuição do crescimento do PIB preocupam os investidores e colocam em risco a realização dos objetivos internos de longo prazo, como a manutenção de um crescimento anual do PIB de 6,5%, a duplicação do PIB per capita até 2020 e a passagem da China para uma economia de consumo.

Problemas ou não, ao longo dos últimos anos ficamos a conhecer o modelo seguido em Pequim: nada de ameaças, nada de invasões militares, nada de levantar a voz. A China prefere o silêncio e o trabalho, com resultados que pagam. Da velha Grande Marcha sobrou apenas o partido, que todavia abriu definitivamente a um livre mercado "controlado".

Não podem existir ilusões: a China atirou-se para o livre mercado, talvez colorido de vermelho, mas sempre filho primogénito do Capitalismo. Aliás: nesta altura a China é o melhor exemplo de Capitalismo em circulação, aquele feito de meios de produção, não apenas de Bolsas de Valores. Nada de Socialismo aqui, nada de Esquerda. Pequim quer criar uma classe média chinesa e os primeiros resultados estão a aparecer. Nem faltam as manchas: as condições de trabalho, as restrições pessoais (só um filho por cada família, a censura em internet), sem esquecer a questão do Tibete (que, a propósito, desapareceu por completo dos radares ocidentais. E quem não acredita no acaso, pode tentar imaginar a razão).

No entanto, a comparação com a segunda economia mundial, os Estados Unidos, é avassaladora: onde Washington mostra os músculos (e ultimamente sem muito sucesso), Pequim constrói o seu futuro peça após peça. E o OBOR é uma excelente peça.


Ipse dixit.

Relacionados:
A estrada da seda - Parte I
A estrada da seda - Parte II
Os novos acordos entre Irão e Índia 

Fontes: Belt and Road Forum for International Cooperation, The State Council of The People's Republic of China: The Belt and Road Initiative, LehmanBrown: The Belt and Road Initiative (ficheiro Pdf, inglês), Lowy Institute: Understanding China's Belt and Road Initiative (ficheiro Pdf, inglês), Corriere Asia

Fonte: http://feedproxy.google.com/~r/InformaoIncorrecta/~3/_DKnABz62Yg/obor-estrada-da-seda.html