Professores, docentes, multidões de culpados: seguem "o programa" do Ministério, preenchem fichas, dão notas. Mas notas de quê? Se o rapaz sabe Shakespeare de cor merece uma nota elevada? Maravilhoso. E como vai enfrentar a vida real este miúdo? Citando Julieta e Romeu? "Romeu, Romeu. Por que tu Romeu"?
Shakespeare é excelente, que fique claro, e é justo que seja ensinado. Mas não seria melhor também algo mais, algo mais "realidade"? A guerra, por exemplo? Porque não falar dela, sem datas mas como conceito mesmo? Como evita-la? Como lutar contra ela?
Existe uma maneira e nem é tão difícil assim: seria suficiente ensinar a pensar de forma independente. O que é exactamente o contrário do que a escola faz.
Os professores e o pensamento único
A escola distribui o pensamento standard, unificado, as ideias do Poder. Isso devasta a estima e a independência de pensamento do cidadão no prazo máximo dos seus 15 anos. Depois, será um cadáver, um servo para o resto da sua vida. Terá aprendido a raciocinar da mesma forma em que todos raciocinam, seguindo a mesma lógica, com os mesmos processos mentais. Esta é a finalidade da nossa escola: nunca criar um pensamento rebelde, contracorrente, autónomo, mas formatar alguém para que possa seguir o percurso já traçado por outros. E vocês, professores, obedecem, mostram este caminho.
É claro, não faria sentido explicar a uma criança de 6 anos o que é o Verdadeiro Poder. Mas que tal introduzir o assunto já perto dos 15? Por qual razão não explicar como funciona de verdade a nossa sociedade? Quem detém o poder e de que forma o exerce? Complicado, não é? Pois, há sempre "o programa" que deve ser seguido. É uma boa desculpa, sem dúvida.
Mas alguma vez ouviram os professores exigir que entre as várias matérias fosse introduzida uma fundamental: "como evitar as guerras"? Além da retórica nauseante, além das datas, das figuras históricas, o que há? Como ensinam aos jovens a lutar contra a guerra? Dizendo que "a guerra é má"? É uma piada ou quê? Alguém tem que ouvir uma banalidade como esta? Porque não começar a explicar que a guerra faz parte integrante da nossa sociedade, porque é útil, porque é precisa? Não útil para nós mas para um restrito círculo de pessoas, muito restrito.
Porque não explicar isso, que há um grupo que utiliza a guerra para alcançar os seus próprios fins ou como meio de controle? Controle sobra nós. Porque não explicar que não há´"guerras necessárias" porque nunca uma guerra é necessária? Porque não explicar que hoje a maior parte das guerras são feitas apenas para obter e controlar o petróleo ou o gás? Porque não explicar que as guerras são travadas para alimentar o nosso estilo de vida, opulento, exagerado, desnecessário e injusto, porque só desta forma o povinho fica calmo e aceita tudo e mais alguma coisa?
O exemplo banal: a Coca Cola
Olhem para os vossos rapazes: o que têm nas mochilas, uma Coca-Cola? Não, já devem ter explicado que a Coca Cola faz mal, deve ser evitada. Muito bem.
Explicaram também quem produz a Coca Cola? Com quais ingredientes? Explicaram que a Coca Cola importa cocaína do México na mesma altura em que morrem centenas ou milhares de pessoas por ano naquele País por causa das drogas?
Explicaram que Coca-Cola (tal como a Pepsi) estão desnecessariamente a expor milhões de norte-americanos a um químico que provoca cancro?
Que a Coca Cola despeja os seus poluentes no rio Humedal de Capellanía, na área de Fontibon. uma área de importância especial e ecologicamente protegida?
Que a Coca Cola convenceu milhares de agricultores da Índia a utilizar os seus poluentes para que fossem utilizados como fertilizantes, com o resultado de que hoje aqueles terrenos são inférteis?
Que a Coca Cola foi a primeira empresa a utilizar as mensagens sublimináis para condicionar os espectadores?
Não explicaram isso? Então se calhar é por isso também que os rapazes não trazem a Coca Cola para a escola mas continuam tranquilamente a bebe-la fora dela.
Shakespeare e a luta
Explicar as razões das guerras implicaria necessariamente explicar como funciona a nossa sociedade: seria
um olhar para o espelho, não agradável, mas verdadeiro e útil.
E aqui encontramos o problema. Ninguém quer fazer isso porque ninguém que realmente entender ou admitir isso. Os professores não exigem que a luta contra a guerra seja matéria escolar porque isso seria uma confissão: "criamos e alimentamos uma sociedade doente, baseada em conceitos obsoletos, cruéis".
Mais simples fechar os olhos. Bombas em Paris, cadáveres humanos em Lampedusa, arame farpado na Europa, crises na América do Sul, ordenados de fome na China e na Índia. E nós?
Ser ou não ser, eis a questão: será mais nobreAté Shakespeare indica o caminho: lutar para pôr fim a um mar de provocações. E, curioso, o autor inglês até bem descreve a actual condição dos professores:
Em nosso espírito sofrer pedras e flechas
Com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja,
Ou insurgir-nos contra um mar de provocações
E em luta pôr-lhes fim?
E desde que nos prendam tais cogitações,Porque ensinar, preparar alguém para o resto da vida dele, deveria ser algo fantástico, não uma mera profissão mas quase uma missão. Formatar um indivíduo, pelo contrário, é apenas crueldade.
Empresas de alto escopo e que bem alto planam
Desviam-se de rumo e cessam até mesmo
De se chamar ação.
Há algo de podre no reino da DinamarcaSim, e deve ser uma escola.
Ipse dixit.