
pergunta fica: quem matou Boris Nemtsov?
Com os tempos que vivemos, qualquer hipótese é válida. Então afirmar quem foi o assassino é impossível, por enquanto. A importância do crime é evidente, tal como a cena do crime: a poucas centenas de metros do Kremlin, óbvio o significado simbólico da escolha.
Vladimir Putim eliminou um perigoso adversário? Ou Vladimir Putin foi o alvo deste ataque?
No Ocidente, houve uma vaga de acusações contra o Presidente russo, indicado mais ou menos claramente como o responsável do homicídio. Putin teria assim eliminado um perigoso adversário? A verdade é que Nemtsov estava bem longe do ápice da popularidade, a mesma que tinha quando Yeltsin nomeou-o vice-primeiro ministro do seu governo.
Depois desta experiência, Nemtsov fundou o partido SPS , União das Forças de Direita, e entrou na Duma (o parlamento russo) como adversário de Putin. Mas nas seguintes eleições, em 2007, o SPS não alcançou os votos suficientes (apenas 0,96%) e ficou fora do parlamento. Desde então, o declínio da sua figura tem sido constante: actualmente, Nemtsov não estava entre as primeiras seis figuras da política russa. O seu novo partido, o RPR-PARNAS (Partido Republicano da Rússia - Partido da Liberdade do Povo) ficou outra vez fora da Duma e conseguiu apenas um dos 3.787 lugares nos parlamentos regionais.
Claro que era conhecido, e não pouco. Mas em torno dele reuniu-se uma oposição irregular, extra-parlamentar e divida. Isso explica, por exemplo, porque Nemtsov decidiu relançar-se indo para a Ucrânia e tornando-se, por uns tempos, conselheiro do presidente Viktor Yushchenko. Depois disso, em 2013, Nemtsov voltou para Moscovo, permanecendo nas sombras, apenas para surgir novamente no ano passado, quando atacou a atitude do Kremlin na crise ucraniana.
É por isso que Edward Luttwak (historiador e estratega americano, conselheiro da Administração e da Defesa dos EUA) afirma que Putin não pode ter sido o responsável do assassinato. Segundo ele, Nemtsov:
Era de facto um dos maiores críticos da política de expansão de Putin na Ucrânia, mas o seu protesto era absolutamente incapaz de minar a popularidade do presidente.
Podemos pensar ao Ocidente, nomeadamente aos Estados Unidos. Mas as coisas podem não ser tão simples.
Como explica o inimigo de Putin, Mikhail Gorbaciov:
O crime na ponte [ao lado do Kremlin, ndt] é uma tentativa de empurrar a situação no sentido duma complicação, talvez até mesmo de desestabilizar o País, para fortalecer a oposição
Devem ser procurados entre os ultra-nacionalistas? Entre os que querem uma intervenção militar directa na Ucrânia, em defesa do Donbass? Entre áreas dos serviços secretos russos, também insatisfeitos com a "fraqueza" de Putin perante o Ocidente?
São hipóteses válidas, se calhar menos prováveis mas consistentes e sistematicamente ignoradas pelos media ocidentais. E até pelo próprio Putin, pelo menos oficialmente. Como afirmava num programa televisivo de 2012:
Conheço bem estas tácticas, especialmente daqueles que está de fora. Eu sei: procuram uma vítima sacrificial entre alguns das mais proeminentes, depois acusam os poderes do Estado. São capazes de qualquer coisa.. E eu digo isso sem nenhum exagero.
Depois, como é evidente, há outra hipótese que não pode ser esquecida: aquela segundo a qual o responsável do homicídio tenha sido o mesmo Putin. Não pode ser descartada porque, desde que Putin está no poder, muitos antigos oligarcas (os mais perigosos) tiveram uma morte prematura e não propriamente natural. A não ser que seja considerado "natural" morrer por envenenamento com polónio ou com chumbo...
A verdade é que com Putin, a velha geração no poder sofreu uma espécie de extinção em massa. Todos aqueles que prosperavam no governo "fantoche" de Boris Eltsin e que, depois da queda deste, tentaram travar o surgimento da nova Rússia, ficaram "doentes" (alguns de forma excepcionalmente rápida...) e desapareceram do palco.
Todavia, como já referido, Nemtsov não representava actualmente um sério problema; e se a hipótese tem que ser mantida em aberto, é difícil pensar numa acto tão "previsível" por parte de Putin, pois as consequências na propaganda ocidental também eram amplamente previsíveis.
Por fim, é necessário citar a perturbadora entrevista de Boris Nemtsov no passado 2 de Março de 2014, em que ele confiou à preocupação de ser morto por mão de Putin. Uma azarada previsão ou uma involuntária sugestão para quem estava à procura duma vítima sacrificial?
Ipse dixit.
Fontes: no texto