Temos provas? Temos.
O diário italiano La Repubblica publica dois vídeos. Vamos vê-los.
Crianças que levam uma mangueirada de água. E choram.
Também eu choraria se fosse atacado com o cloro. Mas teria outros sintomas também: tosse, espuma na boca, olhos avermelhados, veias inchadas, garganta inchada, vómito, convulsões. E estaria sem roupa, porque se aquela é a que tinham durante o ataque, todos neste local fechado estariam a ser contaminados. O cloro agradece e desta forma continua a espalhar-se.
Isso não parece preocupar muito os socorristas. Agitam-se, gritam, até há um que pensa bem limpar o chão com uma esfregona. Alguém deveria explicar a razão. Cloro: um raro caso de gás que fica deitado no chão?
Para já, cartão amarelo aos pais das crianças: onde raio estão?
Segundo vídeo (o que interessa é a primeira parte, a segunda é igual ao vídeo anterior):
Diz o jornalista: "Sobretudo um ataque químico, como é evidente pelas imagens".
Ou seja: segundo ele o que vemos são socorristas que correm no meio duma nuvem de cloro. Verdade que alguns têm máscaras anti-poeira (a melhor protecção contra agentes nervosos), mas a resistência destes "rebeldes moderados" é quase sobre-humana.
E o fogo? Oh, não se preocupem, nada de especial: é só o cloro incendiado.
Estas são as "provas" do mais recente ataque químico na Síria.
A fonte: o Observatório Sírio de Direitos Humanos
Nenhuma surpresa: os vídeos foram difundidos pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), uma organização (por assim dizer...) que merece umas linhas porque nomes como Reuters, BBC, CNN ou Amnesty International costumam utiliza-la qual primária. De certeza o Leitor já ouviu citar este nome pelos órgãos de informação.
O OSDH está sediado em Coventry (Reino Unido) na casa de tal Rami Abdulrahman, pseudónimo de Osama Suleiman, único gerente. E único funcionário. O OSDH é ele, Rami, um sírio sunita dono duma loja de roupa.
Mas como faz o simpático Rami, que vive e trabalha em Coventry, a saber o que se passa na Síria? Muito simples: com o telefone. Numa entrevista de 2013, o The New York Times descreve Rami como alguém que está sempre com o telefone na mão, entre 10 e 15 horas por dia.
Isso mesmo: a principal fonte de informação ocidental acerca da guerra na Síria é o dono duma loja de roupa em Coventry que passa muito tempo ao telefone.
O Observatório Sírio de Direitos Humanos |
Em Janeiro de 2012, uma carta foi publicada no site de Syriahr.org, que afirma ser o site oficial do
verdadeiro Observatório Sírio de Direitos Humanos.
A carta indicava Osama Suleiman (o simpático Rami) qual ex-voluntário da organização. Segundo o documento, em Agosto de 2011 Suleiman-Rami foi convidado a demitir-se do cargo de voluntário depois de supostas ligações com Rifa'at al-Assad, o irmão mais novo do falecido Presidente da Síria Hafiz al-Assad e tio do actual Presidente Bashar al-Assad. Como prova, o site do OSDH afirma que Suleiman-Rami tinha dados acerca do exército sírio que era possível ter só estando em contacto com o actual governo.
Mas Suleiman-Rami decidiu vingar-se, alterando o nome de usuário e senha do site e, posteriormente, declarando-se presidente da organização. Então, sempre segundo a carta, começou também a utilizar o pseudónimo de Rami Abdulrahman, que inicialmente era adoptado por todos os membros do OSDH.
Rami negou todas as acusações, admitindo só que o verdadeiro nome dele era Osama Suleiman. Rami afirma que o site Syriahr.org é mantido por Musab Azzawi, antigo tradutor do OSDH mas depois expulso por ter falsamente afirmado ser o porta-voz oficial da organização.
Como é possível constatar, estamos perante o creme do profissionalismo, pessoas que inspiram a máxima confiança. E aqui calha bem a pergunta: quem são os benfeitores que financiam esta intrépida organização? Também neste caso a resposta é simples: segundo a citada entrevista ao New York Times, Rami paga as contas telefónicas com os lucros da loja (!!!) e "pequenos subsídios" da União Europeia e dum País europeu que prefere não identificar.
Isso é: as melhores notícias da Síria chegam ao Ocidente porque as mulheres de Coventry compram roupa. Reflitam acerca disso, colegas homenzinhos, da próxima vez que a vossa mulher ficar na frente duma montra: não pensa em gastar dinheiro, pensa em defender a Democracia.
O Observatório não presta, até as eleições
Rami Abdulrahman ao trabalho |
OSDH como fossem o Evangelho, há poucos meses tinha publicado um artigo no qual demolia a Organização.
...segundo as informações difundidas pelo Observatório, do qual, todavia, foi revelada a escassa confiança, sendo de facto gerido por uma só pessoa, financiada por uma não identificada agência britânica. [...]
Ainda acerca do Observatório, as acusações falam de factos mais relatados e relacionados com a galáxia de formações armadas pelos Países sunitas e definidos como "rebeldes". Factos que deveriam falar dos civis utilizados pelos mercenários como escudos humanos e como proteção para instalações militares e check-point; de como os "rebeldes" têm impedido que a população se afastasse da zona de guerra ou tão só da linha de fogo; ou ainda, de como a pressão internacional impediu que os "rebeldes" encontrassem um acordo [...].
Portanto, a verdade ao que parece é que são os "rebeldes" terroristas que fazem morrer de fome os civis, tirando-lhes as ajudas enviadas, utilizando-os como escudos humanos e como objecto duma ignóbil mistificação da realidade.
Explicação? Claro que há: este artigo fazia parte da campanha eleitoral do Partito Democratico (PD), o principal partido da Esquerda italiana do qual La Repubblica é o órgão de notícias mais lido. Perante as acusações de que o executivo de governo (então liderado pelo PD) era demasiado submisso aos poderes ocidentais (em primeiro lugar da União Europeia), o diário escolheu demonstrar o contrário ao tomar uma posição afastada da narrativa oficial.
Passadas as eleições (no passado mês de Março, com estrondosa derrota do PD), La Repubblica pode voltar à normalidade.
Os avisos e as razões
Pormenor interessante: há cinco dias, em ocasião da conferência de imprensa conjunta com os seus
pares turcos e iranianos após a segunda cúpula trilateral sobre a Síria, o Presidente russo Vladimir Putin tinha afirmado que a Rússia tinha "provas irrefutáveis de que as milícias jihadistas estão a preparar outras provocações usando substâncias tóxicas".
E as autoridades sírias tinham transferido para o Conselho de Segurança da ONU os dados sobre a preparação duma provocação com o uso de cloro no Ghouta Oriental. Dados que, como afirma o representante da Organização para a Proibição de Armas Químicas na Rússia, Alexander Shulguín, foram tomados em consideração mas que não puderam evitar o ataque.
Se ataque foi. Porque entre 2012 e 2018 não houve evidências para demonstrar o uso de agentes venenosos, como afirma Mohammed Adnan Tbanga, médico do Crescente Vermelho na Síria. Os especialistas da organização não encontraram provas da utilização de armas químicas no Ghouta Leste:
Trabalhei no hospital central da Douma por sete anos, houve um ataque em Janeiro de 2018 quando tivemos seis pacientes com problemas respiratórios, depois dum exame médico não encontramos nenhum agente tóxico, fizemos oxigeno-terapia e não encontrámos nenhuma prova de agentes venenosos.
A ideia não é realizar um ataque contra civis, mas espalhar a opinião de que isso aconteceu e que o culpado é o governo sírio. Nesta altura, os "rebeldes" estão a ser definitivamente derrotados e a única esperança é que haja uma intervenção militar por parte dos Estados Unidos ou dum aliado destes (o Reino Unido). Doutro lado, também Washington é obrigada a assumir o fracasso de toda a operação na Síria e uma intervenção provocada por um alegado ataque contra civis seria a única possibilidade para reverter a atual situação (hipótese muito bem vista também em Tel Avive).
Isso explica também a razão pela qual uma "organização" que é uma autêntica farsa (o tal Observatório) consegue ter tamanha importância e até condicionar o panorama informativo ocidental.
Nota final. Novos vídeos terrivelmente parecidos com aqueles já difundidos em ocasião de outros alegados ataques químicos (ver o suposto sarin de Idlib em 2017). Novas declarações americanas e russas terrivelmente parecidas com as velhas. Novas reacções dos media internacionais terrivelmente parecidas com aquelas já relatadas (caso não haja eleições) nos anos anteriores. Novo artigo do blog terrivelmente parecido com quanto já publicado no passado. Aos Leitores as conclusões.
Ipse dixit.
Fontes: The New York Times, La Repubblica, Al Masdra News, Hispan Tv, Pervy TV, RT