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Solženicyn: escolher ou ficar inertes

24 de Junho de 2015, 15:03 , por Informação Incorrecta - | No one following this article yet.
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Considerado que:
  • hoje é dia de S. João, festa em Almada (onde moro)
  • hoje é o aniversário do meu antigo aniversário (isso é: antigamente era hoje que fazia os anos, depois decidi parar na casa dos 35);
então post breve e curto, dedicado ao pensamento de Aleksandr I. Solženicyn, romancista, dramaturgo e historiador russo, conhecido, entre as outras coisas, pelo sua obra Arkhipelag Gulag ("Arquipélago Gulag"), publicado em Ocidente no ano de 1973.

Este é um livro que conta as experiência de Solženicyn no sistema dos gulags da época de Estaline e sem dúvida aconselho a sua leitura. Não completa, pois não conheço pessoas ainda em vida que tenham conseguido digerir todas as 600 páginas, mas as primeiras 200 ou 300 podem ser suficientes para entender a bondade da obra sem arriscar entrar em estado de coma vegetativo.

O pensamento de Solženicyn não é dos mais alegres mas é sem dúvida actual.
Acho que vale a pena reflectir acerca disso.
Como diz o ditado: "São João, dia de reflexão".
Ou algo do género.
Estamos agora perto de atingir o fundo, acima de todos nós paira a mais completa ruína espiritual, está prestes a rebentar a morte física que irá incinerar nós e os nossos filhos, e nós continuamos a murmurar com um tímido sorriso tímido:
- Como podemos impedi-lo? Nós não temos a força.
Estamos tão desumanizados que para obter a modesta sopa de hoje estamos dispostos a sacrificar qualquer princípio, a nossa alma, todos os esforços daqueles que nós antecederam, qualquer possibilidade para a posteridade, desde que não seja perturbada a nossa existência miserável. Nós já não temos nenhum orgulho, nenhum firmeza, nenhum zelo no coração. [...]

Realmente não há nenhuma saída? Apenas podemos esperar que algo aconteça de forma inerte, por si só?
O que fica entranhado em nós nunca irá sair sozinho se continuarmos a aceitar tudo os dias todos, a reverencia-lo, a consolidar, se não rejeitarmos pelo menos a coisa à qual é mais sensível.
Se não rejeitarmos a mentira. [...]

É aqui que encontramos a chave da nossa libertação, uma chave que temos negligenciado e que mesmo assim ainda é tão simples e acessível: a recusa em participar pessoalmente na mentira. Embora a mentira cobra tudo, embora domine em todos os lugares, num ponto somos inflexíveis: que não domine por minha causa!

Esta é a fenda no alegado círculo da nossa inação: a fenda mais fácil de realizar para nós, a mais destrutiva para a mentira. Porque se os homens rejeitarem a mentira, ela simplesmente deixa de existir. Como um contágio, ela só pode existir entre os homens. [...]

Cada um de nós, portanto, ultrapassando a pusilanimidade, faça a sua escolha: ou permanecer servo consciente da falsidade (certamente não por causa da inclinação, mas para alimentar a família, para educar as crianças no espírito das mentiras!), ou convencer-se de que chegou a hora de mexer-se, para se tornar uma pessoa honesta, digna de respeito tanto dos filhos quanto dos contemporâneos. [...]

Para os jovens que querem viver segundo a verdade, no início a existência será bastante complicada; mesmo as lições que são aprendidas na escola estão repletas de mentiras, é preciso escolher. Mas para aqueles que desejam ser honestos não há nenhuma outra saída, mesmo neste caso: jamais, mesmo nas questões técnicas mais inócuas, é possível evitar um ou outro dos passos que foram descritos, do lado da verdade ou do da mentira: do lado da independência espiritual ou do da escravidão da alma. E quem nem teve a coragem de defender a sua alma, não exiba as suas vistas de vanguarda, não se orgulhar de ser um académico ou um "artista do povo" ou um general; diga, em vez disso, simplesmente sou um animal de carga e um covarde, só é para mim suficiente ficar quente com o estômago cheio. [...]

Isto não é começar por primeiro na estrada, mas juntar-se aos outros! A viagem vai parecer tanto mais fácil e curta quanto mais estaremos unidos e numerosos. Se formos milhares, ninguém poderá lidar connosco. Se formos dezenas de milhares, o nosso país vai tornar-se irreconhecível!

Mas se deixarmos que ganhe o medo, então paremos de reclamar de que alguém não deixar-nos respirar: somos nós que não nos deixamos. Dobremos as costas ainda mais, esperemos mais, e os nossos irmãos biólogos farão amadurecer os tempos em que poderão ser lidos os nossos pensamentos e mudados os nossos genes.

Se mais uma vez seremos covardes, isso significará que somos nulidades, que para nós não há esperança, e que merecemos o desprezo de Pushkin:
De que servem às manadas os dons da liberdade?A suas heranças de geração em geraçãosão o jugo com os sinos e o chicote.

Moscovo, 12 de Fevereiro de 1974
O quê? Não é alegre?
Eu avisei, mas o Leitor é curioso, quis ler tudo, agora não pode queixar-se comigo.
Até porque é S. João e, como reza o ditado, "S. João, se não gostaste do pensamento, paciência".
Ok, admito: é um ditado inventado.
Nota-se, não é?
Bem me parecia...


Ipse dixit.

Fonte: Nexus Edizioni
Imagem de abertura: pintura de Carlos Farinha (Site, Facebook)

Nota: nada de parabéns, sério, deixei de festejar há muito para não envelhecer.
E funciona! Pelo menos acho...

Fonte: http://feedproxy.google.com/~r/InformaoIncorrecta/~3/75VwAaHPOAs/solzenicyn-escolher-ou-ficar-inertes.html