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Cidade para quem? O Plano Diretor de Porto Alegre e a luta contra o racismo ambiental

августа 29, 2025 16:57 , by Luíz Müller Blog - | No one following this article yet.
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Quilombo Kédi, um das muitas comunidades ameaçados pelo Plano Diretor de Sebastião Melo.


A revisão do Plano Diretor de Porto Alegre, conduzida pelo prefeito Sebastião Mello, não é uma mera atualização técnica de normas urbanísticas. Trata-se de um projeto político de cidade — e, como todo projeto desse tipo, define quais vidas terão acesso a direitos e quais continuarão relegadas à margem.
O texto encaminhado pela prefeitura, ao flexibilizar regras de construção, ampliar o poder do mercado imobiliário e enfraquecer mecanismos de proteção socioambiental, aponta para uma cidade ainda mais desigual. Mais do que isso, reafirma a lógica do racismo ambiental: o processo histórico pelo qual a população negra, pobre e periférica sofre de forma desproporcional os impactos da degradação ambiental e da falta de planejamento urbano.

Racismo ambiental em Porto Alegre: uma herança estrutural
Porto Alegre é uma cidade profundamente marcada pela segregação espacial. Dos tempos da escravidão às políticas urbanas do século XX, a população negra foi sistematicamente expulsa das áreas centrais e empurrada para regiões de várzea, morros e periferias. Não é por acaso que enchentes, deslizamentos e falta de infraestrutura atingem sempre os mesmos territórios e os mesmos corpos.
As enchentes de 2023 e 2024 escancararam essa realidade: bairros como Sarandi, Humaitá, Lomba do Pinheiro e Ilhas, majoritariamente habitados por população negra e trabalhadora, foram os mais atingidos e os que menos receberam suporte efetivo do poder público. Enquanto isso, áreas nobres seguem recebendo investimentos e proteção prioritária.

Esse cenário se agrava quando lembramos que Porto Alegre abriga 11 quilombos urbanos — territórios de resistência negra que enfrentam cotidianamente ameaças de remoção, precariedade de infraestrutura e ausência de políticas públicas efetivas. O mesmo vale para as comunidades indígenas, que historicamente enfrentam invisibilidade política, negação de direitos básicos e pressões constantes do mercado imobiliário sobre seus territórios. O Plano Diretor de Mello, ao não reconhecer plenamente a importância histórica, cultural e ambiental desses espaços, reforça a vulnerabilidade de comunidades que são patrimônio vivo da cidade.

O grande protagonista dessa proposta é o mercado imobiliário, que ganha ainda mais liberdade para explorar a cidade segundo seus interesses. A lógica da especulação — verticalização sem contrapartida social, remoção indireta de populações pobres e valorização artificial do solo urbano — prevalece sobre o princípio constitucional da função social da propriedade. Em vez de pensar a cidade como espaço de convivência democrática, o Plano Diretor de Mello reforça Porto Alegre como mercadoria a ser negociada, aprofundando desigualdades já históricas.

Como lembrou Benjamin Franklin Chaves Jr., ativista norte-americano e referência na formulação do conceito de racismo ambiental, esse fenômeno ocorre quando comunidades negras e periféricas são sistematicamente colocadas em contato direto com riscos ambientais, enquanto grupos privilegiados são protegidos pelo planejamento urbano. Porto Alegre exemplifica, em escala local, essa lógica perversa.

A disputa pelo direito à cidade
O direito à cidade — conceito formulado por Henri Lefebvre e reivindicado por movimentos sociais — significa o direito de todas e todos a usufruírem da cidade de forma plena, justa e digna. Mas o Plano Diretor de Mello reafirma que apenas quem pode pagar terá esse direito em Porto Alegre.
O mercado imobiliário, grande beneficiário da proposta, segue empurrando famílias pobres para áreas de risco ou para a completa exclusão territorial. Ao mesmo tempo, não há previsão concreta de política habitacional robusta, de proteção às áreas ambientais frágeis ou de fortalecimento da mobilidade pública de qualidade.
Isso é racismo ambiental na prática: negar à maioria negra da cidade o acesso a moradia digna, saneamento, transporte eficiente e áreas verdes, enquanto concentra os benefícios urbanos em espaços brancos e elitizados.

O caminho da resistência
Discutir o Plano Diretor não pode ser reduzido a debates técnicos de zoneamento e coeficientes construtivos. É preciso nomear o que está em jogo: a continuidade de um modelo de cidade que distribui privilégios a poucos e riscos a muitos.
Porto Alegre, que já se orgulhou de ser referência em participação cidadã com o Orçamento Participativo, hoje precisa enfrentar um retrocesso que ameaça a própria democracia urbana. A resistência dos movimentos sociais, do Movimento Negro, das comunidades quilombolas, indígenas, periféricas e das entidades democráticas é fundamental.

A cidade que queremos não é a que expulsa e segrega, mas a que acolhe e integra. Não é a que privilegia terrenos e capitais, mas a que protege vidas.

✍ Assinam:
Josué Franco Lopes – Advogado, membro da Coordenação Executiva da Associação de Juristas pela Democracia e Militante do Movimento Negro Unificado.
Pérola Sampaio – Bacharela em Direito, militante do Movimento Negro Unificado e da Associação de Juristas pela Democracia.


Источник: https://luizmuller.com/2025/08/29/cidade-para-quem-o-plano-diretor-de-porto-alegre-e-a-luta-contra-o-racismo-ambiental/

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