A redação de um grande jornal - sim, já tivemos isso no Brasil! - é um minimundo, onde se encontram pessoas de todo o tipo - mas todo o tipo, mesmo.
No hoje agonizante Estadão, por exemplo, durante um certo tempo um dos herdeiros da dinastia mesquitiana frequentava a redação, talvez para matar o tédio, talvez para pegar gosto pela profissão - algo que não aconteceu, pois ele se sentia mais à vontade entre cavalos e éguas que fazem a festa dos endinheirados nos jóqueis-clubes da vida.
Um belo dia, se aproximou de alguns empregados e puxou prosa. Contou que tinha ido, em viagem de negócios, ao Chile, e que ficara encantado com o país.
- Comi num restaurante com garfo e faca de prata - disse. Serviço sem igual.
As ruas eram limpíssimas, bem diferentes da imundície de São Paulo, relatou. As pessoas, ordeiras e educadas. Outro mundo.
Mas o que realmente o impressionara na viagem havia acontecido durante a cerimônia principal do evento de que participara.
Um senhor evento, que contara com a presença, vejam só, do general Augusto Pinochet, na época ainda o manda-chuva do Chile.
- Nunca vi coisa igual. Que homem! Ficou sentado na mesa principal, mais de meia hora ouvindo um discurso, sem mover um músculo. E o seu olhar, então! Impressionante! Duro, fixo num ponto da sala, sem se desviar um instante!
E arrematou, pouco antes de um telefonema o chamar para a sua sala, longe do barulho da redação:
- Vocês sabiam que ele tem olhos azuis?
É isso.
Quem possui a capacidade de notar que o ditador tem olhos azuis é mesmo especial. (Carlos Motta)