Trump foi eleito defendendo uma política econômica interna ultraliberal, como não se via desde Reagan, prometendo criar empregos às custas de reduzir impostos de empresas e dos mais ricos, desregulamentar a legislação trabalhista, reduzir a intervenção do Estado na economia interna
Por Breno Altman – de São Paulo
Duas novas fantasias da rapaziada.
A primeira delas é achar que o novo presidente norte-americano está se voltando contra a “globalização neoliberal”.
Que piração é essa?

A vitória de Donald Trump nas eleições norte-americanas foi recebida como um terremoto político devido ao conteúdo fascista contido em seu discurso
Trump foi eleito defendendo uma política econômica interna ultraliberal, como não se via desde Reagan, prometendo criar empregos às custas de reduzir impostos de empresas e dos mais ricos, desregulamentar a legislação trabalhista, reduzir a intervenção do Estado na economia interna e eliminar investimentos na rede de bem-estar social, afetando especialmente os grupos sociais mais vulneráveis, como é o caso dos imigrantes.
Montou um gabinete na medida para essa política e já começou a entregar o que prometeu.
Burguesia
Do ponto de vista internacional, seus “ataques à globalização”, salvo eventualmente em casos pontuais, como pode provisoriamente ocorrer com Rússia e Siria, Trump não representa menos imperialismo, mas exatamente o oposto: os pactos atuais com as burguesias europeias, asiáticas e dos países emergentes serão revistos para impor mais benefícios e vantagens à burguesia norte-americana, não ao contrário.
Trump é contra a Nafta porque considera esse acordo excessivamente condescendente com os mexicanos e canadenses, desejando alterar o equilíbrio de uma balança já desequilibrada.
A mesma coisa com o TPP.
Trump será o presidente mais anti-Cuba e pró-Israel das últimas décadas.
A derrota de Hillary foi positiva, de um ponto de vista geopolítico, porque Trump terá mais dificuldade de manter a unidade da burguesia mundial e o acirramento das contradições nas classes dominantes pode ajudar a reorganização e a retomada de iniciativa do campi anti-imperialista.
‘Neoliberalismo progressista’
Daí a considerar Trump um adversário da “globalização neoliberal”, vai uma enorme é intransponível distância.
A segunda fantasia da “esquerda trumpista” se revela de forma melíflua, na crítica velada ou aberta às gigantescas manifestações de mulheres contra o novo presidente.
O argumento: seria a reação do “neoliberalismo progressista” contra uma política que deseja superar o Consenso de Washington e burlar o resultado eleitoral.
Trump e a esquerda
Papo furado: as marchas foram chefiadas pela esquerda norte-americana, Angela Davis à frente, e não há qualquer protagonismo dos democratas de Hillary e Obama, que simplesmente foram deslocados do centro da disputa política que se trava nas ruas, pois são incapazes, por interesses da classe a qual se vinculam, a mesma de Trump, de fazer uma crítica frontal às opções do récem-empossado mandatário.
Se a fração mais progressista dos democratas, Sanders e seus seguidores, se juntar com o movimento liderado por mulheres e negros, mas que arrasta o conjunto das forças progressistas, talvez a esquerda norte-americana volte a ter uma chance, cinquenta anos depois da mobilização contra a guerra do Vietnã e dos levantes negros dos anos 60, de construir uma alternativa unitária e viável de poder.
A “esquerda trumpista” pode continuar ladrando, mas é melhor se dar conta de qual caravana está passando.
Breno Altman é jornalista, diretor da Revista Samuel e do site de notícias Opera Mundi.
O post A ‘esquerda trumpista’ está perdendo o juízo apareceu primeiro em Jornal Correio do Brasil.