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A selva carioca e seus bandidos

November 15, 2015 15:00 , by Jornal Correio do Brasil - | No one following this article yet.
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Por Maria Lúcia Dahl, do Rio de Janeiro:

Sair de noite no Rio de Janeiro se transformou numa perigosa aventura
Sair de noite no Rio de Janeiro se transformou numa perigosa aventura

Uma coisa pode-se dizer dos bandidos de hoje em dia: que são muito criativos. Alem de jogarem água por baixo da porta do apartamento, pro dono da casa abri-la, assustado, e ser assaltado com um revólver na cabeça, ou fumaça, em vez de água, pro pobre futuro assaltado achar que é incêndio, agora usam cachorros . Como a polícia.

Tinha eu ido ver o show do Pedro Erthal e sua banda, cover da Legião Urbana, onde o Pedro faz o Renato Russo, no Teatro Rival,( uma das melhores coisas que já vi últimamente) quando resolvemos, em estado de graça, eu e meus amigos , tomar chope no Bar Luiz, fazendo a linha “cidade à noite”, onde seQuatro cachorros policiais avançaram no carro, como nos filmes de terror, rosnando e saltando na frente dele. Olhei pelo retrovisor e vi dois caras se divertindo em atiçar os cachorros, que quase conseguiram pular no capô. vê os prédios mais lindos do Rio. Isto é, veríamos, se pudéssemos observá-los tranquilamente como num país normal. (Será que ainda existe um?)

Infelizmente, o bar já estava fechando, e por causa disso entramos outra vez no carro em direção à Lapa, e como sempre, me perdi em meio a um beco estreito com pouquíssima iluminação. Quatro cachorros policiais avançaram no carro, como nos filmes de terror, rosnando e saltando na frente dele. Olhei pelo retrovisor e vi dois caras se divertindo em atiçar os cachorros, que quase conseguiram pular no capô.

Meu amigo, ao lado, mandava-me acelerar o máximo que pudesse, e eu comecei a pensar que se tivesse que atropelar os bichos, eu o faria, mesmo sendo apaixonada por cães. Mas é difícil passar por cima de quatro cachorros grandes, ao mesmo tempo,furiosos e dispostos a ganhar a parada. Os bandidos continuavam a rir, no retrovisor, quando vi o carro da polícia que chegou na contramão, causando alvoroço nos animais e seus donos. Passei uma segunda, e consegui sair do beco e do sufoco com o coração desnorteado.

Olha, Prefeito, não dá mais pra ir ao centro da cidade. Se fosse possível , até gostaria de morar num daqueles deslumbrantes casarões art-nouveau, ou mesmo num prédio maravilhoso na Av. Beira-Mar, mas, diante das circunstancias seria melhor uma morte mais indolor, quem sabe, tomando cicuta antes de mudar pra lá?

Nossos assaltantes não deveriam ter mais de 16 anos, já que ,assassinar, no Brasil é a consequência lógica da forma violenta com que são tratadas as crianças pobres, desde que nascem, de mães menores e sem família, mendigando pelas ruas, sem nenhuma noção de certo ou errado, de afeto, de educação. Esses meninos de rua já nascem em campos de concentração, jogados em educandários, não para que sejam educados, limpos e nutridos, mas para que as ruas fiquem livres deles.

Deixo meu amigo em Copacabana onde ele tem que pular por cima de famílias de mendigos, antes de abrir o portão de ferro da sua portaria de mármore, e chego, finalmente, em casa, onde vejo o Corpo de Bombeiros na porta. Quase em pânico , pergunto ao bombeiro o que aconteceu dessa vez.

-“Pobrema de captura, madame” Respondeu ele.

Espero os bombeiros saírem do prédio ao lado, até que os vejo carregando uma coruja assustada, que entrara pela janela do quarto andar ficando em cima da geladeira como um pinguim de louça mordendo quem se aproximava.

Então me despedi dos bombeiros e da coruja que gritava na vizinhança e fui pra minha casa tentar dormir com mais um barulho desses …

Maria Lúcia Dahl , atriz, escritora e roteirista. Participou de mais de 50 filmes entre os quais – Macunaima, Menino de Engenho, Gente Fina é outra Coisa – 29 peças teatrais destacando-se- Se Correr o Bicho pega se ficar o bicho come – Trair e coçar é só começar- O Avarento. Na televisão trabalhou na Rede Globo em cerca de 29 novelas entre as quais – Dancing Days – Anos Dourados – Gabriela e recentemente em – Aquele Beijo. Como cronista escreveu durante 26 anos no Jornal do Brasil e algum tempo no Estado de São Paulo. Escreveu 5 livros sendo 2 de crônicas – O Quebra Cabeça e a Bailarina Agradece-, um romance, Alem da arrebentação, a biografia de Antonio Bivar e a sua autobiografia,- Quem não ouve o seu papai um dia balança e cai. Como redatora escreveu para o Chico Anisio Show.Como roteirista fez recentemente o filme – Vendo ou Alugo – vencedor de mais de 20 premios em festivais no Brasil.

Direto da Redação, editado pelo jornalista Rui Martins.


Source: http://correiodobrasil.com.br/selva-carioca-e-seus-bandidos/

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