Por Redação – do Rio de Janeiro:
Chegou a 11 o número de casos de microcefalia registrados no Estado do Rio de Janeiro em 2015, segundo relatório divulgado neste sábado pela Superintendência de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado de Saúde. No ano passado foram 10 casos e, em 2013, foram identificadas 19 crianças com a doença.

A possível relação da doença com o vírus zika é estudada pela secretaria, porque o Ministério da Saúde informou que existe coincidência entre a circulação do vírus e a ocorrência de casos de microcefalia em alguns estados do Nordeste. Dois casos são avaliados em São Paulo. O governo declarou estado de emergência em Pernambuco, onde foram anotados quase 500 casos de microcefalia, sendo a maioria em Recife. O aumento de casos da doença foi classificado pela Organização Mundial da Saúde como situação inusitada em termos de saúde.
A microcefalia é uma condição neurológica em que a cabeça do recém-nascido é menor quando comparada ao padrão daquela mesma idade e do mesmo sexo. Neste caso, os bebês com a malformação congênita nascem com um perímetro cefálico menor do que 33 centímetros.
Surto no Rio
Enquanto a microcefalia, no Nordeste do país, aproxima-se da epidemia — devido ao grande número de casos ocorridos — a situação se agrava no Rio e alguns infectologistas trabalham com a possibilidade da existência de um surto no Estado. A infectologista pediátrica pernambucana Maria Angela Rocha, de 67 anos, acompanhou desde o início a epidemia de microcefalia atinge o país. Maria Rocha é coordenadora do setor do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (HUOC), em Recife, que tem concentrado a maior parte do atendimento aos bebês com a má-formação no Estado.
Pernambuco, que já tem quase 500 casos notificados neste ano, foi o primeiro Estado a avisar oficialmente o Ministério da Saúde sobre o problema, que tem sido associado ao zika vírus, transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, responsável também pela dengue. No Brasil, já são mais de 700 casos notificados em 160 municípios de nove Estados, especialmente da região Nordeste.
— O serviço que coordeno é um serviço de referência em infecções congênitas. Para nós, tudo começou no finalzinho de agosto e começo de setembro. Nos últimos dias de agosto começaram a chegar três, quatro casos (de bebês com microcefalia) encaminhados por neurologistas. Antes, passávamos meses sem ver um caso. O Estado tinha uma média de nove casos por ano — disse à agência inglesa de notícias BBC.
Segundo a especialista, a primeira medida é conferir a cabeça da criança e conversar com a mãe, detalhar como foi o parto, se ela usou drogas lícitas ou ilícitas, medicamentos, se fumou, se teve alguma doença, etc. Em paralelo, pedimos a tomografia e os exames de sangue da criança. A partir daí avaliamos os resultados.
— A tomografia é a ‘foto’ do que aconteceu com o cérebro. Quando ocorre um processo de infecção, que é o que suspeitamos – geralmente entre o primeiro e o quarto mês de gestação –, o agente causador da infecção provoca um processo inflamatório que deixa cicatrizes no cérebro do bebê, que são as calcificações.
É como se essas calcificações – que podem ser maiores ou menores e estar em vários lugares do órgão – prendessem o cérebro. Aquelas áreas estão mortas, calcificadas. O cérebro não consegue crescer bem, cresce desorganizadamente, e outros problemas em sua estrutura aparecem. Quanto mais calcificações, mais desorganizado é este crescimento — disse.
A médica acredita que tem visto “tomografias muito alteradas, com calcificações extensas. Mas pode haver áreas do cérebro mais afetadas que outras. Cada criança vai ter um tipo de comprometimento a depender de como seu cérebro foi atingido”.
— Por isso, a criança precisa ser acompanhada por um neurologista por toda a vida. As que têm sequelas mais importantes podem ter convulsões de difícil controle, precisam tomar medicações específicas. De qualquer forma, elas terão algum grau de comprometimento, mesmo que seja menor. Também podem ter coisas graves, como não falar, não andar e ter todo o desenvolvimento psicomotor alterado — afirmou.
Para entender os fatos
Os casos suspeitos de microcefalia no Brasil passaram de cerca de 150 por ano para 739 em 2015 – até o dia 21 de novembro. De acordo com o Ministério da Saúde, há notificações (casos ainda não confirmados) em 160 municípios de nove Estados, principalmente no Nordeste. A maior parte delas está em Pernambuco.
Nas últimas semanas, o ministério declarou situação de emergência e recomendou cautela a mulheres que pretendem engravidar.
Segundo a infectologista Maria Angela Rocha, a microcefalia é uma má-formação não muito frequente, que pode ocorrer por alterações genéticas ou ser causada por infecções contraídas pela gestante entre o primeiro e o quarto mês de gravidez.
“O que estamos vendo aqui são casos em que os bebês foram formados corretamente, mas houve uma infecção no período de gravidez. As tomografias mostram características de processos infecciosos”, afirmou.
A principal possibilidade investigada pelos pesquisadores brasileiros é a relação com a epidemia de zika, que ocorre no Brasil desde o início do ano, quando o vírus foi identificado na Bahia.
Também transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, o vírus provoca sintomas parecidos, mas mais brandos que a dengue: febre, dor de cabeça e no corpo, manchas avermelhadas.
Em alguns casos, segundo Rocha, as mães sequer apresentam queixas de sintomas durante a gestação, mas isso não impediria que a infecção prejudicasse o bebê, assim como a rubéola.
No entanto, a correlação entre microcefalia em fetos e o contágio das mães pelo zika vírus ainda não foi comprovada em nenhum lugar do mundo. Nesta semana, a Polinésia Francesa revelou que também teve casos de má-formação cerebral em fetos e recém-nascidos após a epidemia que atingiu o território entre 2013 e 2014.
— Um surto de microcefalia nessa proporção não é descrito em canto nenhum no mundo, independente do agente que causa — concluiu a infectologista.