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Governo está secando a seiva da vida intelectual e artística do Rio

January 31, 2017 9:51 , par Jornal Correio do Brasil - | No one following this article yet.
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Parece que a falta de educação e de saúde obedece à lógica da dominação das classes endinheiradas e do Estado refém de suas estratégias

Por Leonardo Boff – do Rio de Janeiro:

Já se disse quase tudo e se fez de tudo em termos de crítica, de manifestações  de professores, alunos, artistas e intelectuais no sentido de salvar um dos patrimônios culturais mais caros à cidade do Rio de Janeiro: a Universidade do Estado Rio de Janeiro, fundada em 1950. Quero ater-me a um testemunho pessoal dos anos em que fui professor de ética e de filosofia da religião naquela Universidade que teve a generosidade de me oferecer uma cátedra logo após a minha condenação ao “silêncio obsequioso” pelas autoridades doutrinais do Vaticano. Posteriormente ingressei por concurso público. Mas antes vale recordar uma política exemplar vinda de Cuba.

O que caracterizava a Uerj era e continua sendo sua criatividade, sua abertura a fronteiras novas

O que caracterizava a Uerj era e continua sendo sua criatividade, sua abertura a fronteiras novas

A dissolução política da União Soviética que apoiava economicamente Cuba nos quadros de uma política de solidariedade, seguiu-se formidável crise generalizada. Pois a nova Rússia não tinha mais condições de ajudar o país. Entregou-o à própria sorte. Tudo foi duramente reduzido e reajustado.

Mas dois campos ficaram intocáveis: a saúde e a educação. Aí se mantiveram todos os investimentos necessários. É conhecido o alto nível da educação  e da saúde de Cuba. A razão era óbvia. Um povo doente e ignorante nunca poderá levar avante qualquer projeto nacional.

Pois não é isso que ocorre no Brasil. Cortou-se na saúde e na educação. Parece que a falta de educação e de saúde obedece à lógica da dominação das classes endinheiradas e do Estado refém de suas estratégias. É mais fácil explorar um povo ignorante e doente que sadio e educado. Muito do analfabetismo e desassistência sanitária têm raízes políticas, o que é eticamente desumano e politicamente perverso.

Assistir à derrocada da Uerj, uma das melhores universidades do país, com méritos em quase todos os campos do saber e da pesquisa. A primeira a abrir-se à política de cotas face à carência de pobres e negros, é aceitar que se mate a seiva da criatividade e se feche o horizonte de um futuro da atual geração de estudantes e de professores.

Bem dizia Celso Furtado em seu “O longo amanhecer.“Uma sociedade só se transforma se tiver capacidade de improvisar, de ter ou não acesso à criatividade: eis a questão”(1999,p.67). O que caracterizava a Uerj era e continua sendo sua criatividade, sua abertura a fronteiras novas. Seja ligadas a pesquisa de ponta em várias áreas técnicas e na saúde. A primeira a introduzir a medicina integral.

Cursos de extensão

Seja sua articulação com as bases populares com cursos de extensão na formação de lideranças,  em  direito social e educação em direitos humanos em vários município, sua atuação corajosa nos conflitos de terras.

Aceitei ser professor nesta universidade à condição de que minhas aulas fossem abertas a quem quisesse das comunidades e de outros interessados. Sempre havia representantes das bases que animavam as discussões, pois eles não falam palavras, falam coisas.

Minha preocupação em filosofia era levar os estudantes a pensar com suas próprias cabeças. Tomar como temas de tese realidades brasileiras. Não basta saber o que Aristóteles,  Heidegger, Habermas, Bergson, Deleuse ou Gatarri sabiam. Importa pensar o que sabemos.

Daí nasceram teses brilhantes, como, por exemplo, uma sobre o profeta Gentileza. Outra sobre espiritualidade nos tempos modernos no diálogo com a psicologia analítica de C.G. Jung. Uma estudante grávida deveria observar-se nas várias fases da gravidez. Fazer uma leitura filosófica-fenomenológica no sentido de vida que ia se revelando nela. Produziu um texto, digno de publicação. Exemplos entre outros tantos.

Contudo, o que mais me impressionou nesta Universidade da qual trago as melhores lembranças. Cujo nome levei a todos os países nos quais dei palestras e cursos, na Rússia, na China e até entre os samis (esquimós) perto do polo norte.

Brasil real

Foi o ambiente de abertura e de representação do que é o Brasil real. Com a presença de estudantes vindos das classes populares da Baixada Fluminense. A coexistência sem qualquer discriminação entre negros e brancos, a orientação social de todo o ensino da Universidade.

Com forte acento na construção de uma nação livre, criativa, soberana e insubmissa às lógicas da dominação. Há que recordar a resistência da Uerj à ditadura militar com a morte de um estudante pelos órgãos de repressão .

O lema das manifestações é “luto e luta”. Luto pela agonia deste centro de excelência e luta para garantir sua existência contra o sucateamento e sua eventual privatização. Salvar a Uerj é  garantir a seiva da vida intelectual e artística da cidade e permitir que o Brasil inteiro se beneficie com seus serviços sérios e excelentes. 

Leonardo Boff é teólogo, escritor e professor universitário, expoente mundial da Teologia da Libertação.

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