Por Rui Martins, de Genebra
Já tive oportunidade em outras colunas, aqui neste Direto ou no anterior, de comentar o que era ainda um risco iminente do jiadismo trazer a guerra de atentados à Europa. Esses horríveis e covardes atentados desta Sexta-feira 13 de novembro assinalam o começo de uma longa e dolorosa guerra desfechada pelos fanáticos islamitas jiadistas aos infiéis europeus em nome de Alá, por um califado fiel a uma leitura e aplicação literal do Corão.
Alguns ensaios e ameaças tinham sido feitos na Bélgica e, faz dez meses, houve o ataque e assassinato dos redatores da revista Charlie Hebdo com um objetivo bem definido : punir os humoristas desenhistas autores das caricaturas de Maomé. Apesar da grande manifestação pela liberdade de expressão e solidariedade às vítimas dos censores islamitas, uma parte do objetivo foi atingida : muitos caricaturistas não se atreveram mais a brincar com a imagem do profeta Maomé e muita gente, inclusive de esquerda, passou a defender a idéia de que os símbolos religiosos devem ser respeitados.
Os atentados desta Sexta-feira 13 não tinham um objetivo específico mas visavam aglomerações de pessoas, fosse num estádio de futebol como numa casa de espetáculos ou bares e restaurantes com a intenção de matar cegamente a desconhecidos. O atentado clássico – matar para provocar pânico e impor pelas balas de metralhadoras o respeito senão o medo à religião do profeta, que na sua época impunha seu credo pela espada aos países invadidos.
De onde saíram esses novos bárbaros que se comprazer em transmitir imagens de brutalidade e ódio na guerra missionária em que estão empenhados ? Da Caixa de Pandora aberta pelos Bushs americanos ao atacarem e destruírem o Iraque de Sadam Hussein, único Estado láico existente na época no Médio Oriente. Aprendiz feiticeiro, o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy quis imitar Bush, enquanto o inglês Cameron quis imitar Tony Blair e assim abriram outra Caixa de Pandora destruindo a Líbia de Kadhafi. Embora venerados por certos esquerdistas, tanto Hussein como Kadhafi eram ditadores implacáveis, mas asseguravam um certo equilíbrio dentro do mundo árabe-muçulmano xiita ou sunita.
Esse equilíbrio acabou, instalou-se a luta entre os muçulmanos xiitas (o Irã não é árabe mas persa) e os sunitas, discretamente subvencionados pela Arábia Saudita, surgindo primeiro a Al Qaída e a seguir com autonomia própria, o Estado Islamita ou Daesch. Assim, a primavera árabe, que muitos imaginavam levar o mundo árabe à democracia, provocou o caos ao deixar entrarem legiões de combatentes na luta contra o ditador sírio Assad.
Assim, entraram na Síria brigadas vindas do Estado Islamita que, além da guerra na Síria, provocando fuga de milhões de pessoas para a Europa e fracionando a União Européia na questão do dar ao não refúgio aos milhões de fugitivos. E procuraram conquistar jovens das periferias européias, marcados pela estigmatização e exclusão social, para se tornarem voluntários na luta contra Assad com o objetivo de lhes darem treinamento militar para, ao regressarem à Europa, criarem o clima de terror entre os infiéis europeus.
Mais de quatro mil jovens revoltados, filhos de imigrantes do Magreb (Argélia, Marrocos,Tunísia e Líbia), encontraram no fundamentalismo islamita do Corão, onde os conceitos de solidariedade foram substituídos pela aplicação dos preceitos deuma religião exigente e cruel. Alguns já foram mortos em combate pela bandeira negra do terror, mas algumas centenas estão regressando aos seus países, depois de um aprendizado prático da guerra como o saber matar sem ter medo de morrer.
Eles estão de volta e diluídos na população, escondidos e disfarçados entre seus familiares religiosos moderados, irão por em execução sua missão de desestabilizar a União Européia com séries períódicas de atentados. Difíceis de localizar, podendo agir em conjunto mas preferivelmente como células independentes, os jiadistas lançaram nesta Sexta-Feira 13 seu primeiro grande a simultâneo ataque. Alguns eram kamikases, e ao se explodirem com a promessa de irem ao céu de Alá, não deixaram pistas os outros serão difíceis de localizar.
Esses atentados feitos por uns poucos fanáticos serão suficientes para instaurar o caos e desestabilizar a União Européia. Hoje a Europa deixa de viver seus longos anos de paz desde 1945, para entrar numa outra época – a da guerra intestina, de atentados ou guerrilhas, que provocarão a insegurança nas populações dos diversos países a começar pela França.
Essa guerra irá fortalecer os movimentos racistas de extrema-direita que elegerão parlamentos e governos.Hoje a Europa mudou, nada mais será como nestes últimos anos, a insegurança vai se juntar à crise econômica e de desemprego. Como os ovos do Alien, eles serão chocados pelos próprios europeus.