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Das responsabilidades da esquerda e dos progressistas

9 de Janeiro de 2016, 19:05 , por Opinião – Jornal Correio do Brasil - | No one following this article yet.
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Meu maior descontentamento com o PT e com o governo de coalização é exatamente no campo político, na ausência do debate público

Por Conceição Oliveira – de São Paulo

Eu sou petista antes mesmo de me filiar ao PT, sou feminista, sou uma ativista dos direitos humanos e pela democratização das comunicações. Meu currículo, minhas ações e minhas ideias são públicas. Não acho que o PT ou o governo estão imunes a críticas, eu mesma já cansei de formulá-las e, ao fazê-las, faço inúmeros inimigos, inclusive entre petistas. Vários deles dizem que essas críticas têm de ser feitas internamente, como se o PT ainda praticasse o debate interno, como se o contraditório e o divergente tivessem espaço político, como se existissem prévias e fossem respeitadas, como se o PED fosse uma eleição.

Professora e midiativista, Maria Frô se posiciona como grande parte da esquerda brasileira, em relação ao governo Dilma
Professora e midiativista, Maria Frô se posiciona como grande parte da esquerda brasileira, em relação ao governo Dilma

Meu maior descontentamento com o PT e com o governo de coalização é exatamente no campo político, na ausência do debate público.

Vejo Rafael Correa se colocar em entrevistas, vejo a deputada venezuelana se opor às falácias reacionárias de Macri, vejo Pilar, como figura pública, expor ao ridículo os parvos travestidos de repórteres e morro de inveja. Nunca veremos este enfrentamento entre mídia monopolizada e os grandes nomes políticos da esquerda. Só tivemos um Brizola.

Ao contrário, aqui vemos Dilma, Cardozo, Paulo Bernardo na capa ou nas páginas amarelas da criminosa Veja, na bancada do Jornal Nacional. Os políticos petistas têm uma relação vergonhosa com a mídia monopolizada, parecem que têm uma necessidade psicológica de aceitação. Fanon possivelmente explicaria essa síndrome de Estocolmo colada como tatuagem na pele petista e de muitos da esquerda.

Partido e governo abriram mão de disputar a opinião pública. Aceitam desde 2005 um discurso criminalizador do Partido dos Trabalhadores e de suas principais lideranças. Não mexeram uma palha para a democratização das comunicações, lidaram sem paixão com a bandeira da reforma política, reforma tributária então, ninguém viu, ninguém sabe. Se acomodaram muitas vezes para manter um projeto pessoal de poder. Alguns lideranças são vexatórias e só tem cargo, não exercem papel de liderança.

Mas, infelizmente, não é só o PT e seus políticos que têm essa relação patológica com a propaganda midiática do monopólio de comunicação, com os algozes do capital.

Eu tenho cada vez menos vontade de ler e acompanhar alguns debates públicos nas redes sociais, quando os protagonistas perdem o respeito em relação aos antagonistas (mesmo que esses sejam pessoas respeitáveis) e quando os primeiros (e segundos) têm responsabilidade pública de fazer e agir melhor que os haters da rede.

Eu ando muito sem paciência mesmo para o fundamentalismo, seja ele qual for: da direita, do ignorante, da esquerda anti-petista, dos petistas que tratam o partido como se fosse uma igreja e aceitam dogmas sem críticas.

Minha opinião pessoal é que a esfera pública nas redes sociais (na mídia ela inexiste) está perdendo de goleada para a intolerância e, infelizmente, nem aqueles que têm obrigação de qualificar o debate, pois têm formação acadêmica e política, por vezes, deixam o passional falar mais alto.

Para encerrar: vou defender sempre o Estado de Direito, mas não contem comigo para defesa da pífia política econômica do governo Dilma Rousseff.

Não contem comigo pra ignorar a necessidade de se fazer uma auditoria da dívida pública, de taxar as grandes fortunas ao invés de taxar produtos e serviços, uma aberração tributária característica do Brasil e que não encontra paralelo nos países desenvolvidos.

Não contem comigo para aplaudir Kátia Abreu e o agronegócio enquanto bebês indígenas são degolados em praça pública.

Sejamos esquerda

Não contem comigo para passar a mão na cabeça de um Ministro da Justiça decorativo que vê o fascismo crescer a passos largos tomando conta de velórios, restaurantes, aeroportos, hospitais e maternidades e não toma qualquer atitude.

Não defendo (e nunca defendi) as reformas neoliberais dos governos Dilma ou dos governos Lula.

Sempre me colocarei nos debates públicos quando a política for posta de lado e o preconceito falar mais alto, quando os ataques à mulher Dilma servirem como arma da direita golpista, quando cínicos da classe média alta destilarem seus preconceitos contra políticas públicas necessárias à diminuição de nossa vergonhosa desigualdade.

Particularmente acho este governo de Dilma pífio e acho que se continuar nesta toada ele pode enterrar o legado de Lula.

Que o PT e o governo de coalização reaprendam a fazer política e a disputar a opinião pública, que tenham coragem política para fazer as reformas necessárias e elas passam ao largo de jogar a conta no lombo do trabalhador. O preço que toda esquerda pagará por opções conservadoras deste governo é imenso.

E, finalmente, que nós, da esquerda, sejamos esquerda, qualifiquemos o debate público, façamos a defesa do Estado de direito e cobremos uma guinada progressista do governo Dilma, especialmente em suas escolhas da política econômica.

Conceição Oliveira é professora e midiativista, editora do blog Maria Frô.


Fonte: http://www.correiodobrasil.com.br/das-responsabilidades-da-esquerda-e-dos-progressistas/

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