A democracia, cujo pressuposto de existência é o convívio respeitoso dos contrários, o respeito à opinião alheia, no Brasil
Por Hélio Leitão – de Brasília:
Numa madrugada de fins de dezembro do ano que acabou de terminar, o cidadão Francisco Buarque de Hollanda foi vítima de hostilidades, ao sair de um restaurante no Rio de Janeiro, chamado às falas que foi por um grupo de jovens que lhe sapecaram, entre outros impropérios, um “você é um merda”, tudo em razão de sua opção política de apoio ao governo da presidenta Dilma Rousseff, legítima e democraticamente eleita, não custa repisar.
O episódio teve enorme repercussão midiática e trouxe à baila o tema da intolerância política, cancro social que parece vir ultimamente dando o tom do debate político e mesmo das relações interpessoais.
Agudizado pelo acirramento do último processo eleitoral, o ódio de classe, herança atávica e adormecida de nossa ancestralidade escravocrata, parece ganhar as ruas. Personalidades outrora pitorescas e que sequer eram levadas a sério, como o protofascista Jair Messias Bolsonaro, misógino e homofóbico, ganham a dignidade de mito. Nesta senda, a agenda política nacional sofre brutal retrocesso conservador, a ponto de se verbalizar em manifestações de rua a pregação pela volta da ditadura militar.
A democracia, cujo pressuposto de existência é o convívio respeitoso dos contrários, o respeito à opinião alheia, no Brasil, está sob fogo cerrado. Atentai, democratas de todos os matizes e colorações partidárias…
Já quanto ao cidadão atacado nas ruas do Leblon, o letrista de Apesar de você, o romancista de Budapeste e O irmão alemão, o comendador das artes e das letras da França, ícone da cultura nacional, levou tudo na boa: foi até os jovens e, fleumático como ele só, com eles tentou travar um diálogo civilizado, como o fazem os bons democratas. Em vão, claro.
Em tempo: o título do artigo foi tomado de empréstimo do filósofo ateniense Platão, que à sua época sentenciou: “Tempos estranhos são esses em que vivemos, quando velhos e jovens são ensinados na escola da falsidade. E o único homem que se atreve a dizer a verdade é chamado de uma só vez um louco e insensato”.
Hélio Leitão, é advogado, foi presidente da OAB/CE e é secretário da Justiça e Cidadania