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E o Lula falou

8 de Janeiro de 2016, 13:24 , por Política – Jornal Correio do Brasil - | No one following this article yet.
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Lula sempre mostrou a sua honestidade como resultado do que aprendeu com a Mãe analfabeta. Comove e convence

Por Maria Fernanda Arruda – do Rio de Janeiro:

Convidado gentilmente pela Polícia Federal, Lula foi lá e prestou seu depoimento, na qualidade de testemunha. Tivesse sido intimado, por suspeito de prática de crime, a imprensa teria noticiado. Não foi esse o caso. O que ele disse lá? O que ele está nos dizendo? Necessariamente, foi um depoimento muito bem pensado, ouvidos atentos a várias falas e aconselhamentos. Por isso mesmo, houve prudência e muito caldo de galinha. Lula jamais soube de nada errado na Petrobrás, nem foram indicados seus os que mais adiante foram apanhados com a boca na botija. Tudo era encaminhado à Casa Civil e o Ministro responsável fazia e desfazia.

Maria Fernanda Arruda
Maria Fernanda Arruda

Nada mais justo. Afinal, o companheiro Jose Dirceu não corre riscos: ele já está preso. O companheiro Lula não está; e nem quer ser preso. Já por aí, ele nada teve a ver com os nomes já enredados na Operação Lava Rápido e nem em quaisquer outras. O Presidente da República não se desgasta com problemas menores, como a gestão de uma empresa estatal, mesmo quando essa empresa seja a Petrobras. Vamos “fazer de conta” que sempre foi assim.

Logo em suas primeiras palavras, Lula explicou tudo: na campanha de 2015, o PT associou-se a partidos com quem tem afinidades, com o PMDB, por exemplo. Os conchavos e trocas de favor nasceram espontânea e justificadamente disso. Excelente esse esclarecimento: jamais tínhamos suspeitado disso e, a partir de agora, atitudes que seriam tomadas por canalhas serão melhor compreendidas. Como, por exemplo, a aliança com os Picciani e a Máfia do Rio, ganhando-se quórum suficiente para arquivarem-se as tentativas indecentes de Eduardo Cunha contra a Presidenta, a companheira Dilma.

Se essas primeiras palavras foram enganosas e enganadoras, estaremos aceitando que Lula, com arguto senso de conveniência, admitiu tacitamente que o companheiro Jose Dirceu não foi o grande anjo do mal, conduzindo o Partido dos Trabalhadores para a senda do crime, mesmo porque “caixa 2”, que ainda não era roubo, era apenas um ilícito menor, algo como uma contravenção que a sociedade sempre aceita, e que o digam os banqueiros do jogo do bicho. Quanto à Petrobrás especificamente, as afinidades criadas com os novos parceiros políticos implicaram em trocas de confianças e favores de cargos, jogos políticos, não negociatas.

Se ocorreram não mais do que práticas habituais nos meios políticos, a Lula foi possível eximir-se de quaisquer responsabilidades, sem que, com isso, tenha abandonado o companheiro, apontando-o como responsável pelos malfeitos. Se não se praticaram crimes, responsabilidade de quem e no que? Restava apenas a dúvida nascida dos silêncios do PT, que optou sempre por identificar na ação condenatória do STF um ato político e não jurídico, dispensando-se da descrição exata dos fatos e acontecimentos. A postura aberrante do Supremo Tribunal foi sempre o melhor libelo de defesa.

E se Lula disse a verdade? Pior ainda. Ao deixar nas mãos de um auxiliar os destinos de uma empresa decisiva para o futuro do País, foi irresponsável e incompetente, desqualificando-se para o exercício do cargo. Lula não se deu conta do que estava acontecendo? Não recebia relatórios, não tinha em mãos instrumentos mesmo que simplórios de auditoria? É verdade que os bandidos de Brasília têm as mãos perfumadas e os rostos embelezados pelos implantes capilares, cirurgias plásticas e enxertos. Mas ao Lula, por oito anos Presidente da República, e antes disso constituinte de 1986, falta competência para distinguir alhos de bugalhos? Ou ele também se fez temerário? Acordos que envolveram ajustes e acertos com as gentes de Michel Temer poderiam ter sido acompanhados à distância, ou mesmo desacompanhados?

Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi convidado por duas vezes a depoimentos durante 2015

Lula foi convidado por duas vezes a depoimentos durante 2015. Prestou depoimento à Comissão da Verdade, numa pequena cerimônia que não mereceu atenção maior da imprensa. Não foi torturado, mas foi violentado na sua cidadania, principalmente numa prisão estúpida, e não só isso, pois que foi perseguido na sua ação como líder sindical, viu os companheiros espancados nas ruas de São Bernardo do Campo, ouviu o ruído dos motores dos helicópteros militares que acompanhavam com sua ameaça as assembleias na Vila Euclides.

Diante dos que não estavam a julgá-lo, e nem o julgariam, mas sim a História do Terror, Lula assumiu atitude de menino inibido, sua postura física definia o seu incômodo assustado. Não só não viu, como não ouviu nada. Preso, foi muito bem tratado no DOPS por Romeu Tuma e não teve qualquer contato com Sérgio Fleury. Admitiu o cabimento da missão da Comissão, mas externou sua preocupação: para o Exército não é simples aceitar isso. Limitou-se a contar a história de vida do líder sindical não politizado, minimizando o mais possível quaisquer influências de Frei Chico, o irmão do Partido Comunista, preso e torturado pelos esbirros da ditadura.

Foi coerente com a sua história: não veio ao povo, para prestar contas do “caixa 2”: quanto foi? Veio de quem? Foi gasto no que? Não se posicionou diante das condenações de Jose Dirceu e de Jose Genoíno. Não veio ao povo para dividir com ele os problemas e malfeitos em torno da Petrobrás. As contas de governo são contestadas, com má-fé evidente, ação de anjos de cara suja, ladrões de fama pública: mas onde estão as contas? Onde a seriedade no trato do dinheiro público,que houve, não está mostrada? Os procuradores do povo devem satisfações ao povo? Quando e onde? Lula pregava a necessidade de ser feito isso periodicamente, em praça pública, com os papeis na mão: paguei a quem e recebi de quem? Pretérito do passado perfeito. E ponto.

Lula sempre mostrou a sua honestidade como resultado do que aprendeu com a Mãe analfabeta. Comove e convence. Todos já estão a falar sobre 2018, pois que ninguém espera coisas maiores nos três anos que restam a Dilma Rousseff. Espera-se que sejam respeitados e cumpridos. Só.

Maria Fernanda Arruda é escritora, midiativista e colunista do Correio do Brasil, sempre às sextas-feiras.


Fonte: http://www.correiodobrasil.com.br/e-o-lula-falou/

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