Possibilidade de vivenciar cenas inteiras a distância começa, aos poucos, a gerar mudanças no consumo e compartilhamento de conteúdos
Por Redação, com DW – de Barcelona:
Primeiro o usuário vê uma pessoa fazendo uns dribles divertidos. Depois a bola é passada para outros amigos à esquerda, em algum lugar fora de sua linha de visão. Ele gira a cabeça para olhá-los, vê o céu ensolarado acima da praça arborizada. Atrás dele, corre uma rua.
O sujeito não se encontra realmente nessa praça, pelo menos não no sentido físico: ele está usando um headset Gear VR da Samsung, assistindo a um vídeo filmado com uma câmera de 360 graus.
Em vez de observar de fora, como num clip convencional, o espectador se vê inserido no centro dos acontecimentos. Pode ser uma história que alguém está lhe contando ou uma própria, uma lembrança em que ele quer acreditar. A realidade virtual (VR) em streaming permite até acompanhar a narrativa à medida que ela se desenrola.
Futuro do consumo
Demonstrações como essa foram onipresentes no Mobile World Congress (MWC) deste ano, em Barcelona. Isso lembra quão rápido as tendências se atropelam no veloz mundo da tecnologia.
Em 2015, o que fazia furor no maior congresso internacional do setor eram os smartwatches e outros dispositivos do tipo wearable (“vestíveis”). Desta vez, contudo, poucos ainda têm os wearables na mente, uma vez que há menos consumidores do que se esperava os usando no corpo, desde que entraram no mercado.
Que o MWC 2016 seria dedicado à VR ficou claro logo no último domingo, nos eventos anteriores à abertura. O criador do Facebook, Mark Zuckerberg, fez uma aparição-surpresa no lançamento do smartphone Galaxy S7 da Samsung, para anunciar uma parceria entre mídias sociais e realidade virtual.
Dias mais tarde, num discurso aos participantes do MWC, Zuckerberg chamou a atenção para as mudanças no consumo e compartilhamento de conteúdos, o qual começou com textos e passou a fotografias e vídeos à medida que a velocidade da Internet foi crescendo continuamente.
– O que eu acho que vamos ter em seguida, e isso vai acontecer mais cedo do que se pensa, é a possibilidade de compartilhar cenas inteiras. E não apenas um videozinho 2D de algo de que você gostou, mas sim, realmente, uma cena completa.”
E talvez o Facebook não seja um mau início para os consumidores que começam lentamente a se dar conta da existência da realidade virtual, comenta Arthur van Hoff, cofundador da Jaunt, especializada em aplicativos de VR cinemática.
– Neste momento estamos concentrados, justamente, em criar um mercado, estamos assegurando que as pessoas entendam o que é possível – diz Van Hoff.
De lares de idosos ao supermercado
As aplicações potenciais são vastas, explicou Hoff durante um painel sobre realidade virtual no MWC. Recentemente sua companhia levou headsets de VR a lares de idosos, estudando as utilidades possíveis para pacientes que não têm mais como visitar os filhos ou participar de eventos familiares.
A companhia Immersive Media, de produção imagens VR, também tem seus próprios exemplos de usos anticonvencionais. “Fizemos muito trabalho com as forças militares, com soldados e com distúrbios de estresse pós-traumático”, revela o diretor executivo da empresa, Myles McGovern. “E é incrível o que se pode fazer, colocando as pessoas de volta numa experiência, do ponto de vista médico.”
Mas essas são aplicações especializadas. A realidade é um tópico abrangente, e a realidade virtual é reconhecidamente mais ampla ainda. Kevin Curran, docente de ciências de computação na Universidade de Ulster, Irlanda, prevê uma rápida adoção da tecnologia de VR para consumidores.
– A VR é o ingrediente mágico que, de algum modo, pode tornar melhor esse mundo virtual que está concentrando todo o nosso dinheiro, os nossos serviços. Você vai ver gente nos metrôs e nos cafés e em outras partes usando visores, porque vai ser tão viciante. Ela tira você de si mesmo e suspende sua incredulidade.
Curran está convencido de que em breve haverá mais opções de VR até mesmo em setores do dia a dia em que atualmente é difícil aplicar a realidade virtual, como ir ao supermercado para retirar das prateleiras os produtos que se quer comprar.
– Como criador de conteúdos VR, o que você está fazendo é redesenhar uma experiência. É simplesmente tão imersivo e poderoso, o conteúdo está finalmente começando a ser gerado, e a tecnologia está chegando a preços quase aceitáveis.
Última geração sem visores VR
Só que conseguir que todo o mundo passe a usar visores de VR não é tão simples assim. A indústria em torno da realidade virtual, desenvolvedores de aplicativos, criadores de conteúdo, fabricantes de equipamento e outros, está encontrando desafios.
– O maior problema do mercado é que as chances de monetização são poucas – aponta Mihai Pohuntu, diretor do departamento de plataformas emergentes da Samsung. “Na verdade não há muitas maneiras para os desenvolvedores fazerem dinheiro.”
Por sua vez, o presidente da Immersive Media, Myles McGovern, acredita que essa questão se resolverá com o decorrer do tempo, da mesma maneira como a mídia de massa sempre conseguiu faturar. Ele vê o intenso interesse na realidade virtual como uma “corrida do ouro” em que as companhias que usam publicidade vão querer embarcar.
– O que vamos ver não é diferente de como a mídia tem evoluído ao longo dos anos. As marcas vão entrar na onda. A realidade virtual vai continuar a crescer e vai explodir. Acho que o impacto desse espaço sobre a forma como consumimos conteúdos é absolutamente incrível.
Kevin Curran concorda que em breve esses impactos se farão sentir. “Esta vai ser a última geração sem visores”, prediz.