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DPTS

29 de Julho de 2012, 21:00 , por Desconhecido - 0sem comentários ainda | No one following this article yet.
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Às vezes encontro um artigo triste e começo a rir.
"Coitadinho", pensarão os Leitores, "mas já dava sinais de cansaço...".

Nada disso. É que são presentadas como "novidades" coisas antigas como o mundo. Vou fazer um exemplo, baseado numa notícia que chega dos Estados Unidos.

DPTS

400 mil veteranos de guerra americanos sofrem de problemas psicológicos. O nome científico usado em psiquiatria é stress pós-traumático (DPTS), que é o conjunto de fortes sofrimentos psíquicos como resultado dum evento traumático ou violento, definido ainda como "neurose de guerra" sendo frequentemente encontrado em militares envolvidos em situações particularmente dramática e/ou violentas.

Os principais sintomas observados nos pacientes são a insónia, a ansiedade, a tensão e a agressão, muitas vezes os pesadelos, mas também frequentes os flashbacks de eventos traumáticos vividos em primeira pessoa e o numbing, um estado de confusão mental e tonturas.

A maioria das vítimas do DPTS é afectada no curto prazo, mas, de acordo com estudos recentes, um terço dos casos torna-se crónico, embora ainda seja difícil fazer uma estimativa precisa do número de veteranos afectados. Segundo a Veterans Administration, uma percentual que varia de 11 a 20 por cento dos 2,3 milhões de soldados empregues no Iraque e no Afeganistão sofreria de DPTS.
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Depois há os altos custos de tratamento desta doença que, segundo estimativas do Budget Office do Congresso dos EUA, seria de cerca 8.300 Dólares por paciente já durante o primeiro ano; e é precisamente por isso que entre 2011 e o começo de 2012 o exército dos EUA lançou uma revisão de todos os casos de DPTS na sequência de queixas por parte de soldados que temiam ter sofrido alterações do diagnóstico. Esses temores foram confirmados em muitos casos porque alguns diagnóstico de DPTS (cerca de 300) tinham mudado apesar de estarem correctos. O diagnostico constitui o primeiro passo para determinar o montante doa benefícios aos quais o militar tem direito.

Depois há também outro tipo de consequências: vários incidentes, como na base de Lewis McChord onde, além dos suicídios, era possível encontrar a base do sargento Robert Bales, o militar que no passado Março matou 16 civis afegãos, e de quatro outros soldados que em 2010 tinham matado outros civis.

Além da DPTS

Até aqui a notícia. E eu rio. Porquê? Porque não é uma "notícia", é uma idiotice. Nomeadamente um conjunto de idiotice.

Explico: pegamos num grupo de rapazes acostumados aos hamburguers do McDonald's com anexo copo de Coca-Cola, enviamos estes rapazes no meio duma batalha, com balas que voam, bombas que explodem, camaradas que morrem ou perdem pernas e braços; depois, surpresa das surpresa, descobrimos que estes rapazes ficam afectados psicologicamente.
Porquê será? Mistério.

Então temos que procurar uma doença: e para boa sorte temos a DPTS, uma patologia que (olhem só) parece ter existido também no passado mas que foi analisada com cuidado só a partir da Guerra do Vietname.

Depois os sintomas. "Sintomas"? Mas quais sintomas pode ter uma pessoa que foi atirada para o meio do inferno, num dos pontos mais baixos atingidos pela raça humana? "Ansiedade, pesadelos, flashbacks". Quem diria. E entre os militares, claro que alguém parte pela tangente e começa a matar tudo e todos, inclusive os civis do Afeganistão (sempre sortudos estes).

Moral: quem vai para a guerra arrisca voltar (se voltar) ligeiramente afectado. Se o Leitor pensava alistar-se para um pouco de relax, melhor rever os planos.

Cereja no topo do bolo: o soldado afectado merece alguns benefícios económicos (como se o dinheiro pudesse devolver a antiga visão da vida), mas o Ministério tenta poupar uns trocos então os diagnósticos são alterados porque, claro está, individuar a DPTS não é coisa fácil. Será que o homem ficou pasmado com aquilo que viu o será um pouco de gripe?

A nova guerra

O que preocupa mais em tudo isso, e aqui já não há espaço nem para os sorrisos, é a forma como a guerra é encarada.

Em primeiro lugar: todos sabemos que a guerra é má, nem seria preciso falar do assunto. No máximo daria para dizer "a guerra é má", ponto final. Mas não é assim que acaba a coisa.

Há uma intervenção científica que rotula as lógicas consequências da batalha; há os termos "stress", "trauma", "diagnóstico". A palavra "horror", a única que pode descrever a guerra, é substituída por um conjunto de sintomas, por um acrónimo. A guerra é seccionada, cada parte é analisada e rotulada: assim torna-se mais científica, mais "familiar", pois a "nossa" ciência trabalha para resolver estes aspectos também.

O soldado não é um ser humano atirado para o inferno com a função de matar: é um "operador de Paz" que espalha democracia e que no regresso pode ser afectado por uma patologia. Esta patologia é conhecida e tem tratamento, pelo menos na maioria dos casos. Tudo pode ser resolvido com um cheque e uns comprimidos. A guerra está totalmente controlada, já assusta menos.

Desta forma é mais simples difundir a ideia da guerra má, sem dúvida, mas afinal nem tanto má e imprevisível. E, sobretudo, um mal "necessário" que todavia tem amplas margens de controle.

Assim torna-se mais fácil encontrar rapazes prontos para a batalha. É só seguir estes jovens de classe baixa, na maior parte das vezes de origem africana o latina,e espera-lo à saída do centro comercial. É só enviar dois soldados, de bom aspecto, com uns folhetos que resume as vantagens mais a descrição de todas as coisas boas que acontecem a quem for soldado: o fascínio da farda, visitar novos lugares, o dinheiro, tornar.se homem.

É desta forma que são encontrados voluntários, em caso de dúvida é só fazer umas pesquisas na internet, não faltam vídeos.

E para aqueles que continuam a ter dúvidas eis os filmes que glorificam os heróis dos campos de batalhas contra inimigos imaginários mas com traços bem conhecidos. E, sobretudo, eis os videojogos que propõem guerras onde ninguém morre para sempre, é só carregar no retry após o game over. São os videojogos dos quais os pais nem gostam, mas que permitem porque pelo menos o filho fica entretido e não perturba: na ilusão de que uma criança possa operar uma distinção definitiva entre realidade e virtual e na certeza de que certas coisas ficam limitadas à PlayStation ou à consola Nintendo, sem deixar rastos.

Seria um erro pensar que as crianças não sejam capazes de distinguir entre virtual e real, não é isso que está em causa. O que está em causa é a mensagem que rasteja, penetra na mente e aí fica, à espera de ser reactivada: com um novo videogame ou com a ideia duma guerra portadora de paz.


É isso que preocupa, até uma pessoa que, como eu, nem pacifista é.


Ipse dixit.

Fonte: http://feedproxy.google.com/~r/InformaoIncorrecta/~3/v_OUEQjj5Do/dpts.html

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