Então, vamos ver o que se passa: a Ucrânia sempre no caos, mesma coisa na Síria, o terrível Califado que assusta as crianças, Ébola que avança...Muito bem, parece tudo sob controle.
Ehi, esperem: o que é isso em Hong Kong? É uma revolução "colorida"!
Ohhh, finalmente algo novo. Que dizer, "novo" até um certo ponto: o esquema é sempre o do costume. Eventualmente muda o nome: como será este? "Revolução Amarela"? "Primavera Chinoca"?
Não, é Occupy Central, "Ocupar a Central". Qual Central? A Central dos autocarros?
Bah, eu teria preferido "Primavera Chinoca", mas tudo bem, contentes eles...
Ok, então vamos fazer assim. Desfrutamos desta ocasião para ver como funcionam as coisas, pode ser? Como é montada uma revolução colorida, quem fica atrás dela (não é precisa muita imaginação neste ponto...), porque as pessoas continuam invariavelmente a cair nas mesmas armadilhadas.
Comecemos.
Hong Kong & Bruce Lee
Hong Kong, região administrativa especial da República Popular Chinesa, 1.104 quilómetros quadrados (mais pequena do que Rio de Janeiro), 7 milhões de habitantes (mas são baixinhos, parecem menos), colónia britânica até 1997, um dos mais importantes mercados financeiros do planeta e, sobretudo, pátria de Bruce Lee.
Neste pequeno mas importante (economicamente falando) canto do planeta, os habitantes estão enervados. E quando um hongkongolese está enervado, são problemas sérios (lembrem de Bruce Lee).
Dúvida: mas porque estão enervados? Porque falta a Democracia. E quando a Democracia falta, os hongkongoleses ficam doidos; a não ser que os opressores sejam os Ingleses, neste caso os hongkongoleses ficam calminhos ao longo de pelo menos 100 anos.
Pelo que, temos uma nova dúvida: mas não será que alguém (não vamos fazer nomes) pode ter interesses em subtrair a ilha da esfera de influência de Pequim e usá-la como um gatilho para desestabilizar toda a China continental? Mah...
Os Estados Unidos, berço da Democracia, da Liberdade e particularmente sensíveis quando alguém está oprimido, apoiam abertamente o caos nas ruas de Hong Kong. São os mesmos Estados Unidos que condenaram os protestos em Bangkok, no início deste ano: a diferença reside no facto de que os protestos na Tailândia tentam desestabilizar um governo amigo dos Estados Unidos (portanto, um governo "bom" por definição, mesmo que não democrático), enquanto os de Hong Kong tentam colocar a Democracia no poder.
NED + NDI = Democracia
Atrás dos protestos, o que podemos encontrar? Sobretudo um nome: NED e NDI. Que depois são dois nomes, mas melhor não deixar-se enganar: são duas faces da mesma operação. NED significa National Endowment for Democracy, NDI é National Democratic Institute.
O NED é uma organização rigorosamente non-profit financiada directamente pelo Congresso dos EUA (em 2009: 135.5 milhões de Dólares, a Democracia custa).
O NDI é associado ao Partido Democrata e é financiado com fundos federais (isso é, dinheiro dos contribuintes).
De facto, os Estados Unidos elaboraram uma posição de apoio à rede de Occupy Central. que organizou o caos na pequena região, em eo apoio aberto para "Ocupar Central". Como relata a agência de imprensa Reuters, que cita o porta-voz da Casa Branca Josh Earnest:
A Casa Branca está a acompanhar de perto os protestos pró-democracia em Hong Kong e apoia as aspirações do seu povo. Os Estados Unidos apoiam o sufrágio universal em Hong Kong, tal como previsto na Basic Law [a Constituição de Hong Kong, ndt] e apoiam as aspirações do seu povo.
Actualmente em Hong Kong o presidente é escolhido por uma comissão selecionada de forma não-democrática. De acordo com a Basic Law, no entanto, o objectivo final é o Sufrágio Universal, que, embora não legalmente definido, para o povo de Hong Kong significa uma verdadeira democracia.
Mas estes são pormenores. Vamos ver como opera o governo de Washington na tentativa de desestabilizar o relacionamento entre Pequim e a região de Hong Kong.
Desde 1997, o NDI tem efectuado uma série de missões em Hong Kong para avaliar a situação do novo quadro eleitoral (pós 1997), o status de autonomia, legalidade e liberdades civis sob a soberania chinesa, e as oportunidades e os desafios do processo de democratização.
Em 2005, o NDI deu origem a um programa de seis meses para jovens líderes políticos, focado na formação de membros de partidos políticos ou grupos políticos especialistas em política de comunicação emergentes.
O NDI também se comprometeu a trazer partidos políticos, líderes governamentais e personalidades da sociedade civil em fóruns públicos para discutir o desenvolvimento, o papel dos partidos políticos em Hong Kong e as reformas políticas. Em 2012, por exemplo, uma conferência de SynergyNet, um think tank em Hong Kong patrocinado pelo NDI, convidou os membros dos partidos que representam todo o espectro ideológico (deve estar cheia Hong Kong de partidos políticos...) para explorar a adopção dum sistema de coligações de governo pode levar a um processo legislativo mais dinâmico.
Em 2007, o Instituto, em colaboração com a Rede das Mulheres em Política (WPPN) e a Federação dos Centros Feministas de Hong Kong (HKFWC), lançou um programa de participação política das mulheres, a fim de aumentar a presença das mulheres na política e garantir que as questões das mulheres sejam tidas em conta no processo político.
O NDi também suporta o Centro do Direito Comparado e Público (CCPL) e a Universidade de Hong Kong para amplificar a voz dos cidadãos nos processos de consulta para o desenvolvimento de Hong Kong Projeto Democracia, uma página web que dá às pessoas um lugar para discutir o futuro do sistema eleitoral em Hong Kong.
Todas estas acções são claramente (e orgulhosamente) apresentadas nas páginas internet do NDI. Não surpreende, portanto, descobrir que todos os líderes de Occupy Central estejam ligados ao Departamento de Estado americano, NED, NDI, ou envolvidos numa das inúmeras ramificações. Aliás, seria esquisito o contrário.
Benny, Audrey & Martin
O auto-proclamado líder (e viva a Democracia!) de Occupy Central, Benny Tai, é professor de
Direito na já citada universidade de Hong Kong e colaborador regular do CCPL (que é financiado pelo NDI). No relatório de 2006-2007 foi nomeado como membro do conselho de administração, cargo que ocupou até o ano passado.
Curiosamente, no relatório deste ano (2014), Tai desapareceu do conselho. Fugiu? Não parece, até porque participou em pelo menos três das palestras da organização, onde apresentou os seus projectos. E em pelo menos uma conferência falou ao lado de outro membro proeminente do Occupy Central, Audrey Eu.
A presidente do Partido Cívico, Audrey Eu Yuet-Mee, além de falar nas cerimónias da CCPL ao lado de Benny Tai, está ligada ao Departamento de Estado. Participa regularmente nos fóruns patrocinados pelo NED e pela NDI. Em 2009, foi a oradora do fórum público organizado pela SynergyNet e financiado pelo NDI. Em 2012, foi a relatora do Dia Internacional da Mulher do Centro da Mulher, organizada pelo Conselho Hong Kong da Mulher, também financiado pelo NDI.
Depois há Martin Lee, o presidente fundador do Partido Democrata de Hong Kong, que apoia fortemente Occupy Central. Este ano, Lee encontrava-se em Washington, mas não de férias: conheceu o vice-presidente Joe Biden, a deputada Nancy Pelosi e participou num debate organizado pelo NED expressamente para ele e o seu programa de democracia para Hong Kong.
Em Washington estava também Anson Chan, outra figura de realce que suporta os actuais protestos nas ruas de Hong Kong.
Democracia?
Nesta altura, o sagaz Leitor poderia pensar: "Bom, mas não vejo nada de mal nisso tudo: afinal NED e NID apoiam a Democracia, o que é sempre um bem, não é? Que raio de blog este...".
Ahe? É isso que pensa o Leitor? E bravo o Leitor...
Em primeiro lugar, é NED e NDI, não NID.
A seguir: não podemos esquecer qual tipo de Democracia apoiam estas duas organizações. Porque, além dos fundos públicos, NED e NDI recebem apoios de empresas como Goldman Sachs, Ford, VISA, Boeing, McDonald's, Exxon Mobil, Citigroup, Hilton...
Há vários tipos de Democracia e aquela patrocinada por empresas privadas cujo único fim é o lucro não parece ser a melhor de todas.
Depois há um último pormenor que não podemos esquecer.
No passado mês de Junho, houve em Hong Kong um referendo, convocado pelo movimento Occupy Central e aberto ao longo de 10 dias. O tema em debate? O sufrágio universal.
Os resultados foram os seguintes:
- 792.808 eleitores participantes
- 42% dos votantes apoiaram a proposta do movimento.
Portanto, um movimento de protesto cujo programa é tão impopular ao ponto de ser rejeitado pela esmagadora maioria do povo de Hong Kong.
Como disse Bruce Lee: "Palavras para quê?"
E logo morreu.
Ipse dixit.
Fontes: Reuters (via Huffington Post), NDI, Center for Comparative and Public Law: Annual Report 2006-2007, 2011-2013, 2013-2014 (documentos Pdf, inglês), South China Morning Post, NED, BBC, Land Detroyer Report
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