Nos últimos tempos, Facebook tem sido alvo de fortes críticas por se recusar a remover imagens extremamente violentas: o suicídio dum veterano de guerra, tudo postado segundo as sagradas leis da social media.
Apesar das insistência de família e amigos, as imagens do ex-fuzileiro naval Daniel Rey Wolfe permaneceram visíveis desde Domingo até Quarta-feira. Douglas Tripp, um dos ex-companheiros do fuzileiro:
Os seus amigos e familiares foram expostos a imagens que nunca queriam ter visto. São removidas rapidamente as imagens de um peito de mulher nu e aquelas trágicas dum homem que se corta antes de cometer suicídio não?
Pensamos: como é possível que em uma rede social onde tudo é rigidamente controlado, tanto por administradores quanto por parte dos utilizadores (com as ferramentas para relatar conteúdos inapropriados), durante três dias tenha ignorado os pedidos de amigos, família e outros utentes?
Obviamente não é possível. Se as imagens foram deixadas, é porque esta foi uma escolha de Facebook. A qual, é bem lembrar, está a perder usurários, em particular os mais jovens, que começam a preferir outros meios de comunicação. A idade média de quem utiliza Facebook aumenta: o que não é bom do ponto de vista dos administradores, por várias razões. Deixar visíveis imagens particularmente "fortes" é uma tentativa de ré-aproximar os mais jovens, supostamente à procura de sensações mais fortes dum adulto que quer partilhar as fotografias da última peregrinação em Fátima.
Só isso? Talvez não. Já ouviram falar do Efeito Werther?
O Efeito Werther
Parece que os media sejam capazes de influenciar a taxa de suicídio numa sociedade com o simples facto de...falar dos suicídios. É um fenómeno trágico e inquietante de emulação, conhecido pelos sociólogos como Werther Effect (o Efeito Werther). O termo foi cunhado pelo sociólogo David Phillips, em homenagem ao romance de Goethe, Die Leiden des jungen Werthers ("Os Sofrimentos do Jovem Werther"), cujo protagonista, por causa de uma decepção amor, escolhe o suicídio como um meio para parar de sofrer.
Na sequência da publicação do livro, houve uma vaga de suicídios de emulação em toda a Europa, de tamanho suficientemente grande para convencer os governos de alguns Países a proibir a publicação. Segundo as estimativas, o livro de Goethe provocou algo como 2.000 suicídios.
Reacção semelhante aconteceu na Itália, após a divulgação do romance de Ugo Foscolo Le Ultime Lettere di Jacopo Ortis ("As Ultimas Cartas de Jacopo Ortis"), em 1802.
O fenómeno é mais conhecido no mundo da literatura com o termo de Copycat Effect e historicamente tem tido um impacto forte em algumas sociedades, como os EUA . Em Los Angeles, por exemplo, houve um aumento de 40 % no número de suicídios após a morte de Marilyn Monroe. E está demonstrado que depois de alguns suicídios "impressionantes", o número de vítimas de acidentes de aviação ou rodoviários pode aumentar até 1.000 %.
Alguns autores, como o psiquiatra J.A. Motto, deram uma interpretação do fenómeno de "identificação", ou seja de pensamentos suicidas latentes que em algumas pessoas podem ser amplificados e tornados realidade por meio da identificação com alguém que acaba de tomar a mesma decisão.
Esquisito? Nem por isso: o homem não deixa de ser um animal social, e tende a usar as acções dos outros para decidir o que é apropriado fazer, especialmente quando percebemos os outros como semelhantes a nós (por exemplo, mesmo status social). Além disso, em alguns grupos de idade, como a adolescência, a tendência imitativa é em média mais elevada: portanto, pode haver um maior risco de iniciar uma cadeia imitativa..
O sociólogo Prof. Riaz Hassan, da Universidade de Flienders (Austrália), analisou cerca de 20.000 suicídios que ocorreram entre 1981 e 1990 O resultado foi surpreendente: a média diária de suicídios aumenta em cerca de 10 % nos dois dias após a publicação da notícia dum suicídio "importante" ou "significativo" nos principais jornais.
Falamos portanto da potência da linguagem evocativa, que consegue empurrar para novos comportamentos.
E mesmo aqui surge uma dúvida: as notícias horríveis que os media diariamente preparam e servem, podem determinar um estado de desconforto constante, medo de tudo, total desconfiança? Em todos ou na maior de nós? Manter a sociedade em constante apreensão, pode constituir um projecto de poder? Quem pode ter interesse em criar cenários apocalípticos?
Talvez quem deseje mudanças. Uma mudança não espontânea mas "conduzida".
Ao mesmo tempo, sabemos que o medo impede a acção: quando uma pessoa tiver medo, agarra-se aos poucos pontos sólidos e recusa o desconhecido (o "novo"). De facto, o medo imobiliza.
O caso 2007
Mas vamos esquecer por enquanto as "grandes conspirações globais". Será que o medo pode ser utilizado em outras ocasiões, aparentemente mais inócuas? Sem ir até casos extremos como o suicídio, em que medida os media conseguem influenciar as nossas mentes?
Em Italia existe o Osservatorio di Pavia, uma organização independente (uma cooperativa de pesquisa) que analisa desde 1994 os media: diários, revistas, rádio, televisão, internet.
Em 2009, o Osservatorio publicou um relatório acerca de criminalidade e media no período Janeiro de 2005 - Setembro de 2009. Foram utilizadas 20.707 revelações efectuadas em 6 redes televisivas nacionais, 3 públicas (a Rai) e 3 privadas (Mediaset).
Eis os resultados:
Este primeiro gráfico mostra o total das notícias relativas à criminalidade difundidas pelas 6 redes analisadas no período escolhido. Podemos observar duas coisas:
- A tendência geral é de aumento
- Houve um pico nos últimos meses do ano 2007.
Agora observemos o gráfico seguinte:
Aqui podemos observar a atenção das televisões aos factos criminosos (vermelho), a percepção do público em relação à criminalidade (amarelo) e o número real dos crimes cometidos (azul).
Algo não bate certo: afinal a taxa de criminalidade ficou mais ou menos estável, caindo até entre o primeiro semestre de 2007 e o primeiro semestre de 2008.
Vice-versa, a percepção da criminalidade entre os cidadãos cresceu, seguindo de perto o aumentar ou o diminuir das notícias "criminosas" na televisão.
Vamos ver também quais as deferências entre redes públicas (Rai) e privadas (Mediaset, grupo Berlusconi).
Eis o total das notícias "criminosas" apresentadas pelas 3 redes privadas (vermelho)e pelas 3 públicas (azul). São idênticos. Mediaset exagera (Berlusconi é sempre Berlusconi...), mas os gráficos não apresentam diferencia nenhuma nas tendências.
Então, qual a explicação? Porque as televisões, públicas e privadas, aumentaram a sensação de insegurança, focando a atenção nos eventos criminosos, numa altura em que os crimes ou encontravam-se estáveis ou até diminuíam?
Resposta: na segunda metade de 2007 houve um forte ataque da oposição (Direita) contra o governo (Centro-Esquerda), que culminou com as eleições nos primeiros meses de 2008. Era imperativo passar a ideia dum País no caos, com um governo que já tinha perdido o controle da situação; era necessário implementar um clima de insegurança, que tradicionalmente favorece os partidos de Direita. E funcionou, pois em 2008 ganhou a Direita.
Ipse dixit.
Fontes: Osservatorio di Pavia: Sicurezza e Media (ficheiro Pdf, italiano), Wikipedia (versão inglesa)
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