Nota: por alguma misteriosa razão, a publicação previamente programada falhou.
Definitivamente esta não é a minha semana...
Eis o post, atrasado:
Por razões pessoais, conheço um pouco de Hungria, até vivi naquele simpático País ao longo duns tempinhos. E continuo a manter-me informado acerca do que aí se passa.
É por isso que fico surpreendido (mas só até um certo ponto) perante um artigo do diário italiano La Repubblica.
La Repubblica, o jornal da Esquerda.
Quem for de Esquerda em Italia, quem ficou órfão de Marx e Lenine após a queda do Muro de Berlim, não lê Il Corriere della Sera (na prática, o governo), La Stampa (Fiat) ou Il Giornale (Direita). Lê La Repubblica, porque aí pode encontrar o pensamento do Partito Democratico, o antigo Partito Comunista Italiano, que agora paga os impostos na Suíça (Esquerda sim, mas se for possível poupar uns trocos e evitar que o fisco descubra certas coisas...), convencido de encontrar naquelas páginas "a verdade", aquilo que os outros escondem.
Eis o que diz La Repubblica acerca de Viktor Orban, o Primeiro Ministro da Hungria:
O líder autocrate-nacional-populista e euro-céptico húngaro [...]"Autocrata" indica um antigo título dos czares da Rússia, entende uma pessoa cujo poder não depende de ninguém. Tipo um monarca, um déspota. Mas Orban foi democraticamente eleito: em 2010, o partido dele (Fidesz) obteve 52,73% dos votos dos cidadãos húngaros. Não importa: é um autocrata e ponto final, não vamos perder tempo com inúteis detalhes.
Pelo contrário, Mario Monti, ex Primeiro Ministro italiano, foi nomeado pelo Presidente da República Italiana em 2011, sem nunca ter sido eleito. Caso estranho, La Repubblica nunca definiu como "autocrata" o homem da Goldman Sachs.
Repito: detalhes.
"Nacional-populista". Deve ser o contrário de "internacional-populista". Fica ao sabor do Leitor uma possível interpretação.
"Euro-céptico". A suprema ofensa. Nesta altura é pior ser "euro-céptico" do que "mafioso". Porque o mafioso tem uma ideia, um objectivo, talvez até alguns valores. O euro-céptico não, quer só o caos, a destruição, a anarquia. O euro-céptico vive de pulsões irracionais, é uma perigosa besta em campo económico (Klaus Regling, director executivo do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e do Mecanismo Europeu de Estabilidade: "interromper o processo de ajustamento em Portugal seria um erro histórico"), nega a evidência (o Euro é o Bem). O euro-céptico fica bem só perante as desgraças do próximo, como uma guerra no Velho Continente (Jean-Claude Juncker, o ex-líder do Eurogrupo, admite que a actual crise europeia pode provocar uma nova guerra. A salvação? O Euro, claro).
Mas Orban ainda tem sorte: porque pior do que ele há o novo Ministro da Economia, Gyorgy Matoclsi:
- discutido e impopular nos ambientes ecofinanceiros da Europa e do mundo
- perigoso incompetente
- dobrado à vontade do regime
- nacionalista
"Perigoso e incompetente"? Sim, sem dúvida.
Em Novembro de 2011, Matoclsi afirma que o governo dele constrói uma política económica contrária às posições do Fundo Monetário Internacional. Na prática, uma confissão: Matoclsi admite ser perigoso e extremamente incompetente, até é possível vislumbrar alguns problemas psíquicos ainda não totalmente diagnosticados. Não admira que seja discutido e impopular, principalmente na cantina do FMI.
É "dobrado à vontade do regime"? Regime? Qual regime? Ah, o regime do despótico Orban. Sim, de facto Matoclsi jurou fidelidade à Constituição democrática da Hungria. É um cúmplice do Primeiro Ministro, isso é claro.
Mas até seria possível ignorar todas estas nódoas, fazer de conta que não, que afinal não interessa, há muitos doidos no mundo, o que poderia importar poderia ser o desempenho dele, o que este Ministro pode conseguir em prol do próprio País. Não fosse por um pormenor: é "nacionalista". O que nesta altura, na Europa, fica apenas um degrau acima de "terrorista".
E esta, meus senhores, é La Repubblica, a informação da "Esquerda" (com muitas aspas...) que conta o que os outros escondem. Ou que ainda não conseguiram inventar.
Ipse dixit.
Fontes: La Repubblica, Público, Diário de Notícias
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