Dia de pausa.
Computador internado: análise do sangue, electrocardiograma, intervenção cirúrgica para instalação de nova memória. Coitadinho.
Por isso: espaço livre para comentários! Comentem, sugiram, sugiram e comentem. Obrigado.
Mas antes: um conto inédito de Jean de la Fontaine, poeta e fabulista francês que falava da vaidade, estupidez e agressividade humanas através de animais. Foi o autor de contos quais A Lebre e a Tartaruga, O Homem, O Menino e a Mula, O Leão e o Rato, e O Carvalho e o Caniço.
A cigarra e a formiga reload
Era uma vez uma cigarra empresária, bem diferente da outra que passava a vida a cantar. Esta trabalhava, e trabalhava, e trabalhava. Fazia de tudo: construía bacalhaus para as mesas dos Portugueses, cultivava maracujás para o Brasil, de tudo um pouco fazia. E a empresa funcionava como uma maravilha.
Havia também uma formiga operária que trabalhava na empresa da cigarra.
Um dia um gafanhoto de casaco e gravata apresentou-se na empresa da cigarra e assim falou:
Querida cigarra, olha os teus dependentes:
são demais e pouco eficientes.
Despedes alguns deles e optimizas os restantes:
no final do ano as contas são importantes.
A cigarra pensou e logo falou:
Minha Nossa Senhora,
de despedir chegou a hora!
Tens toda a razão meu bom amigo,
de parasitas estou cheia até o umbigo!
Umbigo? Pois, esta é uma expressão típica das cigarras.
Mas o que conta é que a cigarra tinha percebido: produtividade! Optimização dos recursos humanos! Slimming down! Outsourcing! Este era o futuro da empresa: menos salários, mais produção, lucros maiores.
Assim convocou as formigas trabalhadoras.
Queridas formigas, gostam do trabalho?
Pena, acabou: metade fora do baralho.
Menos bocas famintas, o lucro é que importa,
Obrigado e adeus: quem sair que feche a porta.
Obviamente um drama para as formigas. Algumas delas tinham que pagar as prestações do carro, que é pequeno sendo um carro para formigas, mas nem por isso é menos caro.
As vozes correm e em breve toda a aldeia olhava para a empresa da cigarra e fazia as contas: de facto, fazia sentido. Menos dependentes, mais horas de trabalho, significava mais produção com menos gastos.
Foi por isso que no dia a seguir também a empresa do besouro despediu metade dos trabalhadores, o mesmo se passou na carpintaria do bicho da madeira e na fábrica de pontos negros da joaninha.
A situação das formigas era cada vez mais desesperada. Chegaram ao ponto de falar com as baratas dos sindicatos, as quais organizaram uma grande manifestação nas ruas:
Ah, vão ver o medo destes empreendedores:
os joelhos vão tremer-lhes até sentirem dores!
Obviamente nada disso aconteceu e as formigas continuaram desempregadas. Agora eram milhares.
Passa um ano e numa Segunda-feira uma formiga pobre encontra a cigarra empresária. E surpresa, surpresa: quem tinha o ar mais triste? A cigarra? Não, sempre a formiga que continuava sem trabalho e sem dinheiro. Mas a cigarra também não estava nada satisfeita. Bem pelo contrário.
Eu não sei que aconteceu,
só que nada se vendeu
Produção é que não falta,
mas mais nada compra a malta.
Como empresa é eficiente,
nunca pára o dependente
mas o lucro já se foi
o facturado é que dói.
Então falou a formiga:
Sua cigarra deficiente,
despediste o dependente?
Sem dinheiro não há gastos,
ninguém compra mais nada.
A cigarra estranhou: Mas isso não rima!
E isso? Perguntou a formiga enquanto assestava um murro na cabeça da cigarra.
Moral: a cigarra entendeu a lição, percebeu que o dogma económico dominante é uma burla, começou a estudar os textos de Keynes, Kalecki e Godley. Afinal a ocupação era necessária para criar o círculo virtuoso de investimentos, despesas e consumos.
Por isso assumiu logo 50 formigas chinesas, as quais em breve compraram a empresa dela e de toda a aldeia.
Ipse dixit.
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