Voltamos a falar de Síria.
Monótono? Talvez. Mas se guerra será, a Síria é o teatro mais provável. Há muito em jogo: não na Síria, País pequeno e desprovido de recursos, mas nos arredores de Damasco, nomeadamente nos vizinhos israel e Irão. Sem esquecer a Turquia.
Os jornais destes dias, entre um novo capítulo do psico-drama europeu e uma final de futebol, tiveram bom jogo para atenuar o fracasso dos Estados Unidos nas negociações acerca do País do Médio Oriente. Mas a essência não muda e os Russos foram bastante claros: Bashar el Assad não deve ser forçado a abandonar o poder pelos estrangeiros. Pelo contrário: deverá ser ele a assegurar a transição.
Claro: os acontecimentos podem sempre precipitar e uma "intervenção humanitária" não pode ser excluída totalmente. Mas Washington não conseguiu a luz verde tanto desejada e agora tem que meditar. Sobretudo, tem que rever a própria estratégia.
A ambição com que a administração Obama tem abordado o problema do Médio Oriente e da África do Norte, o cerco da China, a penetração no Turquemenistão, no Cazaquistão, no Quirguistão e na zona afegã e paquistanesa não consegue aguentar o impacto com a realidade.
Causas? Talvez inexperiência, provavelmente uma visão do mundo ainda demasiado focalizada nos Estados Unidos qual única potência "séria" do mundo, com certeza a capacidade dos Chineses e dos Russos em mexer os próprios piões. Há uma enorme diferencia entre as várias partes em jogo: Washington fala da Ásia e do Médio Oriente, Moscovo e Pequim são a Ásia e conhecem o Médio Oriente.
E que não seja apenas um problema da Síria é evidente: no Iraque, Nuri al-Maliki, o primeiro-ministro inventado pelo EUA, acaba de declarar que a Arábia Saudita e o Bahrein estão a financiar forças da oposição para derrubá-lo.
Pode não fazer sentido, pelo menos aparentemente: Arábia Saudita e Bahrein são entre os melhores aliados americanos. Mas um Iraque "democrático" (por assim dizer...) constitui um precedente perigoso na área. Mais uma vez: incapacidade americana em relacionar-se com a realidade local. E mais: o paradoxo de aliar-se com duas das monarquias mais restritivas e opressoras para exportar a democracia.
Tudo isso enquanto o Irão sobreviveu ao 12º ano de histeria nuclear sem sofrer ataques (a não ser cibernéticos mais alguns cientistas nucleares mortos) e agora negoceia com Lady Ashton (quem é esta agora? Lady Catherine Ashton, Baronesa de Upholland - nada mais, nada menos - Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança).
Um pouco mais para Leste e entramos no coração dos problemas americanos. Do Afeganistão nem vale a pena falar: a principal potência mundial não consegue derrotar os talibãs ou os camelos deles, isso já seria motivo para uma profunda reflexão acerca da alegada supremacia militar ocidental.
Mas, aos menos, no Afeganistão os Estados Unidos conseguem cultivar um pouco de opio (um "pouco" é um eufemismo: o Afeganistão, após a "libertação" ocidental, tornou-se o primeiro produtor mundial da substância), enquanto no Paquistão nem isso.
O Paquistão, a mais importante potência nuclear islâmica, é o aliado ambíguo na guerra no Afeganistão e ao mesmo tempo é o aliado ambíguo dos talibãs na guerra do Afeganistão contra a Nato; isso enquanto os Estados Unidos recrutaram bandos de guerrilheiros do Afeganistão para fazer expedições punitivas no Paquistão (na última semana 18 soldados paquistaneses foram mortos em confrontos na zona de fronteira), pois os drones não podem ser utilizados, tendo demonstrado serem armas talvez cómodas mas incrivelmente estúpidas (e muito caras), com uma percentagem de danos colaterais aterradora.
O Pew Global Attitudes Project fez uma sondagem de opinião para medir os sentimentos dos Paquistaneses em relação os EUA: 74% dos entrevistados utilizaram a palavra "ódio". E nos Estados Unidos a taxa de aprovação de Obama é a mais baixa alguma vez registada (dados da passada Quarta-feira).
O comandante dos EUA no Afeganistão, o general John Allen, chegou ao chefe das Forças Armadas do Paquistão, Parvez Kayani, ações conjuntas na fronteira e a designação de objetivos comuns.
A resposta foi algo do tipo "Sim, sim, como não, vais em frente tu que depois vou eu, tranquilo...".
Não é simples, não é tão simples como em Washington tinham imaginado.
E agora ~e ainda mais complicado porque a Rússia começou a mexer-se.
Samir Kabulov é um jovem estudante cujo mestre foi Dmitri Shepilov, , o homem que iniciou a penetração soviética no Oriente no início dos anos '50 e que tratava com o Paquistão na altura em que eram os Russos a ocupar vizinho Afeganistão. É Kabulov que trata com o Paquistão agora, antes da visita de Putin prevista no próximo Setembro. E Kabulov fala duma coisa que desde sempre os Paquistaneses desejaram: a independência energética.
Hoje a eletricidade é distribuída apenas algumas horas por dia, as centrais electricas são obsoletas e o custo do combustível é determinado politicamente. Kabulov propõe:
E o quê ganha a Rússia com isso? Expulsar os ocidentais do Paquistão, possivelmente do Afeganistão também, concessões para a exploração conjunta do petróleo para fornecer energia aos três maiores clientes da área: China, Índia e Irão.
Óbvio o "sim" do Paquistão:
E enquanto um leva pancadas e é obrigado a secar os próprios cofres para manter-se na corrida, os outros obtêm o mesmo sem sangue e sem abalar a economia.
Os tempos mudaram.
Ipse dixit.
Fontes: Il Corriere della Collera, Wikipedia
Monótono? Talvez. Mas se guerra será, a Síria é o teatro mais provável. Há muito em jogo: não na Síria, País pequeno e desprovido de recursos, mas nos arredores de Damasco, nomeadamente nos vizinhos israel e Irão. Sem esquecer a Turquia.
Os jornais destes dias, entre um novo capítulo do psico-drama europeu e uma final de futebol, tiveram bom jogo para atenuar o fracasso dos Estados Unidos nas negociações acerca do País do Médio Oriente. Mas a essência não muda e os Russos foram bastante claros: Bashar el Assad não deve ser forçado a abandonar o poder pelos estrangeiros. Pelo contrário: deverá ser ele a assegurar a transição.
Claro: os acontecimentos podem sempre precipitar e uma "intervenção humanitária" não pode ser excluída totalmente. Mas Washington não conseguiu a luz verde tanto desejada e agora tem que meditar. Sobretudo, tem que rever a própria estratégia.
A ambição com que a administração Obama tem abordado o problema do Médio Oriente e da África do Norte, o cerco da China, a penetração no Turquemenistão, no Cazaquistão, no Quirguistão e na zona afegã e paquistanesa não consegue aguentar o impacto com a realidade.
Causas? Talvez inexperiência, provavelmente uma visão do mundo ainda demasiado focalizada nos Estados Unidos qual única potência "séria" do mundo, com certeza a capacidade dos Chineses e dos Russos em mexer os próprios piões. Há uma enorme diferencia entre as várias partes em jogo: Washington fala da Ásia e do Médio Oriente, Moscovo e Pequim são a Ásia e conhecem o Médio Oriente.
E que não seja apenas um problema da Síria é evidente: no Iraque, Nuri al-Maliki, o primeiro-ministro inventado pelo EUA, acaba de declarar que a Arábia Saudita e o Bahrein estão a financiar forças da oposição para derrubá-lo.
Pode não fazer sentido, pelo menos aparentemente: Arábia Saudita e Bahrein são entre os melhores aliados americanos. Mas um Iraque "democrático" (por assim dizer...) constitui um precedente perigoso na área. Mais uma vez: incapacidade americana em relacionar-se com a realidade local. E mais: o paradoxo de aliar-se com duas das monarquias mais restritivas e opressoras para exportar a democracia.
Tudo isso enquanto o Irão sobreviveu ao 12º ano de histeria nuclear sem sofrer ataques (a não ser cibernéticos mais alguns cientistas nucleares mortos) e agora negoceia com Lady Ashton (quem é esta agora? Lady Catherine Ashton, Baronesa de Upholland - nada mais, nada menos - Alta Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança).
Um pouco mais para Leste e entramos no coração dos problemas americanos. Do Afeganistão nem vale a pena falar: a principal potência mundial não consegue derrotar os talibãs ou os camelos deles, isso já seria motivo para uma profunda reflexão acerca da alegada supremacia militar ocidental.
Mas, aos menos, no Afeganistão os Estados Unidos conseguem cultivar um pouco de opio (um "pouco" é um eufemismo: o Afeganistão, após a "libertação" ocidental, tornou-se o primeiro produtor mundial da substância), enquanto no Paquistão nem isso.
O Paquistão, a mais importante potência nuclear islâmica, é o aliado ambíguo na guerra no Afeganistão e ao mesmo tempo é o aliado ambíguo dos talibãs na guerra do Afeganistão contra a Nato; isso enquanto os Estados Unidos recrutaram bandos de guerrilheiros do Afeganistão para fazer expedições punitivas no Paquistão (na última semana 18 soldados paquistaneses foram mortos em confrontos na zona de fronteira), pois os drones não podem ser utilizados, tendo demonstrado serem armas talvez cómodas mas incrivelmente estúpidas (e muito caras), com uma percentagem de danos colaterais aterradora.
O Pew Global Attitudes Project fez uma sondagem de opinião para medir os sentimentos dos Paquistaneses em relação os EUA: 74% dos entrevistados utilizaram a palavra "ódio". E nos Estados Unidos a taxa de aprovação de Obama é a mais baixa alguma vez registada (dados da passada Quarta-feira).
O comandante dos EUA no Afeganistão, o general John Allen, chegou ao chefe das Forças Armadas do Paquistão, Parvez Kayani, ações conjuntas na fronteira e a designação de objetivos comuns.
A resposta foi algo do tipo "Sim, sim, como não, vais em frente tu que depois vou eu, tranquilo...".
Não é simples, não é tão simples como em Washington tinham imaginado.
E agora ~e ainda mais complicado porque a Rússia começou a mexer-se.
Samir Kabulov é um jovem estudante cujo mestre foi Dmitri Shepilov, , o homem que iniciou a penetração soviética no Oriente no início dos anos '50 e que tratava com o Paquistão na altura em que eram os Russos a ocupar vizinho Afeganistão. É Kabulov que trata com o Paquistão agora, antes da visita de Putin prevista no próximo Setembro. E Kabulov fala duma coisa que desde sempre os Paquistaneses desejaram: a independência energética.
Hoje a eletricidade é distribuída apenas algumas horas por dia, as centrais electricas são obsoletas e o custo do combustível é determinado politicamente. Kabulov propõe:
- como remédio contra a corrupção, nada de concorrência entre privados mas acordos entre governos.
- a Gazprom que fornece tecnologia e, se necessário, assistência financeira
- a execução do programa CASA (Central Asia South Asia) já financiado pelo Banco Islâmico de Desenvolvimento
- a participação nos lucros e a implementação de dois gasodutos principais na Ásia: a TAPI (Turcomenistão, Afeganistão, Paquistão, Índia) e IP (Irão-Paquistão)
E o quê ganha a Rússia com isso? Expulsar os ocidentais do Paquistão, possivelmente do Afeganistão também, concessões para a exploração conjunta do petróleo para fornecer energia aos três maiores clientes da área: China, Índia e Irão.
Óbvio o "sim" do Paquistão:
- em Julho será entregue o esboço do acordo
- no prazo de dois meses a lei sobre a concorrência vai ser alterada e será introduzida a possibilidade de negociações entre os governos
- o Memorando de Entendimento (Memorandum of Understanding) será assinado por Putin em pessoa, em Setembro
- cereja no topo do bolo, a Gazprom é convidada num contrato de 1,5 biliões de Dólares para a construção do gasoduto IP, enqaunto a mesma Gazprom já começou a actualização tecnológica das duas centrais de Guddu e Muzaffatgarh.
E enquanto um leva pancadas e é obrigado a secar os próprios cofres para manter-se na corrida, os outros obtêm o mesmo sem sangue e sem abalar a economia.
Os tempos mudaram.
Ipse dixit.
Fontes: Il Corriere della Collera, Wikipedia
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