Por Paulo Moreira Leite
A decisão de esconder o desempenho de Lula nas pesquisas mais recentes da campanha presidencial só tem comparação com o tratamento reservado a uma pesquisa do Ibope durante o golpe de 1964.
Há meio século, os dados mostravam que João Goulart era um governo com maior aprovação do que a imprensa que patrocinou o golpe dava a entender. Politicamente devastadores para os golpistas, os números permaneceram na sombra durante anos, só sendo descobertos e revelados anos mais tarde, em livros de história. Graças ao trabalha de historiadores como Jorge Ferreira e Muniz Bandeira pode-se saber que até em São Paulo, berço da ditadura, a aprovação de Jango era mais alta do que se poderia imaginar pelas marchas de classe média usadas para criar um clima propício a um golpe de Estado.
Mais uma vez, é preciso reconhecer que são situações muito diferentes mas há pontos de contato entre 2018 e 1964, num país que desde o afastamento de Dilma, há dois anos, se encontra sob uma semi-ditadura dirigida pelo Judiciário.
O segredo sobre a aprovação popular de Lula amplia a margem de manobra daqueles que planejam jogar à sombra, longe dos olhos do eleitor. É a manipulação da política pelo silêncio, pela escuridão. Sua finalidade é amortecer a resistência e confundir a mobilização popular.
O segredo ajuda a esconder a dimensão da intervenção em curso e os riscos evidentes que ela representa contra os poderes soberanos do povo, definidos no artigo número 1 da Constituição.
Como se não bastasse impedir a candidatura do preso político Lula, num gesto truculento que contraria uma decisão legítima do Comitê de Direitos Humanos da ONU, é preciso transformá-lo num novo tipo de desaparecido, que deve ser escondido, ignorado, esquecido.
Foi o que se fez com Jango em 1964, quando um Congresso hesitante entre a cumplicidade e a covardia declarou “vaga a presidência” antes de abrir caminho para um testa-de-ferro civil que logo seria substituído por Castelo Branco.
Além de atingir Lula, a censura às pesquisas destina-se a embaralhar a indicação de Fernando Haddad, sucessor já escolhido — a quem os mesmos institutos apontam como nome provável num possível segundo turno, caso possa disputar eleições minimamente limpas, o que inclui o direito de receber, intacta, sua parte legítima na herança de Lula.
Esta é a questão em jogo, no momento. E é para isso que se tenta esconder o tamanho real de Lula.