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Segundo Clichê

febrero 27, 2017 15:48 , por Blogoosfero - | 1 person following this article.

A república dos alcaguetes

abril 24, 2017 11:11, por segundo clichê


O delator, também conhecido popularmente como dedo-duro, alcagueta, cagueta, X-9 e informante, entre outros substantivos menos conhecidos, é um ser execrável em todas as culturas.

Ninguém neste planeta se sente à vontade entre esse tipo de gente.

Não dá para imaginar uma sociedade onde a delação é encarada como algo normal, onde se permite que os alcaguetas transitem com normalidade, onde alguém pode se meter numa tremenda encrenca porque seu vizinho conta um monte de mentiras para se vingar daquele dia em que o volume da música o incomodou.

O cagueta é, antes de tudo, um covarde.

Também, um mau caráter.

E, em resumo, por reunir inúmeros defeitos e ser, até mesmo, um elemento desestabilizador da ordem social, tudo o que um indivíduo desse tipo falar não pode ser, ao menos em princípio, levado a sério.


O dedo-duro deve sempre ser visto pelo que é: ou um doente que sente prazer em espalhar segredos, reais ou imaginários, e em apontar deslizes éticos, morais ou legais dos outros, ou simplesmente alguém que pretende levar alguma vantagem se prestando a esse papel.

O Brasil de hoje vive uma situação absurda, na qual o X-9 virou peça fundamental de uma megaoperação policial que, com o tempo, assumiu o fantástico propósito de varrer a corrupção que há séculos convive com toda a sociedade, se tornando mesmo parte fundamental de seu funcionamento.

Dessa forma, bandidos já condenados se livram de grande parte de sua pena, se, como se diz popularmente, abrirem o bico, não só contando detalhes de seus crimes, mas falando, em juízo, ou seja, para os autos do processo, aquilo que seus captores querem ouvir.

E todos sabem o que eles querem ouvir - a megaoperação se revelou apenas um pretexto para destruir o maior partido da esquerda latino-americano e sua principal liderança.

Tempos atrás publiquei no meu blog Contos do Motta uma pequena peça de ficção sobre o delator.

Não é uma obra-prima como as cantadas pelo mestre Bezerra da Silva, mas, acho, reflete um pouco essa figura abominável.


Dedo-duro


Começou cedo. 

Quando a professora quis saber quem havia soltado aquele peido estereofônico, foi o primeiro a dizer:

- Não fui eu. Foi o Zezinho.

E apontou o magricela com seu indicador pequeno e raquítico, duro e incisivo.

Ao episódio sonoro sucederam-se outros, de vários tipos e único gênero.

Certa vez falou para o pai que a Inezinha, sua irmã, passava no shopping as tardes em que deveria estar estudando.

Noutra ocasião contou para a mãe que viu o pai parar o carro na esquina e dar carona para a Betinha, a moça loira e bonita do terceiro andar.

Acostumou-se com a delação.

Fez dela um estilo de vida - cômodo, prático, eficaz.

Degrau a degrau, escalou metodicamente posições que o levaram a ser tudo o que sempre quis: viver a tranquilidade dos sem-consciência.

Era apontado pelos vizinhos como modelo a ser seguido.

Só uma vez teve as convicções abaladas.

O filho, adolescente quieto, chegou em casa com a cara inchada, a orelha amassada, o olho fechado.

- Fala quem foi que fez isso, fala de uma vez!

E o garoto quieto.

- Fala que eu entrego esse filho da puta pra polícia!

E nada, nadinha de nada, nem uma palavra.

Nunca entendeu a razão do silêncio, nem soube de nome nenhum.

Mas sempre quis apontar o filho para todos e gritar, o coração explodindo de orgulho:


- É o meu garoto, ele sabe ficar quieto!

(Carlos Motta)



O corruptor, o corrupto, e o meu amigo

abril 22, 2017 11:01, por segundo clichê


Anos atrás, um amigo, jornalista dos bons, criativo e empreendedor, mas que infelizmente não está mais entre nós, me telefonou para que passássemos a limpo as novidades.

Conversa vai, conversa vem, ele, que na época trabalhava como assessor da diretoria de uma grande cervejaria, se mostrou indignado com o alto nível de corrupção no Brasil - como se vê, essa história que hoje é o centro da discussão política no Brasil vem de longe.

E me contou uma historinha, da qual me recordo até hoje.

A empresa queria se expandir e buscava um local no Paraná para instalar sua nova fábrica. Mas, como todo mundo, estava atrás de algumas facilidades, isenções fiscais, essas coisas. E o seu manda-chuva resolveu ir a Brasília atrás de um deputado que lhe indicaram como sendo o homem certo para tocar o negócio.


- E lá fomos nós - disse o meu amigo. Chegamos ao escritório do deputado, entramos para falar com ele, e ele, nem bem escutou o nosso pedido já foi dizendo: "Olha, combinem tudo com o meu secretário. A gente acerta depois." Assim, na lata! É incrível como os nossos políticos são corruptos!

Foi aí, nesse momento da conversa, que interrompi esse meu meu camarada:

-Mas fulano, você não percebeu que vocês, nessa história, eram os corruptores, eram quem estavam dispostos a oferecer vantagens para o deputado facilitar as coisas para a empresa?

Depois dessa, passamos a falar de futebol.

Esse papo se deu bem antes de o Brasil virar essa republiqueta de Quinto Mundo, paraíso dos criminosos de colarinhos multicoloridos, pessoal que até outro dia atrás estava se refestelando na boa vida proporcionada pelos altíssimos salários pagos pelas ilibadas companhias em que trabalhavam.

Não sei se o meu amigo jornalista, se estivesse ainda entre nós, com tudo o que está ocorrendo, continuasse achando que só os políticos roubam e os empresários são uns coitados que têm de implorar aos nossos representantes legislativos favores para que seus negócios andem - favores que saem, como estamos vendo, muito caros.

Tenho certeza, porém, que esse meu amigo jornalista, se fosse novamente solicitado a acompanhar seu chefe numa missão dessas, arranjaria uma boa desculpa para não ir junto. 

É que ele, algumas vezes, se mostrou ingênuo, mas de burro não tinha nada. (Carlos Motta)



Gasolina mais cara, presente do Brasil Novo

abril 21, 2017 10:58, por segundo clichê


A Petrobras reajustou o preço dos combustíveis nas refinarias. 

A estatal aumentou o valor do diesel em 4,3% e da gasolina em 2,2%, em média.

De acordo com a estatal, se o reajuste for integralmente repassado e não houver alterações nas demais parcelas que compõem o preço ao consumidor final, o diesel pode subir 2,9%, ou cerca de R$ 0,09 por litro, em média, e a gasolina, 1,2%, ou R$ 0,04 por litro, em média, nas bombas.


O aumento, segundo a Petrobras, se deve à elevação dos preços dos derivados nos mercados internacionais desde a última decisão de preço, que mais que compensou a valorização do real frente ao dólar, e por ajustes na competitividade da estatal no mercado interno.

“É preciso destacar ainda que o comportamento dos preços de derivados foi marcado por volatilidade nos mercados internacionais em resposta a evento geopolítico, como o ocorrido na Síria”, destacou a companhia em nota.

É, bons tempos aqueles em que o combustível ficava anos sem aumento...

E tinha gente que reclamava...



O país da fofoca

abril 21, 2017 10:33, por segundo clichê


Nos mais de 40 anos que passei em diferentes redações de jornais vi e ouvi muita coisa.

Muita coisa que não foi publicada, que ficou restrita às conversas no cafezinho. 

Até hoje não sei se essas histórias eram verdadeiras ou mentirosas, já que, por absoluta falta de provas elas não se transformaram em notícia.

No jornalismo, pelo menos naquele que vivi, é assim: não adianta o sujeito dizer que foi à Lua montado num tapete voador para que a sua fábula ganhe as páginas do jornal - ou do site na internet.


É preciso que ele prove que a sua narrativa, ou o fato que denuncia, não é simplesmente, uma ficção, uma mentira, uma invencionice qualquer.

Por essas e por outras é que a notícia tem de ser, como se diz no jargão jornalístico, apurada, ou seja, investigada, com a chancela de documentos e fontes diversas.

Sei que o jornalismo de hoje é bem mais, digamos, flexível, do que o de antigamente. Aceita, quando interessa aos seus objetivos, a palavra de qualquer um, publica, sem o cuidado de checar a informação, tudo aquilo que vai de encontro aos seus fins.

Na verdade, o jornalismo é quase inexistente neste Brasil Novo, o que se vê é uma imensa máquina de propaganda a serviço da oligarquia, os endinheirados de sempre.

E o mesmo acontece no Judiciário e no Ministério Público, instituições que deveriam estar totalmente a serviço da verdade factual para que, é óbvio, promovam a Justiça - é para isso que existem e são mantidos pela sociedade.

Miseravelmente, porém, nestes tempos de penúria ética e moral, prescinde-se de provas para condenar, e a investigação foi trocada pela tortura dos réus, que passam anos presos até que confessem aquilo que seus captores querem ouvir.

Pouco importa se o que falam é só uma fofoca, um ouvi dizer, um boato, ou mesmo uma mentira, uma calúnia.

Num país em que cada vez mais esses métodos - medievais, nazistas? - se institucionalizam, não há lugar para a democracia.

Qualquer pessoa com dois neurônios é capaz de entender isso: justiça seletiva não é justiça. E onde não há justiça resta somente a barbárie. (Carlos Motta)



O Coelho, o Chocolate, e a delação combinada

abril 21, 2017 10:31, por segundo clichê



O saudoso sociólogo Antonio Geraldo de Campos Coelho, meu tipo inesquecível da Jundiaí de minha juventude, tinha o costume de apelidar todo mundo.

Eu era o Nero, não sei bem por qual motivo.

Havia ainda o Homem Palha, o Peixe Galo, e tantos outros que a memória apagou.

De dois, porém, me lembro bem: Chocolate e Estilingue, companheiros inseparáveis da extinta Convergência Socialista, hoje o nefando PSTU.

Coelho era um anticomunista ferrenho, mas também um intelectual e, sobretudo, um gozador.


Chocolate e Estilingue, que tinham sonhos revolucionários - vivíamos em plena ditadura militar -, eram vítimas constantes de sua ironia.

Para quem não entendia o porquê do apelido "Chocolate", o Coelho sinteticamente explicava:

- É que, se um dia ele for preso e ameaçarem tirar o chocolate dele, ele confessa até que incendiou Roma. Não vai ser preciso usar tortura...

Não me recordo do motivo do Estilingue ser o Estilingue.

Talvez o fato de ele ser magérrimo e ter pernas compridas fizesse o Coelho achá-lo parecido com a perigosíssima arma que usávamos em nossa infância para atingir os mais variados alvos.

O Coelho e o Chocolate já não estão neste mundo.

Não sei por onde anda o Estilingue.

Sei apenas que eles foram personagens importantes num período de minha vida, um período difícil para todos os brasileiros, mas no qual, ao contrário de hoje, pessoas tão diferentes entre si podiam conviver harmoniosamente, e até mesmo se divertir com a diversidade de suas opiniões.

Eram outros tempos.

Hoje, quando a tortura é aplicada sob formas variadas pelos próprios agentes públicos que deveriam combatê-la, talvez o chiste do Coelho sobre o limite de resistência do Chocolate não fizesse sentido. 

Afinal, para quê privar uma pessoa de seu alimento preferido, se seus captores podem obter dela o que quiserem simplesmente livrando-a da prisão se ela falar em juízo aquilo que eles lhe ordenam? (Carlos Motta)



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