A Conferência Web.br 2015, principal espaço de discussão e networking da comunidade Web do Brasil, promoveu nos dias 22 e 23 de setembro, em São Paulo, uma acalorada defesa da Universalidade e da Re-descentralização da Web. Com a participação de palestrantes internacionais e nacionais, o evento, organizado pelo escritório brasileiro do W3C, instalado na sede do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), por iniciativa do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), mobilizou desenvolvedores, usuários, empreendedores e pesquisadores em torno do debate sobre a Internet e a Web do futuro.
A Universalidade, princípio do decálogo do CGI.br, e tema da 7ª Conferência CGI.br 20 anos, foi abordada por Sunil Abraham, diretor executivo do Centro para Internet e Sociedade (CIS India) e por Lêda Spelta, consultora de acessibilidade e sócia fundadora da Acesso Digital. Abraham trouxe a perspectiva tecnológica sobre as dificuldades para o acesso universal e falou sobre o que considera dois dos principais problemas a serem resolvidos, o hardware e o licenciamento de patentes. A acessibilidade, questão detalhada por Lêda Spelta, também deve ser considerada: apesar de 6% da população indiana ter alguma deficiência (no Brasil, essa proporção é de 20%), 37% dos adultos são analfabetos, indica Sunil.
O conteúdo foi outro ponto levantado pelo empreendedor indiano. “Pessoas não irão acessar a Internet se a rede não tiver informações que sejam do seu interesse”. Nesse cenário, as barreiras impostas por leis de direitos autorais foram listadas por Sunil, que apontou a utilização dos ganhos obtidos a partir do uso do espectro como uma das soluções possíveis para promover a universalidade da Internet.
“Há 14 anos apresentei o primeiro trabalho sobre acessibilidade na Web. De lá para cá, venho falando basicamente as mesmas coisas”, lamentou Lêda Spelta, no início de sua apresentação. Ela narrou dificuldades para realizar atividades simples na Web a partir de recursos de acessibilidade, como fazer reserva em sítios de hotéis, e questionou as razões para que o cenário tenha permanecido o mesmo. “Uma das hipóteses é de que os tomadores de decisões não se interessam por técnicas de acessibilidade na Web”, opinou.
Lêda aponta que não há medidas suficientes para que pessoas com deficiência vivam de forma autônoma no Brasil e lembra que, entre 2007 e 2010, foram fechados 42 mil postos de trabalho para pessoas com deficiência no País. Ela fez propostas para reverter esse cenário como, por exemplo, a eliminação da diferença entre código válido e código acessível nos padrões Web, a inclusão da disciplina obrigatória de Universalidade da Internet nos currículos e a sensibilização, para que indivíduos e empresas apoiem campanhas que respeitem a diversidade. “A acessibilidade não pode ser a cereja do bolo, tem que ser a massa, o suporte”, reitera.
Durante a Web.br, foram lançadas as inscrições para o Prêmio Nacional de Acessibilidade na Web – Todos@Web, que terá a sua 4ª edição realizada pelo Centro de Estudos sobre Tecnologias Web (Ceweb.br), com apoio do W3C Brasil, NIC.br e CGI.br. Hartmut Glaser, secretario executivo do CGI.br, que mediou a 7ª Conferência “CGI.br 20 anos”, destacou a importância da Universalidade para democracia e verdadeira inclusão digital. Ainda durante a Web.br, Glaser analisou o princípio da neutralidade da rede, tema que será discutido na 8ª Conferência “CGI.br 20 anos”, no dia 13 de outubro, em São Paulo.
Web livre e descentralizada
A “Re-descentralização da Web”, tema da Conferência Web.br deste ano, fez parte das apresentações doskeynotes speakers e painelistas, e foi lembrada por Vagner Diniz, gerente do W3C Brasil, na abertura do evento. Diniz destacou os princípios que motivaram a criação de uma Internet livre, robusta e colaborativa. “Esses princípios não morreram, assim como os valores que impulsionaram o surgimento de uma Web livre e descentralizada”, reforçou.
“No entanto, vivemos um momento em que organizações e Governos buscam nos aprisionar em jardins murados, ao limitar possibilidades de compartilhamento e o livre fluxo da informação”. Diniz enfatizou a importância de “re-descentralizar a Web para aproximá-la dos seus princípios originais, para que possamos inovar e criar sem medo”, e também criticou tentativas de impedir a construção de uma nova economia e modelos de negócios baseados na Web.
Os serviços e aplicações descentralizadas foram abordados por Andrei Sambra, pesquisador do MIT e membro do W3C, que propôs ainda uma reflexão sobre a privacidade e a proteção aos dados. Samba lembrou o volume de informações disponíveis online, que cresce exponencialmente com a Internet das Coisas. “Quem é dono desses dados? Quem vai decidir o que deve ser feito com eles? Toda vez que você usa um serviço gratuito na Web, você paga ao permitir acesso aos seus dados pessoais. E esse é um preço muito alto”, alertou.
Ele defende que cada indivíduo tenha o controle sobre suas informações e tenha a liberdade de escolher onde armazena-las – de preferência, em múltiplas fontes – para que empresas, em vez de coletar dados, se preocupem em melhorar a experiência dos usuários. Sambra também apresentou a plataforma SoLiD – Social Linked Data, que planeja mudar a forma como as aplicações na Web são criadas. E convocou a união de forças entre profissionais e usuários. “Devemos trabalhar juntos. O intelecto coletivo é nosso recurso mais valioso”, destacou.
Pagamentos na Web
O keynote speaker Adrian Hope-Bailie, da Ripple Labs, abordou a questão dos Pagamentos na Web – tema que tem sido discutido pelo grupo de trabalho do W3C. Para ele, movimentar dinheiro na Web de forma mais eficiente requer uma mudança na infraestrutura da Web e a chave está no desenvolvimento de novos protocolos que permitam a interação entre sistemas. “Transferir dinheiro deveria ser tão fácil quanto enviar um e-mail. Precisamos de um SMTP monetário”, disse, em referência ao protocolo utilizado para correio eletrônico.
Hope-Bailie argumentou em prol da utilização de padrões abertos e da colaboração de pessoas de diferentes países para chegar a soluções globais. “Mudar o comportamento do usuário é difícil. Precisamos tirar o usuário do fluxo”, afirmou, citando o exemplo de tecnologias como digital wallets que enfrentam resistência no mercado. E fez previsões sobre o futuro dos pagamentos. “Se a movimentação de dinheiroonline for tão fácil quanto é o trânsito de informações, podemos nos livrar de modelos de publicidade”.
Dados na Web
Os Dados Conectados usam conceitos e tecnologias da Web para descrever o mundo. Com base nesta afirmação, Phil Archer apresentou o que grupos de trabalho do W3C envolvidos com dados na Web têm feito e discutido sobre a questão. “Pessoas estão gerando e compartilhando informações sobre tudo, o tempo todo. Precisamos usar essa coisa incrível que é a Web para conectar tudo isso”, destacou. Para Archer, reunir informações das mais diversas fontes vai proporcionar insights que beneficiarão a sociedade. “Vamos encontrar as causas de problemas e suas soluções”.
Deirdre Lee alertou que, apesar da diversidade de fontes, os dados de qualidade e prontos para uso podem ser raros. “Quanto mais adotarmos padrões e seguirmos as melhores práticas, mais fácil e simples será o uso dos dados”, recomendou. Deirdre citou alguns desafios para quem publica dados como as licenças, a qualidade e governança, os recursos, impactos dessas informações e, especialmente, a privacidade. E defendeu, ainda, que as empresas sejam transparentes sobre o uso que fazem dos dados coletados. “Nós, como indivíduos, devemos ter escolha sobre os nossos dados”, sentenciou.
Trilhas
Além da 7ª Conferência CGI.br 20 anos e da apresentação dos keynotes speakers, a programação da Web.br 2015 contou com dezenas de atividades divididas em cinco trilhas: Segurança & Privacidade, Web Payments, Open Web, Trends, Workshops e Tutoriais. As vulnerabilidades na Web, por exemplo, foram abordadas por Miriam von Zuben e Dionathan Nakamura, do CERT.br, enquanto Newton Calegari e Deblyn Prado, do NIC.br, contaram um pouco sobre a rotina de trabalho e integração entre profissionais de desenvolvimento. Outros temas que estiveram em discussão foram: HTML5, CSS3, acessibilidade, web semântica, visualização de dados, Internet/Web das Coisas e digital publishing.
Com informações da Assessoria de Imprensa do CGI/NIC.Br.