Trabalho, um tantão assim; dinheiro, um tiquinho assim
February 28, 2018 10:30Carlos Motta
Em 1956, Marlene lançava a música "O Lamento da Lavadeira", de Monsueto Menezes, João Violão e Nilo Chagas, que foi posteriormente gravada por vários intérpretes, entre eles Pery Ribeiro, Elza Soares, Martinho da Vila, Dudu Nobre e Marisa Monte.
Os versos da composição falam do trabalho cotidiano extenuante das lavadeiras que eram empregadas das mulheres da "alta sociedade" - outra leitura é que a música aborda as condições em que determinadas escravas eram obrigadas a trabalhar.
Seja como for, a degradante realidade exposta em "O Lamento da Lavadeira", por incrível que pareça, permanece atual no Brasil, seis décadas depois de a obra se tornar pública.
O mais conhecido de seus autores, Monsueto, falecido em 1973, deixou várias composições que são ainda cantadas pelos mais importantes artistas da música popular brasileira, como “Eu Quero Essa Mulher Assim Mesmo”, “Me Deixa em Paz”, “Mora na Filosofia” e a “A Fonte Secou”.
Monsueto também trabalhou em cinema, tendo participado de dez filmes brasileiros, três argentinos e um italiano, e na televisão, em quadros de programas humorísticos. Fora isso, ainda se virava pintando quadros na linha dos artistas "primitivos", mesmo estilo que consagrou Heitor dos Prazeres, um dos pioneiros do samba.
Outro dos autores desse clássico da MPB, Nilo Chagas, foi parceiro de Herivelto Martins na dupla Preto e Branco, que se tornou posteriormente o Trio de Ouro, com o ingresso de Dalva de Oliveira.
"Trabalho, um tantão assim/Cansaço, é bastante, sim/A roupa, um montão assim/Dinheiro, um tiquinho assim": impressionante, nada muda neste país!
https://www.youtube.com/watch?v=MakChh80hX0
Sabão, um pedacinho assim
A água, um pinguinho assim
O tanque, um tanquinho assim
A roupa, um montão assim
Para lavar a roupa da minha sinhá
Para lavar a roupa da minha sinhá
Quintal, um quintalzinho assim
A corda, uma cordinha assim
O sol, um solzinho assim
A roupa, um montão assim
Para secar a roupa da minha sinhá
Para secar a roupa da minha sinhá
A sala, uma salinha assim
A mesa, uma mesinha assim
O ferro, um ferrinho assim
A roupa, um montão assim
Para passar a roupa da minha sinhá
Para passar a roupa da minha sinhá
Trabalho, um tantão assim
Cansaço, é bastante, sim
A roupa, um montão assim
Dinheiro, um tiquinho assim
Para lavar a roupa da minha sinhá
Para lavar a roupa da minha sinhá
O jongo resiste
February 27, 2018 9:24No dia 10 de março, às 16h30, a Casa Museu Ema Klabin retorna com sua programação musical. Se apresentará, pela série Tardes Musicais, a Comunidade Jongo Dito Ribeiro, de Campinas, e que tem como objetivo reconstituir a cultura ancestral do jongo.
A Comunidade Jongo Dito Ribeiro foi batizada com esse nome em homenagem ao saudoso Benedito Ribeiro, que chegou a cidade de Campinas na década de 30, vindo do interior de Minas Gerais. Sua neta Alessandra Ribeiro, hoje líder da comunidade, manteve a tradição do jongo recebida por seus antepassados.
Devido à sua importância no âmbito cultural, o jongo foi declarado, em dezembro de 2005, patrimônio cultural imaterial brasileiro pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).
Além da apresentação da Comunidade Jongo Dito Ribeiro, a Casa-Museu Ema Klabin promove o programa Tramas Culturais, que reflete sobre a formação das musicalidades afro-brasileiras. O curso, ministrado pelo historiador Rafael Galante, tem como eixo central uma discussão sobre a imigração forçada para o Brasil das culturas musicais originárias da África. Os encontros acontecem nos dias 8,22 de março e 5,19 de abril, às 19h30.
Serviço
Dia 10/3 – Das 16h30 às 18h -Programa Tardes Musicais - Comunidade Jongo Dito Ribeiro – entrada franca – 170 lugares – não necessita inscrição.
Dias 8,22/3 e 5,19/4 – 19h30 - Programa Tramas culturais: “A África Central e a formação das musicalidades afro-brasileiras” – 30 vagas – Inscrições gratuitas no site: https://emaklabin.org.br/
Local: Casa Museu Ema Klabin
Endereço: Rua Portugal, 43 - Jardim Europa, São Paulo - 11 3897-3232
Festival de teatro de Curitiba terá 400 atrações
February 26, 2018 14:35A capital paranaense será sede, entre os dias 27 de março e 8 de abril, do Festival de Curitiba, uma das maiores atrações de artes cênicas do país. Aberto a incorporações de novos formatos de espetáculo que caem no gosto do público, como a comédia stand-up, o evento tem uma programação que inclui 400 atrações, entre apresentações teatrais e musicais, debates, oficinas, encontros, lançamentos de livros, exibição de filmes e palestras.
No segmento Mostra, estão reunidos os espetáculos convidados pela curadoria oficial do evento, a exemplo do projeto A Máquina de Ser Outro, que se propõe a promover uma maior empatia e tolerância com o outro. "Como seria o mundo se pudéssemos enxergar pelos olhos dos outros?", provoca o coletivo BeAnotherLab.
Além da Mostra, o Guritiba, voltado ao público infantil e juvenil, chega à 10ª edição com mais de 32 mil espectadores, mantendo a iniciativa de distribuir vale-ingressos e trabalhar em dois terrenos: no de espetáculos abertos ao público e nas escolas, de peças exibidas gratuitamente.
Além de poder utilizar, no sistema de busca do site oficial, filtros com base em classificação etária, quem vai acompanhado da família terá diversão garantida pelo segmento MishMash, que inclui shows de mágica, malabarismo e comédia. Também participam do festival diversos comediantes.
Em sua 27ª edição, o festival, que segue com a democratização da arte entre seus principais motes, terá mais de 75 apresentações a céu aberto. A maioria integra o Fringe, uma das ramificações do festival, também exemplo dessa atenção a trocas que possam enriquecer e já bastante familiar aos curitibanos. Praças, parques, ruas da cidadania, feiras, mercadões e casas de leitura de Curitiba e região metropolitana acolherão a plateia em diversas atrações com entrada franca.
Em sua abundante variedade de temas, que vai da dramaturgia infantil a experimentações com sons utilizados em terapias alternativas, o Fringe também se propõe a atingir assuntos mais delicados, como a violência contra a mulher e o feminicídio, abordados em Espaço do Silêncio, de Nina Caetano, de Belo Horizonte.
Outra opção intrigante preparada para o público é a performance Percursos Afetivos, de Cadu Cinelli, do Rio de Janeiro. Quem quiser assistir deve chegar de bicicleta, para acompanhar uma rota escolhida pelo artista para a contação de histórias semificcionais.
Os ingressos estão à venda pelo site www.festivaldecuritiba.com.br, pelo aplicativo Festival de Curitiba 2018 e também em bilheterias instaladas no Shopping Mueller e ParkShoppingBarigui. Os ingressos variam de gratuitos a até R$ 70. Há 384 sessões grátis e em outras 138 funciona o sistema “pague o quanto vale”, em que o público escolhe o quanto paga. (Agência Brasil)
A canção da desesperança
February 26, 2018 10:10Carlos Motta
Vários compositores fizeram músicas de protesto contra a ditadura militar instaurada no Brasil em 1964, que são lembradas e cantadas até hoje, como a icônica "Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores", de Geraldo Vandré.
Nenhuma canção, porém, expressou tão bem a desesperança de uma geração quanto "Pois É, Pra Quê?", de Sidney Miller, lançada em 1969 pelo MPB-4, portanto pouco tempo depois da edição do AI-5, o ato institucional que fechou de vez o regime e condenou o país a duas décadas de trevas.
Sidney Miller morreu cedo demais, aos 35 anos, em 1980. Mas deixou uma obra marcante, inquieta e extremamente sensível ao tempo em que viveu.
Musicalmente, valeu-se, para se expressar, de vários gêneros musicais, mas principalmente do samba. Suas melodias são simples, fáceis de cantar, ao contrário de suas letras, verdadeiros poemas, textos que falam da solidão, do desamor e da dificuldade do homem em se ajustar a um mundo construído na base da opressão, violência e injustiça.
"Pois É, Pra Quê?" tem tudo isso e não aponta caminhos nem soluções para a inutilidade de uma vida que se perde em meio a necessidades, ritos e obrigações impostas por uma sociedade sem "nada de novo", de atmosfera sufocante e que reprime qualquer manifestação de liberdade criativa, qualquer opinião contrária à ideologia dominante.
É uma canção tristíssima, e por isso mesmo atual, já que também no Brasil de hoje a esperança foi soterrada.
O automóvel corre, a lembrança morre,
o suor escorre e molha a calçada,
há verdade na rua, há verdade no povo,
a mulher toda nua, mais nada de novo,
a revolta latente que ninguém vê,
e nem sabe se sente, pois é, pra quê?
O imposto, a conta, o bazar barato,
o relógio aponta o momento exato
da morte incerta, a gravata enforca,
o sapato aperta, o país exporta,
e na minha porta, ninguém quer ver
uma sombra morta, pois é, pra quê?
Que rapaz é esse, que estranho canto,
seu rosto é santo, seu canto é tudo,
saiu do nada, da dor fingida,
desceu a estrada, subiu na vida,
a menina aflita ele não quer ver,
a guitarra excita, pois é, pra quê?
A fome, a doença, o esporte, a gincana,
a praia compensa o trabalho, a semana,
o chope, o cinema, o amor que atenua,
o tiro no peito, o sangue na rua,
o fome a doença, não sei mais porque,
que noite, que lua, meu bem, pra quê?
O patrão sustenta o café, o almoço,
o jornal comenta, um rapaz tão moço,
o calor aumenta, a família cresce,
o cientista inventa uma flor que parece
a razão mais segura pra ninguém saber
de outra flor que tortura, pois é pra quê?
No fim do mundo há um tesouro,
quem for primeiro carrega o ouro,
a vida passa no meu cigarro,
quem tem mais pressa que arranje um carro,
pra andar ligeiro, sem ter porque
Sem ter pra onde, pois é, pra quê?
Tinhorão e a Bossa Nova: a matéria que o Estadão não publicou
February 23, 2018 10:31![]() |
Tinhorão, o compositor Monarco, e Elizabeth, no lançamento da
biografia do pesquisador, na Livraria Folha Seca, no Rio, em 2010
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A matéria não foi publicada, tampouco Elizabeth recebeu um centavo pelo seu trabalho. "Me lembro de ter ido lá e perguntado se iriam ou não publicar, mas em qualquer caso, eu estava cobrando o 'frila', porque aceitaram a pauta, combinaram e etc, e o trabalho foi feito", conta a jornalista. "Me deixaram esperando de pé. Eu já tinha trabalhado naquele jornal duas vezes. Não me lembro exatamente, mas parece que o delicado substituto do editor respondeu algo como não iam publicar mesmo e nem pagar (e não deu explicação sobre o veto). Fui até o então diretor de redação, que me conhecia já do lançamento do livro sobre o Suplemento Literário, do mesmo jornal, em 2007. Muito gentil, me pediu para sentar e disse que resolveria tudo. Neste fevereiro completam-se dez anos e ainda não recebi", completa.
Uma matéria de Elizabeth Lorenzotti sobre José Ramos Tinhorão não é uma matéria qualquer. Afinal, ela é uma das pessoas que mais conhecem a obra e a história de vida desse importante personagem da cultura brasileira - é dela o livro "Tinhorão, o Legendário", publicado pela Imprensa Oficial em 2010, esgotado, muito procurado, mas encontrado apenas em sebos. Elizabeth é ainda autora do livro de poesias "As dez Mil Coisas" (Biblos/Amazon, 2011) e do e-book "Jornalismo Século XXI - o modelo @Midianinja" (E-Galaxia, 2014).
Uma década depois da recusa do Caderno 2, e quando Tinhorão completou lúcidos e festejados 90 anos de vida - e a Bossa Nova, 60 anos de canções -, a matéria de Elizabeth finalmente é publicada - ela está na sequência deste texto. A sua leitura, além de servir como introdução à fascinante aventura de vida de um dos mais valorosos guerreiros da cultura nacional, ajuda a compreender como é necessário que o Brasil debata seriamente todos os temas que envolvem o seu cotidiano - como Tinhorão vem fazendo, obsessivamente, durante décadas, na área da cultura e arte populares. (Carlos Motta)
Tinhorão aos 80 anos: “Chega de saudade”
Elizabeth Lorenzotti
A Bossa Nova completa 50 anos, com festas marcadas para março, nas areias de Copacabana e Ipanema, onde nasceu. E neste fevereiro, seu crítico mais polêmico e devastador, José Ramos Tinhorão, acaba de completar 80. Sem mudar de idéia, radical como sempre, proclama aos bossanovistas, rindo muito: "Chega de saudade! Cinquenta anos de admiração pela música norte-americana! Para com isso rapaziada!"
Para quem não conhece Tinhorão, vituperado à esquerda e à direita durante tantos anos, ou já se esqueceu das histórias que o cercam, é bom lembrar alguns fatos. A famosa apresentação da Bossa Nova no Carnegie Hall foi em 21 de novembro de 1962, mas já em 23 de março daquele ano, na série de matérias sobre a história da música popular brasileira, no Caderno B do "Jornal do Brasil", Tinhorão demolia: “Samba Bossa Nova nasceu como automóvel JK: apenas montado no Brasil.”
“Foi aí que começou o ódio ao Tinhorão”, ele conta.
Artigos como este foram incluídos, em1962, no livro "Música Popular um Tema em Debate", já em quinta edição (Editora 34). “Esses artigos, escritos no calor da hora, são lidos até hoje como história. É o meu livro mais reeditado”, orgulha-se. Também faz parte do livro outro artigo, igualmente devastador, publicado na histórica revista "Senhor", edição abril/maio de 1963 sob o título “Os Pais da Bossa Nova”, com a seguinte abertura:
“Filha de aventuras secretas de apartamento com a música norte-americana – que é, inegavelmente, sua mãe – a bossa nova, no que se refere à paternidade, vive até hoje o mesmo drama de tantas crianças de Copacabana, o bairro em que nasceu: não sabe quem é o pai.”
O artigo provocou grande reação entre os jovens adeptos da bossa. Então, lembra Tinhorão, ”impossibilitados de responder ao principal ponto, um primeiro levantamento das raízes do processo de alienação cultural imposta à música popular, partiram para o lado pessoal”.
Em 1966, em um show produzido por Mieli e Bôscoli, Taiguara atirava longe o livro e dizia: "O livro do Tinhorão dura apenas cinco minutos, a bossa nova já vai fazer dez anos..." Mas tanto um como a outra já alcançaram a posteridade. O jornalista teve muitas de suas matérias escritas para jornais e revistas perenizadas em 22 livros publicados no Brasil, além de outros cinco editados em Lisboa, e hoje é um respeitado historiador da cultura popular urbana.
Tinhorão, conhecida planta ornamental tóxica, não é sobrenome, mas apelido dado por Everardo Gillon, um secretário de redação brincalhão do histórico "Diário Carioca", onde o jornalista se profissionalizou a partir de 1953. O batismo definitivo, em letra impressa, veio do chefe de redação, Pompeu de Souza Brasil, ao assinar a primeira matéria do foca. Esse santista radicado desde a infância no Rio de Janeiro, formado em Direito e em Jornalismo, foi contratado pelo jornal como copydesk (redator) dentro da primeira grande transformação da imprensa brasileira: a introdução do "lead", a abolição do nariz de cera, a padronização dos textos, a implantação do primeiro manual de redação.
Lá ficou até 1958, quando foi convidado para o "Jornal do Brasil", onde trabalhou até 1963 e depois colaborou como crítico entre 1974 e 1982. Estas as críticas que despertaram iras. Uma delas, até, foi imortalizada em letra de música que, Tinhorão presume, tenha se originado do artigo intitulado “O melhor de João Bosco é Aldir Blanc”.
Blanc, com Maurício Tapajós, em “Querelas do Brasil” fala das coisas do Brasil com S que o Brazil com Z desconhece, inclusive as venenosas, mas genuinamente nacionais, entre elas:
“Tinhorão, urutu, sucuri”.
E no verso seguinte cita as aves canoras:
“O Jobim, sabiá, bem-te-vi”.
Tom Jobim, aliás, que, conta a lenda, certa época comprou um vaso de tinhorão, colocado na porta de entrada de sua casa, onde diariamente fazia xixi.
Tinhorão passou pelo "Correio da Manhã", "O Jornal", "Última Hora", TV Globo, revistas "Veja" e "Nova". No fim da década de 70 promoveu uma reviravolta em sua vida: resolveu largar tudo, tornar-se autônomo e viver para escrever seus livros. Foi morar em uma quitinete na Rua Maria Antonia, centro de São Paulo, de 30 metros quadrados, literalmente entupida com seu preciosíssimo acervo, construído ao longo de pelo menos 30 anos.
“Tem aquele folclore de que eu dormia num colchonete na sala. E era verdade. Foi assim que curei minhas dores na coluna” lembra, bem humorado.
Já sem dispor de qualquer centímetro quadrado livre na quitinete, Tinhorão um dia pensou em vender o acervo. Mas no país chamado Brasil, se doar já é difícil, imaginem vender: ninguém queria. Pensou até em colocar à venda, em retalhos, na Avenida São João, mas não teve coragem. Até que, finalmente, obteve êxito com o Instituto Moreira Salles, que hoje abriga o fantástico acervo: 6,5 mil discos 76 e 78 r.p.m. gravados e lançados entre 1902 e 1964; 6 mil discos 33 r.p.m. entre 1960 e 1990, e mais livros, partituras, folhetos, revistas, enfim, documentos raros sobre a música e a cultura popular urbana no Brasil. Muita coisa, ele garante, nem a Biblioteca Nacional tem.
Tinhorão sempre peregrinou pelos sebos. É em um deles, aliás, o Metido a Sebo, na Vila Buarque, que ele passa três vezes por semana e onde costuma encontrar os amigos e dar entrevistas: uma extensão de sua casa.
Ele prossegue: “Os professores querem só o que está dentro da biblioteca da Universidade. Eu ando em sebos há 40 anos, tenho de descobrir muitas coisas. Por isso hoje, muita gente mama na bibliografia do Tinhorão”, reclama.
Embora mestrado em História Social pela USP ("A Imprensa Carnavalesca no Brasil: um Panorama da Linguagem Cômica", Hidra, 2000), o modo de a academia olhar para Tinhorão não mudou: ele é sempre chamado de “jornalista”. Mas a verdade é que se trata de um historiador da cultura popular urbana, que começou sua pesquisa quando a academia não se preocupava com essas questões.
Ele escreve em média um livro a cada dois anos – trabalha com prazer, mesmo aos domingos e feriados – e nos seus 22 publicados no Brasil até agora, contabiliza 2.845 citações de livros, artigos em periódicos e documentos (impressos e manuscritos). “Está tudo documentado. Para me contestar é preciso contar outra história e isso nunca aconteceu.”
Sempre foi fiel ao seu método, o materialismo dialético. Entende que a História é a crônica dos homens no mundo, ou seja, de suas relações com a natureza e com os outros homens. Das relações de produção derivam-se as relações sociais entre os homens que resultarão no sistema capitalista, na divisão em classes. Cada classe tem suas idéias básicas admitidas como boas, ou sua ideologia.
Transportando-se tal princípio para a música, teatro, literatura, etc, esta produção também projetará uma ideologia. Numa sociedade de classes, o que se chama cultura é uma cultura de classes. Que ninguém se engane. Encha-se de esperança ou dispa-se totalmente dela ao adentrar sua obra: esta é a visão que orienta Tinhorão em sua produção intelectual, e está explicada em detalhes na introdução de "Cultura Popular Temas e Questões" (Editora 34).
É esta a visão do mundo que o leva a afirmar: "Se você não produz alta tecnologia, também não pode produzir inovações no campo cultural. Seria uma discrepância: como você é original em cultura e não em tecnologia?"