Três cenários para o governo Temer
julio 7, 2017 14:37São basicamente três os cenários imaginados: a) renúncia, por exaustão do governo; b) a cassação, por decisão do STF, após autorização da Câmara dos Deputados; e c) a Sarneyrização do governo, ou a imagem do “pato manco”, com a equipe econômica e o Congresso fazendo o feijão com arroz, sem qualquer reforma relevante. O primeiro é realista, o segundo pessimista e o terceiro otimista.
O primeiro – de renúncia – poderá vir por exaustão do governo. O agravamento da crise política e ético-moral, com a possível delação de alguns dos aliados presos do presidente – como Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima, Rodrigo Rocha Loures e Henrique Alves – e o preço das concessões à base para a manutenção do mandato, o custo psicológico e o tempo dedicado à administração da crise poderá levar o presidente a rever sua decisão de não renunciar.
Para tanto, dois tipos de estímulos poderão ser determinantes, positivo ou negativo. O positivo seria um acordo que afastasse o risco de prisão imediata após a renúncia, seja por indulto ou por aprovação de foro privilegiado para ex-presidente, seja por outro tipo de arranjo. O negativo seria por abandono do mercado, da base, da própria equipe econômica ou por pressão popular, mediante grandes manifestações com o mote “Fora Temer”. A queda de popularidade do presidente, medida por diferentes institutos de pesquisa, mostra que essa possibilidade não está muito distante de ocorrer.
O segundo – de cassação – poderá vir pela provável saída do PSDB da base, que levaria consigo alguns outros partidos, deixando o governo sem condições de promover reformas, sem sustentação perante o mercado e sem votos para impedir a autorização de abertura do processo por crime comum perante o Supremo Tribuna Federal.
Para um partido com perspectiva de poder, como o PSDB, é um custo insuportável rejeitar na Câmara três denúncias de natureza ético-moral, e com forte suporte fático, propostas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente da República. A primeira, já em curso, sobre corrupção passiva. A segunda, a ser proposta, sobre obstrução da Justiça. E a terceira, também a ser proposta, sobre formação de quadrilha.
O eventual desembarque do PSDB certamente seria acompanhado por seus potenciais aliados no pleito de 2018, e isto poderia deixar o presidente Temer sem condições de barrar na Câmara a abertura do processo no STF, senão já na primeira, possivelmente na segunda ou na terceira tentativa.
Outro vetor que poderia contribuir para esse cenário seria o establishment encontrar um nome que reunisse as cinco condições consideradas ideais para substituir Temer e fazer a transição e a posse do novo presidente eleito diretamente: a) ter voto no Congresso (Câmara e Senado) para ser eleito, b) manter a agenda de reformas, c) continuar com a equipe econômica atual, d) não estar sendo investigado por desvio de conduta, e e) ter maturidade e equilíbrio emocional para conduzir o país nesse período delicado de transição.
Esse é o cenário menos provável, até porque o presidente, percebendo esses movimentos, poderia renunciar antes, evitando o vexame de não reunir 172 votos para se manter à frente do governo. Além disso, o presidente sabe que uma vez autorizada a abertura do processo, com seu imediato afastamento por 180 dias, a chance de voltar é praticamente zero.
Por fim, o cenário de Sarneyrização, que seria a continuação, piorada, do que já vem ocorrendo. O governo conseguiria rejeitar os pedidos de cassação na Câmara, mas ficaria sem forças para aprovar reformas e sem condições de impor sua vontade no governo, passando a depender integralmente da equipe econômica e da base fisiológica do Congresso. O natural enfraquecimento do presidente, por já estar em fim de mandato, seria agravado pela sua total incapacidade de garantir sustentação a qualquer medida de relevo que pudesse recuperar a sua credibilidade.
Esse cenário, aliás, tende a prevalecer mesmo na hipótese de substituição de Temer, caso o sucessor seja alguém do Congresso. Seria mantido o padrão atual, com sua agonia a cada dia.
O desafio seria manter os fundamentos macroeconômicos a cargo do Banco Central, como o controle da inflação, a redução das taxas de juros, o equilíbrio do câmbio e da política monetária, além da preservação das reservas cambiais.
Atualmente, o governo tem aliviado a situação das finanças públicas e da população com receitas provisórias, mas que não se sustentam sem reformas, sem aumento de tributos ou sem o descongelamento do gasto público.
No caso do governo Temer, o alívio decorre da venda de ativos, de receitas de concessões e eventuais privatizações, do novo Refis, da repatriação e do contingenciamento do orçamento e agora do resgate de precatórios não retirados pelos titulares. Porém, se até setembro não houver o descontingenciamento, a máquina vai parar. Alguns setores essenciais já estão evidenciando esse colapso, notadamente a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal.
No caso da população, o alívio decorre da liberação do FGTS e da devolução do imposto de renda, cujos efeitos são passageiros, e da redução da inflação e do valor dos alugueis que, embora sejam importantes, não compensam as perdas decorrentes da estagnação da economia e do desemprego.
Paradoxalmente, voltam ao debate medidas de supressão de direitos, como a extinção do abono salarial, já cogitado em momentos anteriores, e que já foi objeto da redução do valor devido aos trabalhadores, por meio da Medida Provisória 664, em 2015.
A sequência natural disso é que a situação fiscal se deteriora a cada dia, pois o novo regime fiscal não se sustenta sem reformas e sem o aumento de tributos, porque o Orçamento congelado em 2016 não dá conta de manter os atuais serviços públicos e programas sociais. A reação popular será apenas uma questão de tempo, caso se mantenha a meta fiscal sem flexibilização, não haja aumento de receita ou não sejam liberados os recursos orçamentários contingenciados.
Preços caem, sinal de que a crise se aprofunda
julio 7, 2017 9:56A atividade econômica do Brasil Novo está pior do que se pensava: o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a inflação oficial do país, fechou o mês de junho com resultado negativo (deflação) de 0,23%, a primeira registrada em 11 anos.
Os dados foram divulgados pelo IBGE. O resultado é o mais baixo para o mês de junho desde o início do Plano Real e o primeiro resultado mensal negativo desde os -0,21% de 2006. Em agosto de 1998, a taxa atingiu -0,51%.
Com isso, o primeiro semestre do ano fechou em 1,18%, abaixo dos 4,42% registrados no mesmo período do ano passado. Considerando os primeiros semestres do ano, é o resultado mais baixo da série histórica. Em relação aos últimos 12 meses, o índice acumulado foi para 3%, abaixo dos 3,6% relativos aos 12 meses imediatamente anteriores.
A deflação ocorre quando os preços de produtos e serviços caem em determinado período de tempo. É um movimento contrário ao de inflação, quando os preços sobem. A deflação é diferente da chamada desinflação – neste caso, os preços sobem, mas em ritmo mais lento.
E ela é boa para o país?
Definitivamente, não.
Um dos principais fatores que levam à deflação é a recessão, a retração do Produto Interno Bruto, o PIB, soma das riquezas do país. Numa crise econômica, os consumidores compram menos e forçam as empresas a reduzir preços.
Segundo economistas, a deflação é tão ruim ou até pior que a inflação muito alta quando vira uma tendência. O motivo é simples: quando os preços caem demais, as pessoas deixam de consumir e passam a poupar, acreditando que o dinheiro valerá mais no futuro. Isso alimenta uma nova queda de preços, puxando a economia para baixo.
O "Tico-Tico", há cem anos comendo todo o fubá...
julio 6, 2017 17:36
O tico-tico está comendo todo o fubá há 100 anos.
Isso mesmo.
Uma das músicas brasileiras mais conhecidas em todo o mundo, na verdade, um clássico universal, o choro "Tico-Tico no Fubá", de Zequinha de Abreu, foi apresentado pela primeira vez em 1917, num baile na cidade natal de seu autor, Santa Rita do Passa Quatro, no Interior paulista, com o nome de "Tico-Tico no Farelo".
Demorou 14 anos para o pequeno pássaro decolar - a primeira gravação do choro é de 1931, pela Orquestra Colbaz, já com o nome que o consagrou, modificado porque existia um outro tico-tico, de autoria do violonista Canhoto (Américo Jacomino, autor de "Abismo de Rosas"), fazendo a farra no farelo.
Depois, ele voou alto e para bem longe.
O "Tico-Tico" atingiu o auge de seu sucesso na década de 40 do século passado - fez parte de seis filmes de Hollywood naquela época.
As gravações de Carmen Miranda (1945) e a de Ademilde Fonseca (1942), a Rainha do Chorinho, têm letras diferentes: a de Carmen é de autoria de Aloysio de Oliveira, o líder do Bando da Lua, e a de Ademilde, de Eurico Barreiro.
Em 1941, a organista americana Ethel Smith lançou o "Tico-Tico" para o mundo.
E o passarinho percorreu todo o planeta: entre muitos outros, o chorinho foi gravado por Dalida, Michel Legrand, Mantovani, Roberto Inglez, Ray Conniff, Perez Prado, Orquestra Tabajara, Henry Mancini, Stan Kenton, Charlie Parker, Tommy Dorsey, Paco de Lucia, Desi Arnaz, Les Brown, David Grisman, Waldir Azevedo, Garoto, Daniel Barenboim, Moreira Lima, Jacques Klein, Liberace, Lou Bega, Oscar Alemán, Paquito D'Rivera, Raphael Rabello, Armandinho, Paulo Moura, Pixinguinha, Ray Ventura, João Bosco, Benedito Lacerda, Orquestra Filarmônica de Berlim, Percy Faith, Marc-André Hamelin, Edmundo Ros, Klaus Wunderlich, Xavier Cugat, Edson Lopes, Ney Matogrosso e Roberta Sá.
O autor desse clássico, Zequinha de Abreu (José Gomes de Abreu - Santa Rita do Passa Quatro, 19 de setembro de 1880 — São Paulo, 22 de janeiro de 1935), teve a sua vida contada - e romanceada - no filme "Tico-Tico no Fubá", dirigido pelo italiano Adolfo Celi, com Anselmo Duarte, Tônia Carrero, Marisa Prado e Ziembinski no elenco, lançado em 1952.
Zequinha compôs inúmeros outros choros e diversas valsas que se incorporaram ao riquíssimo acervo da música popular brasileira, como "Os Pintinhos no Terreiro", "Branca", e "Tardes em Lindoia".
Mas nenhuma música se igualou, nem de longe, ao sucesso do travesso e comilão passarinho.
No vídeo, o Trio Boa Maré homenageia esse clássico centenário, com a letra de Eurico Barreiro:
Um tico-tico só
O tico-tico lá
Está comendo
Todo, todo, meu fubá
Olha, seu Nicolau
Que o fubá se vai
Pego no meu pica-pau
E um tiro sai
Então eu tenho pena
Do susto que levou
E uma cuia
Cheia de fubá eu dou
E alegre já voando e piando
Meu fubá, meu fubá
Saltando de lá para cá
Houve um dia porém
Que ele não voltou
O seu gostoso fubá
O vento levou
Triste fiquei quase chorei
Mas então vi
Logo depois não era um
E sim já dois
Quero contar baixinho
A vida dos dois
Tiveram ninhos
E filhinhos depois
Todos agora pulam ali
Saltam aqui
Comendo todo o meu fubá
Saltando de lá para cá
Mas afinal, quem elegeu esse bando?
julio 6, 2017 17:32Tem horas em que vejo pensando com os meus botões: mas, afinal, por que existe tanta gente indignada com os deputados, com os senadores, com o governador, com presidente da República, ou mesmo com o prefeito e os vereadores de sua cidade?
Está certo que, descontando as exceções, os parlamentares e os chefes de Executivo do Brasil são, com a maior boa vontade que possamos ter, deploráveis.
Num chute bem dado, é possível dizer que 90% deles são semialfabetizados, defendem seus próprios interesses, não fazem distinção entre o público e o privado, foram eleitos sem respeitar a legislação eleitoral, e usam o cargo como mero balcão de negócios - são corruptos, ou picaretas, como queiram.
Mas, insisto com os meus botões, quem votou nessa súcia, ou seja, quem botou essa corja nas câmaras municipais, assembleias legislativas, Congresso Nacional, governos estaduais ou nas prefeituras?
O povo brasileiro, responde o Grilo Falante, aquela voz interior que existe para nos apoquentar sempre que dúvidas desconfortáveis nos assaltam.
"Eles não são fruto de geração espontânea", me explica o hóspede indesejado.
Daí em diante, o comichão me rói o cérebro e, vítima de enorme desconforto, chego à conclusão que, se esse povo vota nesses desclassificados, eleição após eleição, é porque confia neles, acha que eles merecem representá-lo, está contente com o "trabalho" que fazem - ou então não dá a menor importância a eles ou à sua atuação.
Seja como for, os parlamentares e os chefes de Executivo brasileiros representam o que é o povo deste imenso país - uma nação, afinal, é formada por seus cidadãos, com suas virtudes e defeitos.
A essa altura, meus botões me viram as costas, tampam seus ouvidos, e se recusam a ouvir a minha peroração.
Não querem ser cúmplices, nem mesmo testemunhas, de tamanho sacrilégio.
Afinal, quem sou eu para criticar o povo brasileiro, tão elogiado por poetas, escritores, intelectuais, pessoas de muito mais valor do que este ordinário indivíduo?
E, sem essa audiência, me calo, certo de que, se falei muita bobagem, sempre haverá um Tiririca, um Bolsonaro, um Dória, qualquer um desses ilustres representantes da classe política, para me contrariar com seus notáveis exemplos. (Carlos Motta)
Mitos da austeridade: o caso de Portugal
julio 6, 2017 10:41“A austeridade foi um fracasso para Portugal, como também representou para todos os outros países em que se tentou esta mesma política.”
Essa é a conclusão do prêmio Nobel em Economia, Joseph Stiglitz, ao analisar o período em que Portugal aplicou ao “pé da letra” a cartilha da austeridade.
Para “salvar” a economia e as contas públicas, devastadas pela crise econômica mundial de 2008, o governo português recorreu ao empréstimo de 78 bilhões de euros concedido pela troika (Banco Central Europeu, Comissão Europeia e FMI) e implantou o seu pacote de ajustes de 2011 a 2014, executando medidas que diminuíram o gasto público, aumentaram a carga tributária, reformaram o mercado de trabalho, dificultaram o acesso ao crédito e ainda cortaram vários benefícios sociais e o número de seus beneficiários.
Assim, seguindo a lógica da contração fiscal expansionista, o governo português cortou em até 10% os salários dos funcionários públicos, cortou parte do fornecimento de medicamentos e de transporte de doentes, aumentou em 20% o preço dos transportes públicos, aumentou o imposto de renda e o imposto sobre o valor adicionado, congelou o salário mínimo por 4 anos, facilitou a demissão de funcionários nas empresas privadas, reduziu o prazo e o valor do seguro desemprego, aumentou a idade mínima para a aposentadoria além de muitas outras medidas de austeridade.
Como consequência do ajuste, Portugal agravou ainda mais a sua situação fiscal: a dívida pública aumentou de 96,2% do PIB em 2010 (antes do pacote) para 130,6% em 2014 e o déficit público, apesar de menor do que no auge da crise mundial (2009 e 2010), não se reduziu de maneira significativa, ficando na média de 6,3% entre 2011 e 2014.
Além disso, o desemprego aumentou durante o período da austeridade, atingindo 16,4% da população economicamente ativa em 2013 e a economia, que estava se recuperando em 2010, entrou em recessão, com o PIB apresentando taxas negativas em três anos seguidos, sendo a maior queda em 2012, de -4,0%.
A situação econômica portuguesa só começou a melhorar depois que o país abandonou o programa de ajuste da troika, em junho de 2014, e após a eleição do primeiro ministro António Costa em 2015, com um programa de governo contrário à austeridade.
Desde então as medidas passaram a ser de estímulo à economia, com destaque para o descongelamento do salário mínimo, a recomposição dos salários do funcionalismo público, a retomada de alguns benefícios sociais excluídos entre 2011-2014, o incentivo ao consumo, a revisão dos aumentos nos impostos, o aumento dos subsídios para as empresas contratarem pessoas há muito tempo desempregadas, além de medidas para fortalecer os bancos públicos portugueses.
Ao contrário do que a cartilha da austeridade fiscal defende, são as medidas de estímulo econômico que tanto têm feito a economia portuguesa crescer, quanto têm melhorado as contas públicas do país e seu nível de emprego. O PIB português cresce há 14 trimestres consecutivos, atingindo 2,8% no primeiro trimestre de 2017, o desemprego se reduziu a 10,1% nesse mesmo trimestre e o déficit público caiu em mais de 5 pontos percentuais do PIB desde a supressão das medidas de austeridade e, em 3 anos, chegou a 2,0% do PIB – o nível mais baixo desde a transição de Portugal para a democracia, em 1974. (Brasil Debate/Fundação Perseu Abramo)