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Segundo Clichê

February 27, 2017 15:48 , par Blogoosfero - | 1 person following this article.

O singelo conto de Banana Verde

June 1, 2017 18:02, par segundo clichê


O Dr. Mesóclise era o mais ilustre cidadão de Banana Verde, farol ético e moral para as gerações presentes e futuras, receptáculo de extensivos conhecimentos exclusivos e gerais, conjugador emérito de verbos e excepcional colocador de pronomes.

Com tantas virtudes, coube a ele a tarefa de salvar seu rincão das desgraças causadas por alienígenas sequiosos de impor, como se estivessem em suas exóticas terras, ideologias estranhas à boa índole do trabalhador e ordeiro povo bananaverdense.

Reunidos os cidadãos de bem, foi traçado o plano para que se restaurassem os antigos costumes e a moral de sempre, aquela que determina que cada um não só reconheça, mas permaneça, em seu devido lugar, predeterminado em eras esquecidas, algo que os de fora trataram de mudar, impetuosa e temerariamente, tão logo assumiram o controle dos negócios executivos do povoado.

Escolhidas as tarefas de cada um, saíram todos à labuta, empolgados com a relevância da missão purificadora.


O delegado, o juiz, o promotor, o presidente da Câmara dos Vereadores, o dono do supermercado Boa Compra, o diretor do semanário Letras da Comarca, o quase centenário Juca Belo, ainda ativo nos afazeres de sua fazenda Esperança, todos sabiam perfeitamente o que tinham de fazer para limpar o ar das impurezas trazidas pelos forasteiros.

No austero e venerando salão onde se reuniu o escol bananaverdense, restou apenas o ínclito Dr. Mesóclise, a esfregar as suas delicadas, longas e honradas mãos, como se lhe estivessem a borbulhar milhões de pensamentos, cada qual mais inspirador, sobre o novo porvir de sua querida estância. 

Com tantas forças reunidas, expulsar os adventícios foi um encargo relativamente fácil.

Restaram, na sóbria sociedade bananaverdense, alguns focos de resistência à nova velha ordem que se instaurava, mas eram desorganizados, e, pior, periféricos que eram, por mais alta a sua algaravia, ninguém os escutava.

Passado o tempo, os homens de bem supuseram ter reposto o que de direito em seus lugares arcaicos.

Para eles, tudo corria como sempre deveria ter sido na Banana Verde de seus sonhos. 

Até que...

Um dia,  o carro do juiz quebrou em plena estrada para a vizinha e aprazível Campo dos Abacaxis; o prédio da Delegacia de Polícia pegou fogo; o promotor torceu o pé direito ao subir a escadaria (oito degraus apenas) do Fórum; as vacas do velho Juca Belo pararam de dar leite; pelo menos dez pessoas passaram mal depois de se deliciarem com amostras de petiscos no Supermercado Boa Compra; o presidente da Câmara dos Vereadores foi flagrado em relações íntimas com a secretária da Casa Legislativa; e a manchete do Letras da Comarca saiu com um terrível "Nosocômio local sofrerá amputação" - o redator jura que no texto que mandou para a oficina estava escrito "ampliação".

Já o Dr. Mesóclise sofreu a maior de suas desventuras.

Foi num discurso de inauguração daquela que considerava uma das mais marcantes e grandiosas obras da nova/velha gestão bananaverdense, um sólido e amplo banco para três lugares, todo de cimento, na Praça Imperial, centro pulsante da urbe.

Num lapso, devido talvez ao estresse provocado pelas suas mais recentes funções, quiçá pelo seu esforço cotidiano em prol da recuperação social, econômica, e, principalmente, ética e moral, de seu querido torrão natal, o Dr. Mesóclise desafinou em sua alocução e relegou à mediocridade o pronome usado no elegante verbo "sentar", que usava em referência ao objeto a ser inaugurado - em vez de "sentar-me-ei", muito mais adequado ao seu extenso conhecimento, soltou um singelo, prosaico e ordinário, "me sentarei".

Depois dessa tragédia, o Dr. Mesóclise nunca mais foi o mesmo, danou-se a tartamudear repetidamente, como se as palavras, antes tão próximas, fossem agora suas inimigas.

Também Banana Verde, que parecia ter recuperado, depois da aventura dos forâneos, todo o seu resplender de outrora, rendeu-se à irrelevância de tantos outros povoamentos esquecidos deste planeta Terra.

Estudiosos de centros avançados ainda se debruçam nesse estranho episódio, tentando entender por que se deu o colapso de tão sofisticado projeto redentor.

Castigo divino, coincidências de infortúnios?

As hipóteses são várias, mas a mais tentadora é a que diz que Banana Verde sucumbiu à sua própria ambição, ou a de seus mais ilustres cidadãos - de materializar aquilo que eles possuem em seu íntimo, o que, no caso, era, para surpresa de muitos, tão somente a mais profunda ignorância, um gigantesco vazio - o nada, enfim. (Carlos Motta)



A modinha das diretas já

June 1, 2017 10:29, par segundo clichê


O jornalista Mario Rocha, num texto curto e preciso, publicado no Facebook, alerta para a disseminação de uma nova moda, adotada por parte da sociedade brasileira, de apoiar o movimento pelas eleições diretas.

Esse tipo de manifestação, endossada por pessoas que pouco fizeram contra ou até mesmo apoiaram o golpe que tirou Dilma Rousseff, eleita com 54 milhões de votos, da Presidência da República, vem crescendo e está até mesmo influenciando a organização de atos de repúdio ao governo ilegítimo e pela realização das diretas, como o marcado para este domingo, em São Paulo - os organizadores não querem a participação de partidos políticos, sindicatos e organizações de classe.

É uma atitude que não reforça, mas apenas divide os esforços, gigantescos, de devolver a democracia ao país. 

O texto do jornalista resume a situação:


A modinha agora é criticar o Temer, defender a democracia, apoiar as diretas já. 

A modinha invade colunas de jornais e posts nas redes sociais escritos pelos moderninhos que se calaram diante do golpe que depôs a Dilma, que se ausentaram das discussões acerca das políticas de inclusão dos governos Lula/Dilma, que se omitiram frente aos abusos de autoridade do Moro, que não se importaram com o desmanche da Petrobras e as demissões nas indústrias do petróleo, da construção civil, do setor naval, que namoraram o neoliberalismo tucano. 

A modinha agora é querer ficar de bem com quem esqueceu o que vocês fizeram - ou deixaram de fazer - no verão passado. 

Essa pseudo intelligentsia pequeno burguesa me causa engulhos.

Os comentários de seus amigos/leitores, endossam o que ele escreveu:

- 14 milhões de desempregados e muitos milhares de pequenos negócios fechados é o saldo dessa modinha.

- Concordo!!! 

- Nossa, que raiva que eu tenho dessa gente moderna, sério. Ainda mais porque alguns ainda se atrevem a se qualificar como de esquerda sem nunca na vida terem usado as palavras "trabalhador" e "patrão". Não consigo expressar a minha raiva.

- Governo americano com times de advogados dentro da Petrobrás e da JBS é o saldo real dessa zorra. O resto é detalhe. O objetivo principal foi atingido. Em tudo e por tudo, o Brasil 2017 repete o Brasil do século XIX quando Delmiro Gouveia foi assassina...

- E voltaram com o mantra tosco de 2013: "sem partido" para entregar o movimento de bandeja para a direita!

- Não esquecemos e nunca esqueceremos do que eles fizeram......e enquanto eles insistem em chamar de impeachment....nós vamos escrever na história que o Brasil sofreu o seu mais duro golpe ...até 2016

- Estou puto com tudo isso. De saco estourado. E agora a volta desse discurso de "sem partido" em uma ação com objetivo claro de banir partidos, sindicatos e movimentos sociais de eventos "moderninhos" que agora descobrem a democracia. Quero que essa gen...

- Nunca será esquecido o que fizeram no verão passado... gerações sem futuro vão cobrar.



Para o Copom, a economia vai bem. E vai mal

May 31, 2017 23:11, par segundo clichê

A ata do Comitê de Política Monetária do Banco Central, que decidiu, na reunião desta quarta-feira, 31 de maio, reduzir a taxa Selic para 10,25% ao ano, reflete bem o que é este governo golpista, sem rumo, perdido, um fim de feira completo.

A explicação para a queda dos juros é um primor de banalidades e contradições.

"O conjunto dos indicadores de atividade econômica divulgados desde a última reunião do Copom permanece compatível com estabilização da economia brasileira no curto prazo e recuperação gradual ao longo do ano" - assim começa o texto. 

Até aí, tudo bem. 

O problema é que em seguida, os membros do Copom dizem outra coisa: "A manutenção, por tempo prolongado, de níveis de incerteza elevados sobre a evolução do processo de reformas e ajustes na economia pode ter impacto negativo sobre a atividade econômica."


E desandam a falar, logo depois, do cenário externo, "favorável", do comportamento da inflação, igualmente "favorável", e das previsões otimistas para as taxas de juros e câmbio.

Até que, parece, levam um banho de realidade nos parágrafos seguintes:

"Ressalta-se que, neste momento, as projeções condicionais do Copom envolvem maior grau de incerteza.

"O Comitê entende como fator de risco principal o aumento de incerteza sobre a velocidade do processo de reformas e ajustes na economia. Isso se dá tanto pela maior probabilidade de cenários que dificultem esse processo, quanto pela dificuldade de avaliação dos efeitos desses cenários sobre os determinantes da inflação."

Até que todo o otimismo anterior se transmuta em um "sei lá o que vai acontecer daqui para a frente":

"O Copom ressalta que a extensão do ciclo de flexibilização monetária dependerá, dentre outros fatores, das estimativas da taxa de juros estrutural da economia brasileira. O Comitê entende que o aumento recente da incerteza associada à evolução do processo de reformas e ajustes necessários na economia brasileira dificulta a queda mais célere das estimativas da taxa de juros estrutural e as torna mais incertas. Essas estimativas continuarão a ser reavaliadas pelo Comitê ao longo do tempo."

Para depois, provavelmente por causa da constatação de que estão completamente perdidos em relação ao cenário político-econômico do país, os doutos membros do Comitê decidem seguir os conselhos da vovó e tomar uma boa dose caldo de galinha, ou de cautela, que não faz mal a ninguém:

"Em função do cenário básico e do atual balanço de riscos, o Copom entende que uma redução moderada do ritmo de flexibilização monetária em relação ao ritmo adotado hoje deve se mostrar adequada em sua próxima reunião. Naturalmente, o ritmo de flexibilização continuará dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos, de possíveis reavaliações da estimativa da extensão do ciclo e das projeções e expectativas de inflação."

E assim, nas mãos de tão competentes timoneiros, o transatlântico Brasil navega celeremente em mares tão desconhecidos quanto agitados. (Carlos Motta)



Arte é política, palco é palanque

May 31, 2017 17:19, par segundo clichê


Os artistas que vão participar do ato pró-diretas deste domingo, 4 de junho, na capital paulista, informam os jornalões, não querem a participação de representantes de partidos políticos e movimentos sociais na manifestação.

Alegam que dessa forma o movimento pode ganhar mais adesão popular, incorporando gente que acha o vermelho a cor do diabo.

No domingo passado, balões e bandeiras da CUT e PT foram vetados no ato que reuniu mais de 100 mil pessoas em Copacabana. 

Interessante essa posição dos artistas.


Inaugura uma nova forma de fazer arte, pois afinal toda arte, mesmo aquela que diga que não, carrega em si uma atitude política.

O  famosíssimo verso "uma rosa é uma rosa é uma rosa" parece, à primeira vista, a negação dessa afirmação. 

Mas ao dizer, com tanta ênfase, que uma rosa é apenas uma rosa, Gertrude Stein, a autora do verso, não estaria fazendo política, no sentido de delimitar o papel da poesia na sociedade, no caso reduzindo a definição da flor à botânica, sem levar em conta a sua associação à beleza, perfumes, alegria, ou coisa que o valha?

O termo política, como se sabe, nasceu na Grécia antiga, e foi adquirindo, ao longo dos séculos, inúmeros significados.

Hoje há política para tudo e em tudo, embora muita gente ache que ela seja tão somente a máscara que homens corruptos usam para exercer suas atividades criminosas, e ela esteja restrita aos ambientes muitas vezes insalubres de partidos, parlamentos e gabinetes atapetados e refrigerados.

O ato pró-diretas deste domingo é eminentemente político, conte ou não com artistas, queiram ou não os artistas.

Proibir quem rotineiramente faz da política uma atividade de transformação da sociedade, seja por meio de um partido, sindicato, organização de classe ou da sociedade civil, não é só uma demonstração de falta de conhecimentos históricos ou sociológicos.

É também ignorância do próprio papel do artista.

O palco, por mais mambembe que seja, é antes de mais nada, uma tribuna, que aceita qualquer tipo de manifestação, desde as mais piegas e reacionárias até as mais libertárias e vanguardistas.

Mas todas, sem exceção, políticas. (Carlos Motta)



Reformar não é deformar

May 31, 2017 9:55, par segundo clichê


Clemente Ganz Lúcio

As reformas normalmente são feitas para melhorar alguma coisa. Agora, como promover reformas que incidam sobre as relações sociais? Nesse caso, trata-se de alterar as regras e instituições do jogo social, movido por interesses diversos e, muitas vezes, divergentes. Por isso, frequentemente, o que, para uns, reforma, para outros, deforma.

O projeto de reforma trabalhista, elaborado pela Câmara dos Deputados e em trâmite no Senado, promove uma mudança regressiva para reduzir estruturalmente o custo do trabalho, eliminar passivos trabalhistas e legalizar a precarização.


Muito diferente desse projeto, uma reforma trabalhista deve estar conectada com um projeto de desenvolvimento nacional, visando dar fluidez às relações de trabalho, para torna-las eficazes na promoção de uma produção econômica que agregue valor, gere lucros e aumento dos salários, promova investimentos e crie empregos de qualidade, estruture e estimule um Estado forte, promova e proteja os diretos trabalhistas.

O desenho de uma reforma com esse objetivo começa com as mudanças no sistema de relações de trabalho, ou seja, nas instituições que regem os processos negociais. A negociação coletiva precisa ser o principal meio pelo qual se processa a construção das regras das relações de trabalho, complementando, de maneira harmônica, os marcos legais. Os sindicatos devem ser os sujeitos coletivos de representação de interesse, capazes de firmar compromissos, acordos e convenções.

As mudanças devem definir regras para valorizar e fortalecer as negociações coletivas, indicando como funcionará o sistema sindical de representação, induzindo a alta representatividade dos sindicatos desde o chão da empresa e em toda a estrutura vertical, habilitando-os para conduzir processos negociais em todos os níveis (empresa, categoria, setor, nacional).

Sindicatos representativos devem ter os instrumentos adequados para conduzir a tarefa de negociar em condições de equilíbrio de forças. Acesso à informação, fortalecimento da confiança no cumprimento do acordo, incentivo ao diálogo, mecanismos de solução voluntária e ágil de conflitos, entre outras, são algumas das diretrizes para criar regras que incentivem a negociação. A abrangência dos efeitos dos acordos é uma escolha fundamental, que repercutirá sobre a organização e o financiamento sindical.

São justamente as características e qualidades do novo sistema de relações de trabalho (tipo de organização e representação sindical e de normatização dos processos de negociação) que permitirão definir o conteúdo e escopo do objeto da negociação, sistema este assentado no princípio de ampla participação dos trabalhadores, na responsabilidade compartilhada por decisões democráticas e na proibição de práticas antissindicais.

Tão importante quanto o desenho final de todo o sistema de relações laborais é a definição da estratégia de transição do velho para o novo. Uma transição que valorize e incentive a mudança voluntária assumida pelas partes é fundamental para o sucesso do novo modelo. Uma transição, por exemplo, que reconheça as desigualdades existentes entre as empresas (micros, pequenas, médias e grandes) e a ausência de proteção de parcela expressiva dos trabalhadores, deve gerar mudanças que ampliem a proteção laboral e o desenvolvimento econômico das empresas, com definição de metas e repartição de resultados.

Uma reforma deve buscar construir uma nova cultura política nas relações laborais, por isso deve ser produzida em espaço de diálogo social e de ampla negociação, com o envolvimento de todos os agentes econômicos e políticos. Essa construção deve gerar compromissos fortes com o novo modelo e ser capaz de conduzir a transição e criar confiança para enfrentar incertezas geradas pela mudança.

Efetivamente, esses elementos estão todos fora do projeto de reforma trabalhista elaborado pela Câmara. Ao contrário, o processo de mudança cria derrotados, o que acirrará os conflitos, aumentará a desconfiança, fragilizará compromissos e trará mais insegurança. Trata-se de um projeto de quem gostaria que a senzala ainda existisse.

(Clemente Ganz Lúcio é sociólogo e diretor-técnico do Dieese)



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