Em defesa da greve geral
March 16, 2017 10:05Luis Vitagliano
Com todas as tecnologias de informação, os trabalhadores estavam bem informados sobre os motivos da paralisação e certamente a absoluta maioria concordava com eles: contra a reforma da Previdência - que determina 49 anos de contribuição e idade mínima de 65 anos para aposentadoria -, a reforma trabalhista e a proposta de retorno da terceirização como método de contratação.
Em São Paulo, onde a greve teve sua maior adesão, o caos que se esperava nas portas dos terminais de transporte não ocorreu. Parte importante da população aderiu à paralisação e conseguiu justificar a dificuldade de chegar ao trabalho.
Sobre isso, dois motivos se destacam nesse primeiro grande ato contra as reformas que confrontam os direitos trabalhistas: primeiro, o governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin acionou sua assessoria jurídica para entrar com uma liminar contra a greve e conseguiu na Justiça determinar a ilegalidade da paralisação do sistema de transporte; segundo, a grande imprensa entrevistou muitos trabalhadores, expondo aqueles que reivindicavam o direito de ir ao trabalho.
Sobre isso, chama a atenção como o capital (principal atingido pela paralisação) trabalha com seus tentáculos no Estado e na sociedade civil para inviabilizar o direito de manifestação dos trabalhadores e trabalhadoras, além de cercear a liberdade de manifestação.
Em primeiro lugar, ao entrar com um pedido de liminar para punir os sindicatos dos transportes, o governador Geraldo Alckmin mostra a quem serve: quer garantir a chegada dos trabalhadores e ter um discurso para condenar a greve com o intuito de obrigá-los a furar a paralisação. Em segundo lugar, temos a Justiça, que condenou os sindicatos à multa caso não garantissem os serviços de transporte. Mas, ao conceder uma liminar ao governo e multar diariamente os sindicatos pelas paralisações, a Justiça não reconhece o direito do trabalhador de protestar.
Além da defesa de aparelhos do Estado, o capital ainda conta com a defesa da grande mídia para combater a organização do trabalhador. Portanto, a cobertura midiática (principalmente televisiva) destacava, além da proibição judicial, os contratempos causados pela greve. Na tevê, as entrevistas com a população mostravam quem não conseguiam chegar ao trabalho, criando uma narrativa segundo a qual o direito a trabalhar estava sendo bloqueado pelos sindicatos. Ou seja, invertia completamente a pauta ao dizer que os sindicatos estavam prejudicando o trabalhador. E esse é o grande risco, porque tenta colocar a maioria da população contra aqueles que se propõem a defender seus direitos.
São os trabalhadores os mais prejudicados pela greve? Mesmo aqueles que querem, ao serem impedidos de se deslocarem, têm seus direitos cerceados? É preciso ter pelo menos dois argumentos na ponta da língua para responder a essas provocações. Primeiro, que ao fechar os transportes, bloquear as entradas e parar as estradas, os sindicatos permitem que os trabalhadores justifiquem sua ausência individual e seus atrasos. Muitos são trabalhadores de pequenas empresas e os chefes não perdoariam a ausência. Esses trabalhadores seriam punidos se por conta própria resolvessem encarar o enfrentamento direto ao patrão e, ao encontrarem respaldo no sistema de transportes, pode amenizar seu ato de enfrentamento. Mas o risco é que alguns desses trabalhadores achem mesmo que devem chegar ao trabalho de qualquer maneira, e existem casos em que até mesmo táxi o trabalhador procura para chegar ao trabalho, às vezes custando mais cara a corrida que o dia de trabalho. Mesmo nesses casos de sacrifício, é importante perceber que essa paralisação é fundamental por um segundo motivo: nenhum prejuízo imediato se equivale ao prejuízo futuro se as reformas da Previdência e trabalhista avançarem no Congresso.
Os sindicatos estão na defesa direta dos direitos dos trabalhadores. Lutar contra essas reformas é fundamental e cabe a essas organizações assumirem esse papel de defesa dos direitos. É um fato quase que inexorável para este momento. De outro lado, quando a agenda capital supõe que o principal problema fiscal do Brasil seja a Previdência Social, isso só se justifica com um marketing da pós-verdade: mesmo nos cálculos mais conservadores (e questionáveis), onde se consegue uma contabilidade criativa que identifica déficit na Previdência, esses déficits criados pelos economistas neoclássicos equivalem à metade dos custos da rolagem da dívida. Ou seja: o governo gasta o dobro com rentismo dos grandes bancos e do grande capital em relação ao serviço social da Previdência pública. Enquanto metade da população brasileira tem uma aposentadoria próxima ao salario mínimo, um rentista, sem trabalhar, tem 14,5% crescimento do seu capital ao ano, sem custos. Para a grande mídia, o rentismo, que favorece 0,5% da população rica e gasta 8% do PIB, não é um problema, mas 4% do PIB para 30% da população é digno de uma reforma que, se aprovada, deve comprometer o direito a aposentadoria.
Se neste caso alguém me explicar porque o Brasil tem um dos maiores juros do mundo, talvez eu consiga entender por que os problemas fiscais poderiam ser polêmicos. Até lá, é muito simples: são gastos para o serviço da dívida 8% do orçamento público para manter esse absurdo, o que é escondido pelos ricos. Para isso é preciso convencer a população de que o trabalhador é culpado por viver muito e contribuir pouco. Enquanto uns vivem sem trabalhar, outros trabalham para viver e agora devem pagar pelo tempo de vida extra conquistado.
(Luis Vitagliano é professor universitário e cientista político; foto: Paulo Pinto/AGPT)
O Brasil de ponta-cabeça
March 15, 2017 9:40Quando um político como Paulo Maluf diz, com todo o cinismo que acumulou em décadas de vida pública, que não está na lista de Janot nem no mensalão, aquilo que era uma suposição se transforma numa certeza: o Brasil está de ponta-cabeça.
A folha corrida de Maluf é notória - e ele, de tanto óleo de peroba que já usou, nem se preocupa mais em escondê-la.
Mas seu passado pouco importa: Maluf, como proclamou em alto e bom som, não foi delatado, e assim, conseguiu um valioso atestado de bons antecedentes.
Certo que vários outros Malufs que frequentam as casas legislativas Brasil afora também não foram alvo dessa horda de alcaguetes que, de um momento para outro, invadiu os fóruns, as delegacias de polícia e o noticiário dos jornalões.
Hoje, no Brasil, ser dedo-duro é o máximo.
O X-9 virou sinônimo de gente boa, pois afinal, ele, que errou, que pecou, que roubou, não só se arrependeu de seus crimes, mas ajuda a polícia a ir atrás de tipos como ele.
E graças a esse bando de caguetas, as autoridades, os doutores, os meritíssimos, estão livrando o Brasil da praga da corrupção.
Lugar de bandido é na cadeia.
O destino de Maluf e seus semelhantes, porém, é outro, já que eles estão livres e felizes, como homens de bem que são.
A hipocrisia descobriu um porto seguro e um solo fértil neste Brasil de ponta-cabeça. (Carlos Motta)
A esquerda vitrine ataca de novo
March 14, 2017 16:44O PSol, partido criado por dissidentes do PT, informa Chico Alencar, um dos seus seis deputados federais, não vai apoiar Lula à Presidência da República - isso se lhe for permitido concorrer ao cargo em 2018.
Como se sabe, a candidata do PSol na eleição passada foi a gaúcha Luciana Genro, ex-deputada pelo PT e filha do ex-governador e ex-ministro da Justiça Tarso Genro.
Alencar indicou que seu partido terá candidato próprio para a presidência.
Luciana é nome forte, mas o deputado não deu nenhum sinal de que ela concorrerá ao cargo.
Seja quem for, porém, o candidato do PSol, ele servirá apenas para fortalecer a direita, os golpistas, enfim.
O PSol, por mais barulho que façam seus parlamentares, é um micropartido, e nunca passará disso.
Faz parte da "esquerda vitrine", inconsequente, sem norte, sem nenhum trabalho orgânico nos movimentos sociais e sindicais, com um ou outro nome palatável para a classe média e um discurso vago e cambiante, e dependente da exposição midiática.
Luciana Genro, por exemplo, já deu manifestações públicas de apoio aos fascistas ucranianos.
Chico Alencar compareceu, dias atrás, a um regabofe patrocinado por um dos jornalistas mais antiesquerdas do país, estrela global, e onde alegremente confraternizou com o senador Aécio Neves, golpista de primeira hora.
Parece que todos esses próceres psolistas ainda não digeriram as diferenças que os afastaram do PT no passado e pautam a sua atividade política pelo ódio ao seu ex-partido.
O Brasil passa por um dos mais difíceis momentos de sua história, e o risco de que todas as conquistas sociais dos trabalhadores sejam varridas para a lata de lixo é enorme.
Numa hora dessas, tudo o que os golpistas querem é ver os progressistas divididos.
Lula pode não ser o melhor nome para unir a centro-esquerda brasileira.
Mas qualquer liderança política e social de alguma seriedade não pode pensar em outra coisa a não ser a união das forças democráticas como a principal, e talvez a única, arma para que o Brasil retome o caminho da democracia.
Há uma frase atribuída a Ulysses Guimarães que cabe perfeitamente a essa situação esdrúxula propagandeada pelo deputado Chico Alencar: “Não se pode fazer política com o fígado, conservando o rancor e ressentimentos na geladeira. A pátria não é capanga de idiossincrasias pessoais." (Carlos Motta)
O retrocesso da reforma trabalhista
March 14, 2017 16:43Neuriberg Dias
O PL 6.787/16, que pretende fazer a reforma trabalhista, tem como lógica facilitar a contratação de trabalhadores e reduzir o custo do trabalho sendo uma das principais reivindicações encabeçadas pelo setor empresarial para melhoria do ambiente de negócios.
O governo, ao enviar a proposta colocou paralelamente no projeto dispositivos sobre o representante em local de trabalho, estabelece o negociado acima da lei, dentre outros dispositivos, que provocam mudança profundas no meio sindical e jurídico, desviando as atenções dos pontos essenciais da reforma trabalhista que é flexibilizar os direitos do contrato de trabalho.
Como alternativa em relação às formas atuais de contratação, em especial, ao contrato de trabalho por tempo indeterminado, que garante ao trabalhador todos os direitos previstos na CLT, a proposta amplia o contrato de trabalho temporário e o parcial, inclusive podendo ser incluído pelo relator no seu parecer o contrato de trabalho intermitente, dentre outras formas de contrato, advindos da economia digital ou uberizacão do trabalho.
Sobre o trabalho temporário, a proposta aumenta o prazo de 90 para 120 dias, permitindo a prorrogação por igual período. Prevê ainda que o trabalho temporário vai atender acréscimo extraordinário de serviço decorrente de sazonalidade na produção, situação que existe em empresas de todas as atividades da economia.
Os trabalhadores poderão ser contratados por até oito meses sem direitos trabalhistas como seguro-desemprego, estabilidade para gestantes e verbas rescisórias como o aviso prévio e os 40% de multa do FGTS.
Se a nova regra de contratos temporários for aprovada, os empresários não terão mais a obrigação de registrar os trabalhadores e, assim, garantir todos seus direitos.
Considera, ainda, o trabalho de tempo parcial, os contratos com 30 horas semanais (e não mais 25 horas como foi definido a partir de 2001), sem a possibilidade de realizar horas extras, ou então os contratos de 26 horas, mas com possibilidades de realização de 6 horas extras semanais.
Desse modo, será possível a substituição de um trabalhador por tempo indeterminado por dois trabalhadores, com direitos proporcionais, sem o aumento de custo para o empregador. A garantia da percepção de um salário mínimo e a modificação do contrato de trabalho dos empregados também serão permitidas. Atualmente, a legislação garante os direitos mínimos para os trabalhadores.
E o contrato de trabalho intermitente é aquele em que a prestação de serviços será descontínua, podendo compreender períodos determinados em dia ou hora, e alternar prestação de serviços e folgas, independentemente do tipo de atividade do empregado ou do empregador.
O trabalhador intermitente não poderá receber, pelo período trabalhado, tratamento econômico e normativo menos favorável do que aquele dispensado aos demais empregados no exercício da mesma função, ressalvada a proporcionalidade temporal do trabalho.
Para esse trabalhador é devido o pagamento de salário e remuneração pelas horas efetivamente trabalhadas, excluído o tempo de inatividade.
O fenômeno da uberizacão do trabalho advindo da economia digital, é nada mais que a pejotização do trabalho, fazendo com que o trabalhador individualmente assuma todos os riscos e ônus da relação de trabalho, e sendo remunerado apenas pelo serviço quando realizado.
Caso seja aprovada a reforma com ampliação do trabalho temporário, parcial e a inclusão do intermitente ou pejotização do trabalho, as relações de trabalho e de organização sindical, serão profundamente afetadas, sob a lógica da redução do custo e facilidade de contratação.
Efeito disso será a existência de trabalhadores desempregados, que poderão voltar ao mercado de trabalho contratados em bases mínimas/proporcionais de direitos. E aqueles que atualmente são empregados formais, serão os próximos atingidos, sendo submetidos a esses novos modelos de trabalho.
A reforma trabalhista associada à reforma da Previdência implicará, em curto espaço de tempo, a perpetuação de um mercado de trabalho sem legislação protetiva, o que corresponderá a um avanço significativo de doenças ocupacionais, reflexo de uma exploração exagerada do trabalho.
Os trabalhadores e as entidades sindicais, em especial, as centrais, devem ter clareza sobre estes pontos, sob o risco de, sem mexer em uma vírgula na Constituição e na CLT, a classe trabalhadora poderá sofrer uma das maiores retiradas de direito, com retrocessos sociais inomináveis.
(Neuriberg Dias é analista político e assessor legislativo do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar - Diap)
A esquerda de vitrine ataca de novo
March 14, 2017 10:55O PSol, partido criado por dissidentes do PT, informa Chico Alencar, um dos seus seis deputados federais, não vai apoiar Lula à Presidência da República - isso se lhe for permitido concorrer ao cargo em 2018.
Como se sabe, a candidata do PSol na eleição passada foi a gaúcha Luciana Genro, ex-deputada pelo PT e filha do ex-governador e ex-ministro da Justiça Tarso Genro.
Alencar indicou que seu partido terá candidato próprio para a presidência.
Luciana é nome forte, mas o deputado não deu nenhum sinal de que ela concorrerá ao cargo.
Seja quem for, porém, o candidato do PSol, ele servirá apenas para fortalecer a direita, os golpistas, enfim.
O PSol, por mais barulho que façam seus parlamentares, é um micropartido, e nunca passará disso.
Faz parte da "esquerda vitrine", inconsequente, sem norte, sem nenhum trabalho orgânico nos movimentos sociais e sindicais, com um ou outro nome palatável para a classe média e um discurso vago e cambiante, e dependente da exposição midiática.
Luciana Genro, por exemplo, já deu manifestações públicas de apoio aos fascistas ucranianos.
Chico Alencar compareceu, dias atrás, a um regabofe patrocinado por um dos jornalistas mais antiesquerdas do país, estrela global, e onde alegremente confraternizou com o senador Aécio Neves, golpista de primeira hora.
Parece que todos esses próceres psolistas ainda não digeriram as diferenças que os afastaram do PT no passado e pautam a sua atividade política pelo ódio ao seu ex-partido.
O Brasil passa por um dos mais difíceis momentos de sua história, e o risco de que todas as conquistas sociais dos trabalhadores sejam varridas para a lata de lixo é enorme.
Numa hora dessas, tudo o que os golpistas querem é ver os progressistas divididos.
Lula pode não ser o melhor nome para unir a centro-esquerda brasileira.
Mas qualquer liderança política e social de alguma seriedade não pode pensar em outra coisa a não ser a união das forças democráticas como a principal, e talvez a única, arma para que o Brasil retome o caminho da democracia.
Há uma frase atribuída a Ulysses Guimarães que cabe perfeitamente a essa situação esdrúxula propagandeada pelo deputado Chico Alencar: “Não se pode fazer política com o fígado, conservando o rancor e ressentimentos na geladeira. A pátria não é capanga de idiossincrasias pessoais." (Carlos Motta)