As histórias do Condomínio Feliz Cidade
5 de Março de 2017, 9:44Dias atrás coloquei na rede um blog chamado "Condomínio Feliz Cidade", na realidade uma pequena novela com 20 capítulos, ou minicontos, nos quais o narrador, por coincidência também chamado Carlos, conta alguns aspectos de sua vida num desses edifícios tão comuns nas grandes, médias e até minúsculas cidades - Serra Negra, onde vivo, tem 27 mil habitantes e dezenas de edifícios.
Sempre gostei de ler, assistir e ouvir histórias, e de uns anos para cá passei a contá-las, em contos curtos, 50 deles reunidos num e-book que lancei, "O Riso Frouxo do Homem Insignificante" ( download aqui ), e num outro blog, Contos do Motta.
O "Condomínio" é minha primeira tentativa de escrever algo mais longo, mas não tão longo que possa entediar o leitor.
Os capítulos, ou historietas, podem ainda ser interpretados como fragmentos de um diário escrito pelo narrador.
São simples, como os textos que gosto de ler.
Até ingênuos, nestes tristes dias em que perversidades são praticadas impune e institucionalmente.
Mas foram escritos com alegria e um sentimento misto de fé e esperança no ser humano.
O silêncio vale ouro
Recebi a notícia do Zé, porteiro da manhã, logo que ia saindo para trabalhar - deixo meu carro estacionado na rua mesmo e alugo a vaga da garagem, pois assim reforço o orçamento, o Uno ninguém vai querer roubar de tão velho que é:- Dona Marta quer falar com o senhor.
Antes que perguntem, eu respondo: Dona Marta é a síndica do prédio. Viúva, mandona, mas nunca me incomodou. O que será que ela quer? Olhei para o relógio e vi que dava tempo para uma conversa:
- Liga pra ela, Zé.
O Zé é meio esquisito, calado, mal dá bom dia para os moradores, mas é de confiança. Dizem que tem uma filha doente que cria sozinho - a mulher largou dele já faz uns dez anos. Isso, porém, é outra história.
- Dona Marta, tudo bem? Estou à sua disposição.
E ela me conta que havia recebido uma queixa - não disse de quem - sobre eu ter feito barulho, sei lá, como se estivesse martelando alguma coisa, no domingo - claro que o condomínio não permite isso. Achei estranho. A única coisa diferente que fiz no domingo foi pensar seriamente em arranjar outro emprego. Será que pensei alto demais?
Para não encompridar a conversa, pedi desculpas, falei que estava mesmo pregando um quadro da Norinha na parede (a Norinha é a minha filha, tenho um casal, o menino a gente chama de Beto), quase me convenci da mentira, dona Marta até que foi gentil, me passou um sermão leve e me desejou bom dia.
No caminho para o trabalho lembrei que o tal barulho bem que poderia ter sido obra do Beto - ele é o tipo de garoto capaz de surpreender a gente.
Mas confesso que não escutei nada.
Nem o Beto seria capaz de ferir a modorra de um domingo.
O candidato do Brasil moderno
4 de Março de 2017, 10:41Como diria o ilustre jornalista Mino Carta, é conhecimento até do mundo mineral que a única liderança política capaz de recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento, no caminho do Primeiro Mundo e da justiça social, é o ex-presidente Lula, esse mesmo que vem sendo incansavelmente perseguido pela mais reacionária e criminosa organização do país, o conglomerado Judiciário-Ministério Público.
Lula não é apenas o elemento aglutinador das esquerdas, ou como queiram, de toda a parcela progressista da sociedade brasileira. É também o único líder capaz de dialogar com todos os outros setores na busca de um grande entendimento que propicie a salvação da democracia e a retomada do crescimento econômico.
"O Brasil precisa de Lula", diz a "Carta das brasileiras e dos brasileiros", que dá título a um abaixo-assinado que circula na internet, pedindo a Lula que ele "considera a possibilidade de, desde já, lançar a sua candidatura à Presidência da República".
Lula candidato pode não evitar a sua condenação em um dos vários processos abertos contra ele pelo conglomerado Judiciário-MP, na tentativa de excluí-lo da disputa em 2018.
Mas se isso ocorrer, se ele começar a percorrer o país e falar às massas já como candidato, a sua posição, e a de todos os que almejam a volta da democracia, será substancialmente reforçada.
O link para o abaixo assinado é: http://www.peticaopublica.com.br/pview.aspx?pi=BR97926
A íntegra da "Carta das brasileiras e dos brasileiros" é a seguinte:
Por que Lula?
É o compromisso com o Estado Democrático de Direito, com a defesa da soberania brasileira e de todos os direitos já conquistados pelo povo desse País, que nos faz, através desse documento, solicitar ao ex-Presidente Luiz Inácio LULA da Silva que considere a possibilidade de, desde já, lançar a sua candidatura à Presidência da República no próximo ano, como forma de garantir ao povo brasileiro a dignidade, o orgulho e a autonomia que perderam.
Foi um trabalhador, filho da pobreza nordestina, que assumiu, alguns anos atrás, a Presidência da República e deu significado substantivo e autêntico à democracia brasileira. Descobrimos, então, que não há democracia na fome, na ausência de participação política efetiva, sem educação e saúde de qualidade, sem habitação digna, enfim, sem inclusão social. Aprendemos que não é democrática a sociedade que separa seus cidadãos em diferentes categorias.
Por que Lula? Porque ainda é preciso incluir muita gente e reincluir aqueles que foram banidos outra vez; porque é fundamental para o futuro do Brasil assegurar a soberania sobre o pré-sal, suas terras, sua água, suas riquezas; porque o País deve voltar a ter um papel ativo no cenário internacional; porque é importante distribuir com todos os brasileiros aquilo que os brasileiros produzem. O Brasil precisa de Lula!
(A foto de Lula é de Ricardo Stuckert)
Golpe já extinguiu 3 milhões de empregos formais
3 de Março de 2017, 19:30Novos números oficiais da tragédia que se abateu no Brasil com o golpe de Estado que trocou o governo de Dilma Rousseff por um bando de cleptocratas foram divulgados hoje. E são assustadores: segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, foram fechados mais 40.864 postos formais de trabalho em janeiro. O número leva em conta a diferença entre admissões e demissões.
A última vez em que o Caged registrou saldo positivo foi em março de 2015, quando 19,2 mil vagas haviam sido criadas. Nos 12 meses encerrados em janeiro, o país acumula o fechamento de 1,28 milhão de postos formais de trabalho. Em 2016, o país extinguiu 1,32 milhão de vagas com carteira assinada, e em 2015, 1,54 milhão.
Na divisão por setores da economia, o comércio foi o que mais demitiu em janeiro, com 60.075 vagas encerradas. Na sequência, os setores de serviços, com 9.525 postos extintos, e a construção civil, com 775 empregos a menos. A indústria extrativa mineral fechou 59 vagas em janeiro.
Na comparação por regiões, o Nordeste liderou as demissões, com extinção de 40.803 postos de trabalho em janeiro. Em seguida, vêm as regiões Sudeste (-30.388 vagas) e Norte (-6.835).
Os astros não mentem, Dr. Mesóclise
3 de Março de 2017, 18:09Séculos atrás dirigi a minúscula redação de um semanário de Campinas, o Jornal de Domingo, que tinha uma grande tiragem por ser distribuído gratuitamente.
Era um jornal de amenidades, com uma ou outra matéria mais "séria".
Pouco antes de começar a trabalhar tive uma reunião com o dono para acertarmos os ponteiros.
E, logo de cara, ele foi me dizendo da importância que a seção de horóscopo tinha - vários leitores haviam escrito reclamando de sua falta, já que a pessoa que a escrevia tinha saído do jornal.
Para resolver o problema, me comprometi a produzir eu mesmo os tais horóscopos, aliviado em saber que meu antecessor simplesmente consultava outras publicações para fazer as "previsões" que tanto agradavam os leitores.
Era o que a gente chamava de "gilete press"...
E assim lá ia eu, toda segunda-feira, tão logo chegava à salinha onde funcionava a redação, criar as pérolas da semana.
No início me apoiava nos horóscopos dos outros, mas rapidamente percebi que eles não passavam de um amontoado de frases de autoajuda.
Daí em diante dispensei as revistas e jornais e me transformei no mais otimista "astrólogo" do planeta.
Ninguém, de nenhum signo, reclamava dos meus vaticínios.
Pois bem.
Tanto tempo depois dessa minha fase de astrólogo, sinto que devo, para ajudar o país neste momento tão difícil de sua história, consultar novamente os astros para saber o destino que eles reservam ao mais alto mandatário da pátria, esse nosso preclaro Dr. Mesóclise, em cujos ombros recaem a incomensurável responsabilidade de conduzir-nos rumo a um paraíso de leite e mel.
Descubro que ele nasceu sob o signo de Libra, governado pelo planeta Vênus.
Feito isso, debruço-me nas linhas de seu mapa astral e enfronho-me nos segredos mais profundos do universo na tentativa de desvendar o futuro desse insigne personagem.
E por fim, depois de horas de trabalho e meditação, os astros finalmente me respondem, de maneira categórica, indiscutível, e, surpreendentemente, sintética.
Numa única frase resumem o futuro que aguarda o protagonista desta ópera-bufa, desta tragicomédia, em que se transformou o Brasil:
"Todo o seu esforço será recompensado com um lugar especial na lata de lixo da história."
Os astros não mentem jamais.
(Carlos Motta)
A reforma trabalhista é tão ruim quanto a previdenciária
3 de Março de 2017, 15:42Marcos Verlaine
O projeto é uma demanda do mercado, que embora saiba que para gerar emprego é preciso investimentos para fazer a economia voltar a crescer para o Brasil voltar a se desenvolver, propõe restrições e retrocessos, porque, ao fim e ao cabo, quer maximizar seus lucros, sem amarras que lhe imponha regramentos e restrições para tal intento.
A proposta do governo, por demanda do mercado, é rejeitada pelo Ministério Público do Trabalho, que recomenda-lhe rejeição parcial e ajustes. Então vamos ao contencioso.
Fundado na ideia que a CLT é “velha”, não oferece “segurança jurídica” e não ajuda a “melhorar o ambiente de negócios”, os empresários, há décadas propõem a extinção da legislação trabalhista. Mas não diz que a “velha” septuagenária CLT está recauchutadinha, já foi atualizada em 85% do seu texto. Está rejuvenescida! Está atualizada!
A CLT, de fato, não dá “segurança jurídica” para fazer o querem: demitir sem custo, contratar precariamente, esgaçar a mão de obra com jornadas escorchantes, sem segurança, e outros acessórios importantes para o bem-estar do trabalhador ou trabalhadora. A segurança jurídica que quer o mercado é a insegurança jurídica dos trabalhadores. A “melhoria do ambiente de negócios” é o eufemismo utilizado para dizer que querem a desregulamentação total das relações de trabalho.
Regime parcial
Mas vamos a outros aspectos do projeto. O trabalho em regime parcial, que hoje é de 25 horas, a proposta é aumentar para 30 horas, e mais 26 de horas extras.
Ora, se o empregador, pelo projeto, poderá empregar um parcial em regime quase integral, e pagando salário de parcial, por que contratar um trabalhador em regime integral?
Trabalho temporário
O contrato de trabalho temporário dura hoje 90 dias, prorrogáveis por mais 90, e o projeto amplia para 120, prorrogáveis por mais 120. Seriam oito meses de temporariedade. A mudança, segundo o governo, se faz necessária “motivada pela alteração sazonal na demanda por produtos e serviços”. Aqui o MPT vê dois problemas. A “ocorrência da alteração sazonal faz parte do risco do negócio e admiti-la como justificativa para a contratação de trabalhador temporário é transferir o ônus do empreendimento para o trabalhador, tendo em vista que se trata de contrato de trabalho que prevê patamar de proteção inferior ao contrato por prazo indeterminado. Além disso, haverá dificuldade em se conceituar sazonalidade para a caracterização do contrato temporário, o que irá gerar insegurança jurídica”.
No que diz respeito à ampliação do prazo de 90 para 120 dias, “não se apresenta qualquer justificativa para embasar a alteração”, diz o MPT. “Contudo, em razão de ser uma espécie contratual que estabelece um rol menor de direitos aos trabalhadores, conclui-se que a extensão das possibilidades de utilização causará prejuízo aos trabalhadores”.
E completa: “Os contratos temporários, juntamente com os contratos por tempo parcial, tiveram na Europa e nos Estados Unidos enorme avanço após a crise econômica de 2008 e hoje organismos internacionais e os próprios governos nacionais reconhecem que o fenômeno se revelou socialmente nocivo, tendo produzido um aumento vertiginoso da desigualdade econômica e social.”
Inoportunidade da “reforma”
Mas há outros aspectos negativos no projeto. Não apenas no texto em si, mas também em relação ao momento em que foi apresentado. Numa conjuntura de depressão econômica e desemprego galopante, que obriga os trabalhadores a fazerem uma disputa injusta e desigual com o capital, semelhante àquela que se faz da “adaga contra o pescoço” ou aquela clássica, em que a “raposa é colocada para tomar conta do galinheiro”.
Dizer, por exemplo, como os empresários dizem, matreiramente, que a livre negociação entre patrões e empregados seria mais vantajosa que a legislação trabalhista é de uma desonestidade cretina!
Num momento como o que estamos vivendo, o trabalhador só tem desvantagens, porque as negociações são feitas sob ameaças que comprometem sua existência digna. Assim, para garantir o emprego, o trabalhador ou trabalhadora vai ter de abrir mão de direitos acessórios, porque se não abrir, perde o principal, o emprego!
Por isso, o “império da lei” é fundamental para o trabalhador, pois só a lei pode salvar o trabalhador da sanha pelo lucro incessante e a todo custo. Como diz o deputado Robinson Almeida (PT-BA), membro da comissão especial que discute o PL 6.787/16, “nos conflitos entre capital e trabalho, o Estado, por meio das leis, deve garantir empregos decentes, como proclama a Organização Internacional do Trabalho (OIT)”.
E acrescenta: “Por isso, a Constituição prevê acordo coletivo só para os casos de ampliação de direitos ou quando haja condições para soluções justas e equilibradas”, como determina o artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição de 1988.
Assim, por tudo isto e mais alguma coisa, não há como não dizer que a reforma trabalhista é tão ruim quanto a previdenciária.
(Marcos Verlaine é jornalista, analista político e assessor parlamentar do Diap