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NACIONALISMO E DESENVOLVIMENTO - ensaio sobre as relações Centro-Periferia

14 de Abril de 2014, 12:33 , por Daniel Miranda Soares - 0sem comentários ainda | No one following this article yet.
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NACIONALISMO E DESENVOLVIMENTO - ensaio sobre as relações Centro-Periferia
Estamos aqui empregando esse termo de forma geral, mais abrangente, no sentido vulgar usado nas relações entre os países; ou seja países que protegem suas indústrias de forma estratégica e planejada de tal forma a permitir o seu próprio desenvolvimento a longo prazo são nacionalistas. E países que permitem a livre entrada e saída de empresas e industrias de qualquer nacionalidade, sem qualquer regulação, são liberais em nosso prévio conceito. Isto aconteceu de forma típica no Japão durante o império Meiji, no século XIX. Se o Japão não tivesse implementado esse plano nacionalista certamente não seria um país tão desenvolvido como ele é hoje. E isso aconteceu também com os países que se industrializaram mais tarde, além do Japão, a Itália, Alemanha e demais países europeus mais desenvolvidos. Nossa tese aqui é que além dos países clássicos da Revolução Industrial (Inglaterra, França e EUA) os outros países que se industrializaram e se tornaram desenvolvidos só conseguiram esse intento com o nacionalismo. Mas esse é o nacionalismo clássico seguido pelos países desenvolvidos, mesmo durante o período liberal, que se estendeu do séc. XIX até 1930. Neste período, os países desenvolvidos à medida que conseguiam se industrializar, protegendo suas indústrias, logo em seguida pregavam o liberalismo no comércio mundial, para expandir suas indústrias a nível global. Os países periféricos, ainda sem indústria, ficam sem poder industrializar, porque sua inserção no comércio mundial, pela troca de produtos primários por produtos industrializados, os impediam de fazê-lo. Quem chega por último na corrida industrial não consegue competir com quem chegou primeiro, já que este adquiriu avanços de produtividade e diminuição de custos, além de investir mais em pesquisa e inovações tecnológicas. Deste modo, estes países já num estágio mais avançado de desenvolvimento industrial, deixam de ser nacionalistas e passam a pregar o globalismo, o livre comércio mundial. Pois agora, eles podem competir, mas ao mesmo tempo impedir que outros países (que se pretendem industrializar) se industrializem.; e assim diminuir a concorrência aos seus produtos. Foi por causa desse processo, a difusão do liberalismo, que poucos países puderam se industrializar totalmente enquanto que a grande maioria dos países, que são do Terceiro Mundo, ficam impedidos de iniciar sua industrialização e acabam se especializando em exportações de produtos agrícolas e minerais e até mesmo semi-manifaturados e algumas commodities.
A partir da crise de 1929, que é basicamente uma crise do sistema liberal, o mundo muda bastante . Os Estados Nacionais começam a intervir no sistema econômico para evitar crises ou amenizá-las. É o período keynesiano, contraponto ao sistema liberal. No Terceiro Mundo (periferia), alguns países iniciam um processo de industrialização, aproveitando a crise mundial que se estende de 1929 a 1949, período em que os países periféricos deixam de receber os produtos industrializados do Primeiro Mundo (países centrais) e passam a substituir importações (produzindo internamente o que antes importavam). Como são países de industrialização tardia, esse processo é doloroso e parcial, mas é um começo. Para iniciar esse processo, países como o Brasil precisavam de investimentos estatais, já que a iniciativa privada era muito fraca na época. Mas os americanos entenderam isso como Nacionalismo, como concorrência ao seu projeto de transformar a América Latina num satélite submisso. Na verdade, aproveitaram a ideologia da Guerra Fria, para além de combater o comunismo e o “estatismo”, defender seus interesses capitalistas e a não industrialização da Periferia. O nacionalismo era uma desculpa que se encaixava na Guerra Fria; ou seja a Guerra Fria vem a calhar para defender os interesses capitalistas dos países centrais. Noam Chomsky em seu livro “O que o Tio Sam realmente quer?” (Editora UnB, 1999) deixa muito claro as intenções do Tio Sam, ao analisar documentos estratégicos de alto nível do governo americano, no pós-guerra: “..os estrategistas norte-americanos expunham a visão de que a principal ameaça à nova ordem mundial, liderada pelos EUA, era o nacionalismo do Terceiro Mundo, algumas vezes chamado de ultranacionalismo ….”. Nestes documentos, os estrategistas defendem que os países periféricos tem o papel de suprir com matérias-primas as necessidades dos países centrais.

O NACIONALISMO e em decorrência a transformação do país numa potência global e independente dos EUA, era vista como uma ameaça ao projeto hegemônico americano no lado ocidental. Nacionalistas eram tachados de “comunistas”, aproveitando a propaganda da Guerra Fria. Getúlio Vargas era uma ameaça, porque tinha criado várias estatais e quando criou a Petrobrás, foi a gota d'água. Morreu no ano seguinte. O embate entre nacionalistas versus entreguistas passa a ter muita importância, a partir deste período. Estudos da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina, órgão da ONU sediado em Santiago do Chile) liderados por Celso Furtado (um dos maiores economistas que o Brasil já teve) e Raul Prebisch (argentino) pregavam que a América Latina devia se industrializar sim, usando o Estado Keynesiano como instrumento de Política Econômica e de Planejamento. Na falta de uma burguesia industrial nacional, o Estado deveria executar este papel, preparando o terreno para a industrialização, via infra-estruturas fundamentais na área de energia, estradas, educação e saúde, saneamento, siderúrgicas, etc. Algumas estatais seriam importantes nesse processo para criar o ambiente propício ao processo de industrialização. O problema é que realmente o processo se desenvolveu mas, substituindo importações. As multinacionais vieram para produzir os produtos antes importados em ramos estratégicos como o de bens duráveis (automóveis, eletrodomésticos, etc.). A própria CEPAL reconheceu mais tarde, que o caminho percorrido pelos países periféricos da AL, só conseguia desenvolver o subdesenvolvimento. Os investimentos foram aplicados na indústria e na infra-estrutura, mas não foram feitos investimentos na área social – educação, saúde e saneamento. Assim, as mazelas do subdesenvolvimento continuavam se reproduzindo. A questão é que a elite dominante e conservadora da AL, se aliavam aos interesses americanos e só investiam nos interesses dessas elites. Investir na área social, para melhorar as condições de vida da maioria do povo, era coisa de “comunista”. Foi por causa disso que armaram um golpe de Estado contra João Goulart. Jango pretendia investir na área social, as chamadas Reformas de Base: reforma agrária, reforma educacional, saúde, saneamento,etc, reforçar algumas estatais, entre elas a Petrobrás. De novo a Petrobrás, Jango tinha um projeto de aumentar o poder da estatal. Aí veio o golpe. Foi tachado de comunista, sendo que o apoio que tinha dos comunistas era muito pequeno. Mas ele era “comunista”, porque era nacionalista, estatista. Por isso que foi derrubado. Como disse Noam Chomsky não havia inimigo maior para os americanos nesta época do que os nacionalistas.


Hoje, depois da Guerra Fria, não tem mais sentido chamar os nacionalistas de “comunistas”. Mas eles (os americanos) ganharam a guerra ideológica do liberalismo contra o intervencionismo estatal. O liberalismo é visto como o sistema econômico perfeito, livre das garras e regulações do Estado. Não deu certo nem pra eles - a atual crise econômica (a partir de 2008) é prova das imperfeições deste sistema. A direita americana e por extensão a direita brasileira, ainda entreguista, defende com unhas e dentes o sistema liberal. É claro, é o sistema que salvaguarda os interesses das grandes corporações globais. Se o mundo fosse dominado pelo sistema liberal, em todos os sentidos, as grandes empresas e corporações multinacionais iam mandar no sistema político e anular todas as leis e direitos adquiridos por trabalhadores no período keynesiano, acabando de vez com o “welfare state” ( o Estado do bem estar social). Estas leis e direitos foram responsáveis pelos melhores indicadores sociais, proporcionando distribuição de renda e níveis elevados de educação e saúde à grande maioria da população dos países centrais. A crise atual na verdade é resultado das medidas tomadas pelo período neoliberal, que se iniciou com a crise dos anos 1970/1980 e desde então vem tentando desmontar o “welfare state” criado no período keynesiano (pós-guerra: 1945-1975). Conseguiram diminuir benefícios sociais, gastos dos orçamentos dos governos e fragilizaram a fôrça das centrais sindicais : os salários caíram pela metade nos EUA, neste novo período liberal. O desemprego aumentou, a concentração de renda e a miséria aumentaram. Estes sempre foram os efeitos sociais dos períodos liberais, que significam mais mercado, menos Estado. Para frear este modelo, os trabalhadores necessitam de ter mais controle sobre o Estado, pois é o único instrumento possível para melhorar as condições de vida da população. No mercado livre, o Capital domina e tem mais fôrça. Controlando o Estado, é possível frear o mercado e controlar seus excessos e abusos, permitindo mais benefícios sociais à população. Além do mais, o mercado livre, totalmente livre, gera crises. É fácil de observar que todos os períodos liberais entraram em crises. A grande crise de 1929 é resultado do movimento totalmente livre do capital produtivo que gerou uma crise de superprodução – mercadorias que não se realizavam no mercado. A atual crise, a partir de 2008, é resultado da total desregulamentação do mercado financeiro, promovido pelas autoridades monetárias americanas, a partir dos anos 1980. Mas mesmo assim os capitalistas insistem que não devem ser regulados, que não devem sofrer interferência do Estado e continuam vomitando seus ideais liberais até hoje, quando por exemplo a mídia burguesa (americana e brasileira) atacam a Petrobrás e inventam crises, no intuito de desvalorizá-la para possível privatização.
É por isso que hoje achamos que o nacionalismo não é suficiente para superar as condições de subdesenvolvimento dos países periféricos. A esquerda brasileira (e latino-americana) não abraça mais totalmente o nacionalismo, mas defende um sistema neokeynesiano. Para evitar que o Brasil se torne um grande cafezal (como era antes de 1930) e como querem os liberais dos países centrais e a direita brasileira, com todas as mazelas do subdesenvolvimento (miséria, fome, pobreza e concentração de renda) é necessário maior controle dos representantes dos trabalhadores e da sociedade civil sobre o Estado e sobre o mercado livre. A intervenção do Estado nos países periféricos é necessária, extremamente necessária para corrigir as distorções sociais, promover a distribuição de renda e direcionar os investimentos em setores estratégicos ao nosso desenvolvimento econômico. Essa é a única saída para superar o subdesenvolvimento e alcançar os melhores indicadores de qualidade de vida para a maioria da população.

Daniel Miranda Soares é economista e administrador público, mestre pela UFV.

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