A essa altura você já deve ter ouvido falar do Popcorn Time. O serviço de streaming, chamado por muitos de ‘pesadelo para Hollywood’ e ‘exterminador do Netflix’, usa torrents para transmitir filmes e séries. O layout simples facilita o acesso a um enorme acervo de filmes devidamente catalogados e legendados, naquele esquema de tradução e brodagem coletiva que quem frequenta o universo P2P já conhece (para se ter uma ideia, o site foi traduzido colaborativamente para 32 idiomas).
Eficiente, cheio de conteúdo, gratuito e… ilegal. O Popcorn Time pegou algo restrito a um universo e tornou isso bonito, simples e acessível aos usuários comuns. E começou a funcionar em um limbo legislativo: o serviço não paga direitos autorais, como o Netflix, por exemplo, mas seu conteúdo vem de uma fonte descentralizada e abastecida pelos usuários, ou seja, ele é só uma forma de acesso ao conteúdo que outras pessoas postam. Assim, a ideia de seus criadores é que o Popcorn Time é apenas uma plataforma – a responsabilidade sobre o que circula nela, e a forma como é usada, deve ser dos usuários.
Depois de todo o furor inicial, o Popcorn Time saiu do ar. Por causa de ameaças legais, o site exibe agora uma mensagem de ‘adeus’ de seus criadores argentinos. Eles se dizem muito orgulhosos do que o site representou – afinal, viraram notícia em todo o mundo e levantaram a discussão – e reafirmaram que o site, como projeto, é totalmente legal. “Mas isso não é suficiente. Nosso enorme alcance nos deu acesso a muitas pessoas. Aprendemos um monte, especialmente que se manter contra a antiga indústria tem seus próprios custos associados. Custos que ninguém deveria pagar”, escreveram os criadores.
“A pirataria não é um problema das pessoas. É dos serviços. É um problema criado por uma indústria que vê a inovação como uma ameaça à sua antiga receita de obter lucro. Parece, para todos, que eles não se importam. Mas as pessoas se importam. Nós mostramos que as pessoas correrão o risco de tomar multas, sofrer processos e outras consequências só para assistir a um filme recente de chinelos. Só para ter a experiência que merecem”, diz o comunicado.
Os criadores decidiram ‘continuar com suas vidas’, mas a tecnologia é implacável. Open source, o Popcorn Time ganhou novas versões desde o fechamento da original. Não vou dar nenhum link, mas você consegue baixar o programa sem muita dificuldade. Os servidores ficam espalhados por aí, o código já está no GitHub, não há mais controle sobre o serviço. Seu uso ainda é pequeno (o Popcorn Time correspondeu a 1% do tráfego de torrents em março, segundo a Excipio, empresa alemã de análises relacionadas à pirataria), mas o fato de o programa sobreviver às ameaças é um grande exemplo do funcionamento da rede: se as regras estão erradas (ou é assim que a comunidade entende), elas serão burladas. E ameaças, proibição ou repressão não resolverão o problema. É só ver o Pirate Bay: seus criadores foram processados, presos, condenados à pagar multas milionárias, mas o serviço continua firme e forte.
Por isso precisamos falar sobre torrents. Estima-se que 30 milhões de pessoas em todo o mundo usem torrents todos os dias para baixar músicas, filmes, séries, softwares e trocar outros tipos de arquivos, sejam eles legais ou ilegais. Veja bem: trinta milhões de pessoas que praticamente caem na ilegalidade (ou passam perto dela) porque preferem usar uma tecnologia específica, porque querem poder acessar o conteúdo no conforto de suas casas, quando quiserem, sem restrições relacionadas à sua localização e travas como DRM.
Não está na hora da indústria rever os seus modelos? De financiar essas novas tecnologias de distribuição de conteúdo? Não está na hora das leis de direitos autorais começarem a olhar para o P2P (que pode, sim, virar um negócio tanto para os produtores de conteúdo quanto para a indústria)?
Enquanto isso não acontece, podemos ter uma certeza: outros ‘Popcorn Time’ surgirão.
Fonte: Galileu
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