O papelzinho
30 de Novembro de 2014, 14:52Hoje faz seis meses que nos falamos pela última vez.
Ainda lembro de maneira vívida a primeira vez que saímos. Ela estava linda, com aquele sorriso contido, meio sem jeito, sem saber onde enfiar as mãos ou o que dizer. Não. Ela sempre sabia o que dizer. E assim me desconcertava, com aquele ar de contrariedade.
O telefone dela tocou. A voz de Chet sussurrava "I fall in love too easily..." Mau agouro. Dos dois, eu tinha o coração mais fraco. Eu fiquei apaixonado. Ela não. Fim da história. Não precisaria escrever mais nada. É banal.
Mas vivemos bons momentos. Ficávamos em hotéis baratos do centro. Ela se divertia como uma criança. Eu ficava acabrunhado por ela não me querer como eu a queria. Até que um dia ela não quis mais, aquilo que nunca tinha sido um querer.
A última mensagem foi dela. Respondia, num domingo à noite, aos meus votos de ótima noite e ótima semana com um lacônico "boa noite."
Com um ponto final. Se fosse somente o boa noite, talvez fosse somente mais uma das tantas indiferenças dela. Afinal, ela parecia mesmo viver em um mundo à parte, flutuando imperceptíveis milímetros acima do chão. Ela flutuava. Eu ficava cada vez mais pesado. "I fall in love too fast..."
Aquele maldito ponto final...
Tudo que restou foi o número dela anotado em um papelzinho recortado por uma daquelas tesouras dentadas.
Fica no fundo da gaveta. O contato já foi deletado da agenda do celular há muitos meses. Volta e meia abro a gaveta, pego o papelzinho - sem olhar muito para não correr o risco de decorar o número - e adiciono novamente. Só para ver se ela está on-line no whats ou a última vez que visualizou suas mensagens.
"I fall in love too terribly hard..."
Interestelar: nasce um clássico
14 de Novembro de 2014, 12:07Ontem fui assistir Interestelar e posso dizer que é uma obra prima. Um filme que nasce clássico.
E por que nasce clássico? Porque é o casamento perfeito entre a razão científica (teoria da relatividade, buracos negros, wormholes) e a emoção e experiência humana (amor, família, história, filosofia, devir).
A beleza que os irmãos Nolan (Jonathan e Christopher, roteiro; Christopher, direção) conseguiram dar ao problema da distorção do espaço-tempo afetando a vida de uma família é uma coisa impressionante. É uma história poderosa, dramática, impactante. Nunca vi nada igual em um filme de ficção científica. E tudo isso embalado em um delírio visual extremamente realista que faz a gente perder a noção do tempo (tudo a ver com um dos muitos significados do filme) nas quase três horas de duração. Sem mencionarmos as interpretações espetaculares. Certamente renderá vários óscares.
Tem defeitos? Tem, claro. Como todo filme, como todo livro. Acho que devemos encarar filmes da magnitude de Interestelar - fazendo uma analogia com a literatura - mais como contos do que como romances. Uma história complexa como esta sempre deixará margem para que algo não seja bem explicado, em aberto. É natural, caso contrário o filme teria que ter 8, 9, 10 horas de duração. Mas mesmo assim Interestelar não deixa de ser um filme difícil, que deve ser visto mais de um vez. Pretendo revê-lo logo.