KÁTIA ABREU, CAIM E ABEL
Por Lelê Teles
Ao vencedor, as batatas. Grita Humanitas.
Talvez por isso Kátia Abreu apareceu na cerimônia de posse presidencial com seu vestido verde agronegócio, e as batatas da perna expostas. Um sinal de sua conversão à filosofia do Humanitismo.
Sim, ela venceu. Tomou posse, é amiga da presidenta e, também por isso, venceu a resistência enorme que pesava contra os seus ombros largos.
Na refrega, havia dois grupos insaciados, um deles insaciável, os que ganham muito dinheiro com a terra e os que têm pouca terra e pouco dinheiro.
Há ainda um terceiro grupo que não tem nem um e nem outro.
Terra há.
E é criminoso invadir terras legais e produtivas, a constituição garante a inviolabilidade da propriedade privada. Ponto.
Mas há ressalvas na Carta. Ponto e vírgula. Terras griladas ou ociosas têm dono, o Estado brasileiro, o povo brasileiro.
Há que se pensar também, é só ler a Carta, no princípio constitucional da função social da terra.
Alimentar o povo, gerar renda, gerar emprego.
A lei ainda assegura terras para os povos indígenas, para criação de unidades de conservação e de reservas ecológicas.
O conflito é provocado, sempre, entre a fraternidade versus ganância e egoísmo. Os discípulos do maior filósofo brasileiro, Quincas Borba, acreditam que não pode haver divisão, porque não há para todos, se repartirmos o que temos entre todos nós, nós todos morreremos de inanição. Daí a guerra.
Venceu a chamada Rainha da Motosserra. Batatas pra ela.
Mas tenho cá um pressentimento de que começa a assar a batata de Kátia Abreu.
De um ministro de Estado se espera diálogo, alinhamento com a filosofia do poder central, discrição e, acima de tudo, ação.
Senhora Abreu parece ignorar todas essas etapas. E anda a dar com a língua nos dentes.
Simplória, fez uma analogia tão tacanha, tão chã, tão farelo que deveríamos nem estar a comentá-la aqui, o faremos por ofício. Dizer que os indígenas estão a “descer” e invadir a propriedade dos capitalistas é uma digressão estapafúrdia.
Defender o latifúndio que avança sobre áreas indígenas com o infeliz argumento de que ninguém pretende devolver Niterói ao cacique Araribóia ou Sergipe ao cacique Serigy é uma afronta, um acinte, um deboche.
Mas não paremos por aí, Kátia parece se aproximar de sua homônima, que cantou sucessos até os anos 80, e não enxerga o que está à sua frente. Disse, disso nunca nos esqueceremos, que não há mais latifúndios no Brasil.
Huuuummmm. Essa foi de lascar.
Quer dizer que a soja que alimenta animais mundo afora, a carne e o frango que alimentam seres humanos mundo adentro, as milhares de toneladas exportadas do agronegócio brasileiro são, tudo isso, produções artesanais de chacareiros?
Latifúndios há e estão em crescimento, mesmo que grande parte destas terras sejam apenas fruto de ganância e vaidade, pois estão ociosas, improdutivas.
Há muita gente honesta trabalhando a terra, pequenos e grandes produtores; e há gente honesta precisando de terra para trabalhar. No meio destes, há os astutos seguidores de Caim e Abel, os que avançam sobre florestas, desrespeitam leis, mandam e desmandam; matam e desmatam.
Kátia Abreu ainda não deixou claro de que lado está.
A história da humanidade, segundo a Bíblia, começa com um conflito. Adão, o primeiro homem, teve dois filhos. Um se tornou agricultor e o outro pecuarista.
O Deus de ambos, que era um só, invisível, indizível e indivisível, pedia a eles sacrifício, cada um deu o que produzia.
Mas o ciúme, o egoísmo e a vaidade, fez com que essa história acabasse em morte. Caim, o agricultor, matou Abel, o pecuarista.
A história nos conta, ainda, que os descendentes de Caim se comportaram como ele, egoístas, vaidosos e gananciosos. Todos pereceram no Dilúvio.
Adão teve outro filho, Shais, deste sujeito descende Noé, a justiça e a fraternidade, e deste descendemos todos nós.
Deus, senhora Abreu, mais uma vez pede sacrifício.
Atentai bem, pois é tempo de chuvas.
Palavra da salvação.
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