“O PSDB de Franco Montoro e Mario Covas há muito tempo deixou de existir. O partido que sobrou transfigurou-se numa legenda de direita, com identidade alguma com as tradições da Social-Democracia.” Wgner Iglecias
Abaixo artigo do cientista político Aldo Fornazieri sobre o tema: “Nas suas origens, o PSDB defendeu os direitos trabalhistas, o capitalismo regulado e programas que garantissem e ampliassem direitos sociais. Ao ser fundado em 1988, declarou-se de forma explícita, à esquerda do PMDB. Covas foi líder do bloco parlamentar que, na Constituinte, se opôs ao Centrão – articulação de direita. De modo geral, aquele PSDB se alinhava com as consignas de esquerda e progressistas, que ajudaram a construir um pacto social abrigado na Constituição. Uma das cinco principais bandeiras do partido na sua fundação defendia um “Estado a serviço do povo e não de grupos privilegiados”
O PSDB e o perigoso caminho do golpe institucional
Por Aldo Fornazieri, GGN
De acordo com o noticiário da imprensa, o líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Carlos Sampaio, deverá formalizar nesta semana o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Trata-se da proposição de um golpe institucional, pois não há um fato objetivo que justifique o impeachment. Nem mesmo lideranças tucanas como Fernando Henrique Cardoso, Geraldo Alckmin e José Serra julgam que o pedido encontra uma justificativa razoável. Desta forma, mesmo que o instrumento do impeachment seja previsto constitucionalmente não suficiente para torná-lo legítimo, pois carece de fundamento real.
Nas imagens da #ColunaPrada, um similacro midiático e reacionário da ColunaPrestes a síntese do que o PSDB representa.
O caminho do golpe institucional é perigoso e irresponsável. Perigoso, porque poderá mergulhar o Brasil não só numa crise institucional, mas também numa convulsão social. Se é verdade que hoje a maior parte da sociedade é favorável ao impeachment, é verdade também que existem importantes forças sociais e políticas organizadas que são contrárias. Estas forças, certamente, se mobilizarão na defesa da democracia e contra o golpe institucional. Desta forma, o processo de impedimento da presidente resvalará para fora do Congresso, ganhando as ruas. Com o ambiente político já radicalizado, os confrontos serão inevitáveis.
O caminho escolhido pelo PSDB e por outros setores da oposição é irresponsável, pois cavalga no oportunismo político da falsa suposição de que eles têm força popular. Pesquisas de opinião mostram que apenas 11% dos que foram na Avenida Paulista no último dia 12 de abril confiam no PSDB e que mais de 70% não confiam em Aécio Neves. Pesquisa do Datafolha indica que o Congresso é avaliado positivamente por apenas 9% da população do país. O fato é que a sociedade percebe a prática da corrupção como algo institucionalizado e inerente a quase todos os partidos políticos. É com essas credenciais de crise de legitimidade generalizada que a oposição pretende apresentar-se à sociedade para propor o impeachment. Convém ainda lembrar que políticos da oposição foram rejeitados pelos manifestantes, tanto no dia 15 de março quanto no dia 12 de abril.
Outro erro que a oposição está incorrendo é o da avaliação de que o PT “está morto” e que não tem força de reagir nas ruas contra o processo de impeachment. É verdade que o partido tem sua imagem profundamente desgastada junto à sociedade. Mas o processo de impeachment lhe dará a oportunidade de reagir e de sair da letargia em que se encontra. Pesquisa Datafolha mostra, ainda, que o ex-presidente Lula mantém importante força eleitoral, circunstância que lhe permitiria liderar as mobilizações em reação ao processo de impeachment. As próprias forças sindicais ligadas à CUT e ao PT deram demonstração de força e de capacidade de mobilização na semana passada ao comandar protestos contra o projeto de terceirização.
O PSDB e o Adeus à Social Democracia
O PSDB de Aécio Neves é uma caricatura do PSDB de Franco Montoro e de Mário Covas. É um partido distante até mesmo do PSDB de Fernando Henrique Cardoso, Alckmin e Serra. Nas suas origens, o PSDB defendeu os direitos trabalhistas, o capitalismo regulado e programas que garantissem e ampliassem direitos sociais. Ao ser fundado em 1988, declarou-se de forma explícita, à esquerda do PMDB. Covas foi líder do bloco parlamentar que, na Constituinte, se opôs ao Centrão – articulação de direita. De modo geral, aquele PSDB se alinhava com as consignas de esquerda e progressistas, que ajudaram a construir um pacto social abrigado na Constituição. Uma das cinco principais bandeiras do partido na sua fundação defendia um “Estado a serviço do povo e não de grupos privilegiados”.
Inconformado com as derrotas eleitorais, hoje, o PSDB tornou-se um espectro atual da antiga UDN. A UDN, rejeitada nas urnas, era conhecida como a “vivandeira dos quartéis” por apelar recorrentemente ao golpe militar. O PSDB de Aécio ainda não chegou a tanto, mas aceitou marchar junto nas ruas a grupos que pendem o golpe militar. Os líderes históricos do PSDB que ainda restam, têm responsabilidades sobre os rumos do partido. Afinal de contas, são histórias e biografias que estão em jogo.
O atual PSDB tornou-se integrante do núcleo central da bancada BBB (bala, boi e Bíblia), liderada por Eduardo Cunha. O partido afastou-se por completo de uma agenda pautada em políticas socialdemocratas. Nas eleições, angariou o apoio dos setores mais conservadores da sociedade e passou à direita do PMDB. Nos embates recentes na Câmara dos Deputados, os tucanos posicionaram-se pela redução da maioridade penal e votaram no projeto de terceirização da atividade fim – algo que desfigura a longa e penosa história de conquistas trabalhistas no Brasil.
Infelizmente, as desditas da Fortuna quiseram que os dois partidos que foram criados para levar o Brasil à modernidade e à civilidade, o PSDB e o PT, vivessem um mesmo momento de crise e de desfiguração de seus respectivos ideários. Suas escolhas os afastaram um do outro, impossibilitando diálogos construtivos e até mesmo alianças transformadoras. O PSDB e o PT, cada um por seu lado, bloquearam suas capacidades transformadora e tornaram o Brasil prisioneiro de um sectarismo paralisante.
*Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.
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