O BRASIL EM LONDRES E AS AVES DE RAPINA DA INTERNET
12 de Agosto de 2012, 21:00 - Um comentárioO Walter Falceta foi MUITO brando. Essa é a turma que expressa a ideologia dos MILICANALHAS dos grupelhos guararapes, barbacena, ternuma “et cataerva”. Aqueles mesmos torturadores, assassinos boçais que se dizem “democratas” e “defensores da democracia”.
Não passam de VAGABUNDOS e/ou APÁTRIDAS quase todos imeritamente sustentados pelos nossos impostos.
Por Walter Falceta Jr.
Nos QGs da trollagem virtual, estavam todos com os dedinhos de prontidão. Terminou o aperitivo cênico brasileiro e os gatilhos foram disparados.
Para um troller do UOL "o país é uma vergonha aos mostrar mulatas".
Para outro, no mesmo jornal, faltou o "carro alegórico dos corruptos do PT".
Para um terceiro, um "absurdo perder tanto tempo mostrando um simples gari".
Um quarto afirmou que "o Brasil nunca chegará aos pés da Inglaterra em talento artístico".
Não impressiona que os comitês de trollagem a serviço da oposição reforcem, com devoção, a síndrome de vira-lata. A turma de Soninha e Eduardo Graeff é bem treinada para executar esse "serviço".
Como de costume, comentaristas profissionais do UOL, Estadão e G1 esforçam-se por parecer não-brasileiros. Fantasiam um estrangeirismo caricato. Oniscientes e indignados, pranteiam como se fosse obrigados a viver ao sul do Equador.
Rotulam-se como superiores, como se seus avós ou bisavós não tivessem chegado ao Brasil com uma mão na frente e outra atrás, muitos deles mal vestidos e mal alimentados.
Evidentemente, o pensamento conservador, típico do eleitorado da trinca PSDB-DEM-PPS, não contempla valor na miscigenação. Para esses, no fundo, misturar equivale a "estragar a raça", como dizia Monteiro Lobato.
A mulata lhes causa constrangimento e, muitas vezes, nojo, mesmo quando delas são diretos descendentes. Adoram destilar pequenos venenos sobre a anatomia dos afro-brasileiros.
Logicamente, o história da "corrupissaum" não podia ficar de fora. É o mantra histórico de todo fascista, devotado a denunciar vícios alheios. O adversário deve ser desprezado, humilhado e, por fim, criminalizado.
Logicamente, o gari causou-lhes repugnância. Como pupilos de Boris Casoy, adeptos das doutrinas disseminadas no velho CCC do Mackenzie, adoram barreiras sociais e incomodam-se tremendamente com a diversidade.
Para esses, em vez do funcionário da limpeza pública, talvez o ideal fosse apresentar em Londres engomados como Daniel Dantas, Demóstenes Torres, Cachoeira e o pistoleiro das letras Policarpo Jr.
Houve quem repudiasse os índios, classificados como "vagabundos cachaceiros que vivem dos nossos impostos". Previsível.
É esse tido de visão que embasa a campanha da direita contra as "ações afirmativas". É isso que a gente bandeirante pensa do povo da terra, desde 1554. É isso que um bandeirante ensina a seu filho.
Obviamente, era de se esperar a sentença de inferioridade, o registro de suposta superioridade do gringo. E ela veio no elogio embasbacado da festa londrina, como se os países disputassem a medalha do espetáculo midiático.
Evidentemente, selou o destino brasileiro: "nunca serão capazes de fazer algo melhor".
Afinal, trata-se de estratégia antiga de controle e submissão. Diga ao brasileiro que ele é incapaz, que é menor, que não presta. Drene suas forças e sobre ele exerça pleno domínio.
Pior que isso: convença-o a repetir essa sandice, todos os dias.
A campanha contra a Rio-2016 começou neste domingo de agosto e tomou conta das redes sociais. Na mira dos sabotadores, o Brasil e os brasileiros. A guerra começou.
Filme Francês Ganha Leopardo de Ouro
11 de Agosto de 2012, 21:00 - Um comentário
Rui Martins informa direto de Locarno (Suiça)
Publicado em 11/08/2012
O filme francês La Fille de Nulle Part, do cineasta Jean-Claude Brisseau ganhou o Leopardo de Ouro na competição internacional do Festival de Locarno, que terminou hoje, na Suíça, no Ticino.
O filme é uma espécie de thriller esotérico (ver crítica a seguir), feito com um mínimo de recursos, sendo o realizador Brisseau também ator e roteirista. Tratando da necessidade dos humanos terem ilusões, o filme mantém diálogos dignos de Eric Rohmer.
O Premio Especial do Júri foi para a comédia americana Somebody Up There Likes Me, de Bob Byington.
O prêmio de Melhor Direção foi o chinês professor de cinema em Hong-Kong, Ying Liang pelo filmeQuando Chega a Noite.
O prêmio de Melhor Atriz foi para a chinesa An Nai, do filme Quando Chega a Noite.
O prêmio de Melhor Ator foi para Walter Saabel, do filme austríaco A Luz do Dia, de Tizza Covi e Rainer Frimmel.
Houve uma menção honrosa para o filme portugues A Última Vez que Vi Macau.
Os comentários de Rui Martins sobre o filme vencedor e, em seguida, e outros que foram exibidos em Locarno
Se esse gênero misterioso, transcendental e metafísico ainda não existe, o cineasta francês Jean-Claude Brisseau acaba de inventar com seu filme La Fille de Nulle Part, filmado em Paris, no seu próprio apartamento, onde alguns fenômenos estranhos - como aparições de fantasmas, barulhos inexplicáveis, levitação de mesa, cadeira furiosa se jogando sozinha contra a estante e quebrando espelho se manifestam - depois de acolher uma jovem espancada pelo amante nas escadas do seu prédio, junto ao seu apartamento.
Michel é o personagem principal, vivido pelo enorme e pesado Brisseau, na sua primeira experiência de ator amador num cenário escrito por ele mesmo. Ex-professor, como na vida real, Michel tem o dom do didata e logo interessa sua hóspede, que precisa de cuidados médicos e repousa uma semana em seu apartamento, sobre uma pesquisa envolvendo as crenças e ilusões dos seres humanos.
Michel não é um crédulo mas um agnóstico ou ateu curioso na explicação dos mitos que embalam os seguidores das religiões. Pesquisador, baseado em descobertas arqueológicas, ele considera os personagens bíblicos do Velho Testamento como criaturas saídas da imaginação de um Josias.
Assim, Moisés nunca teria existido, mas se tivesse existido seria não o menino hebreu achado no curso do rio Nilo, mas um egípcio. E, reunindo num arquivo do seu computador os quadros da Ascenção de Cristo, pintados pelos grandes mestres, lhe surge a convicção de ter sido uma ilusão de seus discipulos, mesmo porque se Cristo tivesse subido aos céus para onde iria – para a Lua, Marte ou no forro de alguma igreja ?
Apresença da jovem Dora, de 26 anos, quarenta anos mais jovem que ele, mas esperta e inteligente, capaz de ajudá-lo na conclusão dos seu livro sobre as ilusões criadas pelos homens, como uma necessidade existencial. Mas a jovem Dora parece ter levado o sobrenatural para sua casa e um espírito desenha num papel, com o pé de uma mesa em levitação, o rosto de uma mulher. O rosto se parece com sua esposa falecida há mais de vinte anos, perda da qual Michel nunca se refez.
Aparece também o fantasma de uma mulher de preto, enquanto ruídos estranhos saem de dentro do armário. E o intelectual empedernido, movido pela ilusão da possibilidade de um reencontro com sua esposa, cai na mesma cilada dos que precisam de algo místico para poder viver – Dora seria a reencarnação de sua esposa. E comete o erro fatal de legar todos seus bens, em caso de morte, para Dora, na verdade sua ex-esposa.
O resto nem se precisa contar. Filme indicado para os que vêem fantasmas e mensagens do além por todo lado e que se deixam levar pelo nariz por todos os tipos de crenças e crendices, nutrindo-se de ilusões para viver. Enquanto uns poucos, mais espertos explicarão sinais, vultos, ruídos, levitações, comunicados do além como simples truques de mágica. E ainda outros utilizarão das ilusões e dos crédulos como seu ganha-pão esotérico.
Jean-Claude Brisseau quis também provar ser possível fazer um filme com pouco dinheiro e que muitos caros efeitos especiais, usados nas superproduções sequer são percebidos pelos espectadores. Puro luxo desnecessário. Mas sem as ilusões poucos podem sobreviver.
Moussa Touré e o cinema africano
Moussa Touré um dos importantes cineastas africanos em Locarno irá ao Rio e São Paulo, dia 15, para apresentar seu novo filme A Piroga.
O cinema africano é destaque no Festival de Locarno, na Suíça, com a presença de realizadores africanos na mostra Open Doors ou Open Africa, oportunidade em que se discute a situação do cinema africano.
Alguns filmes africanos antológicos estão em Locarno – Yaaba, de Gaston Kaboré ; Abderrahmane Sissoko, com Bamako, excelente crítica do plano do FMI para a África nos anos 80-90; e Cheick Oumar Sissoko com Guimba.
A abertura do Open Doors, ou Open Africa, foi com o filme A Piroga, do realizador senegalês Moussa Touré, que irá ao Brasil, São Paulo e Rio, no próximo dia 15, para apresentar seu filme.
O filme La Pirogue mostra senegaleses se servindo de barcos precários, canoas e pirogas com o objetivo de chegarem até a Espanha, onde nem todos conseguem aportar, porque morrem vítimas de naufrágios.
A presença de Moussa Touré é a oportunidade para se tomar a temperatura do cinema africano.
“A grande falha atual do cinema africano é não haver salas de projeção”, diz Moussa Touré, “existem muitos filmes mas não há cinemas. Para que o cinema seja possível num país é preciso que o governo ponha dinheiro nisso, como mostra o exemplo positivo da França, e acho que no Senegal agora isso vai ser feito. Sou senegalês, vivo no Senegal e vejo o começo das mudanças, fui dos que jogaram pedras nos protestos contra o outro presidente. E hoje acho que as pessoas que estão no poder, colocarão dinheiro, onde deve ser posto”.
A África tem um grande Festival, criado na época de um incentivador do cinema africano, o ex-presidente Sankara de Burkina. Moussa Touré fez parte do júri do Festival de Ouagadougou e destaca sua importância africana.
“Como eu vejo o Festival de Ouagadougou ? Ainda agora há pouco alguém me disse, mas voce vai sempre a Ouagadougou, e eu respondi, claro, sou patriota por esse festival. Como africano sinto-me obrigado a ir lá. Mesmo se podem surgir falhas de organização nesse festival, prefiro ir lá que em outro lugar, é lá que está meu povo e onde quero mostrar meus filmes, de preferencia a Locarno. Como eu vejo Ouagadougou ? Faço parte integrante desse festival, é meu festival. Não é um festival de Burkina é um festival africano para os africanos e é um momento para juventude africana ver nossos filmes.
Para ele o Festival de Ouagadougou não é um festival de Burkina Faso mas de toda África, visto por milhares de jovens, que ali conhcem os filmes dos realizadores africanos.
Exclusão e eutanásia dos velhos
Locarno continua sendo o Festival da descoberta, do cinema independente e não comprometido. Esta nova safra de filmes mostra alguns temas dominantes. Muitos filmes tratam da velhice, um achado para os atores aposentados e marginalizados pela idade, vivendo um tipo de exclusão que se acentua em tempo de crise.
Essa exclusão de uma população inativa pode sugerir a idéia perigosa da sociedade se desfazer dos velhos, sugerindo-lhes a idéia de se suicidarem, a chamada morte ou suicídio assistido. Melhor coisa não poderia se inventar para se equilibrar os orçamentos das caixas de pensão estatais ou das seguradoras privadas, condenadas a pagarem rendimentos a idosos com esperança de vida cada vez mais longa.
Um filme francês Algumas Horas de Primavera, de Stéphane Brizé, mostra, como ocorre na intimidade, o suicídio dos que decidem colocar um ponto final na existência, seja pelo risco da fase final dolorosa de uma doença grave como o câncer, seja pelo receio de se tornarem velhos decrépitos, senis e dementes. Ou em consequência de uma depressão causada pela solidão.
Basta o candidato ao suicídio subir os Alpes e ir à Suíça, onde o decrépito segredo bancário começa a ceder lugar à eutanásia oferecida pelas associações Exit e Dignitas. Num ambiente de extrema frieza, mesmo cruel e asséptico, num pequeno quarto, quase isolado, o suicida toma suas duas poções com sabor de morango ou limão, pode escolher o gosto, perde gradativamente a consciência e morre, para ser logo depois incinerado e suas cinzas serem jogadas num lago ou rio suíço.
Algumas Horas de Primavera tem como tema as difíceis relações entre a mãe idosa e seu filho único de 48 anos, recém-saído da prisão e desempregado, que volta a morar com ela por falta de recursos. A incomunicabilidade total entre ambos reforça o desejo da velha senhora de por fim à vida, ao receber a confirmação de um câncer no cérebro.
Ao contrário de outros países latinos e dos países árabes, a cultura francesa privilegia a independência e a fragmentação familiar, com o hábito dos filhos irem viver sós ao chegarem a maioridade. O resultado dessa separação pode repercutir na época da velhice dos pais, praticamente abandonados pelos filhos sem vínculo familiar. É grande o número de idosos vivendo sós na França, sem contato com filhos e netos, em estado latente de depressão, presas fáceis para se desfazerem da vida pela eutanásia.
Um trote por telefone leva a uma violação
O realizador Craig Zobel com seu filme Cumplicidade, baseado num fato real nos Estados Unidos, mostra como as pessoas, submetidas a uma pressão, são capazes de gestos e ações inesperadas e quase inexplicáveis.
A gerente de um pequeno fast-food recebe um telefonema do chefe do comissariado próximo e é informada que uma de suas empregadas roubou uma das clientes. O delegado pede para Sandra, a gerente, começar a tomar as primeiras providências, como interrogar a jovem Becky, enquanto ele providencia o envio de policiais.
Mantendo-se na linha, o delegado explica à gerente como deve fazer para o interrogatório. A empregada nega o roubo, mas aceita responder às perguntas, mesmo porque o delegado deixa claro ter autoridade sobre ela e sobre Sandra.
A situação vai pouco a pouco se tornando cada vez mais grave e patética, mesmo se não chegam os policiais, como despir a jovem para ver se ela não esconde o dinheiro no corpo, dar palmadas na bunda de castigo e o noivo de Sandra acaba tendo um relação sexual com a jovem, na sequências das exigências do delegado.
Craig conta ter havido nos nos anos70 nos EUA casos parecidos de uma suposta autoridade telefonar para uma rede de fast-food, sob pretextos diversos e assim provocar arbitrariedades e humilhações nos empregados.
Na verdade não passa de um trote levado às extremas consequências, que levanta a questão de até onde as pessoas são capazes de ir mesmo em termos de tortura, a pretexto de obedecerem ordens. E por que a vítima submetida a diversos tipos de violência, como ser despida, espancada e mesmo violada, não se revolta ?
Seria possível, na Europa, um trote por telefone degenerar ao extremo como no filme ? Na França, um programa na rádio Europa1 consiste justamente em aplicar trotes com a diferença de que tratam de questões sem grande importância e que a cômica, Anna Romanof, se identifica ao final.
De retorno os autores de Miss Sunshine
Foi aqui em Locarno, na Piazza Grande, que começou a carreira de sucesso do filme em todo o mundo e no Brasil, de Little Miss Sunshine. Jonathan Dayton e Valerie Faris, os cenaristas e realizadores estão de volta com outro filme, destinado também ao sucesso.
Trata-se de Ruby Sparks, nome da personagem do jovem escritor Calvin, que, de repente, sai praticamente de sua máquina de escrever para se transformar numa mulher real em carne e osso e pela qual ele se apaixona.
Inicialmente, Calvin mantém distância dessa jovem alegre, viva e inteligente, imaginando ser uma visão ilusória de sua excessiva imaginação. Porém, a dúvida se desfaz, quando seu irmão vindo lhe visitar encontra Ruby Sparks em sua casa. Os três almoçam, conversam e fica evidente ser real a namorada de Calvin.
Intrigado, Calvin explica, à parte, a seu irmão não saber como explicar aquela materialização de sua personagem. O irmão não fica convencido e pede uma prova para Calvin de que Ruby é personagem de romance e não uma jovem real. Calvin vai até a máquina de escrever e bate uma frase, segundo a qual a jovem Ruby fala francês. E imediatamente ouvem Ruby lhes chamando em francês.
Calvin exige de seu irmão não contar a ninguém essa incrível capacidade de manipular uma personagem com sua escritura, porém logo surgem alguns problemas. Calvin percebe estar manipulando Ruby e tenta lhe tornar uma personagem livre, porém isso lhe causa sofrimento, pois Ruby descobre outras amizades, quer estudar arte e nem sempre volta para dormir em casa. Até que, consciente de ser uma personagem irreal e manipulada, Ruby se revolta e vai embora, enquanto Calvin se conscientiza da irrealidade vivida e troca de máquina mecânica para um computador.
O filme lembra outro recente, embora com história diferente, de Woody Allen, Meia Noite em Paris, no qual o escritor por um passe de mágica à meia-noite, vive com escritores e personagens de um romance em fase de escrita. Porém, Ruby Sparks é mais explícito – o escritor, como um Pigmalião, cria e controla a vida real da personagem, como os escritores fazem com suas personagens fictícias e não materializadas ou encarnadas.
Conjugando a escrita com a cena real, o filme pode parecer um bem sucedido exercício de estilo. Feito pelo casal diretor, o filme reúne um casal real de atores Paulo Dano e Zoe Kazan, por sinal a neta do grande cineasta Kazan. Antonio Banderas faz o personagem do irmão do escritor Calvin.
A sobrevivência dos filhos dos nazistas
As atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial em nome da ideologia nazista ainda impressionam as novas gerações de cineastas. Kate Shortland nasceu bem depois do término da Guerra e num país bem distante, a Austrália. Mas ficou impressionada com a leitura do livro da alemã Rachel Seiffert, The Dark Room, sobre a situação dos filhos dos dirigente nazistas, ao entrarem as tropas aliadas na Alemanha.
Lore é o título do filme e o nome da adolescente, filha de um graduado militar alemão, que deverá ser preso e decide esconder sua esposa e os cinco filhos numa casa em plena Floresta Negra. A situação se complica com a entrada dos americanos na região e a mãe das crianças decide se entregar sem saber das consequências, dando à filha mais velha a incumbência de, aos 16 anos, cuidar dos quatro irmãos, um deles ainda bebê e fazer o caminho até a casa da avó, no norte da Alemanha, onde acha que estarão seguros. O trajeto será longo, 900 quilômetros. O caminho é penoso e perigoso na Alemanha devastada pela guerra.
Numa das pousadas precárias em uma casa em ruínas, Lore vê um jovem, Thomas, também em busca de um abrigo, que mostra o desejo de ajudá-la e à pequena família, obrigada a dormir ao relento e geralmente com um mínimo para comer. Sem dúvida a bela e viçosa alemã atrai o rapaz e, por sua vez, Lore sente, passado o momento de desconfiança, que Thomas pode ser de grande valia.
Mas existe uma barreira – Thomas é um judeu foragido de uma campo de concentração à busca de uma proteção junto aos Aliados. Para Lore, criada na ideologia nazista, essa barreira é quase intransponível, será preciso surgir um grave problema para Lore ultrapassar a carga cultural nazista e se aproximar de Thomas, sem o qual não teria chegado à casa da avó.
Histórias de amores entre judeus e alemães, logo depois do fim da Segunda Guerra, quando a dor ainda era profunda, existem. O autor de um dos primeiros livros sobre o Holocausto, escrito por um judeu sobrevivente, Steiner, que se refugiu na França, tinha se casado com a filha de um general nazista alemão.
Steven Soderbergh e seus marmanjos nus
O realizador americano Steven Soderbergh deve entender da coisa, pois em 1989 ganhou a Palma de Ouro de Cannes com Sexo, Mentiras e Videotape. Mas não ficou nisso, pois seus outros filmes tratam de temas diversos, e mesmo político, como o Che, que, ainda em Cannes, valeu o prêmio de melhor ator para Benício del Toro.
Desta vez, Sodergergh, um dos diretores mais ativos e produtivos, mostra um grupo de rapazes boas-pintas e belos corpos, excitando jovens curiosas e ardorosas ou mulheres mais maduras com falta de homem, em strip-teases masculinos numa casa de shows, o Xquisite. Uma versão inversa, mais criativa e movimentada que o Crazy Horse de Paris, endereçado aos homens.
Para dar corpo ao filme, Soderberger foi buscar o alto e corpulento ator Channing Tatum, para viver o Magic Mike que sem roupa só de string com protetor de sexo, é capaz de deixar úmida qualquer mulher. E para compor o elenco foi buscar outros espécimes na série policial sanguinolenta da tevê americana, Experts.
A ideia de homens fazendo strip-tease para mulheres não é nova e não se sabe se funciona na realidade, mas já foi usada com sucesso por ingleses, aqui mesmo no Festival de Locarno. Mas os americanos têm mania de fazer remake e, na contraditória sociedade que fica entre puritanismo e Playboy, deve ser garantia de um público feminino e gay.
O filme evidentemente tem um enredo que inclui um jovem de 19 anos, Adam, desempregado, cuja irmã não aprecia sua chance de ser incluído no grupo de Magic Mike, cujos dançarinos são especialistas nos remelexos com os quadris mimando o ato sexual. Enfim, Mike se cansa de suas fãs desavergonhadas e cai de amores pela reservada e contida irmã de Adam, que não é de tirar roupa e nem de frequentar strip-teases.
Outros artigos sobre o Festival de Locarno
Jeanne Moreau, uma velha ranzinza
Por dentro do Festival de Locarno
RodapéNews - Edição de Domingo, 12/08/2012
11 de Agosto de 2012, 21:00 - sem comentários ainda(informações de rodapé e outras que talvez você não tenha visto, associando os fatos) |
Caso Gushiken: um momento indigno do MPF
"Exaustos", ministros Mendes e Barbosa caem nos braços de Morfeu durante Mensalão
Morfeu, o deus grego do sonho, resolveu visitar a sua colega Têmis, deusa grega da Justiça e entronizada na frente do prédio-sede do Supremo Tribunal Federal (STF). Ele aproveitou para dar um pulo no plenário do Pretório Excelso enquanto eram realizadas as sustentações orais feitas pelos defensores constituídos no processo criminal conhecido por Mensalão. E, então, Morfeu aproveitou para abraçar os ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, que cerraram as pálpebras e davam a impressão de sonhar
Deputado apresentará requerimento de convocação do jornalista Policarpo Jr., diretor da revista Veja em Brasília
“Na próxima terça-feira, dia 14, o deputado Dr. Rosinha, do PT do Paraná, irá ao plenário da CPI do Cachoeira fazer o que ninguém teve coragem de fazer até agora: enfrentar a mídia” (aqui chamada de PiG (*).
“Com base em um documento preparado a partir de todo o material enviado à Comissão pela Polícia Federal, o parlamentar vai apresentar um requerimento de convocação do jornalista Policarpo Jr., diretor da revista Veja em Brasília.”
“O parlamentar tem em mãos um quadro completo das ligações escusas do jornalista e da semanal da Editora Abril com a quadrilha de Carlinhos Cachoeira. Um relicário de quase uma centena de interceptações telefônicas feitas pela Policia Federal nas operações Vegas, de 2009 (aquela que conferiu ao brindeiro Gurgel a acusação de “prevaricador” e “chantagista”- PHA) e Monte Carlo, realizada em 29 de fevereiro deste ano.”
http://www.conversaafiada.com.br/pig/2012/08/11/dr-rosinha-enfrenta-o-pig-a-batata-da-globo-assa/
Paciente morre após ficar quatro dias em pronto-socorro de hospital na zona leste de S. Paulo
Um paciente que ficou internado provisoriamente por quatro dias no pronto-socorro do Hospital Municipal Cidade Tiradentes (zona leste de SP) morreu anteontem de infecção generalizada
http://www.agora.uol.com.br/saopaulo/ult10103u1134969.shtml
COM CICLOVIAS PRATICAMENTE INEXISTENTES EM SP, CONTRARIAMENTE AO QUE É PROPAGADO POR SERRA, KASSAB E ALCKMIN, INDÍCE DE MORTES DE CICLISTAS É ALARMANTE
Até, recentemente, tínhamos os seguintes dados:
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60,8 Km para ciclofaixas (80%), entre poucas permanentes, como a do Ibirapuera, e as de finais de semana (maioria) quando vias são interditadas;
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15,2 Km para ciclovias (20%) na cidade de São Paulo (praticamente inexistente)
SBT- 11/08/2012
Vídeo: Pesquisa indica que um ciclista morre todo dia em São Paulo
Todos os dias, um ciclista morre na cidade de São Paulo. Apesar dessa perigosa estatística, muita gente adotou a bicicleta para escapar do trânsito e levar uma vida mais saudável.
http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/?c=23195&t=Pesquisa
LEMBRANDO:
SPTV - Rede Globo - 17/03/2012
Vídeo: Faltam ciclovias e segurança para os ciclistas em São Paulo
Um ciclista reclamou que a ciclovia que beira o Rio Pinheiros só tem cinco acessos em seus 19 quilômetros de extensão. Isso o obriga a se arriscar dividindo as ruas com ônibus e carros.
Pedalar e morrer em São Paulo - por Álvaro Pereira Júnior
De um lado, o conformismo fatalista de quem julga que São Paulo não tem jeito, não é lugar para bicicletas. É uma visão moralista, na mesma linha de "bandido bom é bandido morto", "os problemas do Brasil são culpa de políticos safados" etc. etc.
Na outra ponta, uma tropa que me dá vergonha de ser, eu mesmo, ciclista: os salafistas da bicicleta, gente burra e primitiva que, diante da própria falta de horizontes, transforma o "cicloativismo" na causa de suas vidas. São tão odiáveis quanto qualquer fundamentalista.
Não faz sentido almejar que os ciclistas sejam donos da cidade. Assim como não há por que decretar que a maior cidade do Brasil é um caso perdido para quem pedala
http://www1.folha.uol.com.br/colunas/alvaropereirajunior/1062991-pedalar-e-morrer-em-sao-paulo.shtm
FALÊNCIA DA POLÍTICA DE SEGURANÇA PÚBLICA EM SÃO PAULO
REDUÇÃO DE JUROS: BANQUEIROS FINGEM QUE ACATAM PROPOSTA DO GOVERNO
O Povo
Para Fazenda, bancos ainda não fizeram o bastante
Os bancos reduziram pouco os juros cobrados do tomador final, mesmo depois que o governo os pressionou para que fizessem o repasse da queda da taxa Selic para o custo final do dinheiro. Cortaram modestamente o spread e fizeram um pequeno movimento de aumento da oferta de crédito
http://www.opovo.com.br/app/economia/2012/08/09/noticiaseconomia,
2896155/para-fazenda-bancos-ainda-nao-fizeram-o-bastante.shtml
Reuters
ANÁLISE-Febraban estava certa: o cavalo não quis beber água
SÃO PAULO, 9 Aug (Reuters) - Números parciais dos balanços dos bancos no segundo trimestre consolidaram as suspeitas: o apoio das grandes instituições privadas à campanha do governo brasileiro para ampliar os empréstimos e reduzir os spreads ficou no plano político.
Embora publicamente apoiem a cruzada do governo por juros mais baixos para sustentar o crescimento de longo prazo do país, gigantes como Bradesco, Itaú Unibanco e Santander Brasil mostraram com os resultados do segundo trimestre que, na prática, prevaleceu a ortodoxia da cartilha bancária, que recomenda prudência em tempos adversos, como os de desaceleração econômica e aumento da inadimplência
http://br.reuters.com/article/businessNews/idBRSPE8780A120120809
INTERNACIONAL
JB
Manifestações, com motivações diferentes, agitam a Espanha e o Brasil
Sociólogo analisa os dois movimentos e aponta suas diferenças.
As motivações para as ações são "completamente diferentes, devido a momentos econômicos quase que opostos", afirma o sociólogo Williams Gonçalves, professor de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Mergulhada em uma profunda crise e enfrentando altas taxas de desemprego - que chega a 50% entre os jovens - os espanhóis estão inconformados com a forma que o governo vem lidando com a crise, afirma. "Estão cortando gastos sociais, com demissões, elevações de impostos e austeridade, o que opõe a classe trabalhadora ao governo".
No Brasil, a situação é bem diferente, afirma Gonçalves. O momento econômico favorável, em que o país não tem sofrido grandes distúrbios mesmo com o agravamento da situação internacional, mostra como as motivações são diversas. "O Brasil não está em crise, sofremos um pouco com o cenário internacional, mas ainda registramos crescimento, não há um sentimento de revolta, como em diversos países da Europa", analisa
TELEVISÃO
Record bate Globo em audiência
ESPORTES
FIASCO BRASILEIRO NO FUTEBOL OLÍMPICO
R7
Melhores momentos de México 2x1 Brasil
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Vídeo: Romário detona Mano: “Espero que nunca mais vista a camisa da seleção”
Comentarista da Record culpa o treinador pela prata
ESPN
Após fracasso do Brasil, Romário ataca Mano Menezes e acredita em demissão do técnico
Um dos maiores jogadores da história da seleção brasileira, Romário não poupou críticas ao técnico Mano Menezes após a derrota por 2 a 1 para o México na final do torneio de futebol masculino dos Jogos Olímpicos de Londres. Para o ex-atacante, o treinador deverá ser demitido em breve.
“Quem é ruim se destrói sozinho. Ainda bem que é a última do Mano”, disse Romário durante a transmissão da TV Record. Após fracasso do Brasil, Romário ataca Mano Menezes e acredita em demissão do técnico
Além disso, Romário ainda criticou os critérios de convocação e escalação utilizados pelo treinador da seleção brasileira. "Um técnico que não sabe escalar, não sabe convocar. Ainda bem que estamos vendo hoje a última partida dele na seleção", Romário.
Vale destacar que Romário é um dos principais críticos do trabalho de Mano Menezes. Logo quando o treinador divulgou a lista de jogadores convocados para a Olimpíada. Na ocasião, o ex-atacante disse que a convocação era "uma merda"
GARRA & DETERMINAÇÃO NO VÔLEI FEMININO
Melhores momentos da vitória por 3 sets a 1 do Brasil diante dos EUA
MELHORES MOMENTOS DO BRASILEIRÃO
G1
Veja o jogo de sua preferência
Cida Pedrosa, Poetisa e Candidata
10 de Agosto de 2012, 21:00 - sem comentários aindaTalvez caso único na história recente do Brasil, o Recife possui uma candidata a vereadora que é poetisa, militante literária e socialista em uma só pessoa.
Por Urariano Motta*

Cida Pedrosa
Quem a vê, quem a escuta, não pode adivinhar que na fragilidade física dos seus um metro e cinquenta e seis, articulados em cinquenta e nove quilos, vive uma escritora em que se misturam três pês: poesia, política e partido. De fala sertaneja, da cidade de Bodocó, Cida Pedrosa vem pelo PC do B para tentar um mandato com as armas da poesia e apoio dos camaradas do partido, além de todas as tendências literárias no Recife.
Ou como ela diz nesta entrevista:
“O meu desafio de candidata, que aceitei, é porque eu acho que a minha figura de poeta, de escritora, é em volta de um processo de encantamento, porque a poesia encanta. Se eu puder levar pra essa discussão política, que nós estamos tendo na minha candidatura, o nível de encantamento para fazer com que pessoas que estejam anestesiadas ou sem querer discutir política, possam refletir um pouco mais, e de que a política é feito beber leite de manhã, e de que a política é tão importante quanto ninar o filho à noite, que o nosso filho não vai dormir acalentado e bem se as questões políticas não estiverem bem, então se eu puder contribuir minimamente possível com a participação, que as pessoas pensem que a participação política é importante, eu já cumpri a missão”.
Mas vamos à entrevista.
Urariano Mota: Cida, como você despertou para a poesia?
Cida Pedrosa: Eu sempre li muito, desde pequena. Em Bodocó, a gente só tinha uma salvação pra poder viajar: era ler. Então eu fui leitora muito assídua de gibi, de livro policial de bolso, e daqueles romances safados de bolso, com aquelas coisas que a gente lê no interior quando é pequena. Daí pra literatura foi um passo, comecei a ler literatura sem dor nenhuma. Porque, quando você é viciado em ler, é normal passar de uma leitura para outra. E o meu colégio municipal tinha uma biblioteca enorme, maravilhosa. Aí li os clássicos lá.
UM: O seu pai era agricultor?
CP: A gente tinha um sítio, meu pai criava gado e plantava. Os meus primeiros irmãos todos trabalharam na roça, pra gente conseguir comprar um pouco mais de terra. Quando meu pai casou com a minha mãe não tinha terra alguma, trabalhava de alugado. Depois foi que teve a primeira terra, e com os filhos mais velhos trabalhando pôde comprar um pedaço de chão. Os meus primeiros quatro irmãos não foram à escola. Uma até foi, depois de adulta. E esses irmãos ajudaram à gente e ajudaram papai, pra gente poder vir estudar no Recife. Vim morar na casa do meu irmão Absolon Pedrosa, porque ele fez um acordo com o meu pai, que se ele viesse estudar, ele se daria bem, e traria todos os outros. E ele fez assim, cumpriu.
UM: Você lembra de algum professor na escola, que tenha influenciado você pra literatura?
CP: Não foi um professor que me influenciou não, de verdade. Foi meu pai e seu Zé Pedro, porque eles eram dois grandes contadores de história. A minha leitura começou antes de eu ir pra escola. A leitura do mundo começou de eu ouvir história de trancoso, da boca do meu pai, e da boca do seu Zé Pedro. Então aprendi a gostar de literatura não foi nem com professor nem com livro. Foi com as contações de história do terreiro na minha casa. Meu pai comprava cordel também, trazia da feira e lia os cordéis, pra gente, de noite.
UM: Vocês tinham energia elétrica?
CP: Não, tinha candeeiro. Só veio ter energia elétrica quando eu tinha 12 anos. Não tinha banheiro também não. A gente fazia xixi e cocô no mato. (Ri)
UM: E a água era de jarra, encanada?
CP: Era encanada nada. A gente pegava de açude, tinha um perto de casa, que tinha água, se o mês fosse de chuva, até agosto. Depois de agosto, tinha que buscar num açude mais fundo, mais longe. Desse açude a gente pegava de lata, pro pote. No mais longe a gente ia com um burrico, com umas jarras.
UM: Você chega ao Recife aos 14 anos, você chega e vai estudar que série?
CP: Primeiro ano científico. No Colégio 2001, que era desse meu irmão, que trouxe todos nós, que veio e se organizou. Ele era formado em Veterinária, mas ensinava Geografia no cursinho. (Hoje em dia não pode mais isso, mas antigamente podia.) Isso foi em 1978. Toda a discussão da abertura, final de ditadura, Cajá é preso aqui no Recife, a gente começa a entregar panfleto. No meu colégio, sempre tinha um policial federal na sala, porque ensinavam lá pessoas muito interessantes, que meu irmão chamava pra trabalhar, que não tinham espaço pra trabalho em outros cantos. Aí fui aluna de Natanael Sarmento, de Nanci, mulher de Zé Arlindo, fui aluna de Biu Vicente, de Pedro América, literatura, então eu tive muitos bons professores nesse colégio. E a movimentação cultural e política lá era muito forte. A gente teve o primeiro grêmio, em 78, uma chapa só de meninas, que ganhou. Valéria Nepomuceno, que hoje coordena o Centro Dom Hélder Câmara, o CENDHEC, era dessa chapa.
UM: No Recife se abrem muitos caminhos pra você. Quais foram as primeiras sementes da tua formação socialista?
CP: Eu acho que, quando li Germinal, de Émile Zola, lá no Sertão, alguma coisa se partiu dentro de mim. Agora, livro de esquerda, marxista, eu tive contato aqui no Recife. Eu tive contato coma fala marxista aqui. Tanto do ponto de vista dos professores da minha escola, quanto do meu irmão. Existia toda uma roda em que se discutiam essas coisas, que falava de marxismo, de comunismo, então me interessei demais e comecei a estudar, a ler. Ele tinha uma biblioteca muito boa, e comecei a ler os existencialistas Camus e Sartre, aí eu comecei a ler Lênin, aí li Mao Tsé Tung, nem gostei do Livro Vermelho, achei um xarope da peste. Aí comecei a ler Marx primeiro por outros, porque o Manifesto é lindo, é um poema, não é? Aquilo é um poema, e um poema válido até hoje. Aí quando você vai ler O Capital, não consegue entender. Nunca li. Eu só li textos soltos, porque é muito difícil. Aí você começa a ler pessoas que fazem a releitura de Marx, não é?
UM: E como você definiu o seu caminho “agora vou fazer poesia”?
CP: Quando eu cheguei aqui eu já escrevia, mas eram aquelas trovinhas, que todo adolescente escreve, aquela coisa singela, não tinha uma definição que eu era uma escritora. Quando eu cheguei no meu colégio, eu fui estudar na mesma sala com algumas pessoas que hoje são poetas. Eu já vim e lá com Cícero Belmar, que é meu amigo desde pequena, e foi estudar no mesmo colégio. E na minha sala eu estudei com Raimundo de Moraes, Ricardo Antunes, Eduardo Martins, tinha um foco de gente que gostava de escrever, Lígia Barros, que hoje é editora do Diário de Pernambuco, ela foi minha colega de turma. Wilson Freire, contemporâneo. E a gente gostava de escrever, e tinha maneira de escrever versos coletivos, um dizia um verso, outro dizia outro. E a professora de literatura da minha escola, do primeiro e segundo ano, era minha irmã Flor Pedrosa, que tinha como grande característica essa história de aglutinar os jovens, de puxar os jovens pra pensar. E ela escrevia poesia, e era mulher de esquerda, e grande professora. Era professora daquelas que vão além da sala de aula. A gente ia pra casa dela, depois da escola, ela revisava os textos, ela arengava, “parem de rimar amor com dor”, e ela cortava, dizia “o poema tá gordo, deixa o poema magro”, “onde é que tá o poema, onde é que tá a essência? Veja se essa palavra cabe”. E dizia: “não tenham medo de escrever boceta, boceta é uma palavra”. Essas coisas assim, que vão dando um norte. Acho que ela deu muito norte pra gente.
UM: Na sua formação, quais são os poetas que definiram ou abriram um caminho pra você?
CP: Acho que eu teria sido muito mais infeliz se eu não tivesse lido tanto Drummond e Ferreira Gullar. Acho que no Poema Sujo a minha definição marxista está ali. Eu me tornei absolutamente de esquerda quando o li. Eu já tinha a sensibilidade social, pra dor do outro, pro humanismo, mas eu acho que me disse eu sou marxista quando li Ferreira Gullar.
UM: E como é que surge a sua relação, que eu sei que é intensa, com a chamada poesia marginal do Recife?
CP: Ah, isso é interessante. Já no colégio, a gente tinha um fanzine, um jornalzinho bem pixotinho, chamado Momento Poético. Quem coordenava, ajudava a gente a fazer era a professora Flor. Saíram 6 números, no ano de 79. O colégio tinha uma gráfica, e a gente tirava numa escala maior que a do colégio. Era um jornalzinho, não era só pra distribuir com os meninos do colégio. E na cidade tinha muita gente querendo fazer essa coisa, de publicar. Onde têm 2 escritores, quer se fazer um jornal, é incrível. Aí outros grupos estavam fazendo a mesma coisa. Fátima Ferreira, Samuca, Geni Vieira, tinha um grupo chamado Banda Voou, que fazia um livrinho bem pequenininho, e também tinha um jornalzinho. E aí eu passei no vestibular de Direito. Quando aconteceu isso, o meu namorado da época, Eduardo Martins, que era poeta, foi estudar Letras na Fafire. E lá ele conheceu Chico Espinhara, que já estava lá, veterano. E aí se meteram juntos no movimento estudantil universitário, e também no literário. E os dois foram juntos com Josualdo, que era do curso de História da Federal, e foram pros encontros nacionais. Eram encontros de Letras, e aí tinham outros poetas, de outros estados. Todo encontro estudantil tem aqueles movimentos paralelos. A esquerda trotskista se reúne num canto, a esquerda leninista se reúne noutro, e aí tinha um pessoal de cultura, que o povo chamava a gente de “maluco beleza”, porque quem era de cultura era “maluco beleza”. E aí os meninos se reuniram à parte com os escritores de outros estados, e cada um veio com essa ideia de criar um movimento. Na época, não se definiu como Independente não, se pensou com o nome underground, periférico, alternativo, a gente é que chegou aqui e viu que o melhor nome era Independente. Independente era porque queria manter uma postura política, diante do que acontecia aqui, que era a política de balcão, todo o mundo que publicava, publicava na Fundação Joaquim Nabuco, sob os auspícios de Gilberto Freyre, ou então sempre aquela coisa do poder do Estado ou do poder da direitona. As pessoas esquecem que Gilberto Freyre era um grande intelectual, mas era um homem de direita.
E a gente tinha isso muito claro. A gente amava a Geração 65 de poetas do Recife, mas achava ela, boa parte dela... a gente dizia assim “tudo que nós conquistamos foi via concurso público, ou ralação, nós não temos nada dado, a minha geração não tem nada dado, nós não temos um cargo que seja de conchavo”. E a gente achava que a geração 65 de poesia do Recife estava bem, muito quieta, a gente tinha essa arenga. Depois, a gente viu que não era bem assim.
UM: Porque o poeta Alberto da Cunha Melo, dessa geração. abriu as portas pra vocês, não é?
CP: (Confirmando) Completamente, Alberto. A gente era muito jovem. Depois a gente reconheceu que a Pirata era um grande movimento, alternativo também, e reconhecemos neles... mas primeiro todo o mundo tem que brigar com o que está anterior, pra depois se firmar. E Alberto, aquilo era um homem santo, um homem bom, então Alberto sempre viu na gente, eu tenho vários livros dedicados por ele, que ele diz assim “musa de uma geração rebelada”, porque a gente era muito rebelde mesmo. E ele acolhia isso com uma delicadeza, com um amor, ele achava que o nosso papel era este, se rebelar. Inclusive contra eles. Contra tudo que estava estabelecido. Ele achava que era o papel da gente. E acolhia, e posicionava. Ele era um homem do bem, demais.
UM: Tem uma tendência de se achar que só a literatura produz literatura. Eu acho que realmente a literatura produz literatura, mas existem coisas que não são essencialmente literárias e que produzem literatura. Que fatos emocionais você acha que determinaram o seu caminho para a poesia?
CP: Eu não tenho dúvida disso não. Eu acho que não tenho uma grande obra por conta disso, porque a vida pra mim é muito mais importante que a literatura. O que é mais fundamental pra mim, o que me decidiu pra essa saga de escrever, que é uma coisa muito doída, porque só sabe a dor de escrever quem é escritor, é muito doloroso. Eu acho que a dor do outro é a dor da humanidade, a divisão de classes, isso pra mim foi o que sempre me moveu. É tanto que a minha literatura inicial ela chega a ser quase panfletária, depois é que tomo o meu rumo. Mas no início eu queria tanto ser braço dessa dor, sabe?...
UM: Mas eu quero observar o seguinte: eu quis me referir a um fato essencialmente biográfico que ocorreu na tua vida e te abalou e te levou para a literatura.
CP: Acho que é a vinda de Bodocó pra cá. Eu acho que a minha chegada aqui ela é um susto muito grande. Ela é um susto. Porque eu não saí de uma cidade para outra cidade. Eu saí de uma cidadezinha, um sítio, eu tinha vivências muito próprias, eu costumo dizer que vivi coisas do século XIX, quando as demais pessoas viviam no século XX. Na minha casa se fazia sabão com sebo de bode. Então tinham práticas na minha casa que eram do século XIX, do ponto de vista de sobreviver, de existir. Então, eu conhecia todos os cegos da minha cidade, todos os mendigos, sabia o nome de cada um, mas quando cheguei no Recife vi montanha de cegos, de mendigos, uma horda na verdade, uma horda de pessoas sem nada. Eu acho que isso rachou minha cuca e meu coração. Eu acho que isso foi fundamental. Aí eu começo a escrever pra não enlouquecer.
UM: Tem aquela canção, linda, de Mercedes Sosa, Volver a los 17, voltar aos 17. Pra você, seria volver a que idade? Aos 17, aos 14, aos 15, aos 10?
CP: Se eu pudesse voltar? (Suspira) Olha, eu voltaria com a mais absoluta certeza aos 6 anos. Diante de uma fogueira acesa com seu Zé Pedro e meu pai (a palavra “pai” sai com a voz embargada). Quando seu Zé Pedro ia lá para o sítio, a gente esperava ele como se espera tudo (a melhor coisa) no mundo. Porque ele vinha contar história também. A gente juntava madeira durante o dia, fazia fogueira, e quando era de noite que ele terminava todo o serviço, ele ia tomar banho, botava roupa limpa, era uma expectativa, arrumava um banco, a gente acendia a fogueira de 6 horas, ele sentava no banco. E ali era o teatro. Eu conheço a obra de Leandro de Barros a partir da voz de seu Zé Pedro. Eu conheço alguns contos italianos, clássicos, a partir da voz dele. Então era a magia, era a possibilidade de você viajar de verdade, no reino da baleia e Júlio Verne a partir da voz de um homem que tinha a capacidade enorme de contar histórias. Ele virava bicho, ele virava princesa, ele virava o que quisesse, diante daquela fogueira e diante de nós.
UM: Os poetas independentes, que vêm de sua geração, incorporam a poesia escrita à poesia de recitais. A tradição dos poetas de antes era de serem lidos. Mas os independentes sabem de cor os próprios poemas. Que poema seu você recita agora?
CP: Este:
“Não te direi o simples convite
Pois o meu corpo é dúvida
Cavalga em mim as incertezas
É dessa matéria a minh’alma
Há muitos anos curvas e círculos me habitam
Não te direi poesias de amor
Nem cantarei canções desesperadas
Mas se quiseres trago no peito o cheiro das estações
Na língua a infâmia dos oprimidos
Enfim, eu tenho o colo em chamas
Para fazer morada.” *
UM: Por que você parte de uma trajetória de poesia para uma candidatura eleitoral?
CP: Eu tive muita dificuldade de entender e aceitar essa tarefa. Primeiro eu achava que a minha identidade pública de poeta já era mais do que suficiente, já era muito difícil trabalhar do ponto de vista privado essa identidade pública. Não é simples, porque você é cobrado como uma personagem, você se transforma em personagem da cidade. Isso já era muito complexo pra mim. Eu faço terapia uma vez por semana. E eu sou uma mulher de partido. Eu sou filiada há quase 15 anos ao PC do B. Sempre fui muito chamada pra exercer essa tarefa, mas eu nunca quis, porque eu sempre quis apoiar os companheiros e companheiras. Sempre estive na luta, mas nunca quis estar na frente. E eu vinha tratando isso até há pouco tempo, de entender por que tinha topado (enfrentado). Porque eu tenho que ter missão, não sou missionária, mas eu sempre acho que eu tenho que ter missões. As tarefas, quando eu digo tarefa, é uma palavra marxista. Mas do ponto de vista religioso, e eu sou uma comunista de sacristia, é missão também, aquilo que você pega para tocar como principal na sua vida, ou como para fazer o coletivo. Então, nós estamos num momento de muito desencanto, um dos maiores males que a democracia sofre hoje é o desencanto. É a incapacidade de participar que o ser humano hoje no Brasil tem. Essa impossibilidade que as pessoas têm de ver que a política é importante, que os políticos são importantes, que a gente não pode balizar por baixo, pelos maus políticos. E de que a democracia sempre foi e será feita por políticos. Quando a gente joga numa mesma vala todos os políticos, e diz que político não presta, a gente está jogando na vala a democracia. E só sabe a importância de democracia quem viveu os anos de chumbo. Eu tenho visto um discurso muito reacionário com relação aos políticos, a gente tem que fazer a crítica às práticas, não à instituição, ao congresso nacional, à assembleia legislativa, câmara de vereadores. A gente tem que discutir é a reforma partidária, a reforma política. A gente tem que discutir talvez até a reforma das estruturas, mas não dizer que as estruturas não servem pra nada. A existência independente dessas estruturas é a existência da própria democracia. Então, o meu desafio, que aceitei, é porque eu acho que a minha figura de poeta, de escritora, ela é em volta de um processo de encantamento porque a poesia encanta. Se eu puder levar pra essa discussão política, que nós estamos tendo nessa candidatura, o nível de encantamento para fazer com que pessoas que estejam anestesiadas ou sem querer discutir política, possam refletir um pouco mais, de que a política é feito beber leite de manhã, e de que a política é tão importante quanto ninar o filho à noite, que o nosso filho não vai dormir acalentado e bem, se as questões políticas não estiverem bem, o futuro dele não estará bem, então se eu puder contribuir minimamente possível com a participação, que as pessoas pensem que a participação política é importante, eu já cumpri a missão.
UM: Quais são as suas bandeiras para a sua candidatura a vereadora do Recife?
CP: Por conta do perfil da candidatura, nós temos o caminho da cultura, porque eu sou escritora, e a gente está agregando um povo muito legal, gente muito boa nisso, e nós temos toda uma proposta desde fortalecer o sistema municipal de cultura, com o seu conselho, fortalecer e reformular, porque o conselho na forma é ruim, o fundo de empresas tem que ser financiamento público direto. Reformulação dos editais, porque eles são obscuros, a questão da política municipal, até a coisa da gestão. Você tem uma Fundação de Cultura que nunca fez um concurso público, você não tem um iluminador, um montador de palco, tudo isso é terceirizado... Eu acho que o mandato que se preze é ser voz das vozes.
O outro perfil, porque sou advogada de direitos humanos, é a agregação dos direitos humanos, e a cultura é um direito humano, não consigo separar isso, cultura é um direito tão importante quanto nascer, quanto estar vivo, quanto a saúde. Então a cultura enquanto direito humano na sua forma mais larga. Aí vem o direito à comunicação democrática. Um dos grandes problemas do país hoje, que a gente nunca pensa, é essa coisa da comunicação. Nós temos uma comunicação na mão de 7 famílias, a gente vê com o olhar que o outro quer que a gente veja. As pessoas não têm discernimento do que estão vendo. A gente engole os pratos feitos e frios. Isso não nos dá poder político, então eu acho que a comunicação como direito humano é uma bandeira importante. Aí vêm todas aquelas outras coisas que chamam direitos sociais: saúde, educação, moradia, saneamento. Uma coisa que eu tenho muito discutido é o direito de ir e vir, que a gente pensa que conquistou desde a Constituição de 88, pra mim ele é cerceado o tempo inteiro. Quem está preso na sua casa, porque tem medo de sair, porque tem medo de levar uma bala, não tem direito de ir e vir.
UM: Você vê como unidas cultura e educação, o tipo de educação que temos em nossas escolas?
CP: Eu acho que a escola trata muito mal a questão da cultura, que é vista como entretenimento. A maioria dos professores que dão arte não são pessoas que tiveram formação artística. É dada de forma chata, de forma pouco intelectualizada. No máximo dão um bocado de lápis de cor pros meninos pintarem. Então eu acho que duas coisas inseparáveis são educação e cultura, mas infelizmente nem a nossa escola está preparada pra absorver, e nem o MEC eu acho que esteja pensando nisso, faz um discurso, mas na prática não resolve. Por exemplo, tem uma lei que diz ser obrigatório o ensino de educação musical. Essa lei devia ter sido implementada há dois anos. Eu não acho que esse tema venha sendo tratada de forma correta. E tenho uma coisa mais pra dizer: eu acho que quem deve dar aula de cultura é quem faz cultura. Então se vai dar aula de poesia, quem tem que dar essa aula é o poeta, não pode ser professor que estudou Letras. Quem tem que dar aula de prosa é escritor que escreve prosa. Quem tem que dar aula de artes plásticas é pintor. Quem tem que dar aula é quem aprendeu o ofício, é quem recebeu o dom, seja de Deus ou do Diabo. A gente não pode botar uma pessoa que apenas aprendeu técnica pra dar aula do que ela não sente e nem sabe.
UM: Você tem bandeira específica para a mulher?
CP: A gente vive um momento muito especial no país. Essa questão de empoderamento feminino, a partir da eleição de Dilma, cria um novo parâmetro. Nós temos no poder legislativo em torno de 10 a 11 por cento de representação de mulheres. E dessa representação feminina muito poucas mulheres tratam de verdade a luta de gênero nas câmaras e assembleias. São mulheres, mas muitas são filhas do político tal, não têm nenhuma história ligada à luta política, então elas nem tratam a luta política do ponto de vista tradicional nem da luta de gênero. O que é que está precisando? Nós temos em nosso partido a maior representação feminina dos partidos no Brasil e no congresso. Quarenta por cento da nossa representação no congresso é de mulheres. E todas elas, do partido, no congresso, tratam essa questão da luta de gênero, porque nós entendemos que não podem existir independência, soberania, se existir diferença de gênero. Se o homem e a mulher não estiverem juntos, não existe soberania se não existir a voz da mulher.
UM: Pergunta de advogado do diabo: você não teme que, com a sua formação poética, literária, vá se decepcionar com a prática cotidiana de uma câmara de vereadores?
CP: Temo, me apavoro, e já estou tratando da terapia. (Risos.) E quero dizer mais uma coisa: o que mais me surpreende na minha candidatura é a quantidade de respostas afetivas que eu tenho dos amigos, dos artistas. Eu posso até não ganhar, mas já ganhei. Eu já sou uma outra pessoa. Luciano Siqueira dizia pra mim, quando eu não queria me candidatar, que não era mistério, que só era a trajetória de vida das pessoas. Eu não concordo com ele porque tem mistério pra caramba. Ainda estou cheia de mistério. Mas do ponto de vista do que você agrega, você não é um factoide, você agrega o que você agregou a vida inteira. É só isso.
*Urariano Motta é jornalista, escritor e colunista do Vermelho, entre outros veículos
Entrevista publicada originalmente no Vermelho
São as Armas; Mas Não Só as armas
9 de Agosto de 2012, 21:00 - sem comentários aindapor Michael Moore [*]
Amigos:
Desde que Caim enlouqueceu e matou Abel sempre houve humanos que, por uma razão ou outra, perdem a cabeça temporária ou definitivamente e cometem atos de violência.
Durante o primeiro século de nossa era, o imperador romano Tibério gozava, jogando suas vítimas na ilha de Capri, no Mediterrâneo. Gilles de Rais, cavalheiro francês aliado de Joana D'Arc, na Idade Média, um dia, enlouqueceu e acabou assassinando centenas de crianças. Apenas umas décadas depois, Vlad, o Empalador, na Transilvânia, tinha inúmeros modos horripilantes de acabar com suas vítimas; o personagem de Drácula foi inspirado nele.
Em tempos modernos, em quase toda as nações há um psicopata ou dois que cometem homicídios em massa, por mais estritas que sejam suas leis em matéria de armas: o demente supremacista branco, cujos atentados na Noruega cumpriram um ano nesse domingo; o carniceiro do pátio escolar em Dunblane, Escócia; o assassino da Escola Politécnica de Montreal; o aniquilador em massa de Erfurt, Alemanha...; a lista parece interminável. E agora o atirador de Aurora, na sexta-feira passada. Sempre houve pessoas com pouco juízo e prudência e sempre haverá.
Porém, aqui reside a diferença entre o resto do mundo e nós: aqui acontecem DUAS Auroras a cada dia de cada ano! Pelo menos 24 estadunidenses morrem a cada dia (de 8 a 9 mil por ano) em mãos de gente armada, e essa cifra inclui os que perdem a vida em acidentes com armas de fogo ou os que cometem suicídio com uma. Se contássemos todos, a cifra se multiplicaria a uns 25 mil.
Isso significa que os Estados Unidos são responsáveis por mais de 80% de todas as mortes por armas de fogo nos 23 países mais ricos do mundo combinados. Considerando que as pessoas desses países, como seres humanos, não são melhores ou piores do que qualquer um de nós, então, por que nós?
Tanto conservadores quanto liberais nos Estados Unidos operam com crenças firmes a respeito do “porquê” desse problema. E a razão pela qual nem uns e nem outros podem encontrar uma solução é porque, de fato, cada um tem a metade da razão.
A direita crê que os fundadores dessa nação, por alguma sorte de decreto divino, lhes garantiram o direito absoluto a possuir tantas armas de fogo quanto desejem. E nos recordam sem cessar que uma arma não dispara sozinha; que “não são as armas, mas quem mata são as pessoas”.
Claro que sabem que estão cometendo uma desonestidade intelectual (se é que posso usar essa palavra) ao sustentar tal coisa acerca da Segunda Emenda porque sabem que as pessoas que escreveram a Constituição unicamente queriam assegurar-se de que se pudesse convocar com rapidez uma milícia entre granjeiros e comerciantes em caso de que os britânicos decidissem regressar e semear um pouco de caos.
Porém, têm a metade da razão quando afirmam que “as armas não matam: os estadunidenses matam!”. Porque somos os únicos no primeiro mundo que cometemos crimes em massa. E escutamos estadunidenses de toda condição aduzir toda classe de razões para não ter que lidar com o que está por trás de todas essas matanças e atos de violência.
Uns culpam os filmes e os jogos de videogame violentos. Na última vez em que revisei, os videojogos do Japão são mais violentos do que os nossos e, no entanto, menos de 20 pessoas ao ano morrem por armas de fogo naquele país; e em 2006 o total foi de duas pessoas! Outros dirão que o número de lares destroçados é o que causa tantas mortes. Detesto dar-lhes essa notícia; porém, na Grã-Bretanha há quase tantos lares desfeitos, com um só dos pais assumindo o cuidado dos filhos quanto nos EUA; e, no entanto, em geral, os crimes cometidos lá com armas de fogo são menos de 40 ao ano.
Pessoas como eu dirão que tudo isso é resultado de ter uma história e uma cultura de homens armados, “índios e vaqueiros”, “dispara agora e pergunta depois”. E se bem é certo que o genocídio de indígenas americanos assentou um modelo bastante feio de fundar uma nação, me parece mais seguro dizer que não somos os únicos com um passado violento ou uma marca genocida.
Olá, Alemanha! Falo de ti e de tua história, desde os hunos até os nazistas, todos os que amavam uma boa carnificina (tal qual os japoneses e os britânicos, que dominaram o mundo por centenas de anos, coisa que não conseguiram plantando margaridas). E, no entanto, na Alemanha, nação de 80 milhões de habitantes, são cometidos apenas 200 assassinatos com armas de fogo ao ano.
Assim que esses países (e muitos outros) são iguais a nós, exceto que aqui mais pessoas acreditam em Deus e vão à Igreja mais do que em qualquer outra nação ocidental.
Meus compatriotas liberais dirão que se tivéssemos menos armas de fogo haveria menos mortes por essa causa. E, em termos matemáticos, seria certo. Se temos menos arsênico na reserva de água, matará menos gente. Menos de qualquer coisa má – calorias, tabaco, reality shows – significará menos mortes. E se tivéssemos leis estritas em matéria de armas, que proibissem as armas automáticas e semiautomáticas e prescrevessem a venda de grandes magazines capazes de portar milhões de balas, atiradores como o de Aurora não poderiam matar a tantas pessoas em pouquíssimos minutos.
Porém, também nisso há um problema. Há um montão de armas no Canadá (a maioria rifles de caça) e, no entanto, a conta de homicídios é de uns 200 ao ano. De fato, por sua proximidade, a cultura canadense é muito similar à nossa: as crianças têm os mesmos videojogos, veem os mesmos filmes e programas de TV; mas, no entanto, não crescem com o desejo de matar uns aos outros. A Suíça ocupa o terceiro lugar mundial em posse de armas por pessoa; porém, sua taxa de criminalidade é baixa. Então, por que nós? Formulei essa pergunta há uma década em meu filme “Tiros em Columbine” (o "link" leva à primeira das oito partes do documentário) , e esta semana tive pouco que dizer porque me parecia ter dito há dez anos o que tinha que dizer; e acho que não fez muito efeito; exceto ser uma espécie de bola de cristal em forma de filme.
Naquela época eu disse algo, que repetirei agora:
1. Os estadunidenses somos incrivelmente bons para matar. Acreditamos em matar como forma de conseguir nossos objetivos. Três quartos de nossos Estados executam criminosos, apesar de que os Estados que têm as taxas mais baixas de homicídios são, em geral, os que não aplicam a pena de morte.
Nossa tendência a matar não é somente histórica (o assassinato de índios, de escravos e de uns e outros na guerra “civil”): é nossa forma atual de resolver qualquer coisa que nos inspira medo. É a invasão como política exterior. Sim, lá estão Iraque e Afeganistão; porém, somos invasores desde que “conquistamos o oeste selvagem” e agora estamos tão enganchados que já não sabemos o que invadir (Bin Laden não se escondia no Afeganistão, mas no Paquistão), nem porque invadir (Saddam não tinha armas de destruição massiva, nem nada a ver com o 11-S).
Enviamos nossas classes pobres para fazer matanças, e os que não temos um ser querido lá, não perdemos um só minuto de um só dia em pensar nessa carnificina. E agora, enviamos aviões sem pilotos para matar (drones), aviões controlados por homens sem rosto em um luxuoso estúdio com ar condicionado em um subúrbio de Las Vegas. É a loucura!
2. Somos um povo que se assusta com facilidade e é fácil de ser manipulado pelo medo. De que temos tanto medo, que necessitamos ter 300 milhões de armas de fogo em nossas casas? Quem vai machucar? Por que a maior parte dessas armas se encontra nas casas de brancos, nos subúrbios ou no campo?
Talvez, se resolvêssemos nosso problema racial e nosso problema de pobreza (uma vez mais, somos o número um com maior número de pobres no mundo industrializado) teria menos pessoas frustradas, atemorizadas e encolerizadas estendendo a mão para pegar a arma que guardam na gaveta. Talvez, cuidaríamos mais uns dos outros (aqui vemos um bom exemplo disso).
Isso é o que penso sobre Aurora e sobre o violento país do qual sou cidadão. Como mencionei, disse tudo nesse filme e se quiserem, podem assisti-lo e partilhá-lo sem custo com os demais. E o que nos faz falta, amigos meus, é valor e determinação. Se vocês estão prontos, eu também.
[*] Cineasta e escritor estadunidense
O artigo original, em inglês, encontra-se em: “It's the Guns – But We All Know, It's Not Really the Guns” e foi publicado em 24/7/2012.
Esta tradução foi feita a partir da versão em castelhano do La Jornada realizada por Jorge Anaya em: “Son las armas, pero no sólo las armas”
Esta versão em português foi extraída de Resistir e foi inicialmente publicada no sítio do PCB e no Adital