Ícones como Genoino que pegaram em armas para lutar contra a ditadura militar sempre foram referências em minha vida desde que comecei a me interessar pela história que não era contada na escola. Sim, porque todos como eu que nasceram durante a ditadura militar não tiveram acesso a um currículo livre de história, aliás eu não tive história nos meus primeiros 8 anos escolares, só ‘estudos sociais’ e ‘educação moral e cívica’. Não me tornei historiadora impunemente, acho que a escolha de modo inconsciente era para sanar a angústia de querer saber e não ter como.
Quando começaram as lutas pela anistia não entendia direito os noticiários, mas os atuais tucanos como Edmur Mesquita (vejam vocês, eles não nasceram escrotos), frequentavam as comunidades de base e líamos vorazmente e discutíamos vorazmente e ouvíamos os primeiros presos políticos libertos que haviam sido torturados e outros que voltavam do exílio. Chegou até a minha mão 1984 de George Orwell e eu tinha certeza qual seria a tortura da sala 101, ouvi e li depoimentos de mulheres que haviam sido torturadas como o protagonista de 1984.
E padre Porfírio nos alimentava com mais e mais livros de filosofia e um mundo angustiante e solidário se descortinava para aquela adolescente ávida de informação. A mãe se angustiava com meus sumiços e conversas, o Lula apareceu e com ele tantos outros adultos que fariam parte da minha trajetória de formação como ser humano, como cidadã, como sujeito político.
Ao final da adolescência e a entrada na História em 1984 (olha que coincidência) me levou para a luta das Diretas-Já e a manter o forte vínculo com as lutas da Baixada Santista. O movimento estudantil não me atraía, havia tucanos demais na minha universidade, eram nas favelas de Cubatão que eu via a luta acontecer que gostava de discutir o Homem que virou suco, que lutávamos contra a poluição e as crianças que nasciam anencefálicas. Minhas batalhas foram ficando cada vez mais amplas: lutar pelo socialismo, lutar contra o machismo, lutar contra o racismo, lutar pelos direitos humanos.
Tornei-me professora desde o primeiro ano da universidade, foi como sobrevivi em São Paulo, dando aula de educação de adultos e depois para crianças e adolescentes.
E foi na Vila, em 1993 que conheci mais de perto um dos meus ídolos de adolescência: José Genoino, o guerrilheiro do Araguaia. Genoíno, pai de meu aluno Ronan.
Lembro de histórias engraçadas de sala de aula , pelas intervenções que Ronan fazia, eu dizia a ele: você só poderia ser filho do Genoino.
Em 2005 como todos que lutaram arduamente para ver o PT no poder eu chorei. Chorava de raiva por ver o nome de toda uma luta na lama, chorava de raiva porque eu já sabia que sem democratização das comunicações o discurso único que criminaliza a luta dos trabalhadores seria o maior inimigo da classe trabalhadora. Chorava de raiva porque já havia Orkut e eu avaliava o estrago que isso faria à esquerda, à luta à esquerda.
No Orkut via companheiros de esquerda putos da vida e xingando muito. Xingando Dirceu, xingando Genoino, como vejo até hoje e não era o discurso raivoso da direita, mas de todo modo era um discurso raivoso.
Comecei a blogar por causa da cobertura porca feita na imprensa sobre o Caixa 2 do PT.
Não consigo aceitar que uma pessoa seja condenada por ocupar a presidência do partido, como no caso de Genoino. Não há nada que o incrimine, nada, só a teoria porcamente lida pelo STF do ‘domínio do fato’ que só serve pra condenar políticos petistas.
Li todo o processo do Dirceu, condenado pela mesma teoria, o processo do Dirceu está na rede para qualquer um ler, não há um documento assinado por ele, nada.
Li as reportagens de Conceição Lemes que mostra que Pizzolato também não poderia ter praticado o que STF o acusa de praticar, há documentos, datas, nada bate.
Um julgamento de exceção, um julgamento partidário, um julgamento vergonhoso para história da Justiça brasileira onde até juristas da direta reconhecem que réus foram condenados sem provas.
Por causa deste julgamento de exceção perdi o meu trabalho. Fui demitida. Sofri assédio moral por ser uma professora de história que não faz concessões, por não repetir o discurso da Veja, por ousar manter a integridade, o compromisso com os fatos, doa a quem doer.
Portanto, perder alguns ‘amigos’ no Facebook ou twitter por defender incondicionalmente o direito dos réus à ampla defesa (e foram injustiçados porque foram condenados sem provas e não tiveram direito à ampla defesa), não é nada pra mim.
Pior é perder o senso de justiça e agir feito manada repetindo rottweiler raivoso sem ao menos se dar ao trabalho de se informar.
No futuro, distante deste transe midiático, espetacularizado nas tevês, rádios e jornalões, historiadores sérios mostrarão como este julgamento foi de exceção e como se condenou, torturou e encarcerou mil vezes os rebeldes que ousaram resistir à ditadura militar.
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