Fabrício Lima sobre a perseguição de Aécio a 66 twiteiros: é um ataque frontal aos dispositivos do recém-aprovado Marco Civil da Internet
September 10, 2014 18:31 - Pas de commentaireNão é apenas por 66 perfis
Por Fabrício Lima, especial para o Maria Frô
10/09/2014
Não deu muito tempo das primeiras notícias de que 66 perfis no twitter eram alvo de ataque judicial do presidenciável Aécio Neves até o processo de 30 páginas chegar às minhas mãos. Antes da página 10 eu estava estarrecido. Nem tanto pelas práticas de silenciamento de opiniões divergentes, muito comuns partindo do candidato, mas pelo festival de absurdos redigidos pela agência de advogados paulista Opice Blum.
O processo não é meramente uma retaliação à 66 perfis opositores, é um ataque frontal aos dispositivos do recém-aprovado Marco Civil da Internet.
Para quem não sabe (ou não se recorda) o Marco Civil da Internet é uma lei defensiva de caráter popular que surgiu em resposta à proposta da PL 84/1999 do então senador Eduardo Azeredo (PSDB)*, que foi prontamente apelidada pelos ciberativistas de AI-5 digital ou ACTA/PIPA/SOPA brasileiro. O Marco Civil foi desenhado durante um processo colaborativo onde qualquer cidadão poderia ajudar a redigi-lo.
O resultado das intensas discussões entre distintos setores da sociedade civil resultou em um Marco Regulatório tido como referência mundial e objeto de celebração por nomes como Tim Berners-Lee, Javier Toret e Julian Assange.
Para entender o tamanho da aberração criada por Aécio Neves e seus advogados, precisamos recordar o tripé de princípios básicos fundamentais que pautam o recém Marco Civil da Internet aprovado pelo Congresso e sancionado pela presidenta da República:
Liberdade na rede: trata-se do direito de que cada cidadão brasileiro poder acessar, criar e compartilhar qualquer tipo de conteúdo (salvo os conteúdos que infrinjam a Constituição Brasileira passíveis de punição nos códigos criminais existentes) impedindo, por exemplo, que conteúdos já divulgados na Internet, que não se caracterizem como ofensivos, sejam retirados do ar antes de uma decisão judicial. Possibilitará que reportagens, documentários e conteúdos de entretenimento continuem disponíveis para acesso de todos.
Privacidade na rede: trata-se da garantia a confidencialidade das mensagens e dados do usuário na rede, obtidos através de cadastros e formulários. As empresas deverão manter essas informações arquivadas por até 6 meses, mas o acesso à elas só poderá ser feito por decisão judicial, como um sigilo telefônico ou bancário.
Neutralidade da Internet: as empresas provedoras de pacotes de Internet passam a não poder mais diferenciar valores de acordo com conteúdos ou páginas acessadas, bem como limitar a velocidade para determinados sites ou ferramentas. Dados são dados, não importa se tratam-se de vídeos, redes sociais, ou qualquer outro tipo. As empresas continuam vendendo pacotes baseados em velocidade, mas o usuário utiliza a Internet como quiser sem restrição por “tipo” de dado. Ou seja, nenhum provedor pode lhe cobrar a mais para você acessar o youtube seja para ver, baixar ou subir vídeos, ou vender pacotes de acesso para você manter um blog ou acessar o Facebook, como as tvs por assinatura fazem com os canais pagos.
Voltando ao processo 1081839-36.2014 movido por Aécio Neves contra 66 perfis do twitter: o ataque ao Marco Civil já começa na segunda folha, quando o requerente Aécio Neves da Cunha requisita ao Twitter Inc, “em até 48 horas sob pena de multa”, os dados cadastrais dos 66 perfis. O artigo 15 do Marco Civil da Internet é bem claro em suas disposições sobre as obrigações do provedor de aplicação. Não cabe ao provedor de aplicação sofrer as retaliações por conta das atividades do usuário em sua plataforma, salvo a recusa de remover conteúdo considerado ilegal após o devido julgamento.
Mas o horror está mesmo na página 9 da peça da Opice Blum, quando a defesa do processo alega que os 66 perfis pretendem “retirar a Neutralidade da Internet, manipular informações e tornar a grande rede um palco para mentiras e crimes contra a honra”. Não vamos aqui entrar no mérito se houve neste trecho uma cavalar dose de má-fé ou um total desconhecimento do terreno de atuação por parte da agência de advocacia (o que é igualmente grave).
O fato é que o conceito de Neutralidade da Internet, como é conhecido internacionalmente desde que Tim Wu, professor Columbia Law School, publicou há 13 anos a sua definição é, exatamente, como consta no Marco Civil, muito longe da definição atribuída por Aécio e seus advogados.
Entre suposições e acusações subjetivas em sua argumentação, o processo impetrado pelo candidato Aécio Neves é um ataque ao princípio da Privacidade, desfigurando o princípio da Neutralidade da Rede para, enfim, derrubar o princípio da Liberdade – princípio este aliás que, dado o histórico, nunca foi o forte do referido candidato.
Nota do Maria Frô: Azeredo para quem não se recorda é o principal acusado do Mensalão Mineiro. Pesa sobre ele acusações de crimes de peculato e lavagem de dinheiro. Em 7 de fevereiro deste ano, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a condenação de Azeredo a 22 anos de prisão. Ele teria desviado recursos do Bemge (Banco do Estado de Minas Gerais), extinto, e das estatais mineiras Copasa e Cemig para sua campanha à reeleição ao governo de Minas Gerais, em 1998. Em valores atuais, seriam cerca de R$ 9 milhões. Como o processo já no STF, Azeredo renunciou ao cargo para perder o foro privilegiado e o processo voltar à primeira instância, onde corre o processo de outros acusados do Mensalão mineiro que não tinha cargo legislativo. De acordo com a Folha, aliados do senador Aécio Neves (PSDB-MG), à época pré-candidato tucano à Presidência da República, faziam pressão nos bastidores para que o caso do mensalão mineiro não atrapalhasse a campanha.
Dilma: a infra-estrutura mais estratégica para o país é a banda larga
September 10, 2014 15:23 - Pas de commentaireA presidenta e candidata à reeleição Dilma Rousseff foi a primeira candidata a aceitar o convite das instituições e coletivos que compõem a Campanha Banda Larga é um Direito Seu para dialogar com ativistas digitais e especialistas na área de infraestrutura de telecomunicação.
O encontro aconteceu ontem (10/09) na sede dos Sindicatos dos Engenheiros. Ela foi sabatinada sobre o tema com vistas à universalização da banda larga no Brasil. Ativistas e acadêmicos questionaram a candidata à reeleição também sobre políticas públicas como Pontos de Cultura, uso de software livres pelos órgãos do Estado Brasileiro, o fomento do desenvolvimento de softwares, a segurança informacional e outros temas.
A presidenta ouviu as questões sem deixar de responder nenhuma delas e surpreendeu o público presente apresentando vasto conhecimento sobre a questão.
Ao avaliar a qualidade da banda larga no país ela concordou com o público especialista que a qualidade da nossa banda larga é ‘péssima’. Dilma defendeu a universalização da banda larga como política de Estado e não feita por decreto.
Dilma falou também sobre segurança e soberania nacional e replicou o professor e ativista Sergio Amadeu, assim como fez antes com Pedro Ekman sobre o caso Snowden. Para ela, não foi o caso Snowden que foi o epicentro pra aprovação do marco civil e sim a organização e pressão da sociedade civil para a sua elaboração e aprovação. A presidenta lembrou aos ativistas e acadêmicos a importância de se manter a mobilização para o processo de Regulamentação do Marco Civil.
Ao tratar do caso Snowden, em relação aos sistemas de intrusão, a presidenta mostra que está atenta à complexidade da indústria de espionagem a ponto de um funcionário e baixo escalão ter acesso a tantas informações. Ela chegou a brincar com Sergio Amadeu: “Ao nos espionar, inovam” (referindo-se a robustez da tecnologia utilizada na indústria de espionagem). Para a presidenta garantir a proteção de um país não se reduz ao Estado usar softwares livres e criptografia, mais do que isso é garantir o fomento da produção de tecnologia própria (dos computadores aos aplicativos passando pela criptografia. A presidenta ressaltou ainda que o Estado brasileiro não pode ser só reativo a casos de intrusão
A presidenta passou mais de duas horas discutindo o assunto com especialistas na área. Ela recebeu vários documentos das associações que compõe a campanha Banda Larga é um Direito Seu e se comprometeu a fortalecer os Pontos de Cultura, telecentros, mídia livre, rediscutindo seus formatos com a sociedade civil e com a criação de políticas públicas para o fomento da produção de conteúdos e aplicativos nacionais.
A presidenta sinalizou muitas coisas interessantes ao longo do encontro: a valorização do diálogo, a necessidade de setores estratégicos no país se tornarem políticas de Estado, a importância da organização da sociedade civil para fazer o país avançar em questões cruciais como o Marco Civil e a Universalização da banda larga. Vale a pena ouvir o áudio na íntegra.
Veja alguns trechos do debate que gravei ao longo do encontro.
Ouça o áudio na íntegra aqui, role a barra até mais ou menos 34 minutos quando efetivamente começa a gravação:
Ou Marina Silva não conhece o Brasil ou mente deliberadamente sobre a Petrobras e sobre a inflação
September 9, 2014 11:03 - Pas de commentaireComo me atenho ao debate político e esse sem dados não se sustenta, tenho de ouvir o que Marina propõe e avaliar suas propostas. Assim assisti a entrevista da candidata Marina Silva ao Jornal da Record. Ao vê, vem a questão proposta no título do post: Marina mente ou não conhece o país no qual disputa as eleições presidenciais?
O que Marina fala sobre o quadro econômico brasileiro e sobre a Petrobras briga com a realidade dos fatos e, infelizmente, no Jornal da Record nenhum dos jornalistas da bancada lhe questionaram sobre a veracidade ou não de suas acusações.
Vamos ouvi-la:
Agora, vamos analisar o que ela afirmou.
Marina diz que vivemos a beira de um abismo econômico, diz que estamos vivendo alta inflacionária e numa volta de 180 graus da velha Marina ex-petista para a neoMarina palatável até aos militares viúvos da ditadura, ela repete o discurso neoliberal de “autonomia do Banco Central. “Autonomia” que como bem argumentou Jorge Furtado significa:
tirar do governante, eleito pelo nosso voto, o poder de guiar o desenvolvimento segundo critérios sociais, protegendo o país do ataque de especuladores e garantindo renda e empregos, e entregar este poder ao tal mercado, hereditário e eleito por si mesmo, sempre predador e zeloso em garantir a sua parte antes de lamentar os danos sociais causados por seus lucros. (Ver Espanha, Grécia, EUA, Finlândia, etc.) Jorge Furtado.
A NeoMarina propõe o tripé macroeconômico dos neoliberais, a ponto de os próprios tucanos cobrarem autoria da política neoliberal pregada pela neoMarina. De acordo com o economista da campanha de Aécio que ironizou as metas econômicas do programa apresentado por Marina, o tripé com metas de inflação, superávit primário e câmbio flutuante foi apresentado por Armínio Fraga, o que torna as propostas de Marina meras cópias. Para quem não sabe, Armínio Fraga foi o ex-presidente do Banco Central no governo de Fernando Henrique Cardoso e durante a campanha Aécio o anunciou como provável ministro da Fazenda.
— Quando olho o programa de Marina, está lá: vamos fazer o que Armínio Fraga já fez. E como Armínio Fraga está na nossa equipe, fico com o original. Mansueto Almeida, economista da campanha tucana de Aécio Neves
Agora vamos aos dados da realidade, que sequer a mídia concentrada, monopolizada e declaradamente anti-Dilma e anti-PT pode esconder, embora nunca anuncie em suas capas ou em seus longos editoriais do Jornal Nacional:
Cadê o caos anunciado por Marina, num país que vive pleno emprego, com inflação em junho 0,1%?
Além disso Marina no melhor estilo de ventríloquo tucano faz acusações ao governo Dilma, ao PT e até mesmo Lula que poderiam bem estar na boca de Álvaro Dias, mas elas também não se sustentam. Por exemplo, Marina diz que a Petrobras está a beira da falência e que isso se deve à corrupção do PT. Ou Marina não conhece a Petrobrás ou mente deliberadamente. Primeiro, porque o governo petista contra toda a mídia monopolizada e a oposição reacionária apostou no Pré-Sal (riqueza aliás que Marina sinaliza privatizar e que desmente quando é confrontada) e em nenhum momento da fala de Marina ela lembra por exemplo, do afundamento da Plataforma P37 ou da luta dos petroleiros que enfrentaram a sanha privatista de FHC, chegando em 1995 a ocuparem as refinarias por 35 dias seguidos, mesmo sob a ameça do exército invadi-las.
Dilma lembrou da Plataforma P37 e o prejuízo dado de 1,5 bi na entrevista ontem do Estadão:
A neoMarina malandramente se esquece de que o delator tem contratos com a Globo, malandramente repete em suas acusações a capa da Veja, capa manjadíssima com seu costumeiro assassinato de reputações e foge da questão sobre as relações perigosas entre o delator e Eduardo Campos. Ao menos nesta os entrevistadores da Record a confrontaram sobre o uso de dois pesos e duas medidas no caso no novo ‘escândalo’ da Petrobras.
Em suas acusações a Dilma, Marina sequer considerou o fato que o delator premiado não foi escolha de Lula ou Dilma, pois o corrupto é funcionário de carreira da Petrobras desde os tempos da Ditadura Militar, desde 1978!
A Neomarina se esquece de sua própria trajetória quando no PT votou junto com seu partido contra medidas neoliberalizantes de FHC em relação à Petrobras como a quebra do monopólio estatal e o modelo de concessão para exploração de petróleo e a reforma administrativa, que cortou benefícios de servidores públicos.
Mas o que mais espanta é o desconhecimento de Marina sobre a Petrobras, como uma candidata à presidência pode dizer no horário nobre que a Petrobras está a beira da insolvência sendo a 9a empresa do mundo, a terceira maior em reserva, a ÚNICA de todas as 10 maiores petroleiras do mundo a aumentar a sua produção em 2013?
Como uma candidata a presidência da República pode dizer que a Petrobras que suplantou a Ambev e ocupa hoje a primeira empresa da América Latina e cujas ações preferenciais já acumularam alta de 23% em 2014?
Como uma candidata à presidência da República pode dizer que a Petrobras está a beira de falir se até 2018 ela terá 20 novas plataformas?
Leia também:
http://mariafro.com/2014/09/03/44572/
http://mariafro.com/2014/07/04/producao-do-pre-sal-bate-novo-recorde-apesar-da-midia-tucana/
http://mariafro.com/2014/09/04/sabe-aquele-brasil-desgovernado-a-bancarrota-que-passa-no-pig-entao/
A nota do viúvos da Ditadura em apoio a Marina, a Capa do Correio Braziliense e uma sombra sempre presente
September 9, 2014 8:19 - Pas de commentaireOito meses após a posse de Dilma Rousseff à Presidência da República, sob ataque frenético da mídia monopolizada que desejava de todas as maneiras desestabilizar o governo da presidenta petista, o Estadão publicou esta imagem:
A foto foi intencional. O fotógrafo depois que recebeu um prêmio de 8 mil dólares revelou que queria fazer algo ‘forte’ que, segundo ele, representasse o momento político.
Dilma é uma presidenta com história de resistência à Ditadura militar: aos 19 anos foi presa e torturada. Os militares reacionários, viúvos da ditadura militar, que comemoram no Clube Militar do Rio de Janeiro o golpe de 1964 como se fosse algo bom para o país, odeiam Dilma Rousseff, odeiam o PT, porque os associam ao governo trabalhista de Jango, legitimamente eleito. Governo este que a partir de um golpe interrompeu a democracia no país por mais de duas décadas e instaurou sob comando dos militares golpistas um regime de exceção que prendeu, exilou, torturou e matou seus opositores.
Não é à toa que além de todas as notas desrespeitosas que os militares viúvos da ditadura lançaram contra a presidenta ao longo de seu mandato, a campanha grotesca que fizeram contra ela para que não fosse criada a Comissão Nacional da Verdade, agora, em ano eleitoral, eles soltam nota de apoio à Marina Silva.
O curioso desta nota é que mesmo reconhecendo todos os problemas da candidata e de seu programa eles optam por Marina como esperança pra destruir o PT. Veja o trecho de revanchismo na nota (aliás, revanchismo esse que anima o coração de muitos opositores do PT à esquerda e à direita do espectro político nacional):
Marina Silva, ex-petista, com um vice-presidente cuja campanha foi financiada pela Monsanto, apoiada pelos herdeiros de Olavo Setúbal do banco Itaú (não é gratuito seu discurso insistente na “autonomia do banco central”, fórmula manjada da Cia para dominação dos países do terceiro mundo e que alguns candidatos neoliberais compram com naturalidade como se a 6a economia do planeta ainda fosse um país da década de 1970).
Assim segue Marina ao lado de banqueiros, do agronegócio, de pastores midiatizados que se opõem publicamente às principais bandeiras dos direitos humanos com discurso neoliberalizante nas falas e nos programas (acusados de plágio pelo PSDB e outras instituições como aqui, aqui, aqui. Para onde caminhará nosso cenário político? As urnas dirão em 5 de outubro. Por hora, a mídia monopolizada continua cotidianamente a minar e desestabilizar o governo de Dilma com a fabricação de escândalos e manipulações de notícias em suas páginas de jornais e revistas, nas estações de rádio e tv, em seus portais na web e nas redes sociais para ver se seu sonho de derrubar Dilma transpassando-a com uma espada ou estraçalhando-a sob a mira de uma metralhadora, traduzido em suas fotos premiadas, escolhidas cuidadosamente para estampar em suas capas, se realiza.
A capa do ‘Correio Braziliense’
Por Venício A. de Lima em na edição 815 do Observatório da Imprensa
09/09/2014
A foto abaixo (11,8 x 19,6 cm, na edição original) está na primeira página da edição de segunda-feira (8/9) do Correio Braziliense (ver aqui). É de autoria do fotógrafo Daniel Ferreira, que trabalha para o Correio e para a D.A. Press, ambos do grupo dos Diários Associados.
Estando na capa, por óbvio, trata-se de uma escolha e é de responsabilidade dos editores do jornal.
Observe o leitor(a) que a foto coloca deliberadamente o rosto da presidente da República, Dilma Rousseff, na mira de uma metralhadora do carro blindado do Exército Brasileiro, que desfila na parada de 7 de setembro, em Brasília.
Qual a mensagem implícita/explícita na foto?
É normalmente aceito como sendo de Confúcio, filósofo chinês que viveu no século V antes de Cristo, a conhecida frase “uma imagem vale mais que mil palavras”. Os que vivemos no mundo contemporâneo sabemos que a afirmação de Confúcio permanece atualíssima, vinte e cinco séculos depois, nestes tempos marcados por imagens de todos os tipos, do cinema, da televisão, das fotos popularizadas digitalmente nas redes da internet.
O que estaria o Correio Braziliense sugerindo a seus leitores(as) com a foto publicada na capa do jornal?
Nela está a maior autoridade da República brasileira, no palanque oficial, rodeada de outras autoridades constituídas, assistindo ao desfile da data símbolo da pátria brasileira: o 7 de setembro, dia de nossa independência.
A foto foi cuidadosamente selecionada, entre centenas de outras disponíveis. É, portanto, legítimo concluir que havia, sim, uma intenção orientando a escolha.
O jornalista que fez a edição da foto para o Correio Braziliense (e respondeu a meu e-mail sobre as razões da escolha) a considerou excelente e a melhor ilustração para o noticiário político do dia. (grifos deste blog)
Credibilidade da democracia
Para além da partidarização inequívoca da grande mídia brasileira e diante de exemplos sucessivos, parece que ela não está sendo capaz de fazer uma distinção fundamental, sobretudo agora, em tempos de campanha eleitoral: a distinção entre o ritual dos cargos públicos, os símbolos nacionais, a institucionalidade da política, dos políticos, dos ocupantes dos mais elevados cargos públicos da democracia representativa brasileira; e sua opinião/posição (dela, grande mídia) em relação a esses eventuais ocupantes.
As consequências dessa “não-distinção” podem ser trágicas para a própria democracia. Ao se desrespeitar reiteradamente eventuais ocupantes de altos cargos públicos, inclusive em fotos com insinuações inconfessáveis, esse desrespeito é transferido para as instituições e a credibilidade da própria democracia. Como mostrou há décadas a professora Maria do Carmo Campello de Souza, “o teor exclusivamente denunciatório de grande parte das informações [dos meios de comunicação] acaba por estabelecer junto à sociedade (…) uma ligação direta e extremamente nefasta entre a desmoralização da atual conjuntura e a substância mesma dos regimes democráticos”.
No atual nível de partidarização da grande mídia brasileira, não há solução de curto prazo para que se desfaça esta confusão nefasta. A cobertura adversa e a desqualificação da politica e dos políticos é sua pauta preferencial. Resta torcer para que a democracia representativa brasileira sobreviva a uma grande mídia que, apesar de se apresentar como sua principal defensora, corrói, cotidiana e reiteradamente, seus fundamentos mais caros.
A ver.
***
Venício A. Lima é jornalista e sociólogo, professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado), pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (Cerbras) da UFMG e organizador de Para Garantir o Direito à Comunicação – A Lei Argentina, o Relatório Leveson e o HGL da União Europeia, Perseu Abramo/Maurício Grabois, 2014; entre outros livros
João Brant explica seu voto em Dilma
September 9, 2014 6:08 - Pas de commentaireJoão Brant foi meu aluno no 9º ano do Ensino Fundamental.
Sempre foi assim: ponderado, extremamente educado, curioso questionador, crítico, profundamente crítico.
Sua atuação no Intervozes e na luta pela democratização das comunicações é reconhecida até mesmo por seus opositores. João tem estofo intelectual, compromisso com bandeiras importantes, une teoria e práxis na tradição da melhor linhagem dos marxistas.
Por isso em tempos que decididamente a política foi para o campo da irracionalidade completa nestas eleições é quase um alento ler a clareza de sua declaração de voto. Eu poderia assiná-la sem mudar uma vírgula.
Não é de modo algum um texto empolgante, emocional que queira pegar o leitor pelo coração. Não é um texto cínico e pragmático que quer destruir sonhos. É um texto acima de tudo honesto com seu leitor sem dourar pílula, sem agressões. Mas ele tem o essencial: política se discute no campo político, com dados, reconhecendo limites, conjunturas e nossas escolhas são direcionadas por aquilo que efetivamente valorizamos, no caso: a diminuição da desigualdades sociais.
João, como uma pessoa à esquerda, vota em Dilma, mesmo com críticas e explica o porquê de sua escolha.
Por que voto em Dilma
Por: João Brant em seu Facebook
04/05/2014
Eu teria muitos motivos para não votar em Dilma: seu governo é mais conservador do que eu gostaria, houve poucas tentativas articuladas para mudar a cultura política do país e sua interlocução com a sociedade é muito limitada. No meu tema histórico de atuação, a comunicação, permaneceu tudo como dantes, sem nenhum esforço real para incidir sobre um sistema de mídia concentrado e conservador. Na cultura, houve retrocessos notáveis em relação ao governo Lula.
Mas a realidade é mais complexa. É preciso lembrar onde estávamos em 2002 e o que significou o ciclo inaugurado em 2003. O Brasil abandonou a rota neoliberal e reorganizou seu rumo na economia e no campo social para buscar diminuir a miséria e a pobreza no país. Fez isso, é verdade, sem romper com o capital financeiro e sem aprofundar processos de mudanças estruturais necessários para avançar mais. Mas não há dúvidas de que PT e PSDB fizeram opções muito distintas, que colocaram o Brasil em rumos opostos nos governos Lula e FHC.
O governo Dilma manteve as bases do governo Lula. No essencial, naquilo que tem capacidade de influir em escala na vida dos trabalhadores, houve poucas mudanças significativas. A conjuntura internacional mudou, e o governo teve méritos e deméritos no processo de adaptação. Conseguiu retardar e mitigar os efeitos da crise de 2008, mas seguiu apostando numa política de exportação de commodities que, aliada à falta de uma política industrial, tem efeitos negativos para o país em médio e longo prazo. De toda forma, diminuímos a desigualdade, mantivemos o desemprego em níveis bem baixos e 36 milhões de pessoas saíram da pobreza extrema.
Explico porque, pra mim, Marina Silva e Luciana Genro não são opções. Em relação à Marina, vejo três problemas centrais. O primeiro é que ela opta por um programa econômico claramente liberal, vinculado à agenda do setor financeiro, que aponta na direção contrária do caminho de enfrentamento às desigualdades que tortuosamente estamos seguindo. Essa opção é estrutural, e com ela vêm todo um pacote cujos efeitos são sentidos diretamente pelos trabalhadores. Não que o programa de Dilma não assuma parte da agenda liberal, mas é só ver a resistência do setor financeiro à sua candidatura para ver que ela contraria interesses poderosos. Além disso, essa opção de Marina tende a neutralizar a oportunidade real de avanços que dependem de outra estrutura econômica. Seu programa tem vários pontos progressistas, alguns mais do que os do programa de Dilma, mas o papel aceita qualquer combinação. No mundo real, não vejo condições de a maior parte da agenda progressista ser mantida com essas bases.
O segundo problema é que a maneira como ela monta o discurso de mudanças na política é ilusória e, a meu ver, despolitizante. Ao dizer que vai governar com os melhores do PSDB e os melhores do PT, ela propõe ao Brasil ignorar que estes são dois projetos opostos para o Brasil, inconciliáveis se mantidas suas características essenciais. Ao mesmo tempo, ao se fixar no bordão da ‘nova política’, Marina transforma as necessárias mudanças na cultura política em um ato de vontade, que pula toda a parte de dar respostas concretas a problemas duros e reais. Não gosto da lógica de governabilidade assumida pelo PT e não acho que ela seja a única maneira de se governar, mas acho que sua superação só pode acontecer em um processo complexo de enfrentamento a essa lógica, que depende de uma articulação social potente. Que nova política é essa a que só teremos acesso depois das eleições? Por que ela depende de se estar no governo para ser praticada? Como acreditar em uma nova política que é mais personalista (baseia-se em quadros) e individualista e menos coletiva? No que Heraclito Fortes, Bornhausen e Roberto Freire se diferenciam de Renan, Maluf e Crivella?
O terceiro problema é o mais explorado nas redes, e tem a ver com um conservadorismo comportamental da candidata. Confesso que esse ponto nem é pra mim o principal, não porque não o considere importante, mas porque não me parece que Dilma e seu governo tenham feito (ou farão) avançar essa agenda de qualquer forma. São necessários casos emblemáticos e comoções gerais com muita luta social para que haja qualquer chance de mudança.
Mas frente a esse cenário por que não votar no PSOL? A opção feita pelo PSOL nos seus 10 anos de existência foi se fixar como um partido que não busca dialogar com um número significativo de brasileiros. Faz um discurso voltado para o eleitorado de extrema esquerda, que não alcança 2% da população, e não se propõe a construir um discurso e um programa que o aproxime das massas. Enquanto parte do petismo exagera na interpretação sobre a correlação de forças, o PSOL parece ignorar esta avaliação.
É preciso compreender como pensa o país. Mesmo sendo considerado um moderado por alguns amigos, eu estou provavelmente nos 2% mais à esquerda do Brasil. Não por ser extremamente radical, mas porque o povo, mesmo com valores de esquerda, é moderado. Essa opção de enclausuramento do partido é aceitável na atuação parlamentar, onde em geral o partido vai bem e cumpre um papel fundamental (vide Ivan Valente e Jean Wyllis), mas é insustentável no âmbito da disputa pelo Poder Executivo.
Ajuda a explicar a situação o fato de parte significativa do PSOL entender que o principal adversário a ser combatido é o PT. Psicanaliticamente dá pra aceitar, politicamente não.
Frente a esse quadro, acho que a opção por Dilma significa uma opção viável pelos mais pobres. Significa também ir por um caminho em que algumas mudanças estruturais podem vir a ser disputadas (embora o governo tenha se fixado em bases nas quais há pouco espaço para elas). E significa deixar longe do governo o PSDB, que representa a agenda orgânica do setor financeiro. Parecem-me motivos suficientes.