MANIFESTO DA ALTERCOM À SOCIEDADE BRASILEIRA
12 de Janeiro de 2015, 12:33MANIFESTO DA ALTERCOM* À SOCIEDADE BRASILEIRA
A realidade dos meios de comunicação no Brasil aponta, cada vez mais, para dois tipos de concentração: o da informação e o das verbas publicitárias.
O maior anunciante público do país, o governo federal, em 2013 investiu 2,3 bilhões de reais em publicidade. Desse total, 1,5 bilhão foi para TV; 309 milhões para jornais e revistas; 176 milhões para rádio; 139 milhões para Internet e 176 milhões em outras mídias. Do montante investido em TV, 1,3 bilhões (86%) foram direcionados para as cinco grandes redes de sinal aberto, sendo que só a Globo ficou com cerca de 570 milhões.Diante desta realidade é forte a tendência ao oligopólio e ao monopólio, bem como a concentração simbólica do pensamento, o que dificulta a manifestação da pluralidade de opiniões. Isto afeta diretamente o direito à liberdade de expressão e o fortalecimento da democracia brasileira.
A Conferência Nacional da Comunicação – Confecom – e os esforços de sistematização do Fórum Nacional de Democratização da Comunicação (FNDC), apontam para a necessidade de uma regulamentação das comunicações: “a legislação brasileira no setor das comunicações, não está adequada aos padrões internacionais de
liberdade de expressão e não contempla questões atuais, como as inovações tecnológicas e a convergência de mídias. (…) Em países como Reino Unido, França, Estados Unidos, Portugal e Alemanha, a existência de instrumentos de regulação não tem configurado censura; ao contrário, tem significado a garantia de maior liberdade de expressão para amplos setores sociais.”A atual política de “distribuição” das verbas de publicidade utiliza-se do critério da mídia técnica, com base somente na audiência como definidor da aplicação dos recursos, negligenciando princípios constitucionais, como o da diversidade, da função social da comunicação, da vedação à concentração do capital e do tratamento
diferenciado às empresas de pequeno porte, entre outros.Assim, ao proceder dessa forma a Secretaria de Comunicação da Presidência da República – Secom/PR – provoca as seguintes distorções:
1) – Afronta a nossa constituição: art. 170, IV (livre concorrência), VII (redução das desigualdades regionais e sociais) e IX (tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte) e ao art. 173, §4º (repressão ao abuso de poder econômico, com vistas à eliminação da concorrência e aumento arbitrário dos lucros).2) – Afronta o Decreto nº 6555/2008, regulamentado pela Instrução Normativa nº 2/2009, que não traz (nem poderia trazer) nenhuma restrição à distribuição dos investimentos à mídia alternativa (empresas de audiência qualificada e que não podem concorrer, em igualdade de condições – porque iguais não são – com portais como UOL ou Organizações Globo). Ao contrário, distribuir os investimentos, sejam quais forem, é um dever elementar do Estado.
O investimento publicitário em veículos de menor porte fortalece a democracia, a pluralidade de expressão e aquece toda a cadeia produtiva das pequenas empresas do setor, gerando mais empregos.
Nesse sentido, a ALTERCOM – Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores da Comunicação, luta pela democratização da comunicação, reivindicando:
I) a aplicação de 30% das verbas publicitárias dos diferentes níveis de governo (federal, estadual e municipal) em mídias e plataformas não vinculadas a oligopólios e monopólios de comunicação;
II) o atendimento ao disposto na Instrução Normativa 2 do Decreto 6.555, que garante o amparo legal para essa iniciativa;
III) a adoção da experiência do Fundo Setorial do Audiovisual como referência para o setor da publicidade governamental, contribuindo assim para a desconcentração financeira e a descentralização regional dos recursos.
IV) A regulamentação do disposto no inciso III do art. 221 da Constituição Federal, para estabelecer os percentuais de regionalização da produção cultural, artística e jornalística das emissoras de radiodifusão sonora e de sons e imagens, respeitando as especificidades da comunicação de tv (radiodifusão de sons e imagens) e do rádio (radiodifusão sonora).
A verdadeira equidistância da justiça consiste em tratar os desiguais de forma desigual. Portanto, tais reivindicações são urgentes para um maior equilíbrio na produção e divulgação de diferentes pontos de vista sobre a nossa sociedade e os desafios do seu desenvolvimento. Sem isso, perde o Estado brasileiro e perde o
fortalecimento de nossa democracia.
* ALTERCOM é uma entidade associativa de empresas e de empreendedores, de iniciativa individual ou coletiva. Nasce com o objetivo de representar e dar legitimidade aos setores da sociedade que lutam por uma comunicação democrática, E para defender a diversidade, pluralidade informativa e a liberdade de expressão para todos
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Laerte: “fundamentalismo e os grupos de ultra-direita xenófobos se alimentam”
10 de Janeiro de 2015, 12:32Sobre o mesmo tema leia também no blog:
O Atentado na França e os ódios da direita no Brasil,
Lelê Teles: JE NE SUIS PAS CHARLIE
PS: Se a entrevista de Laerte não valesse a pena por si só, valeria pela resposta que provocou em Olavo de Carvalho, que não se dignou sequer a se dirigir ao cartunista, foi direto ao patrão do blogueiro, o dono do jornal, Frias:
Desprezado senhor,
A propósito da matéria publicada em Blog do Morris:
Segundo esse senhor ou dona Laerte, “a guerra jihadista contra o mundo é uma idéia louca, alimentada por Bushes da vida, Olavos de Carvalho da vida”. É incrível a leviandade com que palpiteiros me atribuem qualquer estupidez que lhes passa pela cabeça, sem quaisquer escrúpulos, sem qualquer consulta aos meus textos e sem conhecer absolutamente NADA do que penso e digo. Quem assim procede não merece respeito nem consideração, é apenas um cafajeste, um bandidinho pé-de-chinelo. Nem vou perguntar o que tenho a ver com Bush ou com jihadistas, porque quem me lê — o que não é o caso dessa pessoa — sabe que é absolutamente nada e não vejo razão para insistir no óbvio só porque um ignorante com presunção de onissapiência o nega. Não espanta que as opiniões políticas dessa criatura nasçam de uma pura preferência sexual, o que consiste exatamente em pensar com o cu ou com o pau.
Associar o meu nome ao de George W. Bush já é absurdo em si, mas culpar-nos aos dois pelo jihad é puro delírio psicótico, que em tempos normais nenhum jornal publicaria. O jornalismo brasileiro desceu mesmo ao nível do esgoto. Responder a essa porcaria com um xingamento já seria conceder-lhe honra demais. Responsabilizo pessoalmente o sr. Octavio Frias Filho pela publicação dessa enormidade e anuncio que, se ele não me pedir desculpas em público, cuspirei na sua cara tão logo tenha o desprazer de encontrá-lo.
Olavo de Carvalho
O teor da carta e a reação deste senhor mostra bem o que Laerte fala sobre a extrema-direita e a qualidade do debate no Brasil.
No Brasil Charlie Hebdo não existiria
09/11/2014
Encerrando o ciclo virtuoso de entrevistas deste blog, decidi visitar a cartunista Laerte em sua agradável casinha no Butantã, para papearmos sobre Charlie Hebdo e os tenebrosos acontecimentos de Paris.
Como se sabe, Laerte é uma das maiores cartunistas do Brasil. Personagens suas como os Piratas do Tietê entraram para a história. Suas tiras, que pelo menos para mim são as mais inspiradas, continuam sendo publicadas diariamente na Folha de S. Paulo.
Por conta das opiniões que andou divulgando a respeito do atentado, Laerte foi ameaçada no facebook e teve que lidar com comentários do tipo, “não deviam ter matado o Glauco. Mataram o cartunista errado”.
De uns tempos pra cá Laerte se percebeu como uma pessoa transgênera e me recebeu, muito bem por sinal, acompanhada de suas duas gatas, vestindo saia e blusa, havaianas rosas e as unhas feitas pintadas de vermelho. A entrevista ocorreu em seu estúdio, entre pilhas de livros, algumas contas a pagar, um computador turbinado e a boa e velha prancheta de desenhos.
Laerte estará presente amanhã no ato em solidariedade aos colegas do Charlie Hebdo, que está sendo organizado pela secretaria de direitos humanos, sindicato dos jornalistas e entidades de cartunistas. A partir das 11 hs, em frente à Praça das Artes, no Centro.
Qual a influência do humor praticado pelo CH em sua vida?
Pra mim pessoalmente fez parte das informações do final dos anos 60 que me convenceram de que era isso que eu queria fazer.
Nesse final dos anos 60 essas coisas todas, CH, anarquista e porra louca francesa, a contracultura americana, a porra louquice californiana e o Quino, mais essa combinação com o Pasquim, foi o que forjou a gente.
Muitos muçulmanos relataram um choque cultural, com a charge sobre o profeta.
Acho que no Brasil nenhuma dessas capas da Charlie Hebdo teria sido feita. A gente não faria nem Family Guy, a gente não faria nem o South Park, nem Simpsons a gente faria, porque humor tem a ver com a cultura do país. Humor é um vínculo com a população local.
O Charles Hebdo está na França, estão falando com uma população de porra loucas que se julgou durante séculos dona cultural do mundo, e até hoje se acha. Estranham quando você não fala francês. Wolinski não falava uma palavra de inglês ou espanhol.
E por que o Brasil não seria capaz de produzir as capas da Charlie Hebdo?
A formação cultural é outra, tem a ver com compromissos, arranjos de acomodação. Nunca se praticou no Brasil o debate claro. As pessoas tendem, no cotidiano, a acomodar posições, mais que debater ideias. No Brasil o debate vira briga em 2 segundos.
Não que no Brasil não se fale porra louquices ou se deixe de fazer humor agressivo. Mas temo que no Brasil esse tipo de humor só aconteça com pessoas que claramente não têm poder. Chutar cachorro frágil. Digo isso porque lembro de várias situações em que o Danilo Gentili voltou atrás na TV e pediu desculpas: para a comunidade judaica, para a Preta Gil – ele morde e assopra. Aqui existe um negócio que é o respeito a “otoridade”, que é um fato.
E o Pasquim?
Tinha a anarquia e um modo de lidar, mas não sei se iriam tão longe. Foram bastante agressivos em várias situações, mas o alvo principal era a ditadura. A França do Charlie Hebdo existia em um contexto em que não tinha ditadura fazia tempo. De Gaulle já estava nos estertores quando essa linguagem começou.
O Porta dos Fundos também faz bastante gozação. Houve bastante reclamação mas eles não pararam, não foram bloqueados. Sinal de que comunidade religiosa talvez não seja tão poderosa por aqui quanto a gente pensa.
E teve o caso do Rafinha Bastos.
Aí não tem a ver com liberdade de expressão. Tem a ver com o papel subalterno da mulher. Wanessa Camargo não abriu a boca durante todo o processo, que foi movido até pelo feto dela. O autor era o marido dela, era uma briga de homem.
Uma briga idiota, que podia ser respondida com um simples “Rafinha, cresça e apareça”. Mas não, virou um processo porque a honra do marido foi ultrajada. E era um cara rico. Uma coisa de poder econômico e de poder machista que envolveu o Rafinha. Acho a piada idiota mas fiquei do lado do Rafinha.
Qualquer tipo de piada é válida no final das contas?
Hugo Possolo falou uma coisa linda. Você pode fazer piada de qualquer coisa, o que importa é saber de que lado da piada você está. Acho isso muito profundo, porque mostra que toda piada é ideológica, não existe piada só piada. Olha as capas do CH: não são só piada, são declarações, é um discurso ideológico, violento, agressivo, muito engraçado também.
A indignação com a charge de Maomé tem razão de ser?
Maomé apareceu pelado de quatro com estrela no cu. Os caras fizeram coisas… a gente não faria isso nunca. Eu não sei o que eu faria pessoalmente se fosse editor do CH. Por muito menos eu caguei nas calças na época do ‘Balão’ em 72. Era um fanzine, Paulo Caruso fez uma história linda, de uma mulher no parque que não queria dar pra ele, uma história linda e engraçada, e eu caguei nas calças. Pensei: meu Deus isso vai atrair a repressão.
É saudável existir um CH para a sociedade.
Não só saudável. É significativo que ele seja francês. Na Inglaterra tem uma liberdade de expressão parecida, mas eles não fariam isso. O humor britânico é diferente. Monty Python fez “ A vida de Brian” que mexe com judaísmo, com religião e um monte de coisa, é violentíssimo também, mas tem essa elegância.
Isso tudo me faz pensar sobre as construções teóricas sobre o humor.
Em primeiro lugar, que o humor é humano, não existe humor que ridicularize coisas ou animais. É sempre humano. Em segundo lugar, é sempre grupal. Não existe humor produzido nem por um indivíduo nem para um indivíduo. Terceira coisa é algo que Bergson falava, que acho interessante, que nunca consegui apreender totalmente, é a ideia de que o alvo da ação humorística é o momento em que o ser humano deixa de ser humano, quando ele age mecanicamente. Quando se coisifica.
Humor e preconceito se cruzam?
Muitas vezes, porque quem faz a piada precisa contar com a sintonia do público. Se você entra com uma informação polêmica, que é nova, você não obtém risadas, obtém estranhamento, agressividade, estupor. Quando os caras invadem a redação do CH não é piada, estão produzindo uma tragédia e nossa reação não é rir. Agora, se alguém atirar sapato na cara do Bush é muito engraçado.
Fiz uma historinha com o Alzheimer kid que adorei na época, um sujeito saindo correndo na cidade avisando que kid veio pra matar. Ele veio pra matar mas não lembrava quem. É engraçado mas um monte gente reclamou, Alzheimer é uma tragédia.
Tem como fazer humor sem isso?
Renato Aragão disse em entrevista que no seu tempo viado e preto não reclamavam quando se fazia piada sobre eles. Não tinha dor? Tinha. Mas socialmente não eram grupos empoderados. Tinham que ser cúmplices das humilhações que estavam sofrendo.
Um humor que desse vazão às ideias de Bolsonaro por exemplo, é legítimo em sua opinião?
Tem o Danilo Gentili por exemplo. É legítimo que exista esse tipo de humor. Mas ele tem que ser criticado, enfrentado. Faz parte de um pensamento que tem que ser enfrentado.
O Gentili faz piada que humilha as pessoas e as conduz a uma situação de perda, como no caso da doadora de leite que ele chamou de vaca e coisas piores possíveis – ela foi ridicularizada em sua cidade, não podia sair na rua, entrou em depressão.
Os fundamentalistas islâmicos também querem enfrentar o humor, só que pegando pesado em armas.
O objetivo real não é enfrentar o ataque humorístico, o objetivo real é político. O objetivo não era atacar a liberdade expressão. Acho que estão cagando pra liberdade expressão.
Você concorda com a colocação, de que o atentado ao Charles Hebdo foi o “11 de setembro da liberdade de expressão”?
Não gosto, acho tola e apressada. Acho que o que foi atacado não foi a liberdade de expressão. É uma tática para um jogo político mais complexo e perigoso. O jihadismo não tem a pretensão de controlar a liberdade de expressão na França. Este é um traço que vem desde a Comuna de Paris.
Não houve ataque à liberdade de expressão?
Houve um ataque à liberdade de expressão, mas não é este o objetivo estratégico. Por que não atacam a direita anti-islâmica? Porque não interessa. Querem criar uma confusão que visa comprometer todo o sistema. Se atacassem só os fascistas seria uma espécie de limpeza, que até interessaria (risos). Mas o que os terroristas querem é movimentar a opinião massiva. Eles sabem que o sentimento xenófobo vai se exacerbar, e isso pode gerar políticas militaristas de intervenção no Oriente Médio – isso tudo interessa ao Estado Islâmico, um grupo que não está ligado à idéia de construir um Estado, está ligado em construir guerra.
Por que os ataques contra o fascismo não acontecem?
É improdutivo dentro do ponto vista da tática de gerar o terror, a confusão é o que interessa, o irracionalismo. O que embasa o desejo terrorista não é uma construção racional de um coletivo árabe de uma liberdade de expressão, a ideia é outra, de propor uma ideia de guerra jihadista contra o mundo. É uma ideia louca, que é alimentada por Bushes da vida, Olavos de Carvalho da vida. Tentar construir a ideia de um choque de culturas, onde um precisa prevalecer dentro dessa lógica. ‘O que deve prevalecer é o nosso lado, precisamos destruir o outro’.
Qual sua conclusão sobre o atentado ao Charlie Hebdo?
Não existe ainda, tenho procurado ligar os pontos. É aterrorizante o suficiente para abalar as convicções da gente. Agora quais convicções, não sei. De princípio tenho visto que nas exibições de força no facebook, as pessoas se aferram às posições delas e fazem trincheiras de onde atiram.
Tenho tentado entender fora da dor e do sentimento de perda, pois amava e admirava o CH, tento entender politicamente o que está acontecendo. Começam os ataques às mesquitas e restaurantes árabes, ou aos minimercados judaicos… Isso que vai gerar, é um padrão estimulado por grupos de direita que querem construir uma política de exclusão dentro da Europa.
E sobre os acontecimentos de hoje?
A morte dos irmãos? Não tenho o que comentar, sério. Acho que continua em marcha o projeto de irracionalismo.
Como assim?
11/9 salvou a vida do Bush, um político medíocre e desprestigiado que vinha de uma eleição contestada. Foi transformado em herói e abraçou as táticas militaristas e intervencionistas.
Penso porque esses fdp fizeram isso. É que no final das contas o fundamentalismo e os grupos de ultra-direita xenófobos se alimentam. Foram feitos um para o outro. Haja entendimento real ou não, na prática a porra louquice atende ao clamor da porra louquice.
Mas não sei isso é coisa de malucos. Pode ser um jogo muito mais frio do que a gente pensa, e é isso que me aterroriza – ver que não é maluquice. Esse jogo frio pode envolver dinheiro, poder político e controle militar.
Consegue associar este atentado a um fato político da história brasileira?
No Brasil as pessoas foram presas, matou-se gente, pessoas ficaram acuadas. Mas a reação historicamente determinante à ocupação ditatorial se deu quando mataram um jornalista. Na mesma ocasião Manoel Fiel Filho, militante ativista operário foi morto. Todo mundo se comoveu mas não foi decisivo. Decisivo foi terem matado Vladimir Herzog, que era jornalista. Isso foi importantíssimo no jogo cultural que a ditadura estava tentando fazer naquele momento. Hoje sabemos que houve uma tentativa de golpe dentro do golpe, da linha dura, que foi frustrado porque eles foram mais longe do que podiam. Ao mesmo tempo podiam ir menos longe? A lógica deles é de montar canastra. Era o jeito que sabiam jogar.
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Lelê Teles: JE NE SUIS PAS CHARLIE
9 de Janeiro de 2015, 9:19“Não consigo entender o terrorismo que ceifou a vida de jornalistas da revista francesa Charlie Hebdo.
Não consigo entender o racismo e desrespeito religioso da revista francesa Charlie Hebdo.
Não consigo” Marcus Guellwaar Adún Gonçalves
Criticamos o humor ofensivo do CQC, Zorra Total, Praça é Nossa, Casseta & Planeta e outros quando seu alvo são grupos oprimidos e quando o preconceito explícito, travestido de humor, é justificado como liberdade de expressão.
Por que não podemos criticar caricaturas racistas, homofóbicas, sexistas produzidas pela esquerda? A crítica a isso obviamente não é licença para qualquer justifica ao ato brutal do atentado fundamentalista contra 12 vidas ceifadas na redação do periódico francês.
O humor ofensivo das páginas de Charlie Hebdo, por vezes, ultrapassou a islamofobia e chegou à caricatura racista. Não foi apenas uma vez que Charlie Hebdo retratou políticos e outras personalidades negras como macacos.
Ministra da Justiça da França, Christiane Taubira, retratada como macaca no Charlie Hebdo.
Aqui o comediante Dieudonné M’bala M’bala, criador do gesto Quenelle, que os franceses de origem judia afirmam ser anti-semita, é retratado como macaco. O rabo do macaco com outro tom faz alusão a um falo introduzido no traseiro de Dieudonné.
É curioso também que o humor de Dieudonné atacando o judaismo foi proibido na França, o humor da Charlie Hebdo atacando o islamismo foi permitido na França.
É preconceito respondido com preconceito. Mas as autoridades francesas usam dois pesos e duas medidas em relação aos atores produtores dos preconceitos e as vítimas deles. Sonho com um dia que ao menos a esquerda consiga fazer algo diferente.
Conheça a campanha de muçulmanos espalhados pelo mundo: NOT IN MY NAME, que ilustra a capa deste post. Fiquem com o texto de Lelê Teles.
JE NE SUIS PAS CHARLIE
Por: Lelê Teles
07/01/2015
É lamentável que quatro excelentes cartunistas tenham sido mortos de forma brutal. Lamento também a morte das outras oito pessoas, duas delas policiais, um deles muçulmano.
Lamento também que uma importante publicação de esquerda, histórica, tenha se prestado a um exercício vulgar de ofender, obsessivamente, líderes religiosos; porque, na verdade, só conseguem com isso ofender as pessoas que professam essas religiões.
Alá tá lá, na dele.
Charlie Hebdo, demonstrava uma certa obsessão pelo islã, as charges, o profeta de quatro, insinuando que ia comer um camelo… eram vulgares e sem propósito.
Até aí, morreu neves.
Mas o que de fato se pretendia com isso?
Hebdo sabia quem e o quê queria provocar com sua obstinada insistência.
Como bem disse o Therry Meyssan, “o Charlie Hebdo s’était spécialisé dans des provocations anti-musulmanes et la plupart des musulmans de France en ont été directement ou indirectement victimes”.*
Hebdo estava a testar se os fundamentalistas eram de araque?
O fundamentalismo islâmico, esse covarde e extremamente radical, é sempre bom lembrar, é um produto do imperialismo ocidental. Os Estados Unidos alimentaram sujeitos lunáticos, inescrupulosos e sedentos por poder para combater o grande satã, o comunismo.
Bin Laden nasceu daí, e disso todo mundo sabe.
Enquanto cresciam as milícias sanguinárias, protegidas por uma falsa camada religiosa, espancando estudantes, fuzilando professores laicos, colocando as mulheres “na linha”, o Ocidente aplaudia.
É lá, é com eles, é o efeito colateral. Melhor que termos os comunistas sentados sobre as maiores reservas de petróleo e gás do mundo.
É bom frisar que os fundamentalistas, recuso-me a chamá-los de islâmicos, não fabricam armas e que as nações “santinhas” estão a encher as burras com todo esse terror.
Lembram das terríveis imagens de Gaddaffi, assassinado brutalmente por sicários ensandecidos? Limparam a área pra turma da toca ninja.
Hebdo, desculpem-me a franqueza, mas era um inocente útil. Seu jornal, que tinha os maiores chargistas do mundo, estava perdendo leitores, porque sua leitura obstinada, fundamentalista, estava cansativa.
Ir contra o profeta Maomé era pedir briga, não com os muçulmanos, mas com os fanáticos.
Dizer que o crime em França atentava contra a liberdade de expressão é de um lugar comum risível.
O fundamento dos fundamentalistas é cercear a liberdade de expressão. E eles são contra a liberdade de expressão de todos aqueles que não pensam como eles, sobretudo muçulmanos.
Descobriram isso agora quando morreram não-muçulmanos?
Agora as trapalhadas, obsessivas, do jornal satírico fará com que a Europa se volte contra os muçulmanos, que a rigor nada têm a ver com esses sicários.
Para os muçulmanos, as charges Charlie Hebdo são apenas ofensas reprováveis e desrespeito, como o foi Je Vous Salue Marie para os cristãos.
Mas Hebdo sabia que provocava a ira dos sicários e parecia gostar disso. Para os islamofóbicos aquilo era um prato cheio, mais cedo ou mais tarde, embora os muçulmanos convivessem com Hebdo, os fanáticos iriam agir, e o mundo faria crer que agiam em defesa de todos os muçulmanos. O que é uma fraude.
Os Estados Unidos invadiram o Iraque e destruíram o Paquistão embasado numa premissa dessas.
Doze franceses mortos? Sério que é isso que comove o mundo agora? Os extremistas matam pessoas a todo momento, matam sobretudo muçulmanos.Mataram a sangue frio o policial muçulmano que pediu para não morrer. Repito, esses caras matam muçulmanos às pencas, o mundo não se compadece.
Essa histeria comovida, somos todos Charlie, me lembra o 11 de setembro. Não vi essa tristeza toda quando eles entraram no Mali abrindo fogo. Quando o Estado Islâmico executou, covardemente, dezenas de pessoas no Iraque, ninguém disse Somos Todos Iraquianos. Que recorte é esse?
Allahu Akbar!
Tradução livre: *Charlie Hebdo havia se especializado em provocação anti-muçulmana e a maioria dos muçulmanos na França teria sido direta ou indiretamente vítimas.”
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Negro, nordestino, filho de diarista, de escola pública acerta 95% no ENEM
8 de Janeiro de 2015, 16:28Nada tira o mérito deste garoto, seu esforço pessoal e sua determinação o fizeram, aos 16 anos, acertar 95% das questões do ENEM. Mas se antes os João Vitor eram agulhas em palheiro nas universidades, agora eles começam a forçar as grades do preconceito e da discriminação, arrombando as portas e adentrando às melhores universidades, ocupando os lugares em cursos cobiçados e socialmente valorizados.
Um Brasil onde jovens negros, nascidos nos estados nordestinos, filhos de diaristas, vão poder escolher onde querem cursar qualquer curso, em qualquer universidade é um Brasil que muda para melhor.
A escola pública Governador Adauto Bezerra onde João Vitor estuda, mostra que ele não é exceção: só em 2013, quase metade dos alunos matriculados no 3º ano do colégio (244) garantiram o ingresso no Ensino Superior, 144 deles em universidades públicas.
Ouçam o vídeo reproduzido no blog do Planalto, João Vitor é um menino politizado, com consciência racial, de classe, um verdadeiro cidadão.
Aqui a reportagem que a TV Brasil fez com ele em dezembro:
Aluno de escola pública de Fortaleza acerta 95% do Enem
Blog do PlanaltoUma história de superação e de esforço pessoal de um garoto comprometido a mudar o próprio destino. É dessa forma que pode ser resumida a trajetória do estudante cearense João Vitor Claudiano dos Santos, de 16 anos. Aluno da Escola Estadual Governador Adauto Bezerra, de Fortaleza (CE), João acertou 172 das 180 questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o equivalente a 95% do total da prova. Como comparativo, o menino ultrapassou os 164 acertos da estudante mineira Mariana Drummond, que conquistou o primeiro lugar no Enem em 2013.
Filho da diarista Ana Maria dos Santos, que não sabe ler ou escrever, João e os irmãos sempre valorizaram a oportunidade de estudar:
“Ele dormia, em média, quatro horas por dia, passava os finais de semana estudando e quase não assistia televisão. Eu não tive a oportunidade que eles tiveram, mas tentei passar o valor da educação para os meus filhos”, destacou a mãe do estudante em entrevista ao Brasilidade, o Tumblr do Palácio do Planalto.
De acordo com João Vitor, um dos fatores que mais o motivou a estudar foi a ampliação do acesso às universidades públicas no Brasil nos últimos anos por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) e da popularização do Enem.
“Eu e meu irmão, o Gerson, a gente estuda muito. Então, desde 2010, a gente viu, com o sucesso do Enem e do Sisu, que as universidades públicas tinham aberto suas portas. Eu e o Gerson enxergamos nessa oportunidade a chance de conseguirmos vencer na vida e de mudar a realidade da nossa família, que é toda do interior e que não tem ninguém que tenha conseguido chegar à universidade”, afirmou.
Para alcançar esse objetivo, João Vitor se valeu de sua paixão pela leitura para superar uma das maiores dificuldades atribuídas ao Enem: a extensão dos textos e o tamanho da prova.
“O que tem de cansativo no Enem são os textos grandes. Então, minha estratégia foi me adaptar à leitura, ler livros grandes, alguns com linguagem rebuscada”, conta o estudante que começou lendo integralmente os livros didáticos distribuídos gratuitamente pelas escolas públicas. Ele lembra que, a partir do oitavo ano, passou a se interessar também pelos livros clássicos por influências do avô e da mãe:
“Quando eu tinha uns 12 anos, meu avô me deu o livro ‘Caçador de Pipas’ que é um romance extraordinário, daí eu comecei a ver que a leitura não era só fórmula, não era só química, não era só matemática. A minha mãe – que não sabe ler – não deixou que eu esquecesse os clássicos. Quando eu comecei a ler, eu não parei mais. Até hoje eu leio em torno de 80, 90 livros por ano,” contabiliza.
Dificuldades
No entanto, o reconhecimento recente conquistado por seu resultado no Enem não deixa que João Vitor se esqueça das dificuldades que enfrentou durante sua trajetória escolar. Para o estudante, alcançar bons resultados na escola foi a estratégia que adotou para enfrentar o bullying que sempre sofreu em razão do cabelo, da altura e da magreza. Outro episódio que o marcou profundamente foi o fato de não poder ir ao colégio porque seu único tênis havia furado: “Como eu sempre andei bastante para chegar à escola, meu tênis acabou furando. Foi quando eu resolvi não ir ao colégio. As pessoas já me discriminavam antes disso, se eu fosse de chinelo elas iam se distanciar ainda mais, me ‘olhar torto’. Isso me machucava e ainda machuca muito”, afirma. Ao perceber a situação do adolescente, a mãe de João acabou conseguindo comprar um outro calçado para o filho. Essa foi a única vez que o garoto faltou à escola na vida.
Carreira
Apaixonado pela área das ciências exatas e da natureza, João Vitor pretende realizar o sonho de infância de se tornar cientista. Para isso, o estudante planeja cursar a faculdade de Ciências Biológicas em uma importante universidade pública do País e se especializar na área de Biologia Molecular. Ele ainda tem o sonho de participar do Programa Ciência sem Fronteiras do Governo Federal e estudar na Inglaterra ou na Alemanha, segundo ele, os dois países com as pesquisas mais avançadas na área de Biologia Molecular no mundo.Apoio Escolar
Além do sucesso de João Vitor, a Escola Estadual Adauto Bezerra acumula, nos últimos anos, exemplos de alunos aprovados nas principais universidades do Ceará e do País. Isso se deve à política adotada pela escola de preparar os estudantes com base na qualidade de ensino e em um processo de motivação dos alunos. Só em 2013, quase metade dos alunos matriculados no 3º ano do colégio (244) garantiram o ingresso no Ensino Superior, 144 deles em universidades públicas. Em 2005, esse número não chegava a cinco estudantes. “Há alguns anos, se você chegava em uma turma de 3º ano e perguntava quem acreditava que ia entrar em uma universidade, quatro ou cinco levantavam mão. Hoje, praticamente 100% dos estudantes da Adauto Bezerra acreditam que é possível se tornar universitário, mudar a sua vida e mudar a vida de sua família”, destaca o professor Monteiro Firmino.
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O Atentado na França e os ódios da direita no Brasil
8 de Janeiro de 2015, 7:55O atentado na França… e os ódios no Brasil
Por Bob Fernandes
07/01/2014
O ataque ao jornal satírico Charlie Hebdo é um desses fatos que levam o mundo a refletir.
Doze mortos, entre eles quatro cartunistas. Desde 2011, quando publicou charge com o profeta Maomé, o semanário francês estava ameaçado.
O atentado em Paris teria sido motivado por ódio religioso ou, no mínimo, para provocar tal ódio. Portanto, um ato com origem e sentido ideológico.
O Brasil, cada vez mais mergulhado em ondas de ódio ideológico, tem reflexões a fazer.
O Estado brasileiro é oficialmente laico. O Estado, que é o dono dos espaços de radiodifusão, há décadas apenas assiste à escalada de intolerância religiosa.
Há anos terreiros são atacados e o candomblé é agredido e ridicularizado em alguns espaços na Tv e rádio.
Em 2014 terreiros foram alvo de atentados, por exemplo, na Bahia e no Rio.
E os ódios são variados. O Brasil é campeão mundial no assassinato de homossexuais. Em 2013 foram 312 assassinados. Até setembro passado, outros 218.
Isso diante da complacência com tipos notoriamente pregadores de ódio aos homossexuais. E não apenas.
Nas redes sociais, acoitados pelo anonimato covarde, há os que pregam morte a quem critique seu líder político. A quem fascistas tratam por um dos seus sobrenomes, “Messias”.
O que não faltou durante a campanha eleitoral, e sobra desde então, é generalizado ódio ideológico, político-partidário.
De uns que enxergam a oposição como inimigo a ser exterminado.
Ou dos que confundem a resistência a ditaduras com o que chamam de “terrorismo”. E isso ao mesmo tempo em que clamam por outra ditadura.
Essa é uma gente que não sabe, a propósito da França, que franceses veem De Gaulle como grande líder no século XX.
Por De Gaulle ter comandado a resistência a um regime ilegal durante a II Guerra. Por aqui, fosse no embalo da ignorância e burrice, De Gaulle seria chamado de “terrorista”.
Créditos das imagens:
Foto da Capa do post: Manifestação na Praça da República, em Paris JOEL SAGET/AFP
Foto que ilustra o Post: U minuto de silêncio na sede da agência AFP, em Paris BERTRAND GUAY/AFP
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