Plantação coletiva germina laços na luta pela regularização de moradias
26 de Novembro de 2018, 18:28Moradores da Vila São Domingos participam de oficina prática que consolidou horta urbana comunitária
A Vila São Domingos, localizada no bairro Cajuru, em Curitiba, é uma das 404 áreas irregulares da capital. Mas as famílias se mobilizam para o reconhecimento da comunidade há mais de 40 anos. Foi pensando na consolidação da área como moradia permanente, na busca pela regularização fundiária, que famílias da São Domingos cultivam, desde o último sábado, 24 de novembro, uma horta urbana comunitária.
O processo de plantio agroecológico foi articulado pelo Instituto Democracia Popular (IDP) junto a estudantes da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), localizada no Assentamento Contestado, na Lapa, e a estudantes de Direito da UFPR do projeto de extensão EKOA – Direito Ambiental para Tod@s, a partir das experiências da Jornada de Agroecologia, que em 2018 foi realizada pela primeira vez em Curitiba.
“Além da aproximação dos atores envolvidos, a oficina é importante para a aproximação das agendas urbana, rural e ambiental, que frequentemente caminham separadas, mas são faces de uma mesma questão social”, avalia a advogada Mariana Auler, do Instituto Democracia Popular.
Uma oficina prática de plantio e cultivo deu novo destino à terra, adubo e mudas de legumes e hortaliças, trazidas da Lapa, e que agora terão o cuidado dos moradores que em breve poderão utilizar os alimentos nas refeições. A legislação, que ainda não contempla as moradias e os terrenos, favorece a implementação de hortas urbanas na cidade e esse debate também foi realizado no encontro entre os moradores.
Os participantes da oficina ouviram o presidente da Associação de Moradores da São Domingos, Sr. Floriano, falar sobre a importância da horta comunitária. Estudantes da EKOA, da Escola de Agroecologia e as representantes do IDP também retomaram para os moradores a construção desse projeto, que foi planejado ainda em outubro e, agora, implantado.
Outra colaboração ao projeto da horta urbana na São Domingos foi da equipe do mandato do vereador Goura, que realizou as explicações sobre lei municipal nº 15.300/2018, proposta por ele, que regulamenta e autoriza a prática da agricultura ecológica urbana em Curitiba.
“É uma troca entre sujeitos de extrema importância tanto para os moradores, que vão cultivar e se beneficiar da horta, como para todas as pessoas que não moram lá, mas de alguma forma se envolveram e são parte dessa construção coletiva”, acredita a estudante de Direito Ana Santos, que atua junto ao IDP e é integrante do projeto EKOA.
Para o Instituto Democracia Popular, a defesa do Direito à Cidade para todas as pessoas passa pela ocupação dos espaços públicos pela população e a atuação jurídica pela regularização de áreas de moradia só tem sentido com o entendimento de que as lutas coletivas passam pela convivência social. A articulação dessa iniciativa deve se estender para outras localidades onde o IDP atua.
Acesse aqui todas as fotos no álbum do facebook
Saiba mais: Cidade ao Redor | Retratos da luta por moradia: Vila São Domingos
Edição: Paula Zarth Padilha, com a colaboração de Valéria Fiori e Ana Santos
Instituto Democracia Popular
Ato público em Curitiba esclarece a população sobre os riscos de alterações na aposentadoria
22 de Novembro de 2018, 14:31Uma lona preta imensa no chão do calçadão da Rua XV de Novembro, em Curitiba, chama a atenção de quem passa, mas quem mais para conferir, ao lado de uma barraca de jornais, são as pessoas idosas. Em letras brancas, a mensagem é clara: “Luto para aposentar”.
As informações sobre esse Dia Nacional de Mobilização em defesa da aposentadoria do povo brasileiro e contra a Reforma da Previdência balançam em jornais pendurados num varal, enquanto dirigentes sindicais conversam com a população e distribuem o material.
Para Marisa Stedile, diretora da Secretaria de Políticas Sindicais da Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Paraná (FETEC-CUT-PR), o contato presencial com as pessoas na rua é importante nesse período de transição. “Houve muita circulação de mentiras pelo whatsapp durante as eleições, as fakenews, as pessoas não sabem mais em quem confiar. Nós precisamos dialogar com a população e esclarecer o que está em risco, isso é responsabilidade de quem está em uma direção sindical”, afirma a dirigente.
O ato foi convocado pela CUT Nacional e a concentração em Curitiba, nesta quinta-feira, 22 de novembro, é na chamada “Esquina da Democracia”, no encontro da Rua XV com a Monsenhor Celso, onde todas as quintas a entidade distribui a edição semanal do jornal Brasil de Fato. Mas dessa vez, junto ao BDF, a população também está recebendo um material especial sobre aposentadoria.
O presidente da APP Sindicato, Hermes Leão, lembra que as ações de mobilização em todo o Brasil conseguiram barrar a aprovação da Reforma da Previdência, num cenário em que o Congresso, em pouco tempo, aprovou a Lei da Terceirização, a Reforma Trabalhista e a Emenda a Constituição do Teto dos Gastos, que corta investimentos públicos, prejudicando toda a população. “Nós estamos nas ruas pelo Brasil afora para fazer a defesa da aposentadoria contra qualquer Reforma da Previdência. O debate nacional continua na linha do aprofundamento da retirada de direitos dos trabalhadores, que nós conseguimos com muita luta barrar até este momento e continua merecendo todo o esforço, não apenas dos sindicatos e das centrais, mas de todo o povo brasileiro, porque continua em jogo o interesse do mercado financeiro, para beneficiar a previdência privada, particular, onerando os trabalhadores e o povo mais pobre do país”.
De acordo com relatório final da CPI da Previdência, que tramitou no Senado, em 2017, as empresas privadas deviam R$ 450 bilhões à previdência, sendo esse débito responsável pela narrativa de “déficit” e “rombo”. Entre as empresas devedoras, estão a JBS (R$ 2,1 bilhões), a Associação Educacional Luterana do Brasil (R$ 1,8 bilhão), Marfrig Global Foods (R$ 1,1 bilhão), a Vale (R$ 275 milhões), o Bradesco (R$ 465 milhões) e o Itaú Unibanco (R$ 88 milhões).
Como está o debate sobre alteração na aposentadoria?
– A votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016 pela Câmara Federal e pelo Senado, que foi articulada desde o golpe de 2016 pelo governo Temer, está condicionada ao fim da intervenção federal no Rio de Janeiro, que está prevista para durar até 31 de dezembro de 2018, mas pode ser finalizada antes para esse fim, de votação da Reforma da Previdência.
– O que ocorre nesse momento de transição de governo, contudo, são diversas declarações públicas de políticos que apoiam o presidente eleito Bolsonaro, como deputados e governadores eleitos, e ainda declarações do futuro ministro Paulo Guedes, que dão conta de articulações para que alterações na aposentadoria possam ser feitas sem alterar a Constituição, com aprovação ainda em 2018, que seriam acabar com a fórmula 85/95 (que a partir de 2019, se mantida, será de 86/96, referindo-se à soma da idade mais o tempo de contribuição, para mulheres e homens, respectivamente); também o aumento do tempo de contribuição como condicionante para a aposentadoria por idade e ainda mudanças de regras de cálculo, que prejudicariam especialmente os trabalhadores vinculados ao INSS.
– Outras declarações públicas de membros do governo de transição sinalizam que a intenção do próximo período é a implantação de um sistema privado de aposentadoria semelhante à capitalização, em que o trabalhador só teria acesso ao benefício previdenciário que individualmente possa poupar (a Previdência Social atual é uma conta universalizada e coletiva para uso de todos os beneficiários).
Por Paula Zarth Padilha
FETEC-CUT-PR
Foto: Gibran Mendes
A banalidade do Whatsapp
21 de Novembro de 2018, 14:50Vamos supor que certo país passe por eleições. É o país X. Hipotético. Pois bem: vamos fazer de conta que, nessas eleições, um candidato use um slogan de campanha igualzinho ao “Alemanha acima de tudo”. Aquela frase marcante da versão do hino alemão cantada pelos nazistas. Que é mais ou menos como aquele papo de “America first” do atual presidente dos EUA, embora a última frase não tenha sido exatamente seu mote de campanha. Enfim. O ponto é: quem são os “outros”, a quem deveremos ficar por cima? Afinal, já que devemos estar por cima de tudo ou todos, logicamente alguém deve ficar por baixo.
Não dá pra saber ao exato. O que dá é pra rezar pra que EU não faça parte dos “outros”. Meus familiares e amigos, idem. Ou que afinal façamos, dependendo dos casos. Como naquela tirada do Darcy Ribeiro que recebi mil novecentas e sessenta e oito vezes – na verdade foram mil novecentas e oitenta e quatro vezes – no celular. Algo tipo “Eu odiaria estar do lado dos que venceram”.
Bom, acontece que uma vez um cara bem diferente do Darcy Ribeiro disse algo nesse sentido, também. Quero dizer, algo nesse sentido de “nós” contra os “outros” e de perdedores e vencedores. Esse cara era um nazista. O Goebbels, o cara que controlava as mensagens que seguiam pro povo alemão via Whatsapp durante o Terceiro Reich. Não que existisse Whatsapp naquele tempo, exatamente. Eu tenho preguiça de consultar a fonte pra citar direitinho o que esse cara disse, e que deve ter sido replicado por zilhões de robôs e tiozões com celulares na Alemanha dos anos 1930 ou 1940, ou algo equivalente, claro, mas sei que foi algo como: “Nós entraremos para a História como os maiores estadistas; ou como os maiores criminosos”. Nós queremos ser sempre nós, nunca “os outros”.
A gente costuma entender o que aconteceu com os nazistas – e também o que aconteceu por causa e apesar deles – por certos objetos que circulam por aí com relativa facilidade. Eu disse relativa facilidade. São aqueles objetos retangulares, com folhas de papel alinhadas dentro, e letras impressas nessas folhas. Em alguma parte deles, normalmente na superfície onde nossos olhos batam com mais frequência, costuma ter o nome de uma pessoa, não raro louca, além de uma pequena frase ou palavra que dá ideia – ou confunde totalmente – o que vai escrito na parte de dentro, nas chamadas “páginas”. Já ouvi que tais objetos são bons pra ajudar as pessoas a ter “memória”, que é esse troço que faz com que a gente se lembre das paradas sinistras e evite (re)fazer merda.
Me desculpem se eventualmente usei uma palavra chula pra fechar o parágrafo anterior. Na verdade, não usei. É mentira que eu tenha escrito merda logo acima.
Bom. Talvez vocês não se interessem, porque esses objetos paginados são quase sempre caros. Mas tem um desses aí que meio que serve pra tentar entender – e consequentemente ficar cheio de dúvidas – algumas coisas com relação ao “Reich dos Mil Anos, que durou exatamente doze anos e três meses”. É um que tem o nome “Hannah Arendt” escrito. Ela produziu esse objeto do qual estou falando quando foi enviada a Jerusalém, no início dos anos 1960, pra cobrir o julgamento de Otto Adolf Eichmann, um coleguinha de Goebbles responsável por embarcar os judeus em suas viagens derradeiras. Esse objeto foi publicado quase um ano antes da ditadura militar começar aqui no Brasil. “Eichmann em Jerusalém – Um relato sobre a banalidade do mal”, o objeto paginado a respeito desse negócio de “nós” e os “outros” a quem devemos pisotear.
A dona Hannah escreveu bem assim, numa página qualquer do objeto, a respeito da Alemanha nazi:
(…) a prática do auto-engano tinha se tornado tão comum, quase um pré-requisito moral para a sobrevivência, que mesmo agora, dezoito anos depois do colapso do regime nazista, quando a maior parte do conteúdo específico de suas mentiras já foi esquecido, ainda é difícil às vezes não acreditar que a hipocrisia passou a ser parte integrante do caráter nacional alemão. Durante a guerra, a mentira que mais funcionou com a totalidade do povo alemão foi o slogan “a batalha pelo destino do povo alemão” [der Schicksalskampf des deutschen Volkes], cunhado por Hitler ou por Goebbels, e que tornou mais fácil o auto-engano sob três aspectos: sugeria, em primeiro lugar, que a guerra não era guerra; em segundo, que fora iniciada pelo destino e não pela Alemanha; e, em terceiro, que era questão de vida ou morte para os alemães, que tinham de aniquilar seus inimigos ou ser aniquilados.
Isso quer dizer que os caras promoviam o auto-engano e a desinformação. Assim, como estratégia. Coisas pequenas quando se tem uma guerra pra ganhar. Não é de estranhar.
Exemplo. O candidato a presidente do país X a que fiz referência lá no cocuruto deste texto. Vamos supor que ele tenha se elegido. Isso posto, digamos que ele afirme que dificultará a presença no país X de médicos de outro país, o Y, que, antes de mais nada, comete a deselegância de ter posicionamento Y, do qual o referido presidente discorda radicalmente. Digamos que tais médicos, que vinham sendo necessários no país X, saiam, de fato, do país X. O presidente em questão, mesmo tentando argumentar a maior parte dos salários desses médicos iam pro regime Y, sacrificou parte da população X por falta de afinidade ideológica, ou por uma simulação de ética. Na verdade pode ser que tenha sido birra, já que o país X continuará negociando com outros países longe de estarem afinados com a ideologia X. Quanto à ética, melhor deixar pra lá. Enfim.
O que aconteceu, no exemplo acima? Atitude de auto-engano focada no ataque ao “outro”? Mistura de irresponsabilidade com pirotecnia, com vistas a capitalizar só com os do grupo “nós”, e não com os “outros”, numa realidade seletiva e, portanto, hipócrita? De certo, do presidente X pode se esperar tudo, menos pragmatismo. Alguns campos são mais suscetíveis a tomadas de posição desumanas ou criminosas, em outros, nem tanto. Se o país Y fosse a China, que é tudo menos um país hipotético, e se ao invés de médicos estivéssemos falando da indústria de produtos manufaturados, provavelmente o presidente X seria outro. Seria como “o outro”. Quem está na fila de emergência do posto de saúde não liga se o médico que vai atender (vai?) tem nacionalidade X ou Y, ou mesmo posicionamento X ou Y.
Melhor voltar pra Alemanha nazista. Ela perdeu a tal da Segunda Guerra Mundial, segundo o objeto paginado a que me referi acima. Ela fez e aconteceu. E perdeu. Otto Adolf Eichmann, esse cara tão contraditório, desmemoriado, incapaz de se enxergar no lugar do “outro” e de ver suas próprias incoerências, movido menos por argumentos do que por frases feitas, ficou triste. Disse que nunca se arrependeria, porque sempre fizera o que fizera oficialmente. Mas ficou triste. “Senti que teria de viver uma vida individual difícil e sem liderança, não receberia diretivas de ninguém, nenhuma ordem, nem comando me seriam mais dados, não haveria mais nenhum regulamento pertinente para consultar — em resumo, havia diante de mim uma vida desconhecida”. Bom, esse desconhecido doloroso, pra mim, sempre cheirou à liberdade. Mesmo assim, a despeito de qualquer foco em certo “regulamento”, segundo a dona Hannah, “Ele não tinha tempo, e muito menos vontade de se informar adequadamente, jamais conheceu o programa do Partido, nunca leu Mein Kampf”.
Incrivelmente, isso não era um fenômeno restrito ao Eichmann.
O programa do Partido nunca foi levado a sério pelos funcionários nazistas; eles se orgulhavam de pertencer a um movimento, que não devia ser confundido com um partido, e um movimento não podia se prender a um programa. Já antes da ascensão dos nazistas ao poder, esses Vinte e Cinco Pontos não passavam de uma concessão ao sistema partidário e a possíveis eleitores antiquados o bastante para querer saber qual o programa do partido a que estavam se filiando. Eichmann, como vimos, estava livre desses hábitos deploráveis, e quando disse à corte de Jerusalém que não conhecia o programa de Hitler é muito provável que estivesse dizendo a verdade.
Taí. O Terceiro Reich não durou mil anos porque deve ter sido governado pelo Whatsapp.
Por Bruno Brasil, jornalista curitibano radicado no Rio de Janeiro, escreve para o Terra Sem Males na coluna “entre aspas”
Foto: Wikimedia Commons
Curitiba terá ato em defesa da aposentadoria nesta quinta (22)
21 de Novembro de 2018, 11:54A próxima quinta-feira, 22 de novembro, é o Dia Nacional de Mobilização em Defesa da Previdência, conforme calendário das centrais sindicais pela aposentadoria.
Em Curitiba, um ato público será realizado na Esquina da Democracia, no calçadão da Rua XV de Novembro no encontro com a Rua Monsenhor Celso, com concentração das 11h às 14h. Durante a manifestação, a Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Paraná (FETEC-CUT-PR) irá distribuir à população um material elaborado pela CUT, que explica os riscos da Reforma da Previdência engavetada por Temer após intensa mobilização e greves gerais no ano de 2017, e que corre o risco de ser apreciada pelo Congresso até o fim do ano ou já no início do governo Bolsonaro, ainda que as articulações mudem diariamente.
“Querem que o trabalhador pague uma conta que não é cobrada dos grandes devedores da previdência, que são empresas privadas e instituições financeiras. Esse rombo não é nosso e nós não vamos ficar sem aposentadoria para beneficiar os empresários”, afirma Marisa Stedile, diretora da secretaria de Políticas Sociais da FETEC.
De acordo com relatório final da CPI da Previdência, que tramitou no Senado, em 2017, as empresas privadas deviam R$ 450 bilhões à previdência, sendo esse débito responsável pela narrativa de “déficit” e “rombo”. Entre as empresas devedoras, estão a JBS (R$ 2,1 bilhões), a Associação Educacional Luterana do Brasil (R$ 1,8 bilhão), Marfrig Global Foods (R$ 1,1
bilhão), a Vale (R$ 275 milhões), o Bradesco (R$ 465 milhões) e o Itaú Unibanco (R$ 88 milhões).
Como está o debate sobre alteração na aposentadoria?
– A votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016 pela Câmara Federal e pelo Senado, que foi articulada desde o golpe de 2016 pelo governo Temer, está condicionada ao fim da intervenção federal no Rio de Janeiro, que está prevista para durar até 31 de dezembro de 2018, mas pode ser finalizada antes para esse fim, de votação da Reforma da Previdência.
– O que ocorre nesse momento de transição de governo, contudo, são diversas declarações públicas de políticos que apoiam o presidente eleito Bolsonaro, como deputados e governadores eleitos, e ainda declarações do futuro ministro Paulo Guedes, que dão conta de articulações para que alterações na aposentadoria possam ser feitas sem alterar a Constituição, com aprovação ainda em 2018, que seriam acabar com a fórmula 85/95 (que a partir de 2019, se mantida, será de 86/96, referindo-se à soma da idade mais o tempo de contribuição, para mulheres e homens, respectivamente); também o aumento do tempo de contribuição como condicionante para a aposentadoria por idade e ainda mudanças de regras de cálculo, que prejudicariam especialmente os trabalhadores vinculados ao INSS.
– Outras declarações públicas de membros do governo de transição sinalizam que a intenção do próximo período é a implantação de um sistema privado de aposentadoria semelhante à capitalização, em que o trabalhador só teria acesso ao benefício previdenciário que individualmente possa poupar (a Previdência Social atual é uma conta universalizada e coletiva para uso de todos os beneficiários).
Ato público em Curitiba :: Dia Nacional de Mobilização em Defesa da Previdência
Data: quinta-feira, 22 de novembro
Horário: das 11h às 14h
Local: Esquina da Rua XV de Novembro com Rua Monsenhor Celso
Saiba mais: CUT e centrais mobilizam suas bases para atos em defesa da Previdência no dia 22
Por Paula Zarth Padilha, via FETEC-CUT-PR
Foto de arquivo: Joka Madruga
Quem escolherá qual carteira de trabalho será assinada no primeiro emprego?
20 de Novembro de 2018, 9:47Para economista, carteira verde e amarela para jovens que entram no mercado de trabalho poderá criar castas sem chance de ascensão
Anunciada como uma opção de escolha voluntária, conforme plano de governo do presidente eleito Bolsonaro, a carteira de trabalho verde e amarela será destinada a jovens em seu primeiro emprego no mercado de trabalho. Oficialmente, não há informações sobre como será efetivada a implantação desse novo documento, mas já foi publicada em notícias a versão que essa escolha seria definitiva: ao optar pela verde e amarela, com menos direitos, não haveria como migrar para atual carteira de trabalho azul, com garantias da CLT.
De acordo com o plano de governo, “todo jovem que ingresse no mercado de trabalho poderá escolher entre um vínculo empregatício baseado na carteira de trabalho tradicional (azul) — mantendo o ordenamento jurídico atual, ou uma carteira de trabalho verde e amarela (em que o contrato individual prevalece sobre a CLT, mantendo todos os direitos constitucionais)”.
Esses direitos constitucionais são 34 itens garantidos pelo artigo 7º da Constituição Federal, que estabelece salário mínimo, férias remuneradas, seguro-desemprego, repouso semanal remunerado, 13º salário, FGTS. Esse modelo privilegiaria a redução de custos para os patrões, pois não dá conta da jornada de trabalho e não estabelece encargos, como os previdenciários, e esses detalhes seriam parte da escolha do jovem que entra no mercado de trabalho, que estaria submetido a negociações individuais com seu empregador.
Para o economista e coordenador estadual do Dieese Pablo Diaz, mestre em Tecnologia e Trabalho pela UTFPR, a carteira verde e amarela é uma modalidade do trabalho intermitente. “Provavelmente com o tempo ela será o documento oficial do trabalho intermitente. Então quando você utiliza essa modalidade precarizada de contratação, você consegue apresentar números de emprego. Mas na verdade a pessoa vai estar registrada, contudo sem a remuneração mínima que manda a constituição. Então é uma armadilha essa carteira verde e amarela. E a perspectiva o que é, é criar castas dentro da legalidade em que muitas das pessoas não terão chance nenhuma de ascensão e vão viver no subemprego e nós vamos ver daqui uns anos, já estamos assistindo a porta de entrada desse inferno da desigualdade, nós vamos ver a ampliação (da distância) entre os maiores e menores salários, das melhores e piores condições de emprego”, prevê o pesquisador.
Pablo compara a situação do futuro das relações de trabalho no Brasil com países da Europa que eram conhecidos pelo bem-estar social, como Inglaterra, Portugal e Espanha. “Nós vemos essa prática disseminada nos últimos anos através dessa forma de contratação. Na Alemanha, por exemplo, você teve mini-empregos, que corresponde hoje a 10% de toda a força de trabalho da população economicamente ativa. Eles ganham 400 euros por mês, que pra Alemanha é uma miséria, é um salário de miséria. E quem é o público-alvo? Mulheres. Ao passo que na Espanha, Portugal e Inglaterra, o público é mais amplo, principalmente os jovens”.
Para o economista, essas ações de precarização contra o trabalhador, que terão reflexo imediato nos jovens e a longo prazo poderão alterar de forma definitiva a garantia de direitos, são reflexo de uma equipe de transição de governo despreparada, mas que também prioriza um objetivo só: “concentrar riqueza para o setor financeiro que se auto-intitula mercado”, finaliza.
Criação do FGTS eliminou estabilidade no emprego
Um exemplo de alteração trabalhista que foi implantada como opção por adesão voluntária e que se tornou obsoleta até ser eliminada foi a chamada “estabilidade decenal”, que era a garantia de emprego contra a demissão sem justa causa para trabalhadores com dez anos ou mais de contrato de trabalho com carteira assinada, modalidade que vigorou até 1966.
Em 1967, foi criado o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que se estabeleceu como opção prioritária do trabalhador até que formalmente a estabilidade decenal foi extinta na promulgação da Constituição Federal de 1988.
O FGTS acobertou as contratações de trabalho formal como uma proteção contra o desemprego, já que não era mais obrigação das empresas manter as contratações com estabilidade para o trabalhador.
Por Paula Zarth Padilha
Imagem: adaptação de mídia da Campanha Nacional dos Bancários 2015, para a FETEC-CUT-PR
Exposição fotográfica sobre trabalho de agentes penitenciários mostra outro lado do sistema
12 de Novembro de 2018, 22:37Trabalho busca quebrar esteriótipos e romper os preconceitos que ainda existem com a profissão
Mostrar o funcionamento de unidades penais com foco em quem nelas trabalham. Esse é o objetivo da exposição fotográfica “Operários do Cárcere, Rostos Invisíveis”, que acontecerá na OAB-Paraná, de 13 a 26 de novembro. Na abertura da exposição, haverá uma solenidade no local para debater a importância desse servidor no cumprimento da execução penal.
Durante 40 dias, a equipe de comunicação do Sindicato dos Agentes Penitenciários visitou 17 das 33 unidades penais do Paraná para registrar o cotidiano dos servidores por meio de fotos e entrevistas.
A movimentação dentro dos presídios, os desafios enfrentados com a falta de infraestrutura do sistema, o atendimento e a relação com os encarcerados serão exibidos em 40 fotos selecionadas entre 700 imagens feitas pelo fotógrafo Joka Madruga. O trabalho busca quebrar os preconceitos e estereótipos que existem em torno da profissão do agente penitenciário.
Iniciada na OAB, a exposição “Operários do Cárcere, Rostos Invisíveis” será itinerante e vai acontecer, ao longo de 2019, em todas cidades onde existem unidades penais no Paraná (Cascavel, Cruzeiro do Oeste, Francisco Beltrão, Foz do Iguaçu, Guarapuava, Maringá, Londrina e Ponta Grossa).
A abertura da exposição marca também a comemoração pelo Dia do Agente Penitenciário, celebrada em 13/11. “É necessário que a população entenda o que a gente faz e qual a importância da nossa atividade pra segurança de todos”, esclarece o presidente do SINDARSPEN, Ricardo Miranda.
EXPOSIÇÃO FOTOGRÁFICA OPERÁRIOS DO CÁRCERE, ROSTOS INVISÍVEIS
Solenidade de abertura
13/11, às 9h30.
Exposição
De 13 a 26/11, de 9h às 18h.
A OAB fica na Rua Basilino de Moura, 253, Ahú, Curitiba.
Guilherme Boulos, à Vigília Lula Livre: “Democracia não é só eleição”
9 de Novembro de 2018, 11:10Coordenador do MTST e o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) visitaram o ex-presidente em Curitiba
Guilherme Boulos, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), e o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), visitaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta quinta-feira (8), na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, onde o petista está preso há 215 dias.
Em fala à imprensa, Boulos defendeu que a democracia “deve ser uma prática cotidiana”, de respeito à Constituição e aos direitos sociais e trabalhistas. Ele criticou ainda a proposta defendida pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) de criminalização dos movimentos sociais.
“Democracia não se limita a um eleição, de quatro em quatro anos. Democracia tem que ser uma prática cotidiana, onde se respeita a Constituição, os direitos das pessoas, das oposições, das minorias, onde se respeita a liberdade de expressão, dos movimentos sociais. Dessa democracia, a gente não vai abrir mão”, disse Boulos.
O presidente eleito já afirmou que não pretende dialogar com movimentos sociais como o MTST e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Em entrevista à Rede Record, em outubro, Bolsonaro defendeu também que as ações desses movimentos sejam tipificadas como terrorismo, pois “a propriedade privada é sagrada”.
A proposta de ampliação da Lei Antiterrorismo, na qual os movimentos sociais seriam enquadrados, tem relatoria do senador Magno Malta (PR), cotado para integrar a equipe do governo Bolsonaro. A votação da matéria estava marcada para o dia 31 de outubro, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas foi adiada.
Para Boulos, as declarações de Bolsonaro contra os movimentos sociais são “próprias de quem não consegue conviver com a democracia”. O coordenador do MTST explicou que tais movimentos são compostos por pessoas humildes, que lutam para ter direitos básicos como moradia e alimentação.
“Alguém que não consegue pagar aluguel no fim do mês é terrorista? Um trabalhador boia fria, que vai para uma ocupação para ter uma terra para plantar é terrorista? Se querem acabar com o MTST, construam seis milhões de casas para todo sem teto desse país. Se querem acabar com o movimento sem terra, façam a reforma agrária e deem terra para quem precisa”, disse Boulos.
Emblema da resistência
Para o deputado Paulo Pimenta, a atual conjuntura brasileira exige não só dos movimentos sociais, mas de toda a população uma capacidade de organização política e de resistência para barrar retrocessos em direitos. Na visão de Pimenta, a Vigília Lula Livre é um emblema de resistência, que deveria ser tomado como exemplo em diferentes partes do Brasil.
“Nós estamos sendo desafiados a ter capacidade de resistência e capacidade de combate. E não se faz isso sem formação política, sem organização, sem disciplina, sem clareza de um projeto político maior, para compreender, inclusive, a dimensão do que nós estamos vivendo”, afirmou.
Esta é a terceira vez que Paulo Pimenta visita o ex-presidente Lula. Segundo o deputado, em todos encontros Lula reiterou a importância da Vigília para mantê-lo “forte e motivado”.
Edição: Diego Sartorato
Foto: Joka Madruga
Brasil de Fato
Nova era no país terá extinção de Ministério responsável por políticas públicas para o trabalhador
9 de Novembro de 2018, 9:37Procuradores do Ministério Público do Trabalho, magistrados e advogados trabalhistas publicam nota técnica com posicionamento contrário à extinção ou fusão do Ministério do Trabalho, anunciada pelo presidente eleito Bolsonaro
Não é pouca a quantidade de demandas que deverá ser incorporada a um ministério qualquer. Para o trabalhador ou para quem está à procura de recolocação profissional, é preciso disponibilizar diversos cadastros, como de vagas formais, da confecção da carteira de trabalho, do imigrante que vai atuar no país, para recebimento de seguro-desemprego.
Uma pasta qualquer terá que atender demandas de alteração estatutária ou de direções sindicais, registrar acordos coletivos de trabalho. Para as empresas, uma pasta de um ministério qualquer terá que registrar declarações mensais de cadastro de empregados e desempregados, de trabalho temporário, de pagamento de FGTS, PIS, Pasep, receber relação anual do emprego formal.
Esse ministério qualquer também terá que atender os trabalhadores sazonais, como os pescadores organizados em associações, os que se inserem na economia solidária e no empreendedorismo. Tem uns detalhes também como equipamento de segurança, fiscalização.
Talvez lidar com uma papelada de museu para beneficiários do seguro-desemprego, do fundo de amparo ao trabalhador, abono salarial, atender desempregado na recolocação profissional e empregadores na intermediação da mão de obra formal. Olhando bem, tudo parece passível de terceirizar, não? Pois qualquer empresa privada poderia burocratizar tudo isso aí. E quem é que estará no mercado formal de trabalho no Brasil 2019?
A estarrecedora declaração do presidente eleito Jair Bolsonaro, que assume em 2019, de que “o Ministério do Trabalho vai ser incorporado a algum ministério”, mexe, mais uma vez com políticas públicas fomentadas pelo Estado. E que ele está empurrando para a responsabilização das empresas.
Para a bancária Marisa Stedile, diretora da Secretaria de Políticas Sociais da Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito do Paraná (FETEC-CUT-PR), a proposta de extinção do Ministério do Trabalho mostra o descaso e a desinformação do presidente eleito a respeito do seu funcionamento e abrangência. “O Ministério do Trabalho é responsável pela elaboração de políticas públicas para o mundo do trabalho, tais como a qualificação profissional e o seguro desemprego. Produz todas as estatísticas, estudos e pesquisas (desigualdades salariais entre homens, mulheres, negros e brancos por exemplo). Ainda há todo o setor de fiscalização, combate à informalidade e ao trabalho escravo e infantil”, lembra a dirigente.
Marisa explica que além da emissão da carteira de trabalho e da intermediação de mão de obra, outro setor que o Ministério do Trabalho cuidava antes do golpe de 2016 era da economia solidária e da agenda do trabalho decente.
“Durante os governos Lula e Dilma, o Brasil havia aderido à agenda internacional do trabalho decente, que previa o cumprimento de várias convenções da Organização Internacional do Trabalho. Considero que tal medida irá fragilizar ainda mais as relações de trabalho”, diz.
Esse entendimento é também corroborado por representantes da advocacia e da justiça trabalhista. De acordo com Nota Técnica assinada pelos presidentes da Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), pelo Procurador Geral do Trabalho (MTE), pela Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas (Abrat) e pelo Colégio de Presidentes e Corregedores dos Tribunais Regionais do Trabalho (Coleprecor), “qualquer iniciativa desse jaez gerará irreversível desiquilíbrio nas relações entre capital e trabalho, com evidente risco de violação dos compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do Brasil na promoção do trabalho decente”.
O MTE se manifestou publicando nota pública em que lembra que dia 26 de novembro o órgão completa 88 anos e que foi criado para “harmonizar” as relações entre patrões e empregados. A nota registra que é preciso “um ambiente institucional adequado para a sua compatibilização produtiva” para a busca do pleno emprego e melhora de vida dos brasileiros.
O Ministério do Trabalho e Emprego é o órgão do governo federal “que trata das políticas e diretrizes para a geração de emprego e renda e de apoio ao trabalhador” mas que também tem o papel de atuar nas diretrizes das relações de trabalho, da fiscalização das empresas, de políticas salariais, de desenvolvimento profissional, saúde e segurança do trabalhador, cooperativismo e imigração.
A pasta é responsável pelas agências Sine, de busca de emprego formal e recolocação profissional; da confecção da Carteira de Trabalho, um documento que contém, desde 1997, em sistemas online, todas as informações de cada trabalhador registrado: CPF, RG, endereço, digital, sob a justificativa de evitar fraudes nas contabilizações previdenciárias. E nesse sentido, o sigilo de dados pessoais de cada cidadão está em risco, ainda que ele esteja fora do mercado de trabalho formal.
Para o presidente da CUT, o bancário Vagner Freitas, o enfrentamento a esse retrocesso deve ser pela coletividade. Em vídeo publicado no facebook, ele reafirmou o compromisso dos sindicatos em defender a existência do Ministério do Trabalho: “Nós não vamos permitir isso. Trabalhador e trabalhadora, você não está sozinho. Nós estamos aqui para te defender. Se unifique junto com seus sindicatos, venham para a luta para defender os seus direitos. Está em risco o que sobrou deles depois que o Temer fez a reforma trabalhista. Isso é muito grave. É um presidente que não tem respeito pelo mundo do trabalho, pelo seu trabalho, por você que é trabalhador”.
Na última quinta-feira, 8 de novembro, servidores do Ministério do Trabalho fecharam a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, em manifestação contra a extinção da pasta.
Ações do MTE
O Ministério do Trabalho fiscaliza as empresas que não recolhem FGTS de seus empregados. Nos três primeiros trimestres de 2018, a fiscalização resultou em mais de R$ 4,1 bilhões para o FGTS e de Contribuição Social.
As Superintendências regionais nos estados supervisionam e monitoram políticas públicas de trabalho e emprego, disponibilizando as agências Sine, de recolocação profissional, com intermediação de mão de obra formal e habilitação ao seguro desemprego.
O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) possibilitou, até 31 de dezembro de 2016, a adesão de empresas ao Programa de Proteção do Emprego (PPE), que reduziu jornada de trabalho, com redução salarial, mas que teve os vencimentos dos trabalhadores majorados em até 50% do valor da redução salarial, tendo como resultado a manutenção do trabalhador no emprego formal.
Outros cadastros, como a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) e o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), controlam estatisticamente o emprego formal e identificam trabalhadores com direito ao recebimento do Abono Salarial, além de registrar de forma permanente as admissões e dispensa de trabalhadores com carteira assinada.
“Não podemos esquecer que o Ministério do Trabalho, através da Auditoria Fiscal nas superintendências, também investiga acidentes de trabalho, o trabalho escravo e as diversas irregularidades que possam ocorrer nas relações de emprego”, finaliza Junior Cesar Dias, presidente da FETEC-CUT-PR.
Por Paula Zarth Padilha
Foto: Edu Andrade/Divulgação/MTE
O medo do recuo
7 de Novembro de 2018, 18:17É segredo, então, peço que não espalhem, mas eu tenho um péssimo hábito. É o de sair lendo as coisas que os outros insistem em escrever por aí. Isso me coloca em embaraço, mas é inevitável. Outro dia li, sem querer, um meme, todo trabalhado no verde e no amarelo, que dizia, se não me engano, que a arte, ou os artistas, não serviam para nada. Porque, afinal, se você fica doente, procura um médico. Se você quer construir sua casa, procura um engenheiro. Se você quer consumir, procura quem vende trecos por aí. Que mais poderia se esperar da vida?
A minha primeira reação a esse meme foi a mesma de quando vi, também sem querer, uma imagem de um suposto vídeo íntimo de um candidato a governador: arrancar meus olhos, colocar os dois num saco plástico da Havan e jogá-los na lixeira. Mas aí eu lembrei que eu nunca comprei nada na Havan, então, deixei pra lá. Nesses tempos bélicos isso acabou me lembrando, depois, de uma historinha. Ela está num troço que apareceu na minha frente, tempos atrás. Era um livro. “As aventuras de Huckleberry Finn”. O autor era um cara chamado Mark Twain. Acho que é um desses caras que as escolas obrigam os alunos do ensino médio a ler, lá nos EUA. Ele tinha bigode maneiro.
Enfim, essa historinha, que segundo o Roberto Bolaño deveria ser fixada nas paredes de cada bar neste mundo – e de cada escola, também, e arrisco dizer que de cada condomínio fechado com piscina, também, e de cada supermercado e loja de departamento, menos na Havan, claro – é mais ou menos assim: numa pobre cidade sulista dos EUA do século XIX um bêbado inconveniente se prostra na frente da casa de um militar reformado e começa a insultá-lo. Assim, do nada. Lá pelas tantas o milico, que se enfeza com calma, se é que é possível se enfezar com calma, vai até o bêbado e diz algo como “Você tem até as 13h pra continuar me xingando. Se você disser mais uma vírgula a meu respeito depois desse horário, vai pagar caro”. Ou vai pagar com a vida, sei lá. O sentido foi esse. Bem claro. Achei até legal da parte do militar, quero dizer, achei bacana o cara alertar sobre uma punição que nem seria retroativa.
Vou interromper a narrativa só um minutinho, que tem barulho estranho aqui perto.
Voltei. Foi só um veículo militar fortemente armado passando. Tive que tirar as crianças da janela. Continuemos.
Ocorre que o bêbado acabou, sim, dizendo vírgula a respeito do milico depois das 13h. Esse, com toda a placidez do mundo, saiu de casa, atirou no inconveniente no meio da rua, deitou a pistola na calçada e voltou pra dentro. Aí foi aquele drama. A filha do baleado chegou, em prantos. Juntou curioso. Carregaram o bêbado pra dentro de um bar, botaram uma bíblia no peito dele, mas, não adiantou: morreu.
Foi aí que o cidadão semi-anônimo, ali, na multidão que juntou, disse algo a respeito de linchar o milico.
A situação ficou séria. Mais séria ainda, quero dizer. Foram pra casa do assassino, com paus e pedras nas mãos. Gritaria, poeira levantada, alvoroço. Portão derrubado. O barulho ensurdecedor da turba só parou quando se deram conta de que o militar estava de pé no telhado, com um rifle na mão, olhando pra baixo, ameaçador qual um liquidificador sem tampa. E foi aí que ele falou o seguinte (agora vou transcrever):
“Essa ideia de vocês lincharem alguém é divertida. A ideia de vocês acharem que têm coragem pra linchar um homem! Só porque são valentes pra cobrir de piche e penas umas pobres mulheres párias e desamparadas que aparecem por aqui, acham que têm força pra pôr as mãos num homem? Ora, um homem tá seguro nas mãos de dez mil da laia de vocês… desde que seja de dia e que vocês não ataquem por trás. Eu não conheço vocês? Ora, conheço vocês por dentro e por fora. Nasci e fui criado no Sul, e já vivi no Norte, por isso conheço o homem comum por toda parte. O homem comum é covarde”.
Já teria bastado. Mas ele continuou:
“Os seus jornais tanto falam que vocês são um povo valente, que vocês acham que são mais valentes que qualquer outro povo… mas vocês são apenas tão valentes quanto. Por que os seus júris não enforcam os assassinos? Porque têm medo de serem mortos com tiros pelas costas disparados pelos amigos do cara no escuro… exatamente o que eles próprios fariam”.
Já teria bastado, mais ainda. Mas ele continuou:
“Vocês não queriam vir. O homem comum não gosta de encrenca e perigo. Vocês não gostam de encrenca e perigo. Mas se meio homem que seja… como Buck Harness, ali… grita ‘Lincha o cara, lincha o cara!’, vocês ficam com medo de recuar, com medo de todos descobrirem o que vocês são… uns covardes… e assim soltam um berro e agarram-se no rabo da casaca daquele meio homem e vêm vociferar aqui, praguejando e prometendo as grandes coisas que vocês vão fazer. A coisa mais desprezível é uma turba, é o que é um exército… uma turba. Eles não lutam com a coragem que nasce dentro deles, mas com a coragem que tomam emprestado da sua massa e de seus oficiais. Mas uma turba sem nenhum homem à frente está abaixo do desprezível. Agora, o que vocês devem fazer é pôr o rabo entre as pernas, ir pra casa e se meter num buraco. Se qualquer linchamento real acontecer, vai ser no escuro, à maneira do Sul”.
A multidão se arrastou para trás, se despedaçou, e a vida continuou.
O que eu quis dizer com essa historia toda? Nada. Em absoluto.
Ou ao menos nada em aparência.
Provavelmente o próprio Mark Twain não quis dizer nada, ou nada em especial, também. Afinal as pessoas continuarão se provocando, e continuarão reagindo às provocações. Civilização que é barbárie e coisa e tal. E se as pessoas sangrarem, bom, elas procurarão por um médico, e não pelo Mark Twain, que só sabia escrever, e muito menos por mim, que só sei ler. Então, por que se preocupar?
Querer, mesmo, acho que o Mark Twain não queria dizer nada.
E é exatamente por isso, por esse monte de nada, que é engraçado que você tenha lido o que eu escrevi até aqui. Engraçado e terrível. Primeiro, porque talvez você tenha o mesmo péssimo hábito que eu. Que é mais ou menos parecido com o hábito de sobreviver. Segundo, porque o nada que eu quis te dizer alimenta o tudo que você quer entender.
Mais engraçado e mais terrível ainda é o fato de que ninguém avisou aos censores de tempos passados – imagina quanto trabalho seria poupado! – que o Chico Buarque também não quis dizer nada. Nem a Cassandra Rios.
Por Bruno Brasil, jornalista curitibano radicado no Rio de Janeiro, escreve para o Terra Sem Males na coluna “entre aspas”
Foto: Bruna Brasil
Terra Sem Males
Oposição na OAB Paraná reivindica protagonismo da advocacia e ocupação de espaços políticos da entidade pelas mulheres
4 de Novembro de 2018, 10:31A chapa “Algo Novo na Advocacia” prioriza paridade na composição e maior interação com as diversas carreiras jurídicas para além da magistratura
Buscando um novo modelo de gestão participativa e a derrubada do que denominam como “dominação de meio século”, advogadas e advogados do Paraná constroem um plano de gestão chancelado por advogados trabalhistas progressistas, advogadas criminalistas, professores de cursos de Direito, entre outras carreiras jurídicas, formando a chapa “Algo Novo na Advocacia Paranaense”.
Apoiada por coletivos que notoriamente se posicionam e atuam em defesa dos direitos humanos, dos movimentos sociais e dos trabalhadores, mas prioritariamente em defesa da Constituição Federal nas interpretações das leis e decisões, o movimento tem se organizado com encontros abertos para novas adesões, como uma reunião de mulheres advogadas num café, ocorrida no dia 19 de outubro.
A roda de conversa foi mediada pela experiente advogada Ivete Caribé, uma das poucas mulheres formadas na época da ditadura, e que compôs a Comissão da Verdade. Ivete lembrou notória frase de Adail Sobral junto às colegas, lembrando que é dever do advogado defender o oprimido, tendo a consciência de que é um ser político.
A advogada trabalhista Denise Filippetto é uma das entusiastas desse projeto que desde o início pensou a composição da chapa com paridade. Durante o lançamento da chapa, que ocorreu na noite da última quarta-feira, 31 de outubro, ela explicou que o movimento Algo Novo surgiu considerando a importância de espaços de debate sobre cultura política, crise institucional – e também – de desprestígio da advocacia, que atribui à omissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). “É importante que seja um modelo de gestão participativa e transparente na OAB”, falou ainda no encontro com as mulheres. “A chapa foi construída por um grupo de se reúne há anos e que se discute os temas da advocacia e as dificuldades. Essa representação não está deslocada da realidade da advocacia”.
A chapa é encabeçada pelo advogado Manoel Caetano, professor da Universidade Federal do Paraná. Ele declarou que já se sente vitorioso e mencionou que em todos os cargos em disputa a representação é, no mínimo, paritária, e contempla advogadas e advogados das diversas regiões do Paraná.
A crítica da proposta de oposição é pelo “desrespeito da justiça” com a advocacia. “O advogado nunca foi tão desrespeitado pela justiça, ele é vilipendiado e não encontra braço forte na OAB. Reconquistemos o respeito das instituições”, discursou.
O programa de campanha buscou o diálogo coletivo, especialmente com o movimento de mulheres, para ocupação de lugar de fala e espaços decisórios. A luta pelo espaço da representatividade se mistura com a última trincheira da democracia, que para esse grupo são as mulheres advogadas.
A eleição da OAB Paraná será dia 22 de novembro.
Por Paula Zarth Padilha, texto e foto