Reconstruir a dignidade em 2018 com os cacos de 2017...
29 de Dezembro de 2017, 22:01Fiquei pensando o que escrever como o último post de 2017. Algo que expressasse minhas preocupações em relação ao desmonte nacional, provocado pelos golpistas de plantão, mostrasse que só a organização popular e o enfrentamento organizado ao golpe serão capazes de salvar o pouco que restou das conquistas históricas do século passado, mas também, como humanista, trabalhasse uma dose de otimismo, que ninguém é de ferro.
Foi um ano para se aprender e para sofrer. Assistimos incrédulos e inertes instituições brasileiras serem dizimadas uma a uma, impulsionadas pelo mercantilismo espúrio que tomou conta da política nacional. Escândalos de toda ordem vieram à tona, provando que o sistema político nacional está bichado, dominado e à venda. Quem tem mais leva. Pouco restou dos três poderes e quase nada da tal democracia representativa.
Politiqueiros e políticos profissionais de plantão agiram como piratas do mar de lama que transformaram o país e como larápios de casebres roubando dos pobres seus últimos pães. Criaram novas formas de rapinagem e se deliciaram com as farras e as montanhas de dinheiro público, que só não há para garantir a Previdência dos assalariados, nem para um aumento digno do salário mínimo, por exemplo, mas sobra quando a pegada é à compra de deputados e senadores que votem a favor do desmonte nacional, ou ainda para lotar os cofres dos bancos internacionais em contas pessoais privadas.
Quem vai pagar essa conta? Lula que é o candidato que se não condenarem ganha as eleições e o povo trabalhador é claro! Tá tudo dominado!
Na ordem do dia está reconstrução da casa-grande com grandes muralhas e construir a maior senzala que esse país já viu. Uma senzala que não tem cor. Tem apenas ódio de classe. Uma espécie de primeiro passo para um e extermínio em massa, visto que já está em curso, com a matança de jovens negros e pessoas da periferia. Uma verdadeira limpeza racial e econômica.
Em resumo, o ano de 2017 foi um ano de trevas. Roubaram a luz. O golpe em curso levou com ele a esperança de milhares de pessoas, como também centenas de conquistas alcançadas nos últimos cem anos. Só isso já bastava, para fechar o sinistro ciclo, porém em 2018 o governo golpista quer destroçar a Previdência. Desfigurar um direito fundamental de quem trabalha tudo em nome de um desenvolvimento, que nada tem de humano, ditado pelo Banco Mundial, pelo FMI e pelo capital internacional. Um pacto entre o deus mercado e o demônio imperialista. Algo que nem com muita água benta se exorciza. A não ser com organização e muita luta.
Desde a primeira greve organizada em 1907, que paralisou a cidade de São Paulo, passando pela primeira greve geral ocorrida em 1917, até os dias de hoje, nada foi doado para trabalhadores e trabalhadoras e sim conquistado com muito luta, mortes e também traições. O medo que ronda o país é que o que se reivindicava em 1907, tais como: jornada de oito horas diárias de trabalho, direito a férias, proibição do trabalho infantil, proibição do trabalho noturno para as mulheres, aposentadoria e assistência médica hospitalar, esteja tão atual após a fatídica reforma trabalhista, que seja a única pauta novamente a ser reivindicada numa próxima empreitada organizada, quando a classe trabalhadora acordar. Porém, pode ser e deve ser tarde demais...
A primeira vitória da rapinagem foi acabar com CLT, que era um sonho deles antigo. A CLT foi jogada no lixo com as 117 mudanças ocorridas, a tal ponto das empresas agora trocarem de funcionários, contratando-os, por favor, com o tal “Contrato Intermitente”. Um verdadeiro desrespeito à própria Constituição Federal. O resultado disso? Mais da metade da classe trabalhadora já se encontra na informalidade e o 1% mais rico do Brasil ficando com 27% da renda nacional e os 10% mais ricos, com 55%. É a volta da pirâmide econômica em grande estilo. É a morte do que eles chamavam de “Nova classe média” e a Professora Marilena Chauí chamava de "Nova classe trabalhadora”. Viveu-se uma doce ilusão.
Em regras gerais, ou trabalhadores e trabalhadoras se unem e lutam ou serão dizimados. Ou se organizam ou nem mesmo sindicatos terão mais.
Uma dose de otimismo...
Para escrever alguma coisa otimista tenho que recorrer a Paulo Freire, que tive a honra de conhecer e materializar uma de suas teorias na Prefeitura de Artur Nogueira, quando era Secretário de Planejamento, quando criamos o Grupo Gestor de Integração e Planejamento e usamos a Teoria do Carrossel.
Paulo era um sonhador por convicção e viajava em sua utopia de empoderar a sociedade, de dar voz a quem não tinha e afirmar que o conhecimento transformava as pessoas e as fazia voltar a sonhar.
Usando Paulo Freire foi nessa linha que conduzi 38 cursos pela Fundação Perseu Abramo nesse ano, em 12 estados, com o principal objetivo de ensinar e aprender. Dar e receber. Subverter as pessoas afirmando que elas podem transformar suas próprias realidades, na medida em que entenderem que sozinhas nada são, mas juntas poderão transformar a sociedade, rumo a uma sociedade justa, fraterna e igualitária para todos e todas.
Termino citando uma das falas de Paulo Freire, onde mostra sua inquietação para sair de sua utopia rumo a práticas a ela coerentes.
“Se, na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto de mundo, devo usar toda possibilidade que tenha para não apenas falar de minha utopia, mas participar de práticas com ela coerentes. (Paulo Freire)”.
Um 2018 de muitas conquistas!
Antonio Lopes Cordeiro (Toni)
Pesquisador em Gestão Pública e Social
Um bonde chamado solidão
21 de Dezembro de 2017, 0:01Por definição, solidão pode ser definida como sendo a falta de companhia ocasionada por decisão pessoal ou por contingência de uma situação provocada, que ocasiona entre outras coisas isolamento, carência e um profundo vazio, mas também pode ser falta de contato com a própria essência. Algo que transcende a angústia de estar sozinho e deságua num determinado momento na vida das pessoas.
Porém, a pretensão deste post é chamar a atenção para novos tipos de solidão, como por exemplo, uma solidão vivida em meio á multidão, ou ainda a solidão de não ter objetivo de vida e nem perspectiva de como será o futuro. Uma solidão que caminha com a vida.
Com um pouco de atenção se percebe que uma grande parte da população brasileira se encontra em solidão. Ou seja, apesar de rodeados e rodeadas de outros seres humanos, não interagem e não dialogam sobre suas existências, apenas transitam em pequenos papos ou flertes que nada fica de concreto.
Por ser um sentimento decorrente, a solidão pode ocorrer não só pelas questões sentimentais ligadas ao amor ou falta dele, mas também se revelar num ambiente de trabalho, por exemplo, ou em qualquer outro setor de convivência humana. Há algo mais cruel do que a discriminação explicita ou dissimulada, que provoca um estado de carência que leva à solidão? Ou ainda, pessoas do seu ambiente e trabalho que ao cruzar contigo desvie o olhar?
Partindo desse cenário vêm outras perguntas: Será preciso estar solitário para que se reflita sobre a vida? Será necessária uma dose de tristeza para que se acorde sobre a realidade interior? A introspecção provocada pela solidão nos leva à reflexão, ou apenas expõe nossas fragilidades?
No Samba da Benção, Vinicius de Morais afirma que para se fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza, senão, não se faz um samba não. Ou seja, nesse caso a tristeza leva os compositores a dialogarem com ela mesma, com a esperança e quase sempre com o desamor.
A solidão é um tema complexo, pois envolve origens diversas e caminhos muitos diferentes de se lidar com a situação. Para uns solidão é uma doença, para outros uma necessidade rumo à reflexão e para muitas pessoas uma angustia constante que pode levar a um estado depressivo.
Ao se fazer uma breve análise do modernismo atual, ou seja, da era do conhecimento, observa-se as redes sociais bombando, milhares de pessoas interagindo dia e noite sobre diversos assuntos, dos mais sérios aos mais banais, porém a maioria das pessoas permanece só. A interação na web por si só não dá conta de superar a solidão. A busca por tudo e nada ao mesmo tempo nas redes só faz aumentar o estado de solidão. Seres humanos precisam de um projeto de vida, que faça valer suas próprias vidas.
Trata-se de novos tipos de solidão. Uma busca incessante por não se sabe o quê e a resposta de tudo isso pode ser uma insatisfação individual ou coletiva que começa nas redes e pode terminar num ponto qualquer da cidade ou do campo e muitas vezes em diferentes formas de violência. Nesse caso podemos chegar à conclusão que a solidão pode se transformar numa doença social.
ONGs britânicas chegaram à conclusão através de pesquisa, que a solidão é uma “assassina invisível”, mata aos poucos, principalmente as pessoas idosas. Segundo essas organizações, um em cada dez idosos britânicos sofre de solidão intensa, que desencadeia vários problemas, como o Alzheimer.
Partindo desse pressuposto, há evidências de que uma possível cura para a solidão pode estar no processo de interações que busquem o prazer, se referindo ao prazer aqui como algo que eleve a pessoa, que a mesma se sinta contemplada com o que estiver fazendo e principalmente que seja algo que fortaleça o ego e aponte para missões futuras. Ou seja, algo que mantenha as pessoas ocupadas em atividades que as façam felizes.
É até possível e compreensível que algumas pessoas necessitem de uma dose de solidão contida, para fazer fluir ideias, como na samba do Vinicius. Porém, há sempre um grau de risco numa situação como essa.
Clarice Lispector escreveu sobre isso e afirmou: “Sim, minha força está na solidão. Não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite”. Uma frase poética, mas que deixa a entender que às vezes precisamos da solidão para revermos a vida que passou e mirar na vida que virá.
Fecho essa pequena incursão sobre a solidão com duas frases. Uma do Augusto Cury, que faz um alerta diferenciando a solidão provocada por fatores externos, da solidão que veio e ficou como um abandono do ser: “Quando somos abandonados pelo mundo, a solidão é superável; quando somos abandonados por nós mesmos, a solidão é quase incurável”.
A outra de Vinicius de Morais, afirmando que mesmo um amor inacabado ou às vezes inexistente vale mais que a solidão: “Não há mal pior que a descrença, mesmo o amor que não compensa é melhor que a solidão”.
No mais, quem nunca viveu uma solidão, ou pelo menos momentos de solidão? Trato minha parcela de solidão tentando entender meu presente, frutos de desencontros passados e focando na minha missão. Lutar por uma causa e deixar para a história minha contribuição.
Antonio Lopes Cordeiro
Estatístico e Pesquisador em Gestão Pública Social
tonicordeiro1608@gmail.com