Mudanças climáticas vão agravar secas e prejudicar produção de alimentos no Caribe, segundo a FAO. Foto: FAO
Por Alicia Bárcena*
O Fórum Político de Alto Nível que aconteceu na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, até quarta-feira (18), convidou os países-membros a apresentarem seus avanços na implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, adotada em 2015, e trocar experiências na construção de sociedades mais resilientes.
Com esse objetivo, o fórum deste ano se concentra principalmente em cinco dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), cuja implementação contribui para fortalecer a resiliência econômica, social e ambiental.
Avançar rumo a sociedades mais resilientes é um desafio ainda maior para nossa região devido ao seu alto grau de vulnerabilidade diante dos desastres naturais, particularmente na América Central e no Caribe, cuja vulnerabilidade a esses eventos aumenta como consequência da mudança climática.
Entre 1990 e 2017, foram registrados 345 desastres vinculados ao clima nos pequenos Estados insulares do Caribe, e seu impacto representa uma carga adicional para essas nações que, devido a seu tamanho, não podem aproveitar economias de escala.
Da mesma forma, esses países são caracterizados por altos níveis de endividamento, que limitaram a dotação orçamentária para prevenção, mitigação e reconstrução pós-desastre em detrimento de investimentos em outros setores-chave para o desenvolvimento sustentável.
Por isso, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), no marco de sua estratégia “Caribe Primeiro”, destacou o atual contexto de crise ambiental e vulnerabilidade financeira como uma oportunidade para criar um mecanismo de alívio da dívida multilateral dos países do Caribe. A finalidade seria liberar recursos para a criação de um fundo para investimentos de adaptação e mitigação climáticas de baixo carbono.
Em toda a região, a capacidade de dar resposta aos desafios climáticos e ambientais encontra-se enfraquecida pela persistência da desigualdade em suas diferentes dimensões, cujos efeitos pioraram devido à mudança climática.
Esse fenômeno implica uma dupla desigualdade: os grupos de maiores rendas são os principais emissores de gases de efeito estufa — ao ser os maiores consumidores de combustíveis fósseis —, enquanto os mais pobres são os mais vulneráveis a seus efeitos, dada a sua menor capacidade de mitigação e adaptação.
A redução da desigualdade em termos de renda observada na primeira década deste século foi freada nos últimos anos, e a lacuna continua sendo uma das mais elevadas: na escala regional, a renda do quintil mais rico representa em torno de 45% da renda dos domicílios, enquanto que a renda média do quintil mais pobre alcança apenas 6% da renda total.
Na América Latina e no Caribe, dado o alto nível de urbanização que, segundo os dados das Nações Unidas, alcançará 83,6% em 2030, as cidades emergem como um dos espaços estratégicos e prioritários nos esforços para fomentar o desenvolvimento sustentável e resiliente com a contribuição de vários atores.
No âmbito mundial, as cidades concentram uma porcentagem cada vez maior da população e são responsáveis pela maior parte do consumo energético e pelas emissões de gases de efeito estufa.
A transição energética para uma maior participação de fontes renováveis e limpas representa uma oportunidade prioritária não somente para a sustentabilidade urbana, mas para impulsionar o crescimento de setores produtivos com a incorporação de progresso tecnológico.
Mudar a matriz energética da mobilidade na estratégia energética das cidades e assegurar sua acessibilidade é a chave para investimentos sustentáveis, e pode ser uma importante contribuição para o cumprimento do Acordo de Paris para o clima e para a Agenda 2030.
A segunda reunião do Fórum dos Países da América Latina e do Caribe sobre o Desenvolvimento Sustentável, realizada em abril deste ano na sede da CEPAL em Santiago, Chile, foi uma oportunidade para debater e trocar experiências sobre os temas prioritários para a cooperação e investimentos sustentáveis e envolver vários atores na implementação das agendas globais de sustentabilidade.
Acabar com as várias formas de desigualdade nas cidades e territórios é uma condição fundamental para alcançar um desenvolvimento sustentável e resiliente na região. A estratégia deve ser sustentada com mecanismos de governança mais harmônicos entre diferentes níveis de governo e o fortalecimento de seu financiamiento.
Esses desafios exigem uma conversa renovada entre Estado, mercado e sociedade e um aumento na capacidade de formar coalizões e fortalecer instituições para o fomento de políticas sustentáveis e promotoras de resiliência em escala mundial, regional, nacional e local.
*secretária-executiva da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL)