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Forçada a se casar, refugiada de 12 anos foge da família na Mauritânia

13 de Julho de 2018, 14:53 , por ONU Brasil - | No one following this article yet.
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Na tenda de seus pais, Fatimata escreve e desenha em seus cadernos da escola. Atrás dela, empilhados, estão os colchões e cobertores que serviriam como seu dote. Foto: ACNUR /Helena Pes

Na tenda de seus pais, Fatimata escreve e desenha em seus cadernos da escola. Atrás dela, empilhados, estão os colchões e cobertores que serviriam como seu dote. Foto: ACNUR/Helena Pes

Sentada numa tenda do campo de refugiados de Mbera, na Mauritânia, a jovem Fatimata, de 12 anos, desenha uma flor em seu caderno escolar. Atrás dela estão empilhados os colchões e cobertores que seriam seu dote, se ela não tivesse resistido à tentativa da família de casá-la à força com um primo, pastor de gado em sua terra natal, o Mali.

“Foi só no dia em que meu tio do Mali veio para cá que entendi que meus pais tinham arranjado um casamento para mim”, conta a menina. “Ninguém me perguntou se eu queria me casar. Eu estava com tanto medo que fugi.”

“Agora eu sei que eles estavam falando sobre isso há muito tempo”, acrescenta Fatimata, que diz ainda não conhecer o parente com quem queriam casá-la. “Mas sei que ele é muito mais velho que eu.”

O campo de refugiados é a casa de Fatimata desde os seis anos de idade. O assentamento está localizado numa região árida do sudeste da Mauritânia, perto da fronteira com o território malês. Após a onda de violência que começou no norte do Mali em 2012, Mbera se tornou o lar temporário para mais de 56 mil refugiados. Entre a população deslocada, existem muitos pastores árabes e tuaregues que perderam seus meios de subsistência no conflito.

Como a falta de segurança perdura no Mali, novos fluxos migratórios para a Mauritânia são comuns. Desde janeiro de 2018, mais de 4,7 mil pessoas foram registradas em Mbera. Os refugiados trazem relatos de ameaças, extorsão e execuções por grupos armados. Também falam sobre condições de vida exaustivas nos lugares onde moravam.

A pobreza e a vulnerabilidade dentro do acampamento contribuíram para a realização de casamentos precoces e forçados. Em 2017, 97 casos foram registrados pela Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). No entanto, o número real é provavelmente muito maior. O organismo das Nações Unidas, em parceria com o Fundo da ONU para a Infância (UNICEF) e a ONG italiana Intersos, criou uma rede de segurança para proteger as crianças que moram no campo.

Pouco depois de fugir da família, Fatimata foi encontrada e levada de volta para a tenda dos pais. “Meu tio me amarrou com uma corda para ter certeza de que eu não escaparia novamente, mas consegui me libertar e fugir mais uma vez para a casa da minha prima, do outro lado do campo”, lembra a jovem. A menina esperou amanhecer antes de ir à escola mais próxima e procurar ajuda.

“Quando encontrei Fatimata, ela estava angustiada e com contusões nos braços e no pescoço por causa da corda”, afirma a também refugiada Halima Sidiwa, indicada pela Intersos como ponto focal da comunidade para crianças em risco. A voluntária oferece um lugar seguro para meninas.

Fatimata passou cinco dias na casa de Halima, recusando-se a voltar para os pais até o tio ir embora. “Ela estava apavorada e chorava porque queria voltar para a escola”, explica a assistente sênior de Proteção do ACNUR, Houleymata Diawara. A especialista e outros profissionais de assistência discutiram o episódio com líderes comunitários antes de se encontrar com a família da menina.

As conversas com os parentes não foram fáceis, mas a mãe de Fatimata, Walet, estava entre os que eram contrários ao matrimônio. “Eu não estava feliz com a ideia de dar a minha filha em uma idade tão jovem e expressei minha tristeza, mas eles não me ouviram”, lamenta.

“Quando meu pai ouviu o que estava acontecendo, ele me avisou para não me meter entre meu marido e seu irmão mais velho e deixá-los fazer o que deviam”, completa a mãe. “Em nossa cultura, o irmão mais novo deve respeitar as decisões tomadas por um irmão mais velho. Ele já havia decidido que iria levar minha filha, então eu não fiz nada.”

Após um longo processo, a equipe de proteção e outros moradores de Mbera conseguiram persuadir a família a cancelar a união e permitir que Fatimata continuasse estudando. “Agora que o casamento foi cancelado, eu não tenho mais medo”, diz Fatimata, alegre. “Ouvi dizer que encontraram outra esposa para o meu primo e estou feliz de poder ir à escola.”

O representante do ACNUR na Mauritânia, Nabil Othman, disse que a agência e seus parceiros continuarão se envolvendo com as comunidades para aumentar a conscientização sobre o assunto e tentar prevenir novas ocorrências.

Além da proteção social para crianças, “a documentação também é uma ferramenta de proteção infantil muito importante, que nos permite intervir em casos de casamentos precoces e forçados”, explica Othman.

Recentemente, a Mauritânia começou a distribuir certidões de nascimento para todos os refugiados maleses nascidos no campo de Mbera. A data de nascença desempenha um papel fundamental na proteção dos menores de idade, permitindo que as autoridades identifiquem casos de matrimônio infantil e outras formas de abuso, antes de recolher provas contra os agressores.


Fonte: https://nacoesunidas.org/forcada-a-se-casar-refugiada-de-12-anos-foge-da-familia-na-mauritania/

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