
Mulher durante protesto em Manágua, Nicarágua, em abril de 2018. Foto: Foto: Celia Mendoza/Voice Of America
Semanas de protestos e violência na Nicarágua revelaram a grave situação dos direitos humanos no país e a necessidade de o governo adotar medidas significativas para evitar novas mortes, combater a impunidade e garantir justiça às vítimas, disse o alto-comissário das Nações Unidas para os direitos humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein.
“A violência e a repressão vistas na Nicarágua desde as manifestações iniciadas em abril são produto da erosão sistemática dos direitos humanos ao longo dos anos e destacam a fragilidade geral das instituições e do Estado de Direito”, disse Zeid.
Os protestos foram inicialmente contrários a uma proposta de reforma previdenciária, mas se ampliaram para manifestações mais amplas contra o governo do presidente Daniel Ortega.
Informações de várias fontes indicam que aproximadamente 250 pessoas, muitas delas jovens, foram assassinadas e milhares ficaram feridas entre meados de abril e 4 de julho. Fontes do governo indicam que 12 policiais também foram mortos. Mais de 700 pessoas foram declaradas detidas arbitrariamente, com algumas pessoas sujeitas a maus-tratos, de acordo com as acusações. Casos de desaparecimentos também foram relatados.
“Peço ao governo que ponha fim à violência do Estado e desmobilize os indivíduos armados pró-governo que têm sido cada vez mais responsáveis pela repressão e pelos ataques. Aqueles que instigaram ou permitiram que tais elementos armados atuassem devem ser responsabilizados”, disse Zeid.
Uma equipe do escritório de direitos humanos da ONU visitou a Nicarágua a convite do governo de 26 de junho a 3 de julho para realizar o monitoramento dos direitos humanos e apoiar o trabalho da Comissão de Verificação e Segurança. Esta é uma das comissões criadas pelo diálogo nacional envolvendo funcionários do governo e representantes de vários setores. Seus objetivos incluem o desarmamento de indivíduos pró-governo e a criação de condições para que as barricadas erguidas por algumas comunidades sejam desmanteladas.
“Apesar de eu agradecer o governo da Nicarágua por ter convidado o Escritório de Direitos Humanos da ONU para o país, peço agora que as autoridades tomem medidas reais para reconhecer a gravidade da situação e cumprir suas obrigações de direitos humanos, inclusive adotando medidas apropriadas para proteger a população e evitar mais mortes”, disse o alto-comissário.
O uso excessivo da força contra os manifestantes observado no início da crise diminuiu à medida que os policiais se retiraram de muitas de suas funções. No entanto, a violência por elementos armados pró-governo continuou a aumentar, particularmente contra comunidades que ergueram barricadas ou bloqueios de estradas como forma de protesto ou como meio de autoproteção, segundo Zeid.
Há sinais alarmantes de repressão seletiva e intimidação contra os manifestantes e suas famílias, estudantes, defensores dos direitos humanos e membros da Igreja Católica, entre outros, alertou. A equipe da ONU também recebeu relatos de que a presença de indivíduos armados nas ruas, além de elementos armados pró-governo, contribuíram para o clima de intimidação e insegurança. A equipe também ouviu alegações de partidários do governo de que eles sofreram ataques e foram ameaçados de linchamento.
“Minha equipe ouviu relatos de profunda frustração e desespero, além de medo generalizado. Garantias reais precisam ser estabelecidas para que as pessoas possam exercer seu direito à liberdade de expressão, reunião e associação. Os direitos das vítimas à verdade, justiça e reparação também precisam ser respeitados. Exorto o Estado a garantir que haja investigações eficazes, independentes, imparciais e imediatas para estabelecer a verdade e garantir a responsabilidade pelas violações e abusos cometidos desde abril”, disse Zeid.
“É de vital importância que as evidências, incluindo documentação médica e legal, sejam preservadas. O trabalho do Grupo Independente de Peritos da Comissão Interamericana de Direitos Humanos contribuirá para o estabelecimento dos fatos e para a luta contra a impunidade”, observou o alto-comissário.
O Escritório de Direitos Humanos da ONU manterá presença na Nicarágua para continuar seu trabalho de monitoramento e assistência técnica e coordenará suas atividades com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.