Por Clemente Ganz Lúcio1
O desenvolvimento pode ser interpretado como a capacidade política que tem uma sociedade de distribuir os ganhos do crescimento econômico. Já a qualidade do crescimento pode ser interpretada como a capacidade social de criar os instrumentos para conferir bem-estar material, qualidade de vida, liberdade, justiça e sustentabilidade ambiental.
O Brasil é uma das maiores potências econômicas do planeta e vem construindo, no espaço das suas contradições e conflitos, profundas transformações: a urbanização e industrialização, que colocou mais de 80% da população nas cidades; um mercado de trabalho heterogêneo que envolve quase 100 milhões de trabalhadores; sistemas públicos de proteção e promoção social na saúde, educação, assistência social, segurança, entre outros, bases de disputa do nosso desenvolvimento. Essas transformações têm impactos sobre a vida das pessoas e podem ser medidas, por exemplo, pelo aumento da expectativa de vida dos brasileiros.
Compete ao IBGE produzir os indicadores para medir esse fenômeno. Os dados mais recentes mostram que a expectativa de vida dos brasileiros saltou de 62,6 anos (1980) para 74,9 anos em 2013. São 12,3 anos a mais, um crescimento de quase 4,5 meses por ano. As mulheres têm maior expectativa de vida, passando de 65,7 para 78,6 anos, um acréscimo de 12,9 anos. Para os homens, por sua vez, o aumento foi de 59,6 anos para 71,3 anos no mesmo período, acréscimo de 11,7 anos. Em média as mulheres vivem 7,3 anos a mais que os homens.
Esse fenômeno de crescimento da expectativa de vida se deve à diminuição geral da mortalidade da população, com especial destaque para os menores de um ano e dos idosos. Em 1980, por exemplo, a mortalidade infantil era de 70 por mil nascidos vivos, em 2013 essa taxa caiu para 15 por mil, uma redução de mais de 78%. Estudos mostram que isso se deve ao aumento da escolaridade feminina, ao incremento do saneamento básico (água, esgoto e coleta de lixo), diminuição da desnutrição infanto-juvenil, maior acesso aos serviços de saúde, melhoria no atendimento pré-natal e durante primeiros anos de vida da criança, entre outros fatores.
Mas existem diferenças estarrecedoras, como a da taxa de mortalidade entre homens e mulheres jovens (15 a 24 anos). Em 1980 a estimativa indicava que 23 em cada mil jovens do sexo masculino não completariam 25 anos e em 2013 o total de rapazes que não atingiriam o mesmo patamar reduziu-se para 22. Entre as jovens do sexo feminino, em 1980, de cada mil 12 não completariam 25 anos e em 2013 esse contingente caiu para cinco. Por que essa diferença? Os fatores para essa desigualdade são justificados pelo fato de os jovens do sexo masculino estarem muito mais expostos a causas externas, leia-se, violência, homicídios e acidentes de trânsito.
Para aqueles que atingem 60 anos, a expectativa de vida saltou de 16,4 anos para 21,8 anos, no período de 1980/2013. Uma mulher ao atingir 60 anos tem a expectativa de viver até os 83,5 anos e um homem até os 79,9 anos. A diferença de expectativa de vida entre homens e mulheres vem aumentado a favor destas.
De outro lado, há uma profunda mudança na taxa de fecundidade das mulheres. Em 1960 a taxa média era de 6 crianças/mulher em idade fértil, em 2010 reduziu-se para 1,8 filhos. Isso significa que temos uma taxa de crescimento populacional abaixo da reposição básica: um casal deve ter 2,1 filhos para que a população permaneça do mesmo tamanho.
Transforma-se o padrão demográfico brasileiro com reduções na fecundidade e na mortalidade, ou seja, temos um novo padrão que indica o envelhecimento médio da população. A cada década observa-se uma mudança na relação entre o contingente de crianças/jovens e adultos/idosos, ou seja, tem aumentado a participação relativa dos últimos no conjunto da população. Quais as consequências dessa mudança demográfica para o nosso desenvolvimento? Qual o desafio do crescimento econômico para responder a esta transformação populacional?
1 Sociólogo, diretor técnico do DIEESE, membro do CDES – Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.