Há tempos várias pessoas se perguntam sobre que tipo de país, que futuro, estamos construindo.
A experiência europeia nos mostra qual caminha evitar. Lá a esquerda copiou a direita e o povo acabou optando pelo original.
A discussão não é nova, mas não está resolvida. O artigo de Clauido Bernabucci, na CartaCapital de 18/07/12, a resgata de forma intensa.
Vale a pena colocá-la em pauta novamente.
Confira!
Classe média, que significa?
Por Claudio Bernabucci
O compromisso silencioso entre o operário eleito presidente da República e a chamada elite brasileira – criar um mercado interno significativo e promover o crescimento de uma nova classe média – representa a autêntica obra-prima deste líder político indiscutível. Há quem diga que tal compromisso tenha premiado mais os ricos do que os pobres. Fato é que o processo desencadeado por Lula abriu uma dinâmica socioeconômica de baixo para cima que parece irresistível e, talvez, irreversível.
Desde então, fala-se e escreve-se muito no Brasil sobre classe média. A meu ver – salvo raras exceções – em termos ainda inadequados ou instrumentais.
Não importa aqui analisar a questão de um ponto de vista sociológico ou estatístico, nem rodar a faca da polêmica em torno da medida governamental que estabelece ex-púlpito – a partir de maio 2012 – que a classe média no Brasil é formada por pessoas com renda per capita entre 291 reais e 1.019 reais. O que nos interessa é focalizar a urgência de um debate amplo e de maior conteúdo. Para esse fim, o método comparativo poderia ser útil. Não para copiar modelos alheios, mas para, eventualmente, identificar um modelo original de classe média à brasileira, que faça tesouro das experiências já realizadas em outros países. Infelizmente, não observo nada disso. Ao contrário, me parece que se fala desta nova realidade de maneira distorcida: para exaltá-la em tom de propaganda ou para atraí-la em perspectiva eleitoral.
Aprofundar hoje no Brasil um debate sobre classe média equivale a abrir uma reflexão sobre o País que queremos. Na atual fase de decadência mundial da democracia, quando a política vai atrás da realidade para depois definir as próprias escolhas, o Brasil poderia ter a ambição de inverter o rumo: identificar o caminho a ser percorrido para depois aplicar políticas consequentes, evitando assim submeter-se às dinâmicas ditadas pelos “mercados”.
É verdade que no Brasil também a economia e a finança detêm a hegemonia sobre a política, mas – diferentemente do resto dos países democráticos – as escolhas iluminadas dos últimos tempos construíram uma solidez financeira pública que permitiria à política espaço de manobra mais amplo do que em outras latitudes.
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Educação: O que quebrará o País?
Navegador seguro é o que conhece os mapas e depois decide a rota. No início da longa tempestade econômica que se vislumbra no horizonte, seria sábio estabelecer tal rota com a participação da tripulação, para poder chamá-la a dar o melhor de si nos momentos difíceis que inevitavelmente virão. Mas essa classe trabalhadora ampliada, agora chamada de classe média, não conhece suficientemente a arte de navegar: sua despolitização é patente. Além disso, ela não tem sido adequadamente informada pelo comandante do navio sobre os mares a serem navegados: o Estado não vem oferecendo a necessária educação.
Abre-se então a discussão sobre os (diferentes) papéis da política e do Estado na construção do Brasil futuro. Resulta evidente como a responsabilidade de governo tenha inibido a plena mobilização do PT, do sindicato e das associações aliadas. O que é mais grave, há sintomas de que esta renúncia pode ter-se transformado em perda de efetiva participação social, fundamental alimento de sustentação das organizações progressistas. Os adeptos do neoliberalismo podem facilmente abrir mão desses fatores; as forças de esquerda não, pena a perda de identidade (e segura derrota eleitoral).
Na Europa do pensamento único das décadas passadas, caracterizado pelo consenso neoliberal, os partidos progressistas perderam o senso da própria missão, e suas diferenças em relação aos adversários pareceram ser quase inexistentes. No cidadão fixou-se a convicção de que “são todos iguais”. Resultado: a classe média e os setores populares deram-lhes as costas e preferiram os originais às cópias.
Na dificuldade dessa conjuntura, seria a hora de redescobrir o partido – qualquer partido – como aquela livre associação que não somente organiza, mas elabora e transmite cultura, forja a prática da cidadania, trabalha na sociedade. Esse seria o momento de voar alto novamente e valorizar o papel irrenunciável dos sindicatos independentes e das organizações da sociedade civil. Quanto ao Estado, seria decisivo considerar que o investimento em educação é o que faz a diferença entre cidadão e consumidor.
Não pode ser esquecido que o Brasil se esforça para superar imensos atrasos herdados do passado, mas seria pecar de grave omissão deixar de lembrar que a política atrelada à contingência, não consegue criar uma nova proposta de Estado e um novo projeto-país. Permanecerá, inevitavelmente, portanto, e subalterna às tradicionais classes dominantes.
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