Este blog foi criado em 2008 como um espaço livre de exercício de comunicação, pensamento, filosofia, música, poesia e assim por diante. A interação atingida entre o autor e os leitores fez o trabalho prosseguir.
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Como interpretar a confissão da Globo?
2 de Setembro de 2013, 9:50 - sem comentários aindaSe a Globo confessar todos os pecados, o confessionário ficará ocupado por muitos anos.
Mas é de uma confissão específica que vamos tratar: o apoio ao golpe de 1964. A confissão, expressa numa nota publicada ontem, teve ampla repercussão, como era de esperar.
A questão mais intrigante, para mim, é: o que a Globo pretendeu com isso? A única hipótese lógica que encontro é que ela quis fazer uma ação de marketing que limpe uma marca – ela própria – que, como os protestos de agora mais uma vez mostraram, sofre uma colossal rejeição dos brasileiros.
São remotas, remotíssimas na verdade, as chances de que isso melhore o drama da má reputação da Globo.
Primeiro porque o raciocínio usado no texto é manipulador. Palavras de Roberto Marinho, nos vinte anos do golpe, são evocadas para afirmar uma lorota histórica que eu imaginava que ninguém mais usaria, conhecidos os fatos reais: a de que foi o povo que exigiu a deposição de João Goulart.
Disse Roberto Marinho: “Os acontecimentos se iniciaram, como reconheceu o marechal Costa e Silva, ‘por exigência inelutável do povo brasileiro’. Sem povo, não haveria revolução, mas apenas um ‘pronunciamento’ ou ‘golpe’, com o qual não estaríamos solidários.”
Pobre povo brasileiro: além de ser objeto de uma predação econômica selvagem que transformaria o Brasil no campeão mundial de desigualdade social, ainda é responsabilizado por isso.
Não foi a CIA, não foi a direita, não foram generais reacionários, não foram barões da mídia como Roberto Marinho que deram o golpe do qual seriam grandes beneficiários. Foi o povo, vítima número 1 da quartelada.
Por esse ângulo, para voltarmos à confissão do Globo, Roberto Marinho estava, portanto, ao lado do povo, como um Zorro ou um Robin Hood.
Nas reflexões de RM rememoradas na confissão, são destacados “os avanços econômicos obtidos naqueles vinte anos”.
Avanço para quem?
Para ele, certamente. Os militares lhe deram uma televisão que transformou a Globo de dona de um jornal de segunda categoria numa grande corporação.
Basicamente, foi uma troca: Marinho levou a tevê e, em troca, garantiu apoio à ditadura. No livro Dossiê Geisel, escrito à base de documentos pessoais de Geisel, essa troca aparece com clareza. Roberto Marinho não fazia nenhuma cerimônia em pedir mais e mais favores à ditadura lembrando o apoio que dava a ela.
Para o “povo”, o golpe foi uma tragédia econômica. Os trabalhadores perderam direitos trabalhistas como a estabilidade, e foram proibidos – não raro a balas — de fazer greve para se defender na relação desigual com as empresas.
Disso resultou uma brutal concentração de renda. A fatia do bolo nacional do povo foi minguando, enquanto homens como Roberto Marinho acumulavam uma fortuna pessoal que os levaria, ou a seus herdeiros, às listas de bilionários feitas pela respeitada revista americana Forbes.
A falácia empregada na época, uma criação do homem forte da economia, Delfim Netto, era que o bolo tinha antes que crescer para depois ser distribuído.
Impedidos de responder com greves, os trabalhadores tinham, para usar a grande expressão de Noam Chomsky, a “liberdade de consentir” naquela tese desonesta, cínica e responsável pela favelização do Brasil.
Se realmente quiser melhorar sua imagem, a Globo terá mais sucesso com ações concretas.
Uma delas, que poderia ser a primeira, é pagar o que deve à Receita Federal depois de ter sido flagrada numa fraude fiscal na compra dos direitos da Copa de 2002.
O problema é que, para isso, não bastam palavras. É preciso colocar dinheiro: 1 bilhão de reais em valores atuais.
E quem acredita que a Globo põe a mão no bolso, mesmo em situações escandalosamente claras como aquela, acredita em tudo, como disse Wellington.
(Publicado por DCM)
Artigo original do Comunica Tudo por M.A.D..
Como interpretar a confissão da Globo?
2 de Setembro de 2013, 9:50 - sem comentários aindaSe a Globo confessar todos os pecados, o confessionário ficará ocupado por muitos anos.
Mas é de uma confissão específica que vamos tratar: o apoio ao golpe de 1964. A confissão, expressa numa nota publicada ontem, teve ampla repercussão, como era de esperar.
A questão mais intrigante, para mim, é: o que a Globo pretendeu com isso? A única hipótese lógica que encontro é que ela quis fazer uma ação de marketing que limpe uma marca – ela própria – que, como os protestos de agora mais uma vez mostraram, sofre uma colossal rejeição dos brasileiros.
São remotas, remotíssimas na verdade, as chances de que isso melhore o drama da má reputação da Globo.
Primeiro porque o raciocínio usado no texto é manipulador. Palavras de Roberto Marinho, nos vinte anos do golpe, são evocadas para afirmar uma lorota histórica que eu imaginava que ninguém mais usaria, conhecidos os fatos reais: a de que foi o povo que exigiu a deposição de João Goulart.
Disse Roberto Marinho: “Os acontecimentos se iniciaram, como reconheceu o marechal Costa e Silva, ‘por exigência inelutável do povo brasileiro’. Sem povo, não haveria revolução, mas apenas um ‘pronunciamento’ ou ‘golpe’, com o qual não estaríamos solidários.”
Pobre povo brasileiro: além de ser objeto de uma predação econômica selvagem que transformaria o Brasil no campeão mundial de desigualdade social, ainda é responsabilizado por isso.
Não foi a CIA, não foi a direita, não foram generais reacionários, não foram barões da mídia como Roberto Marinho que deram o golpe do qual seriam grandes beneficiários. Foi o povo, vítima número 1 da quartelada.
Por esse ângulo, para voltarmos à confissão do Globo, Roberto Marinho estava, portanto, ao lado do povo, como um Zorro ou um Robin Hood.
Nas reflexões de RM rememoradas na confissão, são destacados “os avanços econômicos obtidos naqueles vinte anos”.
Avanço para quem?
Para ele, certamente. Os militares lhe deram uma televisão que transformou a Globo de dona de um jornal de segunda categoria numa grande corporação.
Basicamente, foi uma troca: Marinho levou a tevê e, em troca, garantiu apoio à ditadura. No livro Dossiê Geisel, escrito à base de documentos pessoais de Geisel, essa troca aparece com clareza. Roberto Marinho não fazia nenhuma cerimônia em pedir mais e mais favores à ditadura lembrando o apoio que dava a ela.
Para o “povo”, o golpe foi uma tragédia econômica. Os trabalhadores perderam direitos trabalhistas como a estabilidade, e foram proibidos – não raro a balas — de fazer greve para se defender na relação desigual com as empresas.
Disso resultou uma brutal concentração de renda. A fatia do bolo nacional do povo foi minguando, enquanto homens como Roberto Marinho acumulavam uma fortuna pessoal que os levaria, ou a seus herdeiros, às listas de bilionários feitas pela respeitada revista americana Forbes.
A falácia empregada na época, uma criação do homem forte da economia, Delfim Netto, era que o bolo tinha antes que crescer para depois ser distribuído.
Impedidos de responder com greves, os trabalhadores tinham, para usar a grande expressão de Noam Chomsky, a “liberdade de consentir” naquela tese desonesta, cínica e responsável pela favelização do Brasil.
Se realmente quiser melhorar sua imagem, a Globo terá mais sucesso com ações concretas.
Uma delas, que poderia ser a primeira, é pagar o que deve à Receita Federal depois de ter sido flagrada numa fraude fiscal na compra dos direitos da Copa de 2002.
O problema é que, para isso, não bastam palavras. É preciso colocar dinheiro: 1 bilhão de reais em valores atuais.
E quem acredita que a Globo põe a mão no bolso, mesmo em situações escandalosamente claras como aquela, acredita em tudo, como disse Wellington.
(Publicado por DCM)
Artigo original do Comunica Tudo por M.A.D..
Médicos Cubanos: o cheiro da intolerância
2 de Setembro de 2013, 8:49 - sem comentários ainda
A vinda dos médicos cubanos ao Brasil tem alcançado limites do absurdo e falta de imaginação. Ler textos de jornalistas formadores de opinião dizendo que é igual à vinda dos escravos em navios negreiros, é o mesmo que chamar o leitor do jornal de imbecil. Outra pérola ficou com a chamada invasão comunista dita por alguns “profissionais” da informação. O pior de toda essa história é que tem pessoas que acreditam.
Contudo, um fato que talvez passe despercebido: por que os médicos cubanos têm sido alvos das maiores críticas? Os demais tiveram as mesmas reações? Não tanto quanto os cubanos. Parece que isso cheira um tanto a xenofobia. Logo quem? Nós, povo brasileiro conhecido pelo mundo como uma nação tolerante. Pelo contrário, isso mostra o quanto somos hipócritas quando o assunto é querer sobre o mesmo teto a igualdade e a diferença. O antropólogo Roberto Da Mata foi feliz ao dizer que não sabemos viver sob o julgo da Igualdade.
A formação de nossos médicos vem de berço, com o “destino” quase traçado. Existem aqueles que, quando se formam nas universidades públicas, sequer põem os seus pés em um hospital da rede pública. Outros quando estão dentro não dão importância ao paciente, pois talvez esquecem que aquele paciente quase morto é quem paga os impostos e quer em troca simplesmente o direito de ser bem atendido. Ainda há aqueles que batem o cartão quando chegam ao hospital e somente voltam para registrar a saída. Tudo pago com dinheiro do contribuinte. Para que, então, se formam? Estão fazendo jus ao mérito e o diploma?
O descaso vem de ambos os lados. De um lado, o governo administra mal a saúde, não investe em equipamento e em material humano. Por outro lado, médicos elitistas que batem o cartão no hospital público e vão para uma clínica particular. Pacientes perdendo a vida por descasos médicos, em muitos casos não chegam a ser atendidos porque o médico não se encontra no hospital ou simplesmente não está nem aí para o ser humano. Não fico surpreso quando um membro da família desfere uma agressão física nesses profissionais.
Ao olhar a chegada dos médicos cubanos sendo hostilizados pelos próprios colegas de profissão, fica uma pergunta: Será que aquele discurso de salvar vidas é levado a sério? Por que os meios de comunicações têm questionado a vinda somente dos médicos cubanos? A mesma pergunta vale para os próprios médicos.
Longe de eu querer generalizar dizendo que os médicos brasileiros não honram os seus jalecos, mas por um momento fiquei com um misto de vergonha e raiva. Queria não passar por casos como esse. Na atual circunstância, onde nenhum médico brasileiro quer ir tratar onde tem mais necessidade, fica no ar que aquele juramento não valeu de nada.
Mais uma vez as elites burguesas põem para fora suas garras quando o status quo está sendo ameaçado. Não é a primeira nem a última vez. Vivenciamos nos últimos tempos reações de grupos afins, que mandam e desmandam nesse país. Ditando o que devemos fazer ou não para manter o seu controle ideológico sobre os outros. Os mesmos que são contra a presença de médicos cubanos são contra as cotas, a bolsa família e a carteira assinada para as empregadas domésticas. Observamos que as raízes entre a senzala e a casa grande não foram cortadas, e nossas cabeças ainda não foram descolonizadas. O sabe com quem está falando mantém-se ativo quando necessário.
As elites brasileiras não sabem conviver com as diferenças.
Por Fabio Nogueira, brasileiro muito envergonhado dos seus médicos, é estudante de História da Universidade Castelo Branco e militante com orgulho da Educafro.
Fabionogueira95@yahoo.com.br
Artigo original do Comunica Tudo por M.A.D..
Médicos Cubanos: o cheiro da intolerância
2 de Setembro de 2013, 8:49 - sem comentários ainda
A vinda dos médicos cubanos ao Brasil tem alcançado limites do absurdo e falta de imaginação. Ler textos de jornalistas formadores de opinião dizendo que é igual à vinda dos escravos em navios negreiros, é o mesmo que chamar o leitor do jornal de imbecil. Outra pérola ficou com a chamada invasão comunista dita por alguns “profissionais” da informação. O pior de toda essa história é que tem pessoas que acreditam.
Contudo, um fato que talvez passe despercebido: por que os médicos cubanos têm sido alvos das maiores críticas? Os demais tiveram as mesmas reações? Não tanto quanto os cubanos. Parece que isso cheira um tanto a xenofobia. Logo quem? Nós, povo brasileiro conhecido pelo mundo como uma nação tolerante. Pelo contrário, isso mostra o quanto somos hipócritas quando o assunto é querer sobre o mesmo teto a igualdade e a diferença. O antropólogo Roberto Da Mata foi feliz ao dizer que não sabemos viver sob o julgo da Igualdade.
A formação de nossos médicos vem de berço, com o “destino” quase traçado. Existem aqueles que, quando se formam nas universidades públicas, sequer põem os seus pés em um hospital da rede pública. Outros quando estão dentro não dão importância ao paciente, pois talvez esquecem que aquele paciente quase morto é quem paga os impostos e quer em troca simplesmente o direito de ser bem atendido. Ainda há aqueles que batem o cartão quando chegam ao hospital e somente voltam para registrar a saída. Tudo pago com dinheiro do contribuinte. Para que, então, se formam? Estão fazendo jus ao mérito e o diploma?
O descaso vem de ambos os lados. De um lado, o governo administra mal a saúde, não investe em equipamento e em material humano. Por outro lado, médicos elitistas que batem o cartão no hospital público e vão para uma clínica particular. Pacientes perdendo a vida por descasos médicos, em muitos casos não chegam a ser atendidos porque o médico não se encontra no hospital ou simplesmente não está nem aí para o ser humano. Não fico surpreso quando um membro da família desfere uma agressão física nesses profissionais.
Ao olhar a chegada dos médicos cubanos sendo hostilizados pelos próprios colegas de profissão, fica uma pergunta: Será que aquele discurso de salvar vidas é levado a sério? Por que os meios de comunicações têm questionado a vinda somente dos médicos cubanos? A mesma pergunta vale para os próprios médicos.
Longe de eu querer generalizar dizendo que os médicos brasileiros não honram os seus jalecos, mas por um momento fiquei com um misto de vergonha e raiva. Queria não passar por casos como esse. Na atual circunstância, onde nenhum médico brasileiro quer ir tratar onde tem mais necessidade, fica no ar que aquele juramento não valeu de nada.
Mais uma vez as elites burguesas põem para fora suas garras quando o status quo está sendo ameaçado. Não é a primeira nem a última vez. Vivenciamos nos últimos tempos reações de grupos afins, que mandam e desmandam nesse país. Ditando o que devemos fazer ou não para manter o seu controle ideológico sobre os outros. Os mesmos que são contra a presença de médicos cubanos são contra as cotas, a bolsa família e a carteira assinada para as empregadas domésticas. Observamos que as raízes entre a senzala e a casa grande não foram cortadas, e nossas cabeças ainda não foram descolonizadas. O sabe com quem está falando mantém-se ativo quando necessário.
As elites brasileiras não sabem conviver com as diferenças.
Por Fabio Nogueira, brasileiro muito envergonhado dos seus médicos, é estudante de História da Universidade Castelo Branco e militante com orgulho da Educafro.
Fabionogueira95@yahoo.com.br
Artigo original do Comunica Tudo por M.A.D..